Arquivo

Jorge Luis Borges – Poesia – 21/04/24

Boa noite. Aqui. Hoje Jorge Luis Borges ¹ Já somos o esquecimento que seremos. A poeira elementar que nos ignora e que foi o ruivo Adão e que é agora todos os homens e que não veremos. Já somos na tumba as duas datas do princípio e do término, o esquife, a obscena corrupção e a mortalha, os ritos da morte e as elegias. Não sou o insensato que se aferra ao mágico sonido de teu nome: penso com esperança naquele homem que não saberá que fui sobre a Terra. Embaixo do indiferente azul do céu esta meditação é um consolo. (Tradução: Charles Kiefer) ¹ Jorge Luis Borges * Buenos Aires, Argentina – 24 de Agosto de 1899 d.C + Genebra, Suíça – 14 de Junho de 1986 d.C

Leia mais »

Murilo Mendes – Poesia – 07/12/23

Boa noite O fósforo Murilo Mendes ¹ Acendendo um fósforo acendeu Prometeu, o futuro, a liquidação dos falsos deuses, o trabalho do homem. O fósforo: tão radioso quanto secreto. Furioso, deli- cado. Encolhe-se no seu casulo marrom; mas quando chamado e provocado, polêmico estoura, esclarecendo tudo. O século é polêmico. O gás não funciona hoje. Temos greve dos gasistas. A Itália tornou-se a Grevelândia. Mas preferimos essa semi-anarquia à “ordem” fascista. O fósforo, hoje em férias, espera paciente no seu casulo o dia de amanhã desprovido de greves. O dia racional, o dia do entendimento universal, o dia do mundo sem classes, o dia de Prometeu totalizado. O fósforo é o portador mais antigo da tradição viva. Eu sou pela tradição viva, capaz de acompanhar a correnteza da modernidade. Que riquezas poderosas extraio dela! Subscrevo a grande palavra de Jaures: “De l’autel des ancêtres on doit garder non les cendres mais le feu.” ¹ Murilo Monteiro Mendes * Juiz de Fora, MG – 13 de maio de 1901 + Lisboa, Portugal – 13 de agosto de 1975 Poeta brasileiro, expoente do modernismo brasileiro.

Leia mais »

