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Geopolítica da América Latina e grande mídia

Nas últimas décadas a América Latina presenciou uma grande ascensão de governos com tendências políticas à esquerda. Por Francisco Fernandes Ladeira ¹ Embora em escalas diferentes, estes mandatários romperam com alguns paradigmas neoliberais, incrementaram políticas sociais, fomentaram uma maior participação estatal em setores estratégicos da economia e colocaram em prática medidas que visavam a minimizar a histórica concentração dos meios de comunicação de massa no subcontinente. Em 2007, Hugo Chávez não renovou a concessão da RCTV alegando que a emissora, ao privilegiar negócios privados em detrimento de prestar informações de interesse público, não cumpria as funções destinadas aos canais de televisão, conforme o previsto na constituição venezuelana. Durante seu mandato também houve grande incentivo para a criação de rádios comunitárias.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] No primeiro governo de Lula, a maioria das outorgas radiofônicas (63,68%) foi concedida para rádios comunitárias. O ex-presidente também ampliou de 499 para 8.094 o número de veículos que recebem publicidade estatal, diminuindo assim os lucros dos grandes empresários da mídia. Por sua vez, Cristina Kirchner promulgou a chamada Ley de Medios, medida que pregava o fim do monopólio de grandes grupos de comunicação argentinos ao restringir a porcentagem de mercado que poderiam dominar e quantos canais poderiam deter, além de incentivar veículos independentes. Seguindo essa tendência, países como Equador e Uruguai também reformaram suas legislações de comunicação nos últimos anos. Tais mudanças coincidiram com os mandatos de Rafael Correa e Pepe Mujica. No âmbito internacional, esses governos de esquerda privilegiaram as relações diplomáticas e econômicas com seus vizinhos continentais ou com outros países subdesenvolvidos em detrimento das históricas alianças com as nações desenvolvidas, sobretudo os Estados Unidos. Entretanto, conforme o colocado pela professora Margareth Steinberger, a América Latina ainda constrói práticas sócio-informativas a partir de um imaginário colonialista. As informações que as nações do subcontinente recebem sobre os países vizinhos não são geradas diretamente por eles, mas por agências de notícias sediadas nos países desenvolvidos. Diante dessa realidade, governos latino-americanos que tenham posturas contrárias aos interesses das grandes potências mundiais ou representem obstáculos para a expansão capitalista tendem a ser representados de maneira negativa na mídia. No documentário Ao Sul da Fronteira, o cineasta Oliver Stone demonstra como a grande imprensa dos Estados Unidos retrata os governantes de esquerda latino-americanos a partir de visões desrespeitosas e levianas, representando Hugo Chávez e Evo Morales como tiranos que perseguem opositores, apoiam narcotraficantes e concedem abrigo a células de organizações terroristas internacionais. Além do mais, estes veículos de comunicação recorrem constantemente a práticas cômicas para difundir clichês e generalizações que ridicularizam hábitos e costumes das populações da América Latina. De maneira geral, conclui Stone, as maiores redes de notícia estadunidenses seguem as orientações da política externa da Casa Branca e dividem o mundo em “amigos” (líderes que fazem o que os Estados Unidos querem que eles façam) e “inimigos” (líderes que tendem a discordar de Washington). Um espaço público privatizado pela mídia Seguindo essa linha noticiosa, os discursos da imprensa brasileira sobre os governos de esquerda latino-americanos são marcados por palavras de forte carga semântica negativa como “populismo”, “caudilhismo”, “ditadura”, “demagogia” e “assistencialismo”. Desde a primeira eleição de Hugo Chávez para a presidência da Venezuela, em 1998, há uma ostensiva campanha midiática com o objetivo de deturpar a imagem do líder bolivariano. Conforme constatou Angelo Adami em um trabalho de graduação em Comunicação Social, mesmo Chávez sendo eleito e reeleito em eleições democráticas, avalizadas por observadores internacionais, dentro das normas constitucionais e com a garantia de direito a voto para todos os cidadãos maiores de idade indistintamente, a revista Veja construiu a imagem do ex-presidente venezuelano como um ditador que representava grande ameaça para a estabilidade política da América do Sul. Após a deposição parlamentar do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, em junho de 2012, Arnaldo Jabor teceu um comentário extremamente preconceituoso sobre os presidentes latino-americanos com tendências políticas à