Cantoria
Zé Limeira¹
“Ela parece um limão
Rodeado de cebola,
Uma goiabeira verde
Enfeitada de ceroula,
Com dentadura de pau
Eu elogiá-la vô-la.”
“Eu só gosto dessa moça
Porque tem vegetação,
Porteira de pau-a-pique,
Três pneu de caminhão,
Rabo de jumenta russa
E haja chuva no sertão.”
“Eu sou açude corrente
Dentro da mata bravia,
Gramática azul, beiçuda,
Queijo de leite de jia,
Rincho de burra cardan
E haja festa na Bahia.”
“Um dia eu tava acordado,
No mais rancoroso sono,
Passou uma cobra azul
Falando num microfone,
E um mudo gritando em baixo:
– Vim buscar o meu abono!”
“Sou casado e bem casado,
Com quem, não digo com quem.
A muié ainda é viva,
Mas morreu, mora no Além.
Se um dia voltar à terra
Vai morar no pé da serra,
Não casa mais com ninguém.
“Casemo no ano de quinze, Na seca de vinte e três;
A muié era donzela,
Viuva de sete mês,
Mais não me alembro que tenha
Um dia ficado prenha,
Estado de gravidez.”
¹José Limeira
* Teixeira, PB – 1886 d.C
+ 1954 d.C
Zé Limeira, conhecido como o Poeta do Absurdo. A cidade onde nasceu, Teixeira, estado da Paraíba, foi o principal reduto de repentistas no século XIX e onde a viola teria sido usada pela primeira como instrumento de cantoria lá pelos idos de 1840. Viveu até o ano de 1954. Não há registro de sua voz. Fitas de pesquisadores que gravaram algumas de suas pelejas sumiram ou se deterioraram.
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