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Daniel Bristol – Versos na tarde – 05/09/2015

Devolucionista Daniel Bristol Dantes eu era um oceano cheio de vida. Podia dar conta de tudo, pois era com isso que se contava. Alargava-me por milhas e costumava abarcar toda a terra. Costumava ser tudo para toda a gente; terás só de acreditar na minha palavra. Costumava ser um grande lago. Costumava ser o maior de todos. Era o ventre de onde nascia a lua logo que o sol se punha. Estava sempre a brilhar, chovesse ou fizesse sol, fosse dia ou noite. Fui o lugar aonde trouxeste a tua namorada para a pedir em casamento. Costumavas meditar sobre os teus dias à beira das minhas águas. Depois transformei-me num pequeno lago perfeito para velejar. Os melhores amigos passavam muito tempo a pescar e a rir até que o dia terminava. Eu costumava ser o local de onde assistias ao fogo de artifício do 4 de Julho. E gelei em Dezembro quando fiquei a saber que o teu melhor amigo tinha morrido. Costumava até abraçar o chão onde jaz agora o cão da tua família. E depois fui um rio, correndo rapidamente, saltando o tempo. Costumava transformar rochas aguçadas em pedras perfeitas para lançar sobre a água. Costumava respirar de um modo constante. Costumava seguir o meu próprio ritmo. Tu costumavas chegar-te a mim apenas para lavares os pés sujos. Juntos observávamos as estrelas; costumávamos verter a mesma quantidade de lágrimas. Vi-te florir e crescer; juntos partilhámos os melhores anos. Mas agora sou um afluente debaixo de uma ponte desconhecida, algures. O tempo encolheu-me, e aqui estou na minha solidão. Alguns dias são melhores do que outros; a minha água flui e depois seca. Ter-me-ia ajudado ter alguma companhia, ter junto de mim a minha amiga. Mas na verdade não sei quando voltarei a vê-la. [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Como funciona o lado obscuro da internet

Originalmente desenvolvida pelo governo dos EUA, a darknet é hoje um paraíso para atividades ilegais, como pornografia e venda de drogas. Órgãos de segurança tentam invadir e desmantelar misterioso mercado negro online. Foi na darknet que um grupo de hackers que se autodenomina “Impact Team” publicou recentemente dados de 37 milhões de integrantes dos sites de encontros Ashley Madison e Established Men. Se você está curioso para ver se conhece algum dos nomes na lista, não pense que será tão fácil assim. A darknet é inacessível para a maioria dos usuários da internet, e uma busca no Google não vai encontrá-la, porque a ferramenta de busca não indexa sites da darknet. Geralmente, transações “obscuras” tendem a acontecer nessa rede, envolvendo venda online de drogas, pornografia infantil, informações sobre cartões de crédito e armas, por exemplo. Originalmente desenvolvida pelo governo dos EUA, a darknet também serve hoje de plataforma para lavagem de dinheiro e compra e venda de outros bens e atividades ilegais com relativa impunidade. Anônima e descentralizada Se a internet em geral é uma “superestrada de informação”, a darknet é uma pequena rua que não aparece no GPS. A busca do Google não é capaz de acessar informações da darknet, porque essas são escritas em linguagem diferente da usada na World Wide Web. Para acessar a darknet, você precisa de uma unidade diferente de GPS – neste caso, um browser chamado Tor. Ele é gratuito e tão fácil de instalar quanto o Firefox ou qualquer outro navegador, mas funciona de maneira diferente. O Tor faz com que suas informações “pulem” diversas vezes pelo mundo antes do seu alvo as receber, o que faz com que seja praticamente impossível rastrear quem as enviou. No Facebook, por exemplo, o servidor da companhia envia dados diretamente para o seu computador quando você clica na foto nova de um amigo. Na darknet, essa informação seria fragmentada e espalhada pelo mundo, enviada e reenviada várias vezes, até chegar ao seu computador como pacotes de dados, individuais e anônimos, cuja origem não é clara. Compilados, os pacotes criariam um todo – a foto, nesse caso. Esse processo de distribuição de dados faz com que a darknet opere de maneira mais lenta que a tradicional World Wide Web. Combate em sigilo Quando o FBI, o Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos e a Europol conduziram a operação Onymous, em novembro de 2014, eles tiraram do ar 27 sites da darknet. O mais conhecido era o Silk Road 2.0, cujo operador foi preso. A forma com a qual a Onymous foi conduzida continua desconhecida. Numa entrevista concedida a revista Wired, o chefe da Europol, Troels Oerting, disse que os agentes preferiam manter a metodologia em segredo. “Não podemos compartilhar com todo mundo a forma como fizemos isso, porque queremos fazê-lo de novo, de novo e de novo.” Desde então, a darknet tem estado relativamente tranquila, mas não foi desativada. Não é aconselhável visitar sites da darknet, pois, além da ilegalidade de muitos produtos oferecidos, não é possível verificar que informações do usuário serão recolhidas ou roubadas durante a visita. Páginas da darknet podem ser reconhecidas pela terminação “.onion” – uma referência à estrutura cheia de camadas da cebola (onion, em inglês). Usuários do Tor costumam ir diretamente para os sites, usando seus endereços, exatamente como na internet. Bitcoin é a moeda comum, trocada de forma anônima, mas que pode ser convertida em dinheiro real uma vez acessada a conta de Bitcoin de um indivíduo. Para chegar a criminosos que utilizam a darknet, policiais, autoridades federais, agentes secretos e redes internacionais de combate ao crime usam algumas táticas surpreendentemente antigas. Uma delas é a aquisição de algum produto ilegal disponível no mercado da rede e analisar o pacote e seu conteúdo quando chegar pelo correio. Assim, a polícia pode apurar pistas sobre a origem da encomenda. Outra tática é fazer contato com os proprietários dos sites e solicitar um encontro real para trocar informações e bens. Liberdade de expressão Existe, entretanto, o lado bom da darknet: a liberdade de expressão. A rede permite que os usuários se comuniquem de forma anônima, exigindo que os governos tenham que adotar esforços extremos para tentar localizá-los e identificá-los. Para usuários que vivem em regimes opressores, que monitoram ativamente, bloqueiam conteúdo na internet ou adotam ações punitivas contra dissidentes, a darknet oferece maneiras alternativas de