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Severo Sarduy – Poesia – /03/24

Boa noite Poema Severo Sarduy Uma lâmpada Um copo. Uma garrafa. Sem outra utilidade ou pertinência que estar ali, que dar à consciência um casual pretexto, mas não grafa o traço humano que ora inflama, abafa a luz ou que ali beba. Em tudo a ausência: paredes que, caiadas, dão ciência que ali ninguém repousa ou se estafa. Somente é familiar a luz acesa que põe sobre a toalhaposta à mesa a sombra que se alarga: o dia que do tempo o passo segue em sua vaga irrealidade. A tarde já se apaga. Abraçam-se os objetos: sentem medo.

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Alice Ruiz – Poesia – 10/03/24

Boa noite O poeta me viu Alice Ruiz¹ bastou um olhar e pode ver a mola mestra da aprendiz que sou a escolha que fiz no avesso e apesar da sorte adversa de não pesar de ser feliz poeta é quem vê o que não é de dizer e ainda assim diz ¹Alice Ruiz * Curitiba, PR. – 22 de Janeiro de 1946

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Anderson Christofoletti – Poesia – 08/03/24

Boa noite Amor sem destino Anderson Christofoletti ¹ Eterna falta: flama do desejo. Constante busca de um… qualquer ensejo… Metades atreladas pelo beijo: Beijo lascivo, lábios sem pejo, Mixórdia de seivas, amor sedento… Duas faces que carregam igual tormento; Rebentos de um eterno sentimento; Vidas lidas num único momento. A carícia da simples presença; Um crime intrínseco e sem sentença; Ébria necessidade de outra parte… … Desassossego ingente, que, destarte, Eterniflui na atroz e cega crença, Nisto que, mesmo ausente, nunca parte… ¹Anderson Christofoletti *São paulo,SP – 19 de Abril de 1976 d.C

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Yannis Ritsos – Poesia – 06/03/24

Boa noite Creio na poesia Yannis Ritsos Ele diz: creio na poesia, creio no amor, creio na morte, exatamente porque creio na imortalidade. Escrevo um verso, escrevo o mundo; existo; o mundo existe. Da extremidade do meu dedo mínimo corre um rio. O azul do céu é azul sete vezes. Esta pureza é de novo a primeira verdade, a última das minhas ¹Yannis Ritsos * Grécia – 1909 d.C + Atenas, Grécia -1990 d.C

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Wilhelm Klemm – Poesia – 03/03/24

Boa noite. A Alma e o Caos Wilhelm Klemm¹ Não queremos poesia de gênero algum, Queremos truques mágicos de saco, Procuramos tapar na existência um fatal buraco. E apesar de esforço insano não tapamos nenhum. Mas que sabeis vós outros do secreto aspirar, Dos soluços de divina histeria que em gargantas choram, Quando, plenamente absorvidos da alma elementar, Beijamos o primeiro degrau, para além de cujo limiar Erroneamente os deuses moram? Extraído do Livro 100 poemas expressionistas seleção e tradução de João Barrento ¹ Wilhelm Klemm * Bavária, Alemanha – 1881 d.C + Bavária, Alemanha -1968 d.C

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Adriano Espínola – Poesia – 19/02/24

Boa noite. Língua-mar Adriano Espínola¹ A língua em que navego, marinheiro, na proa das vogais e consoantes, é a que me chega em ondas incessantes à praia deste poema aventureiro. É a língua portuguesa, a que primeiro transpôs o abismo e as dores velejantes, no mistério das águas mais distantes, e que agora me banha por inteiro. Língua de sol, espuma e maresia, que a nau dos sonhadores-navegantes atravessa a caminho dos instantes, cruzando o Bojador de cada dia. Ó língua-mar, viajando em todos nós. No teu sal, singra errante a minha voz. ¹Adriano Espínola * Fortaleza, CE. – 1952 d.C Professor de Literatura Brasileira na Universidade Federal do Ceará e professor-leitor na Université Stendhal-Grenoble III (1989-91). Autor de vários livros de poesia e de antologias em português e em inglês. Já tem publicados uma tese sobre a poesia de Gregório de Matos e os seguintes livros de poesia: Fala, favela (1981); O lote clandestino (1982); Trapézio (1984); Táxi (1986); Metrô (1993); Em trânsito (1996), que reúne os dois livros anteriores; Beira-Sol (1997). Em 1998 foi lançada uma segunda edição bilíngüe (português/francês) do seu livro de estréia.

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Giuseppe Ungaretti – Poesia – 10/02/24

Boa noite. Aniquilamento Giuseppe Ungaretti¹ Meu coração esbanjou vaga-lumes se acendeu e apagou de verde em verde fui contando Com minhas mãos plasmo o solo difuso de grilos modulo-me com igual submisso coração Bem-me-quer mal-me-quer esmaltei-me de margaridas enraizei-me na terra apodrecida cresci como um cardo sobre o caule torto colhi-me no tufo do espinhal Hoje como o Isonzo de asfalto azul me fixo ¹Giuseppe Ungaretti * Alexandria, Egito – 1888

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João Cabral de Melo Neto – Poesia – 23/01/24

Boa noite. Ode Mineral João Cabral de Melo Neto¹ É mineral o papel onde escrever o verso; o verso que é possível não fazer. São minerais as flores e as plantas, as frutas, os bichos quando em estado de palavra. É mineral a linha do horizonte, nossos nomes, essas coisas feitas de palavras. É mineral, por fim, qualquer livro: que é mineral a palavra escrita, a fria natureza da palavra escrita. ¹João Cabral de Melo Neto * Recife, Pe. – 9 de Janeiro de 1920 + Rio de Janeiro, Rj. – 9 de Outubro de 1999

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Ezra Pound – Poesia – 24/01/24

Boa noite Tentei escrever o paraíso Ezra Pound¹ Tentei escrever o Paraíso Não se mova Deixe falar o vento Esse é o paraíso. Deixe os Deuses perdoarem O que eu fiz Deixe aqueles que eu amo tentarem perdoar O que eu fiz. ¹ Ezra Weston Loomis Pound * Idaho,USA 30 de outubro de 1885 + Veneza,Itália 1 de novembro de 1972 Poeta, músico e crítico que, junto com T. S. Eliot, foi uma das maiores figuras do movimento modernista da poesia do início do século XX. Ele foi o motor de diversos movimentos modernistas, notadamente do Imagismo e do Vorticismo.

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Manuel Graña Etcheverry – Versos na tarde – 22/01/24

Boa noite. Hoje já passou Manuel Graña Etcheverry¹ Já o dia passa. Já os livros não podem. Já a música não alcança. A evasão é inútil, solitário. Já tens o espelho a tua frente: mira-te, sozinho, fumando o cigarro, mira no quarto tua presença só. Não estão suas mãos nem seus olhos vêm, nem sua voz se aproxima, nem seu beijo, nem chega seu amor para buscar-te. Consumiste sonhos na espera: edifícios de tenues quadros que as horas gastaram pouco a pouco. E ruínas sonoras de estupendos colóquios de amor que imaginaste têm buscado sua tumba nas paredes. Não te bastou a lembrança: desejava-a vivendo e perto e em teus braços. Mas o dia se vai sem que ela venha. Hoje a paz não veio e tens medo. Não quer retratar-se em cristais nem a água do passado te refresca. Mas o dia se vai… cala-o, esqueça. Beija no ar seu rosto ausente. Hoje a paz não veio. Hoje já passou. ¹ Manuel Graña Etcheverry * Córdoba, Argentina – 1915 + Dean Funes, Argentina – 27 de maio de 2015

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