Os 400 anos da morte de Cervantes e Shakespeare

Com biografias bem distintas, a data nominal de morte une os dois gênios da literatura ocidental – apesar do choque de calendários. Mas uma questão central também fascina a ambos: o que é sonho, o que é realidade? William Shakespeare (esq.) e Miguel de Cervantes Saavedra: biografias e gênios literários distintos numa mesma época Dois escritores de dimensão universal, profundos e espirituosos virtuoses da pena e do papel, filhos das mais ricas potências europeias de sua época: fora isso e a data da morte – 23 de abril de 1616 –, William Shakespeare e Miguel de Cervantes Saavedra parecem não ter muito em comum. O destino lhes designou sortes e azares bem distintos.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Quanto às datas exatas do nascimento de ambos reina incerteza: Shakespeare teria vindo à luz no fim de abril de 1564 em Stratford-upon-Avon, Inglaterra; estima-se que seu colega espanhol nascera 17 anos antes em Alcalá de Henares, nas cercanias de Madri. Enquanto o inglês foi educado na prestigiosa escola de latim de sua cidade natal, lá aprendendo os fundamentos da retórica e da poesia, Cervantes, que provinha de uma família de nobres arruinados, provavelmente estudou teologia na Universidade de Salamanca. O soldado e o “furão” Logo a vida do espanhol tomou um curso aventureiro. Aos 22 anos, mudou-se para Roma – fugindo da Justiça de seu país, ao que tudo indica. No ano seguinte, alistou-se numa companhia de soldados e passou a servir como camareiro do futuro cardeal Giulio Acquaviva. Em 7 de outubro de 1571, participou da batalha naval de Lepanto, contra o Império Otomano. Em combate, foi atingido duas vezes no peito, e uma bala seccionou um nervo de sua mão esquerda, inutilizando-a, fato que lhe valeria o apelido “El Manco de Lepanto”. Cidade natal celebra William Shakespeare O Bardo de Avon, por sua vez, jamais frequentou uma universidade. Durante cerca de sete anos, no fim da juventude, perdeu-se toda pista dele. Somente em 1592 seu nome voltou a aparecer, num panfleto em que o escritor Robert Greene o tacha de “furão” e “convencido”. Tal comentário levou os pesquisadores a deduzirem que, aos 28 anos, Shakespeare já obtivera uma certa projeção como dramaturgo. Como ator, ele integrou a trupe de teatro Lord Chamberlain’s Men, rebatizada como King’s Men sob o rei James 1º. E logo brilharia na Inglaterra elisabetana com suas montagens e peças teatrais. Vida de luxo para um, prisão para o outro Por volta dessa mesma idade, em 1575, Cervantes foi capturado ao retornar com a frota naval para a Espanha e, juntamente com o irmão Rodrigo, mantido como escravo em Argel por cinco anos. Para pagar o resgate, o pai empregou toda sua fortuna, a irmã sacrificou o dote, porém só Rodrigo foi libertado. Os locais que inspiraram o famoso romance “Dom Quixote” Após quatro tentativas de fuga frustradas, em 1580 a liberdade de Miguel de Cervantes foi comprada pela ordem religiosa dos trinitários. Consta que o autor só sobreviveu às fugas por ter impressionado com sua coragem o vice-rei de Argel, que também acalentava esperança de obter por ele um resgate mais avantajado. Cervantes elaborou as experiências do cativeiro em sua primeira peça teatral, Los tratos de Argel, que, no entanto, ficou ignorada pelo público espanhol. Devido à permanente falta de sucesso e falta de dinheiro, de 1580 e 1583 ele foi novamente forçado a servir como soldado. Ao contrário do espanhol, que nunca conseguiu viver da literatura, Shakespeare cedo gozava de sucesso como escritor e negociante. Sócio do Globe Theatre e, mais tarde, do Blackfriars Theatre, com plateia coberta e mais exclusivo, ele acumulou fortuna, sendo proprietário da segunda maior casa de Stratford-upon-Avon. “O melhor livro do mundo” Nessa altura da vida, Cervantes passou a trabalhar como atacadista e fornecedor da frota de guerra da Espanha. Devido a negócios mal-sucedidos, voltou a ser preso em 1597-98 e em 1602. No cativeiro começou a escrever sua obra-prima: O engenhoso fidalgo Don Quixote de La Mancha, parodiando os romances de cavalaria populares na época, e que seria lançado em duas partes, em 1605 e 1615. Embora encontrando sucesso imediato, os lucros da publicação ou ficaram nas mãos do editor ou foram reinvestidos em edições sucessivas. Numa votação promovida pelo Instituto Nobel, em 2002, Dom Quixote foi escolhido como “melhor livro do mundo” por um júri composto por 100 autores de renome. Na história da literatura ocidental, ele marca o nascimento do romance moderno. A narrativa se presta a numerosas interpretações, e até hoje analistas disputam qual seria sua real mensagem e a que público-alvo se destinaria. Gruta em Argel onde Cervantes teria sido mantido cativo por cinco anos Realidade ou sonho? O “Bardo” retornou à Stratford natal poucos antes de morrer, aos 52 anos. Por sua vez, Cervantes ainda foi injustamente acusado de homicídio em 1605. A mais esse percalço numa vida atribulada, porém, seguiu-se uma fase de grande atividade literária, até a morte do autor, em Madri, com sintomas de diabetes. Apesar de ambos serem celebrados em 23 de abril, Shakespeare morreu dez dias depois do colega espanhol. A explicação é que, na época, seus países utilizavam sistemas de contagem de tempo distintos: enquanto a Espanha já adotara o calendário gregoriano, a Inglaterra ainda se orientava pelo juliano. Rara primeira edição das obras de Shakespeare foi encontrada em 2016 Shakespeare foi sepultado na Igreja da Santíssima Trindidade. Embora fosse sabido que Cervantes pedira para ser enterrado no Convento das Trinitárias Descalças, em gratidão pela libertação de Argel, só em 2015 seus restos mortais foram localizados num nicho da cripta do convento: as iniciais “M.C.” no caixão e os documentados ferimentos na mão e no peito permitiram a identificação. Um ponto comum entre os dois autores mortos há 400 anos: apesar da distância geográfica e das biografias díspares, ambos enfocaram repetidamente em sua obra o conflito entre ideal e realidade, tematizando a questão “O que é realidade, o que é sonho?”. Assim, enquanto em Dom Quixote, Miguel de Cervantes deixa o leitor na dúvida se seu

