Dilma Rousseff: 3 dias de erros e acertos

Nem mesmo Zé Bêdêu — o derradeiro abestado crédulo da Praça do Ferreira, em Fortaleza —, acredita que todas as obras previstas nos cadernos de encargos da FIFA e Comitê Olímpico Internacional, estarão prontas para a Copa do Mundo, e para as olimpíadas, respectivamente.
O Editor


Três dias de Dilma: uma boa no cravo e uma ruim na ferradura

A mesmice da posse e dos primeiros movimentos de Dilma Rousseff só foi quebrada pelo anúncio de que ela tende a privatizar a construção e a operação de novos terminais nos aeroportos de Congonhas e Guarulhos.

Ao dizer que a mesmice “só foi quebrada…etc” eu não quis minimizar a importância do anúncio. De forma alguma.

Dilma começar o governo contrariando o posicionamento estatizante que assumiu na campanha já é um fato de certa importância. Sugere que ela não leva os dogmas econômicos do PT a sério, ou que o PT não manda nela. Ou ambas as coisas. Se for isto, são duas boas notícias.

Por enquanto é só um anúncio, algo que pode vir a ser feito, não uma medida já tomada. Mas tendo visto o Lula jogar toda a teoria econômica do partido no lixo, em 2003, eu não tenho por que duvidar que essa privatização venha de fato a se concretizar.[ad#Retangulo – Anuncios – Direita]

A ressalva que eu mais ouvi nas discussões de hoje não foi tanto a respeito da intenção anunciada, mas sobre se a privatização vai dar certo. Por que haveria de não dar? Por causa do PT? Com os aeroportos em petição de miséria e o tempo encurtando para a Copa e a Olimpíada, ele chegaria a se contrapor à aprovação ou à implementação de tal medida?

Realmente, estas indagações ficaram no ar, e creio ter identificado as três hipóteses (não excludentes) que a seguir apresento de maneira bem esquemática.

Na primeira hipótese, a privatização de fato será mal recebida por uma parte do PT, notadamente pelos sindicatos trabalhistas, e por certos grupos que gravitam em torno dele. Não se trata propriamente de ideologia, mas de cargos e posições de influência. Sem ligação conhecida com o PT ou com os sindicatos, alguma resistência poderá também surgir em função do tradicional controle do setor pela Aeronáutica. Mas Dilma irá em frente com sua decisão – até porque aprendeu com Lula a arte de neutralizar esse pessoal.

Acrescente-se, claro, que a decisão é presidencial, não partidária, e que Dilma está começando e não terminando o mandato. Um dos segredos do amplo apoio a Lula foi ele ter meticulosamente evitado tomar decisões em assuntos conflituosos. Arbitrar interesses nunca foi muito a dele, menos ainda no segundo mandato, por mais claro que fosse o interesse público em jogo.

Outra hipótese é a de que a presidente já teria deixado o velho ranço ideológico e estaria pronta para governar em termos estritamente pragmáticos. Também neste aspecto, é preciso lembrar o aprendizado dela com Lula. Para o grande capital, não há nada melhor que um governo de “esquerda” disposto a seguir uma linha de “centro”.

Além do que, ela daria um tiro no pé se começasse desde agora a fugir de decisões difíceis, ou a fazer só o que a sociedade considera provável. No mínimo, ela reforçaria, por inércia, a suposição de ter sido eleita só para esquentar a cadeira para o Lula. Por isso é que ela estaria evitando se atritar com o petismo e com os chamados movimentos organizados especificos. Isto não faria muito sentido, pois nem estes quererão o fracasso do governo, sabendo-se que o que pretendem é antes de tudo se perpetuarem no poder.

A terceira hipótese – para mim a mais provável – é que a propalada privatização é tão-somente uma imposição da realidade. Trata-se, não nos esqueçamos, de melhorar as condições do transporte aéreo. Noutros setores, a presidente talvez se mantenha fiel à sua antiga ideologia estatizante.

Mas a situação dos aeroportos, além de envolver interesses numerosos e ponderáveis, reveste-se de urgência urgentíssima, tendo em vista a já mencionada aproximação da Copa e dos Jogos, cuja realização no Brasil pode até ficar comprometida se as graves deficiências de infra-estrutura continuarem sem solução. A questão, aliás, é por que só agora, depois de 8 anos no governo Lula, se mostra receptiva ao capital privado.

Seja como for, por maior que seja a medida anunciada, é muito cedo para tentarmos decifrar a equação decisória dos próximos anos : qual será o peso relativo da presidente, do PT, do PMDB e de outros interesses. E da própria realidade, porque certas medidas são às vezes tomadas de um jeito ou de outro – par la force des choses.

Bem mais claro, infelizmente, foi o que a presidente indicou sobre seu modo de ver a corrupção. Tudo indica que ela vai se manter na linha lulista de firmar jurisprudência mediante afagos. Lula, como se recorda, chegou até a se declarar “traído” por certos companheiros, mas nunca os nominou, e tampouco declarou formalmente o que eles teriam feito. Longe de censurá-los ou encaminhá-los à justiça, optou sempre pela anistia simbólica, reintegrando-os a seu convívio. Manteve estrita fidelidade à jurisprudência pelo afago.

Dilma seguiu o mesmo ritual ao anistiar simbolicamente a companheira Erenice. Nada declarou formalmente, mas indicou, para bom entendedor, que foi só de mentirinha a raiva que sentiu durante a campanha.

Mal comparando, o método até lembrou o velho estilo soviético: não se pune nem absolve ninguém; quando têm as boas graças dos poderosos, as pessoas simplesmente reaparecem.

blog do Bolívar Lamounier

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