Cruz e Souza – Versos na tarde – 31/07/2016

Assim Seja
Cruz e Sousa¹

Fecha os olhos e morre calmamente!
Morre sereno do Dever cumprido!
Nem o mais leve, nem um só gemido
traía, sequer, o teu Sentir latente.

Morre com a alma leal, clarividente,
da Crença errando no Vergel florido
e o Pensamento pelos céus brandido
como um gládio soberbo e refulgente.

Vai abrindo sacrário por sacrário
do teu Sonho no templo imaginário
na hora glacial da negra Morte imensa…

Morre com o teu Dever! Na alta confiança
de quem triunfou e sabe que descansa.
desdenhando de toda a Recompensa!

¹João da Cruz e Sousa
* Desterro, atual Florianópolis, SC. – 14 de Novembro de 1861 d.C
+ Antonio Carlos, MG. – 19 de Março 1898 d.C
Poeta brasileiro, alcunhado Dante Negro e Cisne Negro. Foi um dos precursores do simbolismo no Brasil. Filho de negros alforriados, desde pequeno recebeu a tutela e uma educação refinada de seu ex-senhor, o Marechal Guilherme Xavier de Sousa – de quem adotou o nome de família. Aprendeu francês, latim e grego, além de ter sido discípulo do alemão Fritz Müller, com quem aprendeu Matemática e Ciências Naturais.
Em 1881, dirigiu o jornal Tribuna Popular, no qual combateu a escravidão e o preconceito racial. Em 1883, foi recusado como promotor de Laguna por ser negro. Em 1885 lançou o primeiro livro, Tropos e Fantasias em parceria com Virgílio Várzea. Cinco anos depois foi para o Rio de Janeiro, onde trabalhou como arquivista na Estrada de Ferro Central do Brasil, colaborando também com o jornal Folha Popular. Em Fevereiro de 1893, publica Missais e em agosto, Broquéis, dando início ao Simbolismo no Brasil. Em novembro desse mesmo ano casou-se com Gavita Gonçalves, também negra, com quem tem quatro filhos, todos mortos prematuramente por tuberculose, levando-a à loucura.

Faleceu a 19 de Março de 1898 no município mineiro de Antônio Carlos, num povoado chamado Estação do Sítio, para onde fôra transportado às pressas vencido pela tuberculose. Teve o seu corpo transportado para o Rio de Janeiro em um vagão destinado ao transporte de cavalos. Ao chegar, foi sepultado no Cemitério de São Francisco Xavier por seus amigos, dentre eles José do Patrocínio, onde permanece até hoje.

Análise da obra
Seus poemas são marcados pela musicalidade (uso constante de aliterações), pelo individualismo, pelo sensualismo, às vezes pelo desespero, às vezes pelo apaziguamento, além de uma obsessão pela cor branca. É certo que encontram-se inúmeras referências à cor branca, assim como à transparência, à translucidez, à nebulosidade e aos brilhos, e a muitas outras cores, todas sempre presentes em seus versos.

Não é difícil entender que alguém negro, nas condições de Cruz e Souza, pudesse, em algum momento, cogitar um outro status. Também não se há de esquecer que, nos primeiros anos da vida do poeta, ele teve o calor do colo de uma mulher branca, que além de rodeá-lo de carinho, foi sua mestra de primeiras letras.

Quando Cruz e Souza diz “brancura”, é preciso recorrer aos mais altos significados desta palavra, muito além da cor em si.

No aspecto de influências do simbolismo, nota-se uma amálgama que conflui águas do satanismo de Baudelaire ao espiritualismo (e dentro desse, idéias budistas e espíritas) ligados tanto a tendências estéticas vigentes como a fases na vida do autor.

Livros
Broquéis (1893, poesia)
Faróis (1900, poesia)
Últimos Sonetos (1905, poesia)
Tropos e Fanfarras (1885, prosa – em conjunto com Virgílio Várezea)
Missal (1893, poema em prosa)
Evocações (1898, poemas em prosa)

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