Mudando para lucrar mais?
País viveu experiência de que é possível ter falta d’água mesmo com maior estoque hídrico do planeta: 12% da água doce superficial
“No fronte da guerra de Bolsonaro pela Amazônia, quem depende da floresta luta contra a catástrofe climática.” Estou fazendo a minha parte. Por favor, leiam!
Manoel de Barros: “Quem não tem ferramentas de pensar, inventa”.
Estudo aponta ser possível produzir alimentos suficientes para os quase 10 bilhões de habitantes que o planeta deve ter em meados do século. Para isso, é essencial mudar a dieta, sobretudo comendo menos carne. A ONU estima que, dos 7,1 bilhões atuais, até 2050 a população mundial passará a 9,7 bilhões. Algo que preocupa quando se pensa em todas as bocas a alimentar – ainda mais tendo em vista como a agricultura industrial afeta o planeta com erosão, emissões de CO2, poluentes químicos e perda de biodiversidade.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] No entanto, um estudo publicado nesta semana pela revista Nature traz boas notícias: há maneiras de fornecer alimentos para uma população de até 10 bilhões de pessoas e, ao mesmo tempo, manter as florestas que restam intactas. E isso até mesmo sem mudanças drásticas na dieta humana, afirma Karl-Heinz Erb, principal autor do estudo. Mas é necessário encontrar um equilíbrio entre o tipo de métodos agrícolas utilizados, a preservação do meio ambiente e a alimentação diária. Consumo de carne O estudo aponta que a quantidade de carne consumida é um fator importante. Se a humanidade abrisse mão de produtos animais, tornando-se vegana, se precisaria de menos espaço para cultivo em 2050 do que no ano 2000, mesmo com uma população mundial significativamente maior. Contudo, se a humanidade continuar comendo carne como hoje, em meados do século serão necessários mais de 50% de áreas agrícolas adicionais, prevê o estudo. Culto à alimentação saudável pode virar doença “Se virmos uma forte onda de dietas vegetarianas ou veganas, até mesmo nas classes mais baixas, podemos ter cenários factíveis, pois a demanda [de carne] não seria tão grande”, afirma Erb. Os pesquisadores se basearam principalmente em projeções da demanda de alimentos traçadas pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), que preveem forte intensificação da agricultura. Mas os cientistas também analisaram cenários com colheitas menores – como resultado ou de uma mudança em direção a métodos menos intensivos, como a agricultura orgânica, ou de impactos das mudanças climáticas que reduzam a produtividade. Status quo Erb afirma que cenários “business as usual” – ou seja, manter os métodos atuais – até são possíveis em termos de disponibilidade alimentar, mas fora os custos ecológicos que acarreta, é questionável se são desejáveis ou não. Ao mesmo tempo em que dietas tipicamente ocidentais, com muita carne e alimentos processados, não são saudáveis, uma em cada nove pessoas no mundo “não tem alimento suficiente para levar uma vida saudável”, segundo o Programa Alimentar Mundial, da ONU. A partir dessa perspectiva, a questão não é tanto a possibilidade de manter o status quo à medida que a população mundial cresce, mas sim como encontrar rapidamente melhores maneiras de alimentar o mundo. José Luis Vivero Pol, pesquisador da Universidade de Louvain, na Bélgica, argumenta que a nutrição básica deveria ser garantida, da mesma maneira que muitos países garantem acesso à educação e à saúde. Agricultura intensiva e monocultura, como a da soja, têm altos custos ambientais Problema do desperdício O especialista em governança alimentar afirma que o desafio não é encontrar maneiras de aumentar a produção de alimentos, pois já se produzi o suficiente para alimentar quase 9 bilhões de pessoas. O problema é que um terço dessa produção é desperdiçado – problema também aprontado no estudo publicado na Nature. “Por a comida ser tão barata, não nos importa desperdiçar um terço dela – ainda é rentável”, comentou Pol à DW. “Isso seria impossível em qualquer outra cadeia de produção industrial.” Ele culpa a cultura de não dar valor à comida pelo conceito de produzir o máximo de comida possível a custos mínimos. No Ocidente industrializado, acredita-se que se pode comer tanta carne quanto se quer, pensando-se pouco na grande quantidade de alimentos jogados no lixo, diz. Quando consumidores fazem escolhas que têm um impacto tão negativo, o Estado precisa intervir, aponta Pol – por exemplo, redirecionando os enormes subsídios à agricultura industrial para práticas mais sustentáveis, e taxando ou limitando a venda de carne. Karl-Heinz Erb salienta que seu estudo não é sobre segurança alimentar em geral, mas sim sobre assegurar que há capacidade de produzir comida suficiente, considerando os níveis atuais de consumo. Os resultados podem ser interpretados como uma alternativa oferecida à humanidade: entre preservar ecossistemas e a saúde humana, e sistemas de produção de alimentos que não saudáveis para as pessoas nem para o planeta.