Leia mais »

A subversão do vernáculo e Diego Moraes

Com o derrame diário de escritores no mercado, a faculdade de Letras se transformou numa espécie de cartório que autentica a ambição dos neófitos, funciona como se fosse um curso de Direito linguístico para jovens e adultos que ignoram o fato de que ali nada há relevante para se assimilar sobre o ato de escrever ou mesmo sobre as sutilezas marginais do idioma. Letras, em muitas instituições, praticamente, é um curso técnico sobre línguas e literatura. Ao concluir a jornada acadêmica, receberão um triste diploma de burocratas, castiços que terão como destino imediato o magistério. Enlutados na beca negra, assassinaram a própria criatividade com uma dose fatal de arsênico.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Li um artigo do crítico e jornalista José Castello classificando Letras como a última opção para alguém que deseja escrever, eu concordo. Hoje, se formos separar o joio do trigo, constataremos que a maioria dos que se anunciam como autores não passam de corvos obcecados por rankings editoriais, em busca da fama e do panteão dos best-sellers. Porém, o que o curso de Letras tem a ver com o trabalho do Diego Moraes? Nada. Letras é a tabuada e Diego é a subversão do vernáculo. Ele integra uma geração que encontrou na literatura a expressão passional, usando a vantagem tecnológica do novo século para abrir os próprios caminhos. Twitter, Facebook e todas as ferramentas das Redes Sociais servem como outdoors para poemas, prosa poética e aforismos. Impactam. Não é incomum observarmos escritores consagrados, como Fernando Morais, curtindo pelo Faceos posts do destemido Diego. Como autor, ele está em construção, exercitando a tenacidade num reality show que a Internet nos permite observar ao vivo. Às vezes, é possível compará-lo a um Schopenhauer acordando de bom humor. Tal qual o velho filósofo, Diego desconstrói hipocrisias e ilusões que são fabricadas para sabotar a liberdade em nome da virtude. Aparentemente, assume uma postura apolítica, mas sua verve carrega um engajamento espontâneo, está sintonizada com a realidade. Não é banal, há uma obsessão em domar a selvageria feroz do pensamento pela escrita. “Quando você descobrir que Deus é ironia, sua dor vira piada” Fiz incursões atentas em 3 dos seus livros, a seguir: “A fotografia do meu antigo amor dançando tango” (Editora Bartlebee);  “Um bar fecha dentro da gente” (Editora Douda Correria) editora de Lisboa/Portugal; e “Eu já fui aquele cara que comprava vinte fichas e falava Eu te amo no orelhão” (Editora Corsário-Satã). Chamam-no de poeta, talvez porque poeta sejam aqueles indivíduos indefiníveis, pairando em nebulosas que estremecem nas explosões cósmicas. “Poeta é o cara que junta silêncios e grava um disco mudo. ” Generoso, enquanto estrutura o seu trabalho, Diego também abre portas e compartilha espaço com outros autores. É um dos criadores da Flipobre, conferência de escritores, com transmissão em tempo real, que faz sucesso entre os que buscam se firmar na constelação literária. Um evento alternativo aos clubes privês que chamam de feiras literárias, onde a participação não segue um critério transparente nem democrático. Diego já foi matéria em grandes jornais, como o Estadão, onde costumam destacar uma desventurosa passagem por São Paulo e seu contato involuntário com o submundo das ruas, do abandono e das drogas. Elementos externos que trazem muito mais responsabilidade ao artista, pois são rótulos que podem limitá-lo a uma caricatura de si mesmo ou torná-lo mito, como foi Rimbaud, Van Gogh, Hemingway, etc. Ser maldito não é chancela à genialidade, ser genial ao reinterpretar valores é que faz o maldito perpetuar a sua arte. Por isso, sempre considero injusto quando alçam a biografia acima de qualquer produção autoral, pois afogam a obra na história do indivíduo que a criou. Como é um apreciador da autoficção, de John Fante e Bukowski, tenho certeza que Diego Moraes sabe os traçar os caminhos que percorre. No Brasil, talvez no mundo, instalou-se um fenômeno querendo atestar que só após escrever um romance o autor confirma o seu talento. Temos notícias de que Diego Moraes está elaborando o seu primeiro romance, a ser publicado pela editora Record. Quem o acompanha, sabe que não será uma narrativa mais longa que validará o seu estilo em crescente aprimoramento, consolidado na prática e no afinamento diário. No entanto, a investida não o desqualificará e será interessante ver um maestro do vocábulo enxuto, das frases afiadas, dos versos concentrados e corrosivos, se derramar na verbosidade romanesca. “Silêncio de passarinho morto aqui na minha rua. ” Diego é manauara, sem nenhum vínculo com o consagrado Milton Hatoum, além daquele de possuir a capacidade de deslocar os nossos olhos das cansativas regiões Sul e Sudeste, para nos lançar nas extremas e enigmáticas fronteiras amazônicas. Manaus emerge sem ufanismos exagerados, é apenas um cenário ao fundo, tão pesado como outras capitais, mas sem potência de protagonista em seus livros. Urso é o seu apelido, seu personagem. E como um urso, Diego se agarra a literatura com a força de um náufrago que precisa daquele pedaço de tronco para sobreviver às ruínas do cotidiano; ele a abraça tentando não a sufocar, porque ali estão seus pulmões, seu coração. Nas sarjetas de São Paulo, ele esbarrou com o demônio, a quem se recusou entregar a alma. Na literatura, encontrou a redenção e se tornou apóstolo. Com Diego, aprendo que terminar de compor um texto é tomar a última dose num bar que fecha dentro da gente. *** Alexandre Coslei é jornalista e escritor

