Foi descoberta agora, na Câmara, uma máfia que opera com passagens aéreas. Tudo indica que funcionários dos deputados repassam para agências de viagens os bilhetes a que os parlamentares têm direito, e as empresas os revendem para clientes. Os ministros Eros Grau e Gilmar Mendes, do Supremo, aparecem como supostos beneficiários da cota de passagens de deputados.
Mendes já apresentou a fatura de seu cartão de crédito, demonstrando que pagou a viagem com os seus próprios recursos. Grau provou que seu bilhete foi pago pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, onde deu uma palestra. Foi aberta uma sindicância para apurar o caso.
Como se vê, à lambança, junta-se também o banditismo. Temos aí a evidência do absoluto descontrole na emissão e no uso dessas passagens. E tudo por quê? Porque o Parlamento brasileiro, infelizmente, fraudou o princípio que faculta as viagens aos congressistas.
Qual era o espírito? O Brasil é um país continental. Muitos parlamentares não levam suas respectivas famílias para Brasília. Mais: têm o trabalho político a fazer junto a suas bases. O princípio é justo: a visita a seus estados de origem uma vez por semana, espetando a conta no erário, é compreensível. Assim, bastaria a cota de quatro passagens por mês para uso pessoal.
As exceções – para membros da Mesa Diretora – deveriam ser rigorosamente acompanhadas. Líderes partidários não têm de ter licença especial coisa nenhuma. Isso é parte do custo de manutenção do partido. A menos que viajassem a serviço da Casa, não da legenda.
Pois bem. Ocorre que os digníssimos fraudaram o princípio. Vejam a síntese que o Estadão publica das “mudanças” feitas por Câmara e Senado. Volto em seguida:
No Senado
1 – Fim das duas passagens com escala no Rio. Senador mantém direito a 5 passagens mensais de Brasília para Estado
2 – Fim das duas passagens extras para líderes e integrantes da Mesa do Senado
3 – Liberada doação das passagens para cônjuges, filhos, dependentes, familiares, assessores e correligionários
4 – A cota de passagens pode ser usada para alugar jatinhos e barcos, desde que no Estado do parlamentar
5 – Os bilhetes aéreos não usados poderão continuar sendo transformados em créditos. A
cota de passagens continua podendo ser usada para viagens ao exterior.
Na Câmara
1 – Corte de 20% da cota de passagem. A mais alta é para deputados de Roraima,
de R$ 18.737,44, e a menor para o DF, R$ 4.705,72
2 – Permite uso de passagens do deputado por cônjuge, dependentes legais e para atividades parlamentares, incluindo nesse critério os assessores
3 – Permite ao deputado interpretar o que entende por atividade parlamentar. Não veta uso de passagens para turismo
Voltei
Por que é que nós temos de pagar as passagens aéreas das mulheres, maridos, filhos e apaniguados dos digníssimos parlamentares? Ao se permitir que um “assessor” ou “correligionário” utilize o bilhete, abre-se a porteira para toda e qualquer irregularidade. Mais: as viagens turísticas estão liberadas – desde que dentro da cota. É o fim da picada! Ao tentar moralizar o procedimento, Câmara e Senado oficializaram a lambança. Bateu aquela saudade na esposa ou no marido do congressista? Pois que façam como as demais esposas e maridos do país: arquem com o custo do seu chamego. Ou isso agora também é problema nosso?
O escândalo está na transformação das cotas em SALÁRIO. Isso fica evidente no caso da viúva do senador Jefferson Peres. Ele não usou as cotas a que tinha direito. Elas foram transformadas em dinheiro, (in)devidamente repassado à viúva. O mais chato disso tudo é que as duas Casas decidiram que a bagunça vai continuar. As “novas” regras acima estabelecidas oficializam a bagunça.
Não é de estranhar que o presidente Lula pareça reinar sobre toda coisa viva no Brasil. Não sabemos as lambanças que o Executivo faz com passagens aéreas, por exemplo. O Congresso, felizmente, está submetido a um escrutínio bem mais rigoroso. E, como se vê, é pródigo em maus exemplos.
blog Reinaldo Azevedo