esquerda. Na fala do articulista da Rede Globo, a Bolívia de Evo Morales é uma “república cocalera”, Lula dava dinheiro para o Paraguai, Cristina Kirchner se destaca por usar botox e o próprio Lugo foi “acusado” de “proteger os sem-terra paraguaios”. Não obstante, a concentração dos meios de comunicação de massa latino-americanos em propriedade de poucos grupos não representa apenas a reprodução de ideologias colonialistas, mas, conforme a história recente tem demonstrado, também consiste em grande ameaça aos preceitos democráticos, pois, em ocasiões pontuais, influentes grupos midiáticos contribuíram ativamente para a deposição de governos com tendências políticas à esquerda. Lembrando as palavras da blogueira Cynara Menezes: “A mídia tem sido o braço pseudo-democrático dos golpes brancos que vêm ocorrendo na América do Sul ao longo da última década. Como não consegue ganhar eleições, a direita se alia aos principais jornais e emissoras de TV e apela a soluções jurídicas, quando não diretamente para a força bruta, para chegar ao poder.” Portanto, como nosso imaginário social latino-americano tornou-se um espaço público privatizado pela mídia, articulado a partir das categorias da linguagem jornalística, um novo espaço de resistência subcontinental depende, intrinsecamente, de um esforço coletivo para “desmidiatizar o pensamento”. Para isso, torna-se necessário solapar qualquer forma de “coronelismo midiático” e promover uma completa democratização dos meios de comunicação de massa para permitir que os diferentes setores sociais da América Latina construam representações sociais próprias e tenham voz para divulgar suas demandas e reivindicações. Uma democracia verdadeira requer, sobretudo, uma mídia que não seja mera reprodutora do status quo, mas que contemple a grande pluralidade de espectros ideológicos. ¹Francisco Fernandes Ladeira é mestrando em Geografia

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América Latina vive o fim da era dourada da esquerda no poder

A derrota de Evo Morales no referendo boliviano, a quem muitos viam como o último moicano da esquerda bolivariana, marca uma mudança de ciclo evidente na América Latina, que começou com a vitória de Mauricio Macri na Argentina. Maduro conversa com Morales e Correa, em uma reunião na Bolívia. Fot: Jorge Abrego/efe MAIS INFORMAÇÕES PF investiga se o presidente do Peru, Ollanta Humala, recebeu propina da Odebrecht Evo Morales atribui sua derrota à “guerra suja” e às redes sociais Lava Jato ganha alcance internacional com João Santana e Odebrecht Depois de anos de grande crescimento e inclusão social, a crise econômica e uma sociedade latino-americana nova, com gerações exigentes que demandam mais e melhor democracia e não toleram a corrupção nem o poder absoluto, estão derrubando um a um quase todos os Governos da região.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] A Argentina viveu o início do eixo bolivariano, com a reunião de Mar del Plata de 2005, que marcou uma década de afastamento dos EUA e de políticas contrárias à ortodoxia econômica. O país austral também marcou o final, com a derrota do kirchnerismo em novembro passado, depois de 12 anos no poder. Só três semanas depois foi a vez das eleições na Venezuela, que representaram o princípio do fim do chavismo no poder com a conquista de dois terços do Parlamento pela oposição. Agora a Bolívia também diz não à continuidade de Morales depois de 2019. O presidente equatoriano, Rafael Correa, também com problemas, anunciou que não tentará a reeleição em 2017.  E em poucas semanas, em abril, o Peru deve concluir o ciclo com a saída de cena de Ollanta Humala e o provável regresso de um Fujimori ao poder. O Brasil, por outro lado, vive uma crise política econômica e política permanente, e o Partido dos Trabalhadores, que governa o país há quase 13 anos, corre sérios riscos de não fazer um sucessor para a presidenta Dilma Rousseff em 2018, quando o ex-presidente Lula, que governou o país de 2003 a 2010, poderia se candidatar novamente. Mas, denúncias de corrupção ininterruptas na mídia que atingem o próprio Lula e outros membros do partido, além de uma recessão que já entra no seu segundo ano, reduzem as chances de que esse intento seja bem-sucedido. Algo parece evidente: na América Latina há correntes de fundo. Nos anos noventa triunfou o liberalismo. O início do século XXI chegou com um forte grito anti-neoliberal. Agora há uma guinada à direita? Ninguém parece corroborar com essa tese. Os dados indicam, na verdade, que os cidadãos latino-americanos, sobretudo as novas gerações, depois de conseguir uma maior inclusão social e um aumento da classe média, querem