‘Tudo é crackeado algum dia’, diz cracker.
Empresas tentam conter a pirataria de apps em smartphones.
Por causa da pirataria, desenvolvedores procuram aumentar a segurança de aplicativos móveis.
(Foto: Felipe Figueiró/LD)
Grupos especializados em piratear aplicativos para dispositivos portáteis, como o PalmOS, agora se concentram nos celulares e, principalmente, nas plataformas dominantes como Symbian (da Nokia), Android (do Google) e iOS (da Apple).
Não há muitos dados sobre a prática, mas desenvolvedores já começaram a criar e incluir tecnologias antipirataria em seus produtos para conter a ação dos “crackers”.[ad#Retangulo – Anuncios – Esquerda]
A Flurry, uma empresa especializada em analisar o comportamento de usuários enquanto utilizam softwares em celulares, afirma que entre 5 e 8% dos downloads são piratas.
A Mtiks, uma companhia de software que desenvolve recursos antipirataria para iOS e Android, afirma que 98 dos 100 softwares pagos mais populares no App Store do iTunes foram crackeados e são distribuídos ilegalmente.
O aparecimento de empresas especializadas nessa área como a Mtiks mostram a demanda por tecnologias antipirataria “enlatadas”. No Windows, elas são muito comuns.
A Rovi Corporation, antigamente conhecida como Macrovision, fornece proteção antipirataria para vários games. A tecnologia SafeDisk da Macrovision é incorporada na instalação padrão do Windows desde o Windows XP.
Segundo David Brennan, diretor da empresa que cria a suíte de escritório QuickOffice, a pirataria ocorre em todas as plataformas, mas as medidas para combater a prática variam.
No Symbian, da Nokia, a companhia usa uma tecnologia antipirataria própria. “Já no iOS e no Android, nós usamos as tecnologias das lojas oficiais das plataformas e do sistema operacional”.
“Nosso software é destravado só para um aparelho específico usando um identificador único como um PIN ou o número IMEI”, explica Brennan; o IMEI é uma espécie de número de série do celular para identificá-lo na rede sem fio. Mas essas medidas atraem ainda mais crackers. “Quanto mais sofisticada é a medida que tomamos, parece que há um apelo maior para quebrá-la”, conta o executivo.
O QuickOffice é um dos softwares mais populares para a utilização de arquivos comuns como documentos Word e planilhas do Excel no celular.
Ele está disponível para várias plataformas.
Em julho, o Google anunciou um serviço unificado de licenciamento para softwares disponíveis no Android Market. Em agosto, o protocolo foi quebrado facilmente. O Google respondeu que parte da culpa era dos desenvolvedores, que usavam o código de exemplo fornecido pela empresa sem alterações. Desenvolvedores devem seguir as instruções para implementar segurança antipirataria em seus produtos.
No iPhone, a App Store também fornece controles semelhantes, mas usuários que fizeram jailbreak em seus iPhones conseguem instalar softwares piratas sem nenhuma dificuldade.
‘Jamais peça dinheiro’
Altieres Rohr/G1
Muitos usuários usam somente programas piratas e a pirataria é quase uma regra em alguns mercados, em vez de ser a exceção. É o caso, inclusive, no Brasil. Mas os indivíduos responsáveis pela criação e distribuição de softwares piratas, ou “warez”, são pouco conhecidos. A maneira que eles operam é ainda menos conhecida.
O G1 conversou com um rapaz de 24 anos que cria “cracks” para softwares de celular e trabalha como vendedor em uma loja de celulares e outros portáteis. Ele disse fazer parte do grupo CorePDA. “Core” é um grupo antigo na criação de cracks para software. O CorePDA é separado do original e se especializa somente nos celulares. Tem cerca de 10 membros; um grupo com 20 pessoas é considerado grande.
Para ele, a pirataria de softwares de celulares é “tão comum quanto a de filmes”. “Tudo é crackeado algum dia”, diz. Os grupos especializados em celulares são os mesmos que anteriormente buscavam crackear programas para gadgets como Palm, iPaq e outros portáteis; muitos grupos continuam usando o termo PDA (Personal Digital Assistant),
Grupos como o Core e o CorePDA fazem parte da Scene (“cena”).
Todos os softwares, games, filmes e CDs de música distribuídos por membros da “cena” são a moeda de troca para obter outros títulos ou “releases”, como eles são chamados. A Scene não é diretamente responsável pela disseminação dos “releases” nas redes ponto a ponto (P2P). Existem grupos separados que atuam apenas no P2P e que trazem os “releases” da cena tradicional ao P2P, atingindo um número maior de pessoas que a distribuição inicial, limitada a servidores privados chamados “topsites”.
Para participar da cena é preciso seguir várias regras. Cada “release” deve obedecer a essas regras bem claras e, caso isso não seja feito, o grupo pode ser punido. Mas existem também regras “não escritas” da cena.
“’Jamais peça dinheiro’, é uma das regras não escritas da cena”, explica o cracker anônimo. Ele diz que já faz isso há mais de dois anos, mas a programação é um hobby. “Eu estudei programação, mas não para trabalhar com isso. Gostaria de trabalhar em um asilo, pagam mais e o trabalho traz mais satisfação”.
Para Brennan, da QuickOffice, a questão não é tão simples. Ele afirma que, em vários casos, os softwares piratas são distribuídos em sites comerciais, com receitas provenientes de anúncios publicitários. “Na prática, são agências de publicidade e anunciantes legítimos que financiam a criação e distribuição dos cracks”.
A popularidade dos aplicativos é um fator decisivo na hora de decidir o “alvo”. O cracker afirma que muitas vezes proteções semelhantes são usadas em vários softwares. “A primeira vez é sempre mais complicada. Depois fica fácil”. Mas os softwares populares são geralmente os que também são mais protegidos e o “desafio” torna-se mais interessante.
Compartilhar é se importar – sharing is caring
Várias vezes durante a conversa – que ocorreu em um canal criptografado de bate-papo IRC – o cracker proferiu o mantra “sharing is caring”, que pode ser traduzido para português como “compartilhar é se importar”, dando a entender que a pirataria, ao compartilhar os softwares, filmes e música, está distribuindo também algo para os desfavorecidos.
“Pessoas pensam que somos terroristas, que somos os seres mais desprezíveis do mundo. Mas eles não sabem nada sobre a cena. Eu sou fã de alguns jogos, então eu compro. Você vê nos arquivos .nfo [que acompanham os lançamentos da cena]: ‘se você gosta, compre’. O cracker da CorePDA exemplifica: “eu jogo ‘World of Warcraft’ nos servidores oficiais. Mas outras pessoas podem não ter condições de fazer isso. Então sharing is caring”.
Altieres Rohr/G1