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Manuel Graña Etcheverry – Versos na tarde – 21/01/2015

Hoje já passou Manuel Graña Etcheverry ¹ Já o dia passa. Já os livros não podem. Já a música não alcança. A evasão é inútil, solitário. Já tens o espelho a tua frente: mira-te, sozinho, fumando o cigarro, mira no quarto tua presença só. Não estão suas mãos nem seus olhos vêm, nem sua voz se aproxima, nem seu beijo, nem chega seu amor para buscar-te. Consumiste sonhos na espera: edifícios de tenues quadros que as horas gastaram pouco a pouco. E ruínas sonoras de estupendos colóquios de amor que imaginaste têm buscado sua tumba nas paredes. Não te bastou a lembrança: desejava-a vivendo e perto e em teus braços. Mas o dia se vai sem que ela venha. Hoje a paz não veio e tens medo. Não quer retratar-se em cristais nem a água do passado te refresca. Mas o dia se vai… cala-o, esqueça. Beija no ar seu rosto ausente. Hoje a paz não veio. Hoje já passou. ¹ Manuel Graña Etcheverry * Córdoba, Argentina – 1915 d.C [ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]

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Jorge Luis Borges – Reflexões na tarde – 06/10/2013

Uma oração Jorge Luis Borges¹ Minha boca pronunciou e pronunciará, milhares de vezes e nos dois idiomas que me são íntimos, o pai-nosso, mas só em parte o entendo. Hoje quero tentar uma oração que seja pessoal, não herdada. Sei que se trata de uma tarefa que exige uma sinceridade mais que humana. É evidente, em primeiro lugar, que me está vedado pedir. Pedir que não anoiteçam meus olhos seria loucura; sei de milhares de pessoas que vêem e que não são particularmente felizes, justas ou sábias. O processo do tempo é uma trama de efeitos e causas, de sorte que pedir qualquer mercê, por ínfima que seja, é pedir que se rompa um elo dessa trama de ferro, é pedir que já se tenha rompido. Ninguém merece tal milagre. Não posso suplicar que meus erros me sejam perdoados; o perdão é um ato alheio e só eu posso salvar-me. O perdão purifica o ofendido, não o ofensor, a quem quase não afeta. A liberdade de meu arbítrio é talvez ilusória, mas posso dar ou sonhar que dou. Posso dar a coragem, que não tenho; posso dar a esperança, que não está em mim; posso ensinar a vontade de aprender o que pouco sei ou entrevejo. Quero ser lembrado menos como poeta que como amigo; que alguém repita uma cadência de Dunbar ou de Frost ou do homem que viu à meia-noite a árvore que sangra, a Cruz, e pense que pela primeira vez a ouviu de meus lábios. O restante não me importa; espero que o esquecimento não demore. Desconhecemos os desígnios do universo, mas sabemos que raciocinar com lucidez e agir com justiça é ajudar esses desígnios, que não nos serão revelados. ¹Jorge Luis Borges * Buenos Aires, Argentina – 24 de Agosto de 1899 d.C + Genebra, Suíça – 14 de Junho de 1986 d.C >> biografia de Jorge Luis Borges [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Jorge Luis Borges – Versos na tarde – 02/01/2013

Poema Jorge Luis Borges ¹ O ocaso é sempre comovente por mais pobre ou berrante que seja, porém mais comovente ainda é o fulgor desesperado e final que enferruja a planície quando o último sol mergulhou. É doloroso manter essa luz tensa e diversa, essa alucinação que impõe ao espaço o medo unânime da sombra e cessa de repente quando notamos sua falsidade, como cessam os sonhos quando sabemos que sonhamos. ¹ Jorge Luis Borges * Buenos Aires, Argentina – 24 de Agosto de 1899 d.C + Genebra, Suíça – 14 de Junho de 1986 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Alfonsina Storni – Versos na tarde