mais, e se tornaram muito críticos com o poder. Reconhecem as conquistas de seus Governos mas não se conformam. Morales, por exemplo, tem boa avaliação, poderia ganhar as eleições, mas quando esta semana perguntou-se se a população lhe permitiria mais uma reeleição, a ideia foi rechaçada com 51,3%. Querem mudança. Na Argentina, aconteceu algo parecido. Cristina Fernández de Kirchner tinha uma alta avaliação, mas, quando quis mudar a Constituição para poder continuar, perdeu em 2013 as eleições intermediárias, propostas quase como um plebiscito. Os dados indicam, na verdade, que os cidadãos latino-americanos, sobretudo as novas gerações, depois de conseguir uma maior inclusão social e um aumento da classe média, querem mais, e se tornaram muito críticos com o poder. Contra a corrupção Em todos os países há uma linha comum: os protestos exigem maior transparência, luta contra a corrupção e uma troca geracional. A Bolívia foi o país com maior crescimento econômico do eixo bolivariano. No entanto, como aconteceu a seus correligionários, diante do enfrentamento da economia e do surgimento de casos de corrupção, optou por defender-se recorrendo a um discurso do qual os cidadãos parecem já cansados: uma conspiração orquestrada pelos EUA. O fim da década dourada das matérias-primas também tem muito a ver com esta mudança de ciclo. As economias latino-americanas cresceram, entre 2003 e 2012, acima de 4%, segundo dados da CEPAL. Desde os anos sessenta, a região não registrou um período tão intenso. No entanto, as previsões do Fundo Monetário Internacional destacam que a economia latino-americana acabará 2016 com uma recessão do 0,3%. A queda das matérias-primas é a principal causa. Entre 2011 e 2015, a queda dos preços dos metais e da energia (petróleo, gás e carvão) foi de quase 50%, segundo a CEPAL. Só em 2015, os produtos energéticos caíram 24%. Estes anos de bonança e Governos de esquerda mudaram muitas coisas no continente. Durante a década de ouro, entre 2002 e 2012, os níveis de pobreza caíram de 44% para 29%, enquanto que os de pobreza extrema diminuíram de 19,5% para 11,5%, com um aumento considerável das classes médias. Também houve um aumento notável do gasto público. E isso implicou em inclusão social. Uma amostra: entre 1999 e 2011, segundo a Unesco, o nível de escolarização inicial passou de 55% a 75%. No entanto, os cidadãos não se conformam. Querem mais e melhor. E tudo indica que quase nenhum Governo ficará em pé diante desta onda. El País

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Por que o Brasil está procurando uma saída para o Pacífico

Mais um projeto para escoar produtos brasileiros pelo Pacífico está entre os temas que a presidente Dilma Rousseff deve levar ao encontro com o líder equatoriano, Rafael Correa, nesta terça-feira, segundo autoridades brasileiras.  Dilma se encontra com Rafael Correa nesta terça; integração do Brasil ao Pacífico está entre os temas a serem discutidos. Img. Copyright Roberto Stuckert Fº Trata-se da rota que liga o Norte do Brasil ao porto equatoriano de Manta – conhecido como eixo Manta-Manaus. Nos últimos anos, foram elaborados diversos projetos para criar a infraestrutura necessária para que os produtos brasileiros possam cruzar para o outro lado da América do Sul. O que está mais avançado é a chamada rodovia interoceânica, que liga a fronteira do Brasil, no Acre, com três portos no Peru, passando pelos Andes e pela Amazônia peruana.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Em 2014, os presidentes do Brasil, Peru e China assinaram um memorando de entendimento, para construir a ferrovia transcontinental, ligando o Rio de Janeiro à costa peruana, mas o projeto ainda não saiu do papel. O eixo multimodal Manta-Manaus, que é visto com ceticismo por alguns analistas, seria um corredor logístico unindo o porto equatoriano de Manta a Manaus por rios e estradas. Sua implementação exige a construção de portos fluviais e a dragagem do rio Napos, na Amazônia equatoriana. O projeto foi incluído ainda nos anos 2000 no portfólio da Iniciativa para a Integração Regional Sul-Americana (IIRSA), embora em mais de uma década apenas algumas de suas obras tenham sido finalizadas. “Esperamos que (nesse encontro bilateral) possa haver avanços na finalização do eixo multimodal Manta-Manaus”, disse o subsecretário-geral do Itamaraty para a América do Sul, Paulo Estivallet, em entrevista coletiva para comentar a agenda da reunião entre Dilma e Correa. Mas por que, afinal, o país estaria interessado em mais um projeto de ligação com o Pacífico?   