Nicolau Sião – Versos na tarde – 20/12/2016

Relíquia
Nicolau Sião ¹
(ao Le Clézio, c/ o velho abraço)

Onde está o silêncio onde jaz o silêncio?
Não neste braço sujo cortado
Não neste tapete espesso neste bloco de apontamentos
onde se cruzam insultos rimas
Não no pequeno perímetro das veias

– afinal tudo tudo entre nuvens de carbono
semelhantes a um bafo de camponês sobre a neve
onde se esmagavam insectos e excrementos de lobo
O primo velho outrora mo ensinara num mês adolescente.

Onde em que ilha de desolação
sufocado incerto esse silêncio soberano
onde jaz cerzido por traços de faca de pedra
Não não o barulho de um passo que caminha para a beleza dum rosto
saindo de um vazadouro para a lama musgosa da margem
Brilhante como celofane

O silencio que respira
Sim o silêncio morno de quem procura o vazio
ou de quem busca uma cor imersa na carne recordada
da mão faminta de muitos negrumes alheios
O silêncio que se recolhe
que se desdobra
que nos relembra de momentos e perdas
O silêncio que permutamos
O silêncio para além da luz entre os olhos de uma fera morta.

¹ Nicolau Sião
* Monforte do Alentejo, Portugal – 1946
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Poeta, pintor, publicista e ator/declamador. Publicou Os Objectos Inquietantes, Flauta de Pan, Assembleia Geral e Os Olhares Perdidos (poesia), Passagem de Nível e O desejo dança na poeira do tempo (teatro). Editada pela paulistana Ed. Escrituras/IPLB saíu no Brasil a antologia de poesia e pintura Olhares perdidos, organizada por Floriano Martins. Em Moçambique, pela mão de António Cabrita, publicou O armário de Midas e está programado Poemas dos quatro cantos(poesia).

Tem para sair As Vozes Ausentes (prosa diversa), Nigredo/Albedo – o livro das translações, Cantos do deserto, Escrita e o seu contrário (poesia), As estrelas sobre a casa(teatro), Em nós o céu (policial).

Traduziu Vestígios, de Gérard Calandre e Fungos de Yuggoth, de H. P. Lovecraft (publicado por Black Sun). É membro honorário da Confraria dos Vinhos de Felgueiras. A Ass. Port. Escritores atribuiu-lhe em 92 o Prémio Revelação/Poesia. Vive em Atalaião, agregado populacional a nordeste de Portalegre.


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