Murilo Mendes – Poesia – 07/12/23

Boa noite
O fósforo
Murilo Mendes ¹

Acendendo um fósforo
acendeu Prometeu, o futuro, a liquidação dos falsos deuses,
o trabalho do homem.

O fósforo: tão radioso quanto secreto. Furioso, deli-
cado. Encolhe-se no seu casulo marrom; mas quando chamado e provocado, polêmico estoura, esclarecendo tudo.
O século é polêmico.

O gás não funciona hoje. Temos greve dos gasistas.

A Itália tornou-se a Grevelândia. Mas preferimos essa semi-anarquia à “ordem” fascista.
O fósforo, hoje em férias, espera paciente no seu casulo
o dia de amanhã desprovido de greves. O dia racional, o
dia do entendimento universal, o dia do mundo sem classes,
o dia de Prometeu totalizado.

O fósforo é o portador mais antigo da tradição viva. Eu
sou pela tradição viva, capaz de acompanhar a correnteza
da modernidade.

Que riquezas poderosas extraio dela!
Subscrevo a grande palavra de Jaures: “De l’autel des
ancêtres on doit garder non les cendres mais le feu.”

¹ Murilo Monteiro Mendes
* Juiz de Fora, MG – 13 de maio de 1901
+ Lisboa, Portugal – 13 de agosto de 1975

Poeta brasileiro, expoente do modernismo brasileiro.

Dentista, telegrafista, auxiliar de guarda-livros, notário e Inspetor do Ensino Secundário do Distrito Federal. Foi escrivão da quarta Vara de Família do Distrito Federal, em 1946. De 1953 a 1955 percorreu diversos países da Europa, divulgando, em conferências, a cultura brasileira. Em 1957 se estabeleceu em Roma, onde lecionou Literatura Brasileira. Manteve-se fiel às imagens mineiras, mesclando-as às da Sicília e Espanha, carregadas de história.

Iniciou-se na literatura escrevendo nas revistas modernistas Terra Roxa, Outras Terras e Antropofagia.

Obra
Os livros Poemas (1930), História do Brasil (1932) e Bumba-Meu-Poeta, escrito em 1930, mas só publicado em 1959, na edição da obra completa intitulada Poesias (1925-1955), são claramente modernistas, revelando uma visão humorística da realidade brasileira.

Tempo e Eternidade (1935) marca a conversão de Murilo Mendes ao catolicismo. Nesse livro, os elementos humorísticos diminuem e os valores visuais do texto são acentuados. Foi escrito em colaboração com o poeta Jorge de Lima.

Nos volumes da fase seguinte, Poesia em Pânico (1938), O Visionário (1941), As Metamorfoses (1944) e Mundo Enigma (1945), o poeta apresenta influência cubista, superpondo imagens e fazendo o plástico predominar sobre o discursivo. Poesia Liberdade (1947), como alguns outros livros do poeta, foi escrito sob o impacto da guerra, refletindo a inquietação do autor diante da situação do mundo.

Em 1954, saiu Contemplação de Ouro Preto, em que Murilo Mendes alterou sua linguagem e suas preocupações, reportando-se às velhas cidades mineiras e sua atmosfera. Daí por diante, o poeta lançou-se a novos processos estilísticos, realizando uma poesia de caráter mais rigoroso e despojado, como em Parábola (1946-1952) e Siciliana (1954-1955), publicados em Poesias (1925-1955).

As características desse período atingem sua melhor realização no livro Tempo Espanhol (1959). Em 1970, Murilo Mendes publicou Convergência, um livro de poemas vanguardistas. Murilo Mendes também publicou livros de prosa, como O Discípulo de Emaús (1944), A Idade do Serrote (1968), livro de memórias, e Poliedro ( 1972). Ao morrer, em Lisboa, deixou inéditas várias obras.

Prêmios recebidos
Prêmio Internacional de Poesia Etna-Taormina, 1972.

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