Alterar a presunção da inocência? Não se mudam leis com raiva!
Da série De Tédio Ninguém Morre Neste País
Da série De Tédio Ninguém Morre Neste País
Gilmar Mendes: Um magistrado acima de qualquer noção de Ética Clique sobre a imagem para ampliá-la Leniência e parcialidade. Até pouco tempo, os Magistrados ainda ficavam constrangidos! Agora, nem isso mais! [ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]
O limite do Direito Positivado é a ética.
“A liberdade é o direito de fazer o próprio dever” August Comte
Para que 420 advogados deem conta de 360 mil processos, é preciso, matematicamente, que cada profissional cuide de 857 ações ao mesmo tempo. A conta dessa equação só fecha graças a um único fator: tecnologia. Por Maurício Cardoso e Marcos de Vasconcellos/Consultor Jurídico Foi com ela que o JBM Advogados, em um ano, cortou pela metade o número de profissionais da banca e, ainda assim, aumentou a quantidade de processos do escritório. Enquanto o processo judicial eletrônico ainda é motivo de relutância no Judiciário e na comunidade jurídica, a banca tem “robôs” tocando partes dos processos no lugar de humanos. O advogado só entra para tomar decisões estritamente jurídicas, não mais para atuar na rotina burocrática.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] “Hoje em dia, 70% do trabalho que um advogado faz não é privativo da advocacia”, diz Renato Mandalitti, um dos sócios. Tarefas como localizar processo no sistema do tribunal, fazer download de petição inicial, conferir prazos ou calcular custas, por exemplo, não têm nada de jurídico na visão dele. Atualmente, o escritório, que fica em Bauru, cidade paulista de 350 mil habitantes a 330 quilômetros da capital, tem 35 procedimentos automatizados — ou robôs. Cabe aos softwares, por exemplo, fazer o recebimento e o cadastro de novas ações, juntar petições aos processos, elaborar as guias para pagamento de custas e enviá-las aos clientes — e conferir se o pagamento foi feito. Copia e cola inteligente Além disso, de acordo com o tipo de matéria que o processo discute, existe o robô que foi apelidado de “clicador”. Ele é usado para casos repetitivos, em que a defesa costuma ser muito semelhante. Imagine um caso clássico de pedido de indenização de um cliente que ficou mais de 30 minutos na fila de um banco. Substituindo o “copia e cola” das petições, ao identificar o cadastro (feito por outro robô), o programa já monta uma defesa, preenchendo espaços com os dados daquele processo específico, com os argumentos de defesa que o escritório usa. Cabe ao advogado simplesmente clicar nos trechos que serão aproveitadas na peça em questão e dar o “ok”, gerando uma assinatura e enviando a peça ao sistema. O processo pode assustar e induzir à ideia de que a máquina está dominando o homem e que o advogado passar a ser figura dispensável. Porém, a noção disseminada entre os dirigentes do escritório é que o advogado passou a agir apenas onde é exigido saber de Direito. Ou seja, o advogado concentra-se em exercitar e aplicar seu conhecimento jurídico uma vez que fica livre de tarefas meramente mecânicas ou burocráticas. Ainda assim, para dar conta do volume de trabalho, exerce essa função dentro de uma espécie de linha de produção. Esteira de produção Dentro do cadeia produtiva criada pela banca, nenhum cliente é exclusivo de nenhum advogado e vice-versa — menos ainda, cada processo. Não é exagero dizer que, as esteiras de produção, velhas conhecidas da indústria, chegaram à advocacia. A divisão de tarefas obedece às fases do processo, como o recebimento da ação, contestação, execução ou recolhimento de custos, por exemplo. Traçando fluxogramas da chegada de uma nova ação até o seu encerramento, o trabalho é dividido em fileiras de mesas, cada uma com um gerente e onde os advogados trabalham por demanda. O modelo funciona desde 2013 Assim, uma fileira de 20 advogados fica responsável, por exemplo, por acompanhar a execução de processos. Conforme as execuções vão sendo cadastradas por robôs, as ações passam para esta esteira. O gerente da