Porto de Manta, no Equador, seria rota alternativa ao Canal do Panamá, mas projeto requer diversas obras – Image copyright Thinkstock Mais rápido do que pelo Panamá Segundo Estivallet, “funcionando adequadamente”, o eixo “Manta-Manaus” permitiria “o transporte (de produtos) com uma redução de até dez dias com relação ao transporte pelo Canal do Panamá, que é a atual rota para o Pacífico. “Isso abre uma possibilidade importante não só para o comércio entre os dois países, mas também para a exportação de produtos brasileiros, principalmente da região Norte para o Pacifico, via esse porto no Equador”, disse. Segundo autoridades dos dois países, a ideia é que esse eixo também ajude a ativar o comércio pelas regiões em que passa. “O Equador e o norte do Peru, por exemplo, podem vender ao Norte do Brasil produtos como frutas, cimento e outros, que hoje vêm do Nordeste a um preço maior”, explicou uma fonte ligada ao Itamaraty. “Isso interessa aos equatorianos porque ajudaria a dar um equilíbrio maior para o comércio local – atualmente exportamos para o Equador quatro ou cinco vezes mais do que importamos desse país.” Hoje, boa parte das ligações entre os países sul-americanos é pouco confiável como rota comercial. O comércio é feito principalmente por meio de barcos que contornam a costa brasileira e atravessam para o Pacífico pelo Canal do Panamá, o que é caro e leva muito tempo. Por isso, os projetos de rotas que atravessam o território brasileiro ao de países vizinhos sempre foram vistos como uma alternativa para o acesso a mercados da Ásia e da própria América Latina – como o Equador – principalmente diante da sobrecarga dos portos mais tradicionais brasileiros, como o de Santos. Críticas e ceticismo Há quem critique esses projetos, porém, dizendo que não adianta o Brasil querer a abertura de estradas e hidrovias em países vizinhos se as conexões das grandes áreas produtoras e exportadoras com as fronteiras ainda são precárias. Até em função da existência desses outros projetos de saída para o Pacífico, o economista e especialista em relações internacionais equatoriano Marco Romero é cético sobre a possibilidade uma finalização do eixo Manta-Manaus. “O Brasil já tem esse outro projeto de acesso ao Pacífico pelo Peru, que está mais avançado, então seria mais fácil apostar nessa alternativa em um contexto de orçamento apertado”, diz ele. “A questão é que, se o eixo Manta-Manaus não andou em tempos de vacas gordas, quando os dois países tinham dinheiro para gastar, vai ser mais difícil que caminhe agora, quando o Brasil está em recessão e o governo equatoriano tem menos recursos em função da queda do petróleo. A história nos mostra que nas crises econômicas há retração e até crise de identidade nas iniciativas de integração.” Um dos temas “pendentes” no que diz respeito a esse projeto é que uma das obras que complementaria o eixo seria a ampliação e modernização do porto marítimo de Manta, cuja licitação foi ganha pela empresa brasileira Odebrecht em 2014 (com financiamento do BNDES), mas não avançou. Segundo a imprensa equatoriana, o contrato para essa obra não foi firmado por falta de acordos sobre a questão econômica. Após divulgar que não assinaria o contrato, o Ministério do Transporte equatoriano anunciou uma redução no valor máximo a ser aplicado na fase inicial da obra – de US$ 180 para 160 milhões. “Então esse é um dos temas que também poderiam estar na pauta (da reunião bilateral). O Brasil pode sugerir que o projeto seja retomado ainda que em uma escala um pouco menor”, disse uma fonte próxima ao governo brasileiro. Dependência do Canal do Panamá encarece e dificulta rota para o Pacífico Odebrecht e relações bilaterais Nos últimos anos, o momento de maior tensão nas relações bilaterais foi criado pela expulsão da Odebrecht do Equador, em 2008, como lembra Michel Levi, coordenador da cátedra Brasil-Comunidade Andina da Universidade Andina Simón Bolívar. Na época, a empresa foi acusada por Correa de responsabilidade pelas falhas estruturais da obra da hidrelétrica de São Francisco, que fizeram com que a usina tivesse de ser paralisada. Correa também resolveu levar a arbitragem internacional termos do contrato do BNDES, que financiou a obra. O processo

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Lula mete o casco na democracia