Leia mais »

Marguerite Yourcenar – Reflexões na tarde – 06/01/2016

Marguerite Yourcenar¹ In Memórias de Adriano “(…) Quando tivermos reduzido o máximo possível as servidões inúteis, evitando as desgraças desnecessárias, restará sempre, para manter vivas as virtudes heróicas do homem, a longa série de males verdadeiros: a morte, a velhice, as doenças incuráveis, o amor não partilhado, a amizade rejeitada, a mediocridade de uma vida menos vasta do que nossos projetos e mais enevoada do que nossos sonhos. Enfim, todas as desventuras causadas pela divina natureza das coisas”. ¹Marguerite Cleenewerck de Crayencour * Bruxelas, Bélgica – 8 de Junho de 1902 d.C + Maine, USA – 17 de Dezembro de 1987 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

Ferreira Gullar – Versos na tarde – 07/06/2015

Estranheza do Mundo Ferreira Gullar ¹ Olho a árvore e indago: está aí para quê? O mundo é sem sentido quanto mais vasto é. Esta pedra esta folha este mar sem tamanho fecham-se em si, me repelem. Pervago em um mundo estranho. Mas em meio à estranheza do mundo, descubro uma nova beleza com que me deslumbro: é teu doce sorriso é tua pele macia são teus olhos brilhando é essa tua alegria. Olho a árvore e já não pergunto “para quê”? A estranheza do mundo se dissipa em você. ¹ José Ribamar Ferreira * São Luiz, MA. – 10 de Setembro de 1930 d.C >> biografia de Ferreira Gullar [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

