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JG de Araújo Jorge – Poesia – 30/11/2023

Boa noite Amor… de mentiras J. G. de Araújo Jorge ¹ Eram beijos de fogo, eram de lavas, e sabiam a sonhos e ambrosias. Com pensar que a boca com que os dava era a mesma afinal com que mentias? Se eras a mais humilde das escravas em dádivas, anseios, alegrias, – como prever que o amor que me juravas seria mais uma das tuas heresias? Como supor ser tudo um falso jogo? E crer que se extinguisse aquele fogo que acendia em teus olhos duas piras? E descobrir, – no instante em que me amavas, – que em tua boca ansiosa misturavas ao mesmo tempo beijos e mentiras? ¹ José Guilherme de Araújo Jorge * Tarauacá, AC. – 20 de Maio de 1914 + Rio de Janeiro, RJ. – 27 de Janeiro de 1983

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Mallarmé – Poesia – 29/11/23

Boa noite. Angústia Mallarmé ¹ Não vim domar teu corpo esta noite, ó cadela Que encerras os pecados de um povo, ou cavar Em teus cabelos torpes a triste procela No incurável fastio em meu beijo a vazar: Busco em teu leito o sono atroz sem devaneios Pairando sob ignotas telas do remorso, E que possas gozar após negros enleios, Tu que acima do nada sabes mais que os mortos: Pois o Vício, a roer minha nata nobreza, Tal como a ti marcou-me de esterilidade, Mas enquanto teu seio de pedra é cidade. De um coração que crime algum fere com presas, Pálido, fujo, nulo, envolto em meu sudário, Com medo de morrer pois durmo solitário. (Tradução de Humberto de Campos) Stéphane Mallarmé * Paris, França – 18 de Março de 1842 d.C + Valvins, França – 09 de Setembro de 1898 d.C Stéphane Mallarmé é um importante nome do simbolismo na poesia francesa. Influenciado por Charles Baudelaire, valoriza o artifício de inverter a sintaxe das frases para ressaltar a dificuldade como elemento principal.

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Pushkin – Poesia – 18/11/23

Boa noite Os olhos dela Pushkin¹ É terror do herói palaciano E bela – aqui posso afirmar -, E é lícito -e, em verso, de plano – Cada seu olho circassiano A estrela do sul comparar. Ela os emprega, se tem azo; Arde nos dois vivo clarão. Mas disto, confessa, faz caso De minha Olènina o olhar? Não. E há neles pensativo duende, E muita infantil expansão, E muito que ao langor atende, E volúpia e imaginação. Se a sorrir qual Lel, ela os desce, Triunfam as graças do pudor; Se os alça, eis anjo que se esquece A contemplar (Sanzio…) o Criador ¹ Aleksandr Sergeevich Pushkin Poeta e novelista Russo * Moscou, Rússia – 1799 d.C + Moscou, Rússia – 1873 d.C

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Vinicius de Moraes – Poesia – 10/11/23

Boa noite Ternura Vinicius de Moraes ¹ Eu te peço perdão por te amar de repente Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos Das horas que passei à sombra dos teus gestos Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos Das noites que vivi acalentado Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente E posso te dizer que o grande afeto que te deixo Não trai o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas Nem as misteriosas palavras dos véus da alma… É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias E só te pede que te repouses quieta, muito quieta E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar estático da aurora. ¹ Marcus Vinicius de Mello Moraes * Rio de Janeiro, RJ. – 19 de Outubro de 1913 + Rio de Janeiro, RJ. – 09 de Julho de 1980

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Tomas Tranströmer – Poesia – 26/10/23

Boa noite Fachadas Tomas Tranströmer ¹ I Ao fim do caminho vejo o poder Lembra uma cebola com rostos sobrepostos que vão caindo uns após outros… II Os teatros esvaziam-se. É meia-noite. Letreiros flamejam nas fachadas. O mistério das cartas sem resposta afunda-se por entre a fria cintilação. Tradução para português por Luís Costa ¹ Tomas Tranströmer * Estocolmo, Suécia – 15 de abril de 1931

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Bárbara Lia – Poesia – 19/10/23