esteira seleciona quais advogados estão disponíveis naquele dia. Os advogados, por sua vez, recebem direto em seu computador a ação na qual precisam trabalhar. Assim que encerram aquela tarefa, clicam para enviá-la ao sistema e já veem, automaticamente, outra chegar. Para não perder o foco no cliente, como pregam os manuais, o método de trabalho do JBM conta ainda com um advogado chamado “focal”, a quem cabe manter contato direto com os bancos, empresas de energia e outras companhias que contratam a banca para gerenciar suas carteiras de processos. São processadas por dia mais de 1,8 mil citações a clientes do escritório, cerca de 200 atas de audiências e mais de 100 mensagens de clientes. Muitas são as intimações que chegam direto às empresas. A transformação do JBM começou quando os sócios José Edgar Bueno e Renato Mandaliti notaram que investiam muito em tecnologia e BackOffice, para atender seus clientes e viram nisso uma oportunidade. Dividiram de vez: a parte do trabalho que exigia advogados continuou sendo JBM. A parte de tecnologia foi para uma nova empresa, chamada Finch. Hoje, o JBM paga à Finch Serviços para usar seus softwares e serviços. A empresa, por sua vez, passou a vender os mesmos serviços para departamentos jurídicos e escritórios de advocacia. A companhia contabiliza 34 clientes. Novo e velho A tecnologia está tão entranhada na estrutura do JBM que um termo é frequentemente repetido por advogados do escritório: “advocacia antiga”. É assim que os profissionais da banca se referem ao modus operandi da maioria dos escritórios, em que o advogado é responsável por um processo do começo ao fim. O uso da expressão, entretanto, é repreendido e desencorajado pelos sócios. Isso porque antigo e moderno convivem lado a lado nas organizações comandadas por eles. O mesmo prédio que abriga o JBM, que seria “o escritório do futuro”, também hospeda o Madaliti Advogados, fundada em 1997 e mais adequada ao que se pode chamar de “firma tradicional”. Enquanto o primeiro é especializado em ações de massa, que se repetem aos milhares, o segundo é quase uma butique, com atuações em Direito Empresarial, Administrativo, Tributário e Trabalhista. Nessa altura de desenvolvimento, a tecnologia é muito mais adequada para ser empregado em uma firma que lida preferencialmente com ações repetitivas. Mas com o tempo, preveem José Edgar Bueno e Renato Mandaliti, ela trará vantagens também para todo tipo de escritório e para o Judiciário em si. Veja bem As mudanças são vistas com ressalvas por advogados de bancas mais tradicionais. Sócio do Araújo e Policastro, o advogado Décio Policastro diz que, mesmo que parte do trabalho seja executado por máquinas, o advogado “não é
Já falei aqui de Ângelo, de Medida por Medida, personagem de Shakespeare – biografia de Shakespeare – que ao ocupar o cargo de juiz supremo se corrompe apaixonado por uma bela mulher. Suponhamos que um juiz do STF se corrompa. O que se deve fazer? Seus pares o expulsarão? A sociedade o enxotará? Ou a Corte deve permanecer infectada, com membro gangrenado – pois que é um corpo? A pergunta não é descabida, já que dois juízes do STJ foram expulsos por seus pares acusados de pesadíssima corrupção. Seria bom que alguém respondesse essa pergunta. Ou ela não tem resposta? A Corte é realmente uma figura só, como o Leviatã de Hobbes, que é feito de muitos homenzinhos. Só que a nossa corte suprema é feita de apenas 11 criaturinhas. Ou seja, existe apenas o STF – o corpo -, não existe mais o indivíduo. É assim no mundo todo, sabemos. Agora, é possível que um ou dois membros destoem bastante do resto do corpo, e não cumpram a função para a qual foram criados! E aí, o que faremos? Shakespeare provou que o homem é um ser falível, imperfeito; a religião, a ciência, e o Direito mostram que é essa a condição humana. Assim é plenamente possível que um ou outro membro dessa Corte possa se afastar dos caminhos da honra.