Grandes expectativas, sem grandes decepções

Administrar nossas esperanças e perspectivas diante da vida pode ser uma boa forma de lidar com as frustracões que invariavelmente vão surgir em nosso caminho Existe uma lição universal: nem tudo na vida acontece da maneira como queremos ou desejamos. Alguns aprendem isso no dia a dia, vendo que o trânsito não vai andar só porque se está com pressa, que aquele filme nem sempre vai ser bom porque se apostava que ele fosse, que as pessoas de quem gostamos vão nos magoar de vez em quando, mesmo que quiséssemos evitar isso. Já outros têm que passar por situações mais delicadas para constatar a mesma verdade: ver um relacionamento acabar, perder alguém querido, ser demitido depois de anos de dedicação à empresa. Mas ninguém, em todos esses casos, discorda de como é difícil encontrar obstáculos no caminho da realização de um desejo. Mas, se a gente sabe disso de cor e salteado, por que é que ainda sofremos tanto quando temos uma vontade frustrada? A resposta está no fato de que tendemos a idealizar demais as coisas, criar grandes expectativas sobre tudo. É normal – e até imprescindível – nos rodearmos de expectativas. O problema é que, na maior parte das vezes, essas expectativas são tão elevadas que o confronto com a realidade é uma desilusão. E acabamos sofrendo com isso. No entanto dá, sim, para tolerar melhor a frustração que surge desse processo. É sobre isso que vamos falar a seguir.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Mas espera lá: antes que você crie esperanças demais sobre essa reportagem, vale deixar claro que nosso objetivo não é dar respostas prontas. Até porque cada um lida com as suas decepções de maneiras diferentes. Queremos mostrar que dá para colocar as frustrações para trabalhar a nosso favor no trabalho, na vida pessoal, nos relacionamentos e até nas relações familiares. Tudo para você chegar ao fim do texto refletindo melhor sobre o que fazer quando algo contrariar suas expectativas. Sem grandes decepções. Na família É na infância que lidamos pela primeira vez com nossas frustrações: ter que largar a chupeta, não ganhar aquele brinquedo que pedimos, perder a atenção irrestrita com o nascimento do irmão. Nessa fase aparece em nosso caminho uma palavra chata que vai nos perseguir para sempre: “não!” E é justamente a relação com ela que vai definir nosso controle emocional diante das negativas da vida. “As pessoas que ouviram pouco ‘não’ na infância têm muito mais dificuldade de aceitar uma recusa quando se desenvolvem e se tornam adultas”, afirma a filósofa e educadora Tânia Zagury. Muitos pais evitam dizer “não” como forma de resguardar o filho de se frustrar. Como se fosse possível impedir que a criança se sinta desiludida vez ou outra. O grande problema é que, se uma pessoa não aprende desde cedo a conviver com a decepção em coisas cotidianas, vai ter sérias dificuldades para lidar com o fim de um relacionamento ou não ser aceito em um trabalho Na mesma medida que é importante ensinar os filhos a conquistarem o que querem, é imprescindível também mostrar que nem tudo que se quer pode ser conquistado. Nesse sentido, a frustração coloca nossos pés no chão, mostrando que a realidade dos fatos, na maioria das vezes, está muito longe daquela que idealizamos. “A frustração é pintada como algo ruim, que se deve evitar. Ao passo que, se bem trabalhada, ela pode ser bastante positiva para o crescimento pessoal, para o amadurecimento psíquico e o aprimoramento das relações de um indivíduo”, diz Tânia. Desde pequena Melissa Rondon teve que conviver com a decepção de não conhecer o pai. Quando a mãe dela ainda estava grávida, eles brigaram e ele nunca mais apareceu. Aos 12 anos, ela resolveu que queria conhecê-lo, tentar resgatar uma relação mesmo que tardia. Com a ajuda de uma tia, ela conseguiu contatá-lo e marcaram um encontro. Mas de novo teve que enfrentar a frustração. O pai tinha outra família e não estava disposto a assumi-la para a esposa e os novos filhos. A rejeição foi um balde de água fria na expectativa de Melissa. “Quando o procurei, achei que teria um pai de verdade, que me ligasse, que pudesse sair comigo para conversar, que se preocupasse. Não alguém que quisesse uma relação assim, escondida”, diz. Hoje, aos 25 anos, Melissa garante que superou bem a desilusão justamente por não ter idealizado tanto o pai. “Não podia esperar muito de alguém que nunca se esforçou para me conhecer.” É comum as crianças verem seus pais e mães como deuses, infalíveis e perfeitos. Mas, à medida que crescem, percebem que essa imagem não é real, que eles têm defeitos, limitações – e se frustram. Nas relações familiares, as decepções estão principalmente ligadas a padrões que criamos. O pai que quer que o filho seja algo que ele não é, o filho que espera que a mãe seja mais carinhosa. “O segredo é aceitar que nossos familiares são pessoas com visões diferentes das nossas idealizações”, aconselha o terapeuta familiar americano David Niven. E ele conclui: “Não estrague sua vida familiar estabelecendo padrões que você criou para ela”.