Artigo de Odenildo Sena, ex-presidente do CONSECTI e ex-presidente do CONFAP sobre a proposta de extinção da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia & Inovação (SECTI) do Amazonas Há dois tipos de gestores políticos: os que são desprovidos de espírito público, infelizmente a maioria, e os que cultivam essa virtude, infelizmente a minoria. Para os primeiros, o horizonte de tempo sempre está sintonizado com suas ambições e interesses pessoais. No dia em que assumem o governo do estado ou a prefeitura, por exemplo, já o fazem de olho vidrado no final dos quatros anos de mandato. Até lá, toda e qualquer ação é medida e calculada com a metragem do varejo, caracterizando-se pelo imediatismo e, portanto, ao sabor dos interesses paroquiais que, por sua vez, estarão a serviço da eleição seguinte. Metaforicamente, fazem do pão, do circo e da verborragia sua exclusiva plataforma de governo. Para os que cultivam o espírito público, por outro lado, os quatro anos à frente não deixam de ser referência para uma nova empreitada eleitoral, mas não são limitadores de suas ações em prol da coletividade. Preocupam-se e agem sobre as necessidades imediatas por força das contingências, mas seu olhar e suas obras voltadas para o bem comum estão sempre adiante de seu tempo e muito além de seu mandato. Daí a conclusão: nada mais nocivo na vida pública do que um homem público sem espírito público. Neste sentido, é consequência até natural que o homem público sem espírito público mantenha uma convivência sempre conflituosa com o mundo científico, sobretudo caracterizada pelo desprezo e pela indiferença. Afinal, o tempo da ciência, além de ser regulado pela necessária continuidade, é marcado por algumas ações que, se têm data pra começar, não têm data pra terminar. Só pra ficar num exemplo bem impactante, há mais de setenta anos pesquisadores, em vários cantos do mundo, tentam encontrar o caminho que resulte em uma vacina contra a dengue. Nunca estiveram tão perto, é certo, mas lá se foram sete décadas![ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Essa reflexão vem à tona a propósito da trágica decisão do senhor governador do Amazonas de extinguir a Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia & Inovação (SECTI). Criada em 2003, não há como negar que, de seus acertos, essa foi uma das iniciativas mais importantes e de maior visão de futuro do então governador Eduardo Braga. Ao lado da SECTI, criou a Fapeam e instituiu o Sistema Público Estadual de CT&I. Com isso, pavimentou a estrutura para o avanço científico e tecnológico no Estado, mérito dos mais louváveis. Em seus 11 anos, o Amazonas deu saltos extraordinários na produção científica, na formação de mestres e doutores e na inovação tecnológica e, como se sabe, passou a ser reconhecido e a compor o mapa da ciência brasileira, sem contar com incursões e parcerias internacionais. Vale lembrar, a Fapeam continua sendo a quarta instituição do gênero no Brasil, atrás apenas de SP, Rio e Minas. Suficiente? Não, claro que não. Consolidar um sistema dessa natureza exige muito mais tempo de maturação e ações contínuas, a exemplo do caso de São Paulo, cuja estrutura tem mais de cinquenta anos e é referência no Brasil e no mundo. Interromper esse avanço virtuoso, portanto, é um golpe duro no presente e no futuro do desenvolvimento do Estado e, sem dúvida alguma, o mais estúpido dos equívocos e a demonstração mais cabal de obscurantismo, ausência de espírito público e falta de compromisso com o futuro do Amazonas. Por fim, a justificativa corrente de que o propósito é enfrentar a crise econômica e reduzir despesas soa como flagrante contrassenso. De um lado, porque as nações mais poderosas do mundo nos ensinam que a saída para as crises está exatamente na valorização do capital intelectual, no aumento da produção de conhecimentos e na inovação tecnológica. De outro, porque a SECTI, pelo seu extraordinário papel articulador das ações de CT&I no Estado, não dá prejuízo. Muito pelo contrário. Só pra ficar no ano de 2014 e no plano de recursos, sua atuação permitiu captar em recursos federais para o sistema no Amazonas R$ 37,4 milhões. Ou seja, 8 vezes mais do que o seu reduzido orçamento, de R$ 4,5 milhões. Prejuízo grande mesmo é o desatino de extinguir a instituição. É bom a comunidade científica e estudantil vestir luto.