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Faço essas observações, porque vejo no momento a parte dos operadores do direito revoltados com os juízes, que têm se comportado como se fosse um Juiz Ungido pelo Senhor, o Justiceiro Supremo. Pois, avocou para si a teoria do Direito Divino dos Reis, de Jean Bodin e do Bispo Bossuet. A nova teoria se chama Teoria do Direito Divino dos Juízes do STF. Lá o instituto do Impeachment não é sequer um espectro, funciona pro Executivo, mas não pro Supremo Tribunal Federal. Precisamos de uma nova teoria. De uma nova visão. Um novo Montesquieu, já que as três pilastras de sustentação do Sistema Democrático de Direito não estão funcionando no Brasil. As últimas decisões do STF contrariam completamente a opinião dos mais respeitados juristas do país. Nosso Legislativo padece da mais absoluta degradação, o STF, órgão máximo do poder Judiciário, funciona com se a sociedade civil não existisse. Lembro que nos EUA há mais de um século ocorreu o impeachment de um juiz da Suprema Corte, aqui é sacrilégio falar no assunto. É como se dissessem: o céu não permite que se destitua um juiz (do STF) ungido, ele está acima de todos os homens. Parece a Idade das Trevas! Ora, a Inglaterra cortou a cabeça de Charles I em 1649 porque ele se achava acima de tudo e de todos. Essa história tem quase quatro séculos, e Charles I era um Rei! No entanto, aqui no Brasil, em pleno século XXI, temos um Excelência I no Judiciário. Claro, a Corte Suprema é para julgar todos os homens! E seus juízes também são homens! Mas, quem os julgará? E cada um deles, quando ocupando a presidência, um cargo rotatório, se comporta como o dono das leis, a quem apelaremos? Apelo para Shakespeare: “Quando um juiz não faz justiça, é legal impedir que seja injusto”! Por: Theófilo Silva é Presidente da Sociedade Shakespeare de Brasília.
Por: Antônio T. Praxedes – Mestre em Direito O pensamento analítico ocidental define força como tudo aquilo que possa mudar o estado no qual se encontra um objeto. Para isso, foram formuladas duas classificações na Física, que podem ajudar o jurista a compreender o conceito de força. A primeira, é a força de campo: uma força que age à distância, e provoca uma alteração no estado inicial de um corpo. A segunda, é a força de contato: que necessita de dois objetos em contato, para que possa haver a transferência de energia capaz de alterar o status corporis, pelo contato da matéria. [ad#Retangulo – Anuncios – Esquerda]Mas, por que falar de Física, para comentar acerca do Direito? Por dois motivos. Primeiro, porque precisamos recorrer a conceitos externos à nossa disciplina, que devolvam aquilo que estudamos ao mundo natural; o Direito é um fenômeno social, parte do mundo dos fatos, vez que o ser humano não está dissociado da natureza – embora isso contrarie o pensamento positivista. Segundo, porque a mente humana lida bem com metáforas; o processo cognitivo segue, dentre outros fenômenos menos nobres, algumas etapas racionais: do concreto para o abstrato, do abstrato para o abstrato pensado, e do abstrato pensado para o concreto pensado. O ser humano, portanto, ao passo em que é transformado pelo conhecimento, impregna os objetos do mundo com o seu raciocínio, com significados, modificando a sua forma de percepção do real. Assim, por utilizarmos uma linguagem transversal, podemos atingir objetivos mais amplos do que se utilizarmos apenas a habitual. Dessa forma, podemos assumir que o Direito é um fenômeno do mundo das idéias, que se transfere à realidade por meio da ação humana: atos que são praticados por meio de forças, de razões e, também, de sentimentos ou emoções, do acaso e de contingências sócio-ambientais. Não precisamos dizer que esse fenômenos é registrado documentalmente, dispendendo o trabalho de muitos, quer para sua conservação, quer para sua transformação. As percepções de mundo e ações humanas são traduzidas em forças de campo e forças de contato, respectivamente: aquelas que dirigem a tomada de decisões, controlando ideologicamente as atitudes, são forças de campo, como a Moral, as religiões, o Direito, a Economia, Psicologia, Matemática e tantas outras normas sociais; essas não