Leia mais »

Shakespeare – Prosa na tarde – 12/04/2015

A Tempestade Shakespeare ¹ — (…)  “Pois o mesmo comigo vai se dar. Sendo ar, apenas, como és, revelas tanto sentimento por suas aflições; e eu, que me incluo entre os de sua espécie, e as dores sinto, como os prazeres, tão profundamente tal como qualquer deles, não podia me mostrar agora menos abalado. Muito embora seus crimes me tivessem tocado tão de perto, em seu auxílio chamo a nobre razão, para sofrearmos de todo minha cólera. É mais nobre o perdão que a vingança. Estando todos arrependidos, não se estende o impulso do meu intento nem sequer a um simples franzir do sobrecenho. Vai, liberta–os, meu Ariel. Vou romper o encantamento, a razão restituir–lhes e fazê–los voltar a ser o que eram” (…) Próspero in A Tempestade – Ato V – Cena I ¹ William Shakespeare * Stratford-Avon, Inglaterra – 23 de abril 1564 d.C + Londres, Inglaterra – 23 abril 1616 d.C >> biografia [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

Osman Lins – Reflexões na tarde – 30/04/2014

“A lenta rotação da água, em torno de sua vária natureza. Sua oscilação entre a paz dos copos e as inundações. Talvez seja mineral; ou um ser mitológico; ou uma planta, um liame, enredando continentes, ilhas. Pode ser um bicho, peixe imenso, que tragou escuridões e abismos, com todas as conchas, anêmonas, delfins, baleias e tesouros naufragados. Desejaria ter, talvez, a definição das pedras; e nunca se define. Invisível. Visível. Trespassável. Dura. Amiga. Existem os ciclones, as trombas marinhas. Golpes de barbatanas? E também as nuvens, frutos que, maduros, tombam em chuvas. O peixe as absorve e cresce. Então este peixe, verde e ramal, de prata e sal, dele próprio se nutre? Bebe a sua própria sede? Come sua fome? Nada em si mesmo? Não saberemos jamais sobre este ente fugidio, lustral, obscuro, claro e avassalador. Tenho-o nos meus olhos, dentro das pupilas. Não sei portanto se o vejo; se é ele que se vê.” Do conto Retábulo de Santa Joana Carolina, uma das narrativas do livro Nove Novena. Osman da Costa Lins * Vitória de Santo Antão, PE. – 5 de Julho de 1924 d.C + São Paulo, SP. – 8 de Julho de 1978 d.C >> biografia de Osman Lins [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »