Sylvia Plath – Versos na tarde

As Pedras
Sylvia Plath ¹

Esta é a cidade onde se remendam os homens.
Eu deito sobre uma grande bigorna.
A achatada abóbada azul

Voou feito o chapéu duma boneca
Quando eu caí fora da luz. Ingressei
No estômago da indiferença, armário sem fala.

A mãe dos pilões me reduziu.
Tornei-me um grânulo tranquilo.
As pedras da barriga eram pacíficas,

A pedra-chefe quieta, nada a chacoalhava.
Somente a boca-buraco flauteava,
Grilo impertinente

Numa pedreira de silêncios.
O povo da cidade ouviu.
Caçaram as pedras, taciturnas e apartadas,

A boca-barriga gritando aonde estavam.
Ébria como um feto
Eu sugo as papinhas da escuridão.

Tubos de alimento me envolvem. Esponjas lambem-me os liquens.
O mestre-joalheiro impele seu cinzel para
Extrair um olho da pedra.

Este é o pós-inferno: eu vejo a luz.
Um vento destampa a câmara
Do ouvido, velho preocupador.

A água amolece o lábio da pederneira,
E a luz do dia dispõe sua mesmice na parede.
Os enxertadores são alegres,

Esquentando as torqueses, içando os delicados martelos.
Uma corrente agita os fios
Volt sobre volt. Categute sutura minhas fissuras.

Um operário passa carregando um torso cor-de-rosa.
Os almoxarifados estão cheios de corações.
Esta é a cidade das peças sobressalentes.

Meus membros enfaixados tem cheiro doce feito borracha.
Aqui operam cabeças, ou quaisquer pedaços.
Às sextas-feiras as criancinhas vêm

Para trocar os ganchos por mãos.
Mortos deixam os olhos para os outros.
Amor é o uniforme da minha enfermeira careca.

Amor é tendão e osso da minha praga.
O vaso, reconstruído, abriga
A rosa elusiva.

Dez dedos moldam um bojo às sombras.
Meus remendos coçam. Não há nada a fazer.
Ficarei nova em folha outra vez.

¹ Sylvia Plath
* Massachusetts, USA – 27 de Outubro de 1932
+ Primrose Hill, Londres, Inglaterra – 11 de Fevereiro de 1963 d.C


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