precisam do contato: são referenciais teóricos que guiam o agir, instituídas quer através do consenso, quer através da violência. E, por falar em violência, as forças de contato são aquelas atribuições exercidas pela Sociedade, amparadas pelas forças de campo: as instituições estatais e empresariais, os agentes estatais, as pessoas incumbidas da função de punir, prender e controlar, que executam suas funções interagindo com os indivíduos, por meio das relações intersubjetivas que colocam as pessoas em contato e, caso as “leis das forças de campo” sejam descumpridas, praticarão atos para reorganizar a matéria. Ocorre que, ao contrário das forças de campo naturais, como a gravidade, o ser humano não é capaz de criar as suas “forças de campo” de forma a que atuem de forma perfeita; por não dispor de uma visão holística do Universo, e por estar limitado aos padrões não só de análise mas por questões biológicas que o impedem de ter uma visão do todo, a humanidade produz leis e códigos de conduta baseados na sua percepção que, sedo muito alargada ou reduzida – não importa -, jamais age prevendo todas as possibilidades e certezas. O mundo natural e o social, o universo circundante, todos os elementos que nos cercam trazem uma infinidade de informações; todas as variantes de uma determinada realidade observada só tornam possível a descoberta de pequenas probabilidades. Mesmo que possamos deduzir um evento imediato a uma determinada ação, já podemos imaginar os infinitos desdobramentos que um simples ato poderá ter no futuro, afetando vários outros atos, em cadeia, até os limites da imponderabilidade – tornando-nos incapazes de prever o futuro. Essa nova forma de observar o mundo foi-nos trazida pela Física quântica, que colocou em causa todos os conhecimentos adquiridos pela Mecânica e, dizem alguns estudiosos, pondo em causa até a Termodinâmica. Medindo as menores partículas que compõem a matéria, os cientistas descobriram que não é possível medir, ao mesmo tempo, a velocidade e a posição de um elétron, por exemplo; isso significa que, todas as vezes que tentamos descobrir a velocidade de um elétron, alteramos a sua posição, e vice-versa. Da mesma forma, se fizermos um furo numa cartolina, e colocarmos uma fonte luminosa (uma lanterna) por detrás dessa cartolina, com os raios de luz incidindo sobre o furo, observaremos uma projeção desfocada, porque fizemos com que o fóton se comportasse, ao mesmo tempo, como onda e como partícula, alterando tanto a onda quanto a partícula. Mas, qual a influência dessa imponderabilidade no Direito e em outras áreas do conhecimento humano? Profunda. Devemos tomar consciência de que todas as tomadas de decisão são tão limitadas quanto nossas percepções; mesmo que dispuséssemos de todas as informações, não teríamos como prever eventos que se encontram adiante da nossa capacidade ante o imponderável. As análises simplistas que juristas, economistas e todos os “istas” disponíveis e de plantão fazem sobre a realidade serão sempre limitadas pelo acaso. Foi por isso que desenvolvemos uma ferramenta bastante útil: o diálogo, no qual cada uma das partes envolvidas por um problema pode apresentar o seu ponto de vista desse mesmo problema, aumentando, assim, o leque de possibilidades de solução. Daí a importância de termos forças de campo que sejam bastante cuidadosas na operacionalização das forças de contato: o mau emprego dos recursos naturais, o mau uso da violência (essa temível e necessária característica bio-antropológica), o mau uso dos recursos econômico-financeiros (…), todos os riscos inerentes às nossas ações devem ser exaustiva e finamente calculados porque, mesmo que ainda nos arvoremos como únicos intérpretes do mundo natural, temos que nos lembrar não só das análises limitadas que fazemos, mas, também, temos que levar em conta o imponderável, o imprevisível. Nesse contexto, nós elegemos o Direito como uma força de campo no controle e prevenção de riscos:
Continuo comungando com a opinião daqueles que não admitem o funcionamento dos Estados Nacionais fora do Estado de Direito. É inacreditável que as ditas nações ocidentais civilizadas se regojizem com a barbárie. Sem dúvida alguma regredimos. Os judeus tinham, e ainda têm , trilhões de motivos para fazer com os nazistas essa chacina e esse linchamento que se fez contra Kadafi e seu filho. No entanto, capturaram todos os que puderam capturar, vivos, e os levaram a julgamento vivos e preservados. O mundo todo pôde ver os julgamentos que serviram de lição para a humanidade. Embora tudo tenha sido muito terrível o que os nazistas fizeram, a reação dos judeus foi civilizada, pedagógica e didática. O que aprendemos com os linchamentos na Líbia? O Editor Sem essa de misturar as coisas! O assassinato de Bin Laden nada tem a ver com a execução extrajudicial de Kadafi e seu filho, sob o patrocínio da ONU. [ad#Retangulo – Anuncios – Esquerda]Já escrevi aqui algumas vezes que defendo a eliminação de comprovados líderes terroristas, como Osama Bin Laden e outros de sua laia. É triste? É, sim! Mas não há alternativa. Essas pessoas se organizam para, de modo deliberado, tirar a vida de inocentes. Não declaram uma guerra ao establishment, à ordem ou sei lá a quê. Buscam fragilidades no sistema de segurança para fazer o maior número possível de vítimas. Não há como combatê-los por métodos convencionais. Alguns leitores tentaram ver contradição entre essa opinião e tudo o que tenho escrito sobre a morte de Muamar Kadafi e Mutassin, um de seus filhos. Presos com vida, foram executados pelos ditos rebeldes sem julgamento. Kadafi pai foi humilhado em vida e teve o corpo vilipendiado depois. Num dos vídeos que estão no Youtube, não vou publicá-lo aqui porque há limites para expor mesmo a abjeção alheia, uma daquelas flores da “Primavera Líbia” que enchem de alegria a vida de Arnaldo Abaixo-Bush Jabor, aparece introduzindo um instrumento qualquer no traseiro do ex-ditador, provavelmente uma arma. Vocês sabem como são os “oprimidos” quando se libertam, não é mesmo? E a democracia sodomizando a ditadura… Tenham paciência! Qual a diferença? O comboio em que viajavam Kadafi e seu filho foi alvejado por forças da Otan — no caso, soldados franceses. Eles estão lá com um mandado e um mandato da ONU e deveriam obedecer ao texto da Resolução 1973 do Conselho de Segurança, que já é ambíguo o bastante para permitir abusos. Mas algumas coisas são claras: não podiam atacar a não ser para defender civis — descumpriram esse requisito desde o primeiro dia — e não tinham autorização para matar Kadafi. A ação final da organização cumpriu o rito das outras: seus aviões fizeram o estrago inicial para que os rebeldes avançassem. Um correspondente da Globo nos EUA chamou isso de “não-guerra”… Ora, na prática, quem executou extrajudicialmente Muamar e Mutassin Kadafi foi a Otan — e, dada a cadeia de responsabilidades, foi, pois, a ONU. Os terroristas eliminados costumam ser colhidos de surpresa, e o objetivo é evitar que reajam. O ex-ditador e seu filho já tinham sido feito prisioneiros, estavam desarmados, não tinham como reagir. Qual é? Não havia mais informação a colher da dupla, estavam derrotados, acabados, vencidos. Que sentido faz a tortura e o contínuo vilipêndio do cadáver? O mundo faz seus votos em favor da democracia líbia, e os dois cadáveres continuam expostos na câmara fria de um açougue, tornados atração turística. A Otan, reitero, ainda está lá. E isso significa que a Líbia continua sob os auspícios da Resolução 1973 da ONU, que segue, então, patrocinando aquele espetáculo tétrico. Não há paralelo possível com o assassinato de Bin Laden ou de líderes de outros grupos terroristas. EUA, França, Reino Unido e ONU escolheram um dos lados de uma guerra civil. Tornam-se, assim, responsáveis por seus métodos. Dona Hillary Clinton, secretária de Estado dos EUA, já havia sido inconveniente o bastante ao ter feito votos, dois dias antes, pela morte de Kadafi, o que não estava na resolução. A eliminação de terroristas ajuda a pôr ordem no mundo; o que se fez na Líbia concorre para a desordem. Doravante, nas intervenções autorizadas pela ONU, já se sabe que o limite é não haver limites. Digam-me cá: o que se praticou com os Kadafis é diferente dos horrores da prisão de Abu Ghraib, que, com razão, chocaram o mundo? Os responsáveis por aquela cenas bárbaras forma punidos. Mundo afora, o que vi, li e ouvi, depois que já estava claro que pai e filho haviam sido executados, foram palavras de regozijo, de felicidade, de louvor. Barack Obama até chegou a advertir os demais ditadores do mundo que aquele pode ser o seu destino. Não, eu não estou entre aqueles que têm grandes esperanças na dita “Primavera Árabe”. Acho que se trata de um sonho que se sonha nas democracias ocidentais. Mas essa minha descrença não interfere no meu juízo objetivo: três das potências ocidentais, usando a ONU como escudo e a Otan como braço armado, patrocinaram a selvageria. Isso não melhora em nada a biografia de Kadafi: era um facínora, um asqueroso, um homicida compulsivo, um ladrão. Mas eu não tenho, por enquanto, um só motivo para apostar que seus algozes sejam melhores do que ele. Eu não reconheço o estatuto do algoz do bem. Uma das coisas que me afastaram da esquerda ainda na primeira juventude (estou na segunda, hehe…) foi o relativismo moral. Todos nós sabemos o que as tropas morais do politicamente correto estariam dizendo se tal espetáculo tivesse se dado sob os auspícios de George W. Bush. Como o arquiteto da ação foi Barack Obama, então se trata, naturalmente, de algo benigno. Não! Obama levou o baguncismo para ONU. “Ah, o Chávez e o PCdoB também criticaram a ação”. E daí? Eles não são meus interlocutores. Se eu me obrigasse a criticar tudo o que eles elogiam, e também o contrário, seria refém deles. Mas não sou refém de ninguém. O Beiçola de Caracas e os
O dedo de Deus ¹ Gaudêncio Torquato O juiz, ensinava Francis Bacon, o filósofo inglês, deve preparar seu caminho para uma justa sentença, como Deus costuma abrir seu caminho elevando os vales e abaixando as montanhas. Perguntinha do momento: será que há juiz abrindo vias judiciárias no Brasil sem olhar para o dedo de Deus? Pelo que se lê, há. É o que se deduz da ferina declaração da ministra Eliana Calmon, corregedora nacional de Justiça, ao anunciar que no Judiciário há “bandidos de toga”. Ela vai além com o rabisco pitoresco de que inspecionará o Tribunal de Justiça de São Paulo, “refratário a qualquer ação do CNJ no dia em que o sargento Garcia prender o Zorro”.[ad#Retangulo – Anuncios – Esquerda] Ora, quem conhece a historinha de TV que se passa em San Diego, no sul da Califórnia (EUA), não tem dúvidas sobre o desfecho. A chance do obeso sargento Garcia, fanfarrão e bebedor de vinho, prender o inimigo, Zorro, defensor do povo, chega perto de zero. A intenção da corregedora é, tudo indica, denunciar a ação corporativa patrocinada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que objetiva reduzir o poder de investigação do Conselho Nacional de Justiça. Quem tem razão na pendenga? A questão avulta nesse momento em que o país presencia agitada movimentação na esfera dos operadores do Direito. Procuradores e promotores, advogados e juízes dominam a cena, brandindo armas flamejantes na arena dos conflitos, cada qual desempenhando suas funções. São ações judiciais – processos criminais, ações civis públicas, ações diretas de inconstitucionalidade -, recursos em defesa de pessoas e grupos de interesse ou, no caso dos magistrados, decisões muito aguardadas, cujos efeitos se fazem sentir nas políticas públicas e na dinâmica das instituições. É oportuno conferir o pano de fundo. O campo da política estreita, a cada dia, a distância que mantém da seara da justiça. Fato registrado pelos dois termos que traduzem a imbricação entre suas fronteiras: a judicialização da política e a politização da justiça. O que se convencionou chamar de “ativismo judicial” se explica por um conjunto de fatores, entre os quais se destacam: o despertar da sociedade, por meio de seus núcleos organizados; a emergência de novos pólos de poder; a promoção da cidadania, na esteira das bandeiras dos direitos humanos e da igualdade, responsável por movimentos como os de defesa das mulheres, de etnias e dos homossexuais; e o vácuo proporcionado pela ausência de legislação infraconstitucional (muitos dispositivos da CF de 88 não foram regulamentados). Nesse ambiente de múltiplas interações, dentro do qual convivem instituições em processo de consolidação e uma cultura patrimonialista que subjuga a res publica ao crivo (e à ambição) do interesse privado, é difícil ao sistema judiciário tornar-se imune às pressões políticas. A partir de 88, a Carta Magna abriu o leque das relações mais intensas. A composição das Cortes, por sua vez, tem proporcionado união mais estável entre justiça e política. Anote-se, por exemplo, o processo de seleção de nomes para compor as listas dos tribunais superiores, encaminhadas ao chefe do Executivo, a quem cabe a palavra final. No torneio de trancas e retrancas, pressões e contrapressões, há jogadores dos partidos, de arenas corporativas (associações de classe) e de grupos, particularmente os da esfera laboral. Registre-se, ainda, que o território dos negócios adentrou muito os domínios do Estado. Portanto, a politização da justiça sob o prisma de indicação de nomes para as Cortes incorpora também esse componente. Em nações desenvolvidas, como a França e a Alemanha, isso é natural. Parcela da Corte Constitucional passa pelo crivo do Parlamento. Há, ali, intenso atrelamento partidário. E nos Estados Unidos, a nomeação de magistrados passa pela régua partidária, seja privilegiando democratas ou republicanos (liberais ou conservadores), dependendo do presidente do momento. Exposto o cenário da interação justiça/política, é comum ouvir nos corredores do Judiciário coisas do tipo: “o juiz fulano é ligado ao político beltrano e vice-versa, o mandatário tem afinidade com o juiz tal”. Até ai, tudo bem. O desenho ganha matiz mais forte quando a aproximação gera suspeita, quando se escancara a influência de atores (políticos/empresariais) nas decisões de juízes. É até provável que a complexidade do sistema judicial brasileiro dê margem a desvios, levando-se ainda em conta a existência de 16.108 magistrados. Os descaminhos acabam batendo às portas da Corregedoria do CNJ. E aqui entra em cena a corregedora Nacional da Justiça com sua pregação: “há bandidos de toga”. Mas a entidade de classe dos magistrados quer nomes, repele a generalização. Como colocar a questão? Pincemos a célebre pergunta dos filósofos do Direito: Quis custodiet custodes? Quem vigia o vigilante? Norberto Bobbio sugere a resposta ao pressupor que a indagação, per si, aponta para um vigilante superior. Faz, porém, a ressalva: o processo deve ter limite sob pena de descambar ao infinito. O Conselho Nacional de Justiça, nesse caso, seria o vigilante das Cortes Estaduais. Sob tal entendimento, o cabo de guerra é puxado para o lado da ministra Calmon. O desembargador Nelson Calandra, presidente da AMB, refuta: “a magistratura não precisa de guardas para guardar os guardas”. Mas se os “guardas” (alguns) não honram o múnus, o desabafo de Calandra, é forçoso reconhecer, perde força. Poderia a própria Corregedoria do Tribunal “guardar” os quadros que o integram? Ora, essa é uma de suas funções. Mas os Tribunais, é sabido, não fazem controles rígidos. O modus operandi é corporativo. Não se controla a permanência dos juízes em suas localidades e nos fóruns. Crítica geral: as Corregedorias são omissas. Processos administrativo-disciplinares, ao chegarem ao plenário, são protelados com pedidos de vista, caindo na prescrição. Querem um bom desfecho para a querela? Basta que os dois lados olhem para onde aponta o dedo de Deus. ¹ Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP e consultor político e de comunicação. Twitter: gaudtorquato
Um menor, que perdeu o pai, marceneiro, atropelado por uma moto quando regressava do trabalho, em Marília, SP., ajuizou ação de indenização contra o causador do acidente. Na ação, o menor, pedia pensão de 01 salário mínimo mais danos morais em função da morte do pai. Declarando-se pobre na forma da Lei e sem condição de arcar com as custas processuais, o menor se valeu da Lei nº1060 de 1950 para usufruir do direito à defesa gratuita. O juiz da vara competente de Marília negou-lhe o direito à defesa gratuita sob o argumento de que o menor não tinha apresentado “prova de pobreza” e ter sido representado, na ação, por “advogado particular”, indeferindo a ação. O menor entrou com um Agravo de Instrumento junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Coube ao desembargador José Luiz Palma Bisson exarar a emocionante sentença, reproduzida abaixo. O exemplar texto do juiz Luiz Bisson, sedimenta a convicção que tenho, de que o Direito transcende a tecnicidade, e mais que um conjunto de normas ou uma Ciência, é elevado à dimensão de arte. O Editor O voto do desembargador José Luiz Palma Bisson: “É o relatório. Que sorte a sua, menino, depois do azar de perder o pai e ter sido vitimado por um filho de coração duro – ou sem ele -, com o indeferimento da gratuidade que você perseguia. Um dedo de sorte apenas, é verdade, mas de sorte rara, que a loteria do distribuidor, perversa por natureza, não costuma proporcionar. Fez caber a mim, com efeito, filho de marceneiro como você, a missão de reavaliar a sua fortuna. Aquela para mim maior, aliás, pelo meu pai – por Deus ainda vivente e trabalhador – legada, olha-me agora. É uma plaina manual feita por ele em paubrasil, e que, aparentemente enfeitando o meu gabinete de trabalho, a rigor diuturnamente avisa quem sou, de onde vim e com que cuidado extremo, cuidado de artesão marceneiro, devo tratar as pessoas que me vêm a julgamento disfarçados de autos processuais, tantos são os que nestes vêem apenas papel repetido. É uma plaina que faz lembrar, sobretudo, meus caros dias de menino, em que trabalhei com meu pai e tantos outros marceneiros como ele, derretendo cola coqueiro – que nem existe mais – num velho fogão a gravetos que nunca faltavam na oficina de marcenaria em que cresci; fogão cheiroso da queima da madeira e do pão com manteiga, ali tostado no paralelo da faina menina. Desde esses dias, que você menino desafortunadamente não terá, eu hauri a certeza de que os marceneiros não são ricos não, de dinheiro ao menos. São os marceneiros nesta Terra até hoje, menino saiba, como aquele José, pai do menino Deus, que até o julgador singular deveria saber quem é. O seu pai, menino, desses marceneiros era. Foi atropelado na volta a pé do trabalho, o que, nesses dias em que qualquer um é motorizado, já é sinal de pobreza bastante. E se tornava para descansar em casa posta no Conjunto Habitacional Monte Castelo, no castelo somente em nome habitava, sinal de pobreza exuberante. Claro como a luz, igualmente, é o fato de que você, menino, no pedir pensão de apenas um salário mínimo, pede não mais que para comer. Logo, para quem quer e consegue ver nas aplainadas entrelinhas da sua vida, o que você nela tem de sobra, menino, é a fome não saciada dos pobres. Por conseguinte um deles é, e não deixa de sê-lo, saiba mais uma vez, nem por estar contando com defensor particular. O ser filho de marceneiro me ensinou inclusive a não ver nesse detalhe um sinal de riqueza do cliente; antes e ao revés a nele divisar um gesto de pureza do causídico. Tantas, deveras, foram as causas pobres que patrocinei quando advogava, em troca quase sempre de nada, ou, em certa feita, como me lembro com a boca cheia d’água, de um prato de alvas balas de coco, verba honorária em riqueza jamais superada pelo lúdico e inesquecível prazer que me proporcionou. Ademais, onde está escrito que pobre que se preza deve procurar somente os advogados dos pobres para defendê-lo? Quiçá no livro grosso dos preconceitos… Enfim, menino, tudo isso é para dizer que você merece sim a gratuidade, em razão da pobreza que, no seu caso, grita a plenos pulmões para quem quer e consegue ouvir. Fica este seu agravo de instrumento então provido; mantida fica, agora com ares de definitiva, a antecipação da tutela recursal. É como marceneiro que voto. JOSÉ LUIZ PALMA BISSON – Relator Sorteado