Boa noite Violetas brancas Bárbara Lia ¹ Sigo teus passos, feito asteca, sonhando a terra eterna e rica — tua pele. Pele de diários, onde leio a lua. A maré suave que me enlaça nua, écharpe de brisa e aurora, corais gris. Adeus soledade de pedra. Paloma triste em vôo riste, ao longe. O deus-do-sol-do-meio-dia, colibri azul da era atômica, é um sopro de luz e sons. Sonhos delineados na tela fria. O mundo sangra e transforma a garça em íbis rubro. Leio um salmo antigo, acordo em manhãs violetas. Tenho por companhia um pequeno vaso de violetas brancas. ¹ Bárbara Lia * Assai, PR

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William Henley – Poesia -11/10/23

Boa noite. Invictus William Henley Do fundo desta noite que persiste A me envolver em breu – eterno e espesso, A qualquer deus – se algum acaso existe, Por mi’alma insubjugável agradeço. Nas garras do destino e seus estragos, Sob os golpes que o acaso atira e acerta, Nunca me lamentei – e ainda trago Minha cabeça – embora em sangue – ereta. Além deste oceano de lamúria, Somente o Horror das trevas se divisa; Porém o tempo, a consumir-se em fúria, Não me amedronta, nem me martiriza. Por ser estreita a senda – eu não declino, Nem por pesada a mão que o mundo espalma; Eu sou dono e senhor de meu destino; Eu sou o comandante de minha alma. Tradução de André C S Masini William Ernest Henley * Gloucester, Inglaterra – 23 de agosto de 1849 + Woking, Inglaterra – 11 de julho de 1903[ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]

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Walter Benjamin – Poesia – 02/10/23

Boa noite Como é que a solidão hei-de Ir medindo? Walter Benjamin Como é que a solidão hei-de ir medindo? desse-me os golpes de uso inda esta dor um a um sua nudez a sobrepor que o ritmo sem nome a foi vestindo mas sofro agora o tempo nu saindo numa levada sem nenhum teor gasto caudal do meu rio interior nem chora o peito por mais gritos vindo Quando é que é novo ano na amargura quando volto a chegar-me à desventura que me faz falta em ocos dias vis. ah quando é que arde escura em cores febris à testa do ano como a vi na altura do agosto em chamas funda cicatriz? Walter Benjamin, in “Sonetos” Tradução de Vasco Graça Moura Walter Benedix Schönflies Benjamin + Berlim, Alemanha – 15 de julho de 1892 + Portbou, Espanha – 27 de setembro de 1940

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Shakespeare – Poesia – 01/10/23

Boa noite Soneto LXX William Shakespeare¹ Se te censuram, não é teu defeito, Porque a injúria os mais belos pretende; Da graça o ornamento é vão, suspeito, Corvo a sujar o céu que mais esplende. Enquanto fores bom, a injúria prova Que tens valor, que o tempo te venera, Pois o Verme na flor gozo renova, E em ti irrompe a mais pura primavera. Da infância os maus tempos pular soubeste, Vencendo o assalto ou do assalto distante; Mas não penses achar vantagem neste Fado, que a inveja alarga, é incessante. Se a ti nada demanda de suspeita, És reino a que o coração se sujeita. ¹ William Shakespeare * Stratford-Avon, Inglaterra – 23 de Abril de 1564 + Londres, Inglaterra – 23 de Abril de 1616

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Emily Dickinson – Poesia – 29/09/23

Boa noite Poema Emily Dickinson ¹ Sépala, pétala, espinho. Na vulgar manhã de Verão – Brilho de orvalho – uma abelha ou duas – Brisa saltando nas árvores – – E sou uma rosa! Ter medo? De quem terei? Não da Morte – quem é ela? O Porteiro de meu Pai Igualmente me atropela. Da Vida? Seria cômico Temer coisa que me inclui Em uma ou mais existências – Conforme Deus estatui. De ressuscitar? O Oriente Tem medo do Madrugar com sua fronte sutil? Mais me valera abdicar! A uma luz evanescente Vemos mais agudamente Que à da candeia que fica. Algo há na fuga silente Que aclara a vista da gente E aos raios afia. Experiência para mim É cada qual que eu encontro. Será que contém um fruto? A Imagem de uma Noz Aparece numa Árvore, Igualmente plausível; Mas Miolo é requisito Para esquilos e p’ra Mim. O Fado mata-o, mas ele não caiu – Dos dois – o Fado tombou. E nas mais terríveis varas empalado – A tudo neutralizou. Morde-O e sapa-lhe o mais firme Avanço Mas, quando o Pior passou, E Ele, impassível, o fitou nos olhos, Por Homem o aceitou. ¹ Emily Dickinson * Boston, Usa – 10 de Dezembro de 1830 + Boston, Usa – 15 de Maio de 1886

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