Estudo aponta ser possível produzir alimentos suficientes para os quase 10 bilhões de habitantes que o planeta deve ter em meados do século. Para isso, é essencial mudar a dieta, sobretudo comendo menos carne.
A ONU estima que, dos 7,1 bilhões atuais, até 2050 a população mundial passará a 9,7 bilhões.
Algo que preocupa quando se pensa em todas as bocas a alimentar – ainda mais tendo em vista como a agricultura industrial afeta o planeta com erosão, emissões de CO2, poluentes químicos e perda de biodiversidade.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”]
No entanto, um estudo publicado nesta semana pela revista Nature traz boas notícias: há maneiras de fornecer alimentos para uma população de até 10 bilhões de pessoas e, ao mesmo tempo, manter as florestas que restam intactas.
E isso até mesmo sem mudanças drásticas na dieta humana, afirma Karl-Heinz Erb, principal autor do estudo. Mas é necessário encontrar um equilíbrio entre o tipo de métodos agrícolas utilizados, a preservação do meio ambiente e a alimentação diária.
Consumo de carne
O estudo aponta que a quantidade de carne consumida é um fator importante. Se a humanidade abrisse mão de produtos animais, tornando-se vegana, se precisaria de menos espaço para cultivo em 2050 do que no ano 2000, mesmo com uma população mundial significativamente maior.
Contudo, se a humanidade continuar comendo carne como hoje, em meados do século serão necessários mais de 50% de áreas agrícolas adicionais, prevê o estudo.
“Se virmos uma forte onda de dietas vegetarianas ou veganas, até mesmo nas classes mais baixas, podemos ter cenários factíveis, pois a demanda [de carne] não seria tão grande”, afirma Erb.
Os pesquisadores se basearam principalmente em projeções da demanda de alimentos traçadas pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), que preveem forte intensificação da agricultura. Mas os cientistas também analisaram cenários com colheitas menores – como resultado ou de uma mudança em direção a métodos menos intensivos, como a agricultura orgânica, ou de impactos das mudanças climáticas que reduzam a produtividade.
Status quo
Erb afirma que cenários “business as usual” – ou seja, manter os métodos atuais – até são possíveis em termos de disponibilidade alimentar, mas fora os custos ecológicos que acarreta, é questionável se são desejáveis ou não.
Ao mesmo tempo em que dietas tipicamente ocidentais, com muita carne e alimentos processados, não são saudáveis, uma em cada nove pessoas no mundo “não tem alimento suficiente para levar uma vida saudável”, segundo o Programa Alimentar Mundial, da ONU.
A partir dessa perspectiva, a questão não é tanto a possibilidade de manter o status quo à medida que a população mundial cresce, mas sim como encontrar rapidamente melhores maneiras de alimentar o mundo.
José Luis Vivero Pol, pesquisador da Universidade de Louvain, na Bélgica, argumenta que a nutrição básica deveria ser garantida, da mesma maneira que muitos países garantem acesso à educação e à saúde.
Problema do desperdício
O especialista em governança alimentar afirma que o desafio não é encontrar maneiras de aumentar a produção de alimentos, pois já se produzi o suficiente para alimentar quase 9 bilhões de pessoas.
O problema é que um terço dessa produção é desperdiçado – problema também aprontado no estudo publicado na Nature.
“Por a comida ser tão barata, não nos importa desperdiçar um terço dela – ainda é rentável”, comentou Pol à DW. “Isso seria impossível em qualquer outra cadeia de produção industrial.”
Ele culpa a cultura de não dar valor à comida pelo conceito de produzir o máximo de comida possível a custos mínimos. No Ocidente industrializado, acredita-se que se pode comer tanta carne quanto se quer, pensando-se pouco na grande quantidade de alimentos jogados no lixo, diz.
Quando consumidores fazem escolhas que têm um impacto tão negativo, o Estado precisa intervir, aponta Pol – por exemplo, redirecionando os enormes subsídios à agricultura industrial para práticas mais sustentáveis, e taxando ou limitando a venda de carne.
Karl-Heinz Erb salienta que seu estudo não é sobre segurança alimentar em geral, mas sim sobre assegurar que há capacidade de produzir comida suficiente, considerando os níveis atuais de consumo.
Os resultados podem ser interpretados como uma alternativa oferecida à humanidade: entre preservar ecossistemas e a saúde humana, e sistemas de produção de alimentos que não saudáveis para as pessoas nem para o planeta.