Militares avaliam que pode ter ocorrido ?desorientação? no pouso, falha mecânica ou problemas no compensador
A análise preliminar do acidente com o Super King Air B-350, que deixou 14 mortos na sexta-feira à noite em Trancoso, no sul da Bahia, leva oficiais da Aeronáutica e especialistas em segurança de voo a apontar três hipóteses como as mais prováveis para explicar a queda do bimotor. Nos próximos dias, peritos do 2º Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes (Seripa-2), no Recife, devem definir onde a caixa-preta do avião será degravada – caso esteja avariada, é provável que seja mandada para os Estados Unidos.
Os motores da aeronave serão enviados para os laboratórios do Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial (CTA), em São José dos Campos, no interior de São Paulo. Outra equipe vai se debruçar sobre a documentação do turboélice e dos pilotos, em busca de eventuais irregularidades ou pistas que ajudem a esclarecer o desastre.
O avião havia decolado do Aeroporto de Congonhas e caiu quase três horas depois, às 21h31, a 197 metros da cabeceira da pista do Aeroporto Terravista. Dez pessoas da família do empresário Roger Ian Wright – além de uma neta da mulher dele, Lucila Lins, da babá da família, do piloto e do copiloto – morreram na tragédia. Até ontem, o Instituto Médico Legal (IML) de Salvador havia identificado por arcada dentária os corpos de quatro vítimas – Victória, Gabriel, Francisco e Nina, todos netos de Roger e Lucila.
A primeira hipótese levantada por militares é uma possível “desorientação” do piloto em relação à posição do aeroporto. Em Trancoso, pelas características da clareira criada na queda – com 20 metros de diâmetro, tamanho relativamente pequeno -, podia-se dizer que o avião tinha mais força no plano vertical, de cima para baixo, do que no horizontal, na hora da queda. Isso indicaria que o piloto se preparava para tocar o solo, mesmo fora da posição.
Conhecida no meio aeronáutico como CFIT (Colisão com o Solo em Voo Controlado, na sigla em inglês), esse tipo de ocorrência está entre as três mais comuns na aviação geral (táxi aéreo e jatos executivos). Entre 1998 e 2007, segundo números do Centro de Prevenção e Investigação de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), os choques com o solo responderam por 13,1% dos acidentes com aviões de pequeno porte no País, atrás apenas de falha de motor em voo (26,5%) e perda de controle em voo (17,6%).
Uma falha assim poderia ocorrer ainda numa eventual troca de comando – quando outro tripulante assume os controles no momento do pouso, por exemplo. Procurada por peritos, a família de Jorge Lang descartou qualquer possibilidade de o piloto ceder o comando durante um voo.
MOTORES
Outra possibilidade é de falha mecânica, especialmente nos motores. Numa fase crítica como a do pouso, uma perda repentina de potência é considerada grave, embora contornável. Testemunhas relataram que o turboélice já parecia avariado, antes da queda e da explosão. Segundo os peritos, imediatamente antes do pouso o grau de dificuldade para correção de imprevistos é altíssimo e qualquer falha pode resultar numa tragédia.
A terceira hipótese – considerada rara, mas possível – é um disparo inadvertido do compensador. O dispositivo, usado durante o pouso, auxilia o piloto a diminuir a sensação de “pressão” nos controles de direção da aeronave (aelerons, leme e profundor). Falhas nesse equipamento causam no piloto uma sensação de “estranhamento” dificilmente solucionada a tempo e, em alguns casos, pode até fazer o avião tomar uma direção errada. Nas investigações realizadas até o momento, a Aeronáutica descartou como determinantes para a queda do King Air tanto a chuva quanto a iluminação do aeroporto. Peritos e especialistas dizem que a leitura da caixa-preta deve ajudar a restringir o número de hipóteses. Lembram ainda que situações atípicas, como um mal súbito, desmaio ou mesmo um enfarte, não podem ser descartadas.
Bruno Tavares – O Estado de São Paulo