Boa noite
Flor escandalosa
Bárbara Lia ¹
Meu pai sonhava o deserto
E viveu ao lado do amor
Rimbaud sonhava as areias
Também reinventar o amor
Rimbaud viveu no deserto
Meu pai morreu de amor
Meu pai surfava o mar de estrelas
Com um teodolito da cor da destemperança
– verde oliva que tende ao amarelo –
Quando eu dormia ele soprava
Sementes de poesia
Por cima das minhas cobertas
Rimbaud passava noites inteiras
Regando com um regador de nuvens
Minha alma de fogo e a semente
Nasceu esta flor escandalosa
Misto de estrela e rosa
Da cor dos olhos do amor
E do deserto sonhado
Por meu pai e Rimbaud
Meu pai viveu em poesia
Nunca escreveu um verso
Rimbaud desistiu bem cedo
Meu pai sabia; sabia Rimbaud
O vento que atravessa a cortina
Traz a voz de ambos, mixada:
Ilumine o verbo!
Incendeie a alma!
Faça de corações desertos
Cactos em flor
Sangue em ebulição