Qualquer pessoa isenta e com um pouquinho de bom senso, não tem a menor dúvida que o voto distrital é a melhor solução para o país. Aristóteles há 2.500 anos já alertava “Seria um grande perigo permitir que a massa dos cidadãos, por serem homens livres, mas que não são ricos, nem se distinguem por alguma espécie de mérito pessoal, partilhassem de altos cargos do governo, pois sua tolice os levaria ao erro e sua desonestidade ao crime”. O Editor Lula mete o casco na democracia, escoiceia a lei e fala até em Constituinte. Responda ao coice chavista com o voto distrital! Ao receber o título de doutor honoris causa da Universidade Federal da Bahia, aquela que está caindo aos pedaços, Luiz Inácio Apedeuta da Silva resolveu se tomar como a medida de todas as coisas e recomendou: “Político tem de ter o casco duro”. Merece ou não merece ser considerado um doutor do saber? Na sua campanha aberta à eleição presidencial de 2014, resolveu ser o grande comandante da reforma política. E o homem mete os cascos mesmo, não quer nem saber. Em companhia do vice-presidente, Michel Temer, começa escoiceando a lei e usando o Palácio do Jaburu como se fosse a sede do PT ou de algum partido da base aliada. Ocupou o aparelho público para comandar uma reunião com partidos da base aliada para tratar da reforma. Leiam um trecho da reportagem de Andrea Jubé Vianna e Tania Monteiro no Estadão. Em reunião ontem com líderes de partidos governistas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que, se não houver acordo para votar a reforma política no Congresso, a base aliada deve se empenhar pela convocação de uma Assembléia Constituinte para mudar o sistema eleitoral. Lula trabalha pela aprovação do financiamento público de campanha, voto proporcional misto e fim das coligações proporcionais. Diante do vice-presidente Michel Temer e de parlamentares e dirigentes de PMDB, PT, PSB, PDT e PC do B, Lula disse, em encontro no Palácio do Jaburu, que a corrupção “diminui bastante” com o financiamento público, mas admitiu haver dificuldades para a aprovação da proposta. Depois de afirmar, na véspera, que “político tem de ter casco duro” e não pode “tremer” quando for acusado de fazer “coisa errada”, Lula disse que 90% das denúncias hoje divulgadas pela imprensa têm como base investigações da Controladoria-Geral da União (CGU), da Polícia Federal e do Ministério Público. Apesar da animação de Lula, o deputado Henrique Fontana (PT-RS), relator da reforma, admitiu não haver consenso entre os partidos, em especial sobre o novo modelo de votação. Contudo, Fontana e o presidente do PMDB, senador Valdir Raupp (RO), citaram avanços nas negociações para a aprovação do financiamento público, principal bandeira do PT. Raupp declarou que o PMDB aceita o financiamento público, principalmente se a reforma contemplar o fim das coligações nas eleições proporcionais. No entanto, advertiu: “O PMDB não aceita o voto em lista defendido pelo PT”. O PMDB defende o voto majoritário nas eleições proporcionais (deputados e vereadores), o chamado “distritão”. “Se complicar demais, a reforma política não sai”, disse. (Aqui). Constituinte para fazer reforma é o método a que recorreram, deixem-me ver… Hugo Chávez, Evo Morales e Rafael Correa… Só gente com vocação para ditador propõe uma estupidez como essa. Assembléias constituintes são instaladas quando se tem um rompimento pra valer da ordem legal. É o caso? A reforma de Lula não poderia ser mais perniciosa para o Brasil. O voto proporcional misto tornará péssimo o que é ruim. Além de carregar todos os vícios do modelo em curso, ainda cassa do eleitor o direito de escolher metade da Câmara. A proposta do financiamento público, como já escrevi há tempos, seria só uma idéia com cascos e orelhas grandes, que afronta a lógica, não fosse uma pilantragem política. Se, hoje, mesmo com a lei permitindo doações privadas, já se faz caixa dois, adivinhem o que aconteceria se elas fossem proibidas. LULA QUER É ESCONDER OS DOADORES DE CAMPANHA. Segundo sua proposta de financiamento público, a maior parte do dinheiro seria distribuída segundo as bancadas da Câmara definidas na eleição anterior — vale dizer: seria mel na sopa para o PT. Ora, a proposta pretende congelar uma vantagem e projetá-la no futuro. Digam-me: e se um determinado partido, com uma grande bancada, fizer um governo desastroso e passar a ser repudiado pela opinião pública? Mesmo assim será o grande destinatário dos recursos públicos com base no que aconteceu há quatro anos? Será premiado pelas bobagens que fez? Todas as pessoas que se sentem compelidas a se manifestar contra a corrupção deveriam refletir bastante sobre as ações de Lula. Sua proposta de reforma política é a quintessência de um modelo corrupto. Não há reforma decente que não passe por um estreitamento da relação entre representante e representado. O Apedeuta, de casco duro, quer exatamente o contrário. Por isso, avalie as vantagens do voto distrital e combata esse verdadeiro assalto ao bolso e à moralidade política que é o financiamento público de campanha. Por Reinaldo Azevedo

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