Esta Tarde Alfonsina Storni ¹ Ahora quiero amar algo lejano… Algún hombre divino Que sea como un ave por lo dulce, Que haya habido mujeres infinitas Y sepa de otras tierras, y florezca La palabra en sus labios, perfumada: Suerte de selva virgen bajo el viento… Y quiero amarlo ahora. Está la tarde Blanda y tranquila como espeso musgo, Tiembla mi boca y mis dedos finos, Se deshacen mis trenzas poco a poco. Siento un vago rumor… Toda la tierra Está cantando dulcemente… Lejos Los bosques se han cargado de corolas, Desbordan los arroyos de sus cauces Y las aguas se filtran en la tierra Así como mis ojos en los ojos Que estoy sonañdo embelesada… Pero Ya está bajando el sol de los montes, Las aves se acurrucan en sus nidos, La tarde ha de morir y él está lejos… Lejos como este sol que para nunca Se marcha y me abandona, con las manos Hundidas en las trenzas, con la boca Húmeda y temblorosa, con el alma Sutilizada, ardida en la esperanza De este amor infinito que me vuelve Dulce y hermosa… ¹ Alfonsina Storni * Sala Capriasca, Suíça 29 de maio de 1892 d.C + Mar del Plata, Argentina; 25 de outubro de 1938 [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Marilina Ross – Versos na tarde

Ponte invisível Marilina Ross ¹ Estás… estás em mim embora não estejas aqui. No canto mais quente onde guardo o amor. Entras e te instalas com naturalidade em cada cavidade e sei também Que estou batendo igual dentro de ti no lugar do grande prazer e a grande dor. Pela ponte invisível para os demais navega vela ao vento nossa liberdade de amarmos contra todos e apesar de tempos de distâncias porque do mesmo modo estás. Estás estás em mim embora não estejas hoje aqui. (Tradução de Maria Teresa Almeida Pina) ¹ María Celina Parrondo * Liniers, Argentina – 16 de fevereiro de 1943 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Alfonsina Storni – Versos na tarde

Alma Desnuda Alfonsina Storni ¹ Soy un alma desnuda en estos versos, Alma desnuda que angustiada y sola Va dejando sus pétalos dispersos. Alma que puede ser una amapola, Que puede ser un lirio, una violeta, Un peñasco, una selva y una ola. Alma que como el viento vaga inquieta Y ruge cuando está sobre los mares, Y duerme dulcemente en una grieta. Alma que adora sobre sus altares, Dioses que no se bajan a cegarla; Alma que no conoce valladares. Alma que fuera fácil dominarla Con sólo un corazón que se partiera Para en su sangre cálida regarla. Alma que cuando está en la primavera Dice al invierno que demora: vuelve, Caiga tu nieve sobre la pradera. Alma que cuando nieva se disuelve En tristezas, clamando por las rosas con que la primavera nos envuelve. Alma que a ratos suelta mariposas A campo abierto, sin fijar distancia, Y les dice: libad sobre las cosas. Alma que ha de morir de una fragancia De un suspiro, de un verso en que se ruega, Sin perder, a poderlo, su elegancia. Alma que nada sabe y todo niega Y negando lo bueno el bien propicia Porque es negando como más se entrega. Alma que suele haber como delicia Palpar las almas, despreciar la huella, Y sentir en la mano una caricia. Alma que siempre disconforme de ella, Como los vientos vaga, corre y gira; Alma que sangra y sin cesar delira Por ser el buque en marcha de la estrella. ¹ Alfonsina Storni * Sala Capriasca, Suíça – 29 de maio de 1892 d.C + Mar del Plata, Argentina – 25 de outubro de 1938 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Jorge Luis Borges – Versos na tarde

O Tango Jorge Luis Borges ¹ Onde estarão? Pergunta a elegia Sobre os que já não são, como se houvesse Uma região onde o Ontem pudesse Ser o Hoje, o Ainda, o Todavia. Onde estará (repito) esse selvagem Que ergueu, em tortuosas azinhagas De terra ou em perdidas plagas, A seita do punhal e da coragem? Onde estarão aqueles que passaram, Deixando à epopeia um episódio, Uma fábula ao tempo, e que sem ódio, Lucro ou paixão de amor se esfaquearam? Procuro-os na lenda, na apagada Brasa que, como uma indecisa rosa, Conserva dessa chusma valorosa De Corrales e Balvanera um nada. Que escuras azinhagas ou que ermo Do outro mundo habitará a dura Sombra daquele que era sombra escura, Muranã, essa faca de Palermo? E esse Iberra (tenham dele piedade Os santos) que na ponte duma via, Matou o irmão, Ñato, que devia Mais mortes que ele, ficando em igualdade? Uma mitologia de punhais No esquecimento aos poucos se desgasta. E dispersou-se uma canção de gesta Em sórdidas notícias policiais. Há outra brasa, outra candente rosa Dos seus restos totais conservadores; Aí estão os soberbos matadores E o peso da adaga silenciosa. Embora a adaga hostil ou essa adaga, O tempo, os dispersassem pelos lodos, Hoje, p’ra além do tempo e da aziaga Morte, no tango vivem eles todos. Na música prosseguem, na mensagem Das cordas da viola trabalhosa, Que tece na toada venturosa A festa, a inocência da coragem. Vejo a roda amarela circular Com leões e cavalos, oiço o eco Desses tangos de Arolas e de Greco Que vi bailar no meio da vereda, Num instante que emerge hoje isolado, Sem antes nem depois, contra o olvido, E que tem o sabor do que, perdido, Perdido está mas foi recuperado. Os acordes conservam velhas cousas: Ou a parreira ou o pátio ancestral. (E por trás das paredes receosas O Sul tem uma viola, um punhal.) O tango, essa rajada, diabrura, Os trabalhosos anos desafia; Feito de pó e tempo, o homem dura Menos que a leviana melodia, Que é tempo somente. O tango cria Um passado irreal, real embora. Recordação que não pôde ir-se embora Morta na luta, algures na periferia. Jorge Luis Borges in Poemas Escolhidos. Edição bilingue. Selecção e Trad. Ruy Belo. Dom Quixote, Lisboa, 2003, pp.43-47 ¹ Jorge Luis Borges * Buenos Aires, Argentina – 24 de Agosto de 1899 d.C + Genebra, Suíça – 14 de Junho de 1986 d.C ->> biografia [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Jorge Luis Borges – Versos na tarde

A um gato Jorge Luis Borges ¹ Não são mais silenciosos os espelhos nem mais furtiva a alba aventureira; és, debaixo da lua, essa pantera que nos é dado ver de longe. Por obra indecifrável de um decreto divino, buscamos-te com vaidade; mais remoto que o Ganges e o poente, é tua a solidão, teu o segredo. O teu lombo condescende à morosa carícia da minha mão receosa. Estás em outro tempo. És o dono de um espaço fechado como um sonho. tradução de Carlos B. Santos ¹ Jorge Luis Borges * Buenos Aires, Argentina – 24 de Agosto de 1899 d.C + Genebra, Suíça – 14 de Junho de 1986 d.C ->> biografia [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Marilina Ross – Versos na tarde

E que nunca mais Marilina Ross ¹ A desenterrar os vivos e aos mortos enterrar Sobre areias movediças não se pode caminhar A desentranhar os leitos dos rios e do mar para que flutuem os restos da verdade e que nunca mais A tirar as teias de aranha que teceu nossa memória Se negamos o passado repetiremos a história A levantar, se é preciso, o obelisco e sua praça ¹ María Celina Parrondo * Liniers, Argentina – 16 de fevereiro de 1943 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Jorge Luis Borges – Versos na tarde

A Rosa Profunda Jorge Luis Borges ¹ A lua ignora que é tranquila e clara E não pode sequer saber que é lua; A areia, que é a areia. Não há uma Coisa que saiba que sua forma é rara. As peças de marfim são tão alheias Ao abstrato xadrez como essa mão Que as rege. Talvez o destino humano, Breve alegria e longas odisséias, Seja instrumento de Outro. Ignoramos; Dar-lhe o nome de Deus não nos conforta. Em vão também o medo, a angústia, a absorta E truncada oração que iniciamos. Que arco terá então lançado a seta Que eu sou? Que cume pode ser a meta? ¹ Jorge Luis Borges * Buenos Aires, Argentina – 24 de Agosto de 1899 d.C + Genebra, Suíça – 14 de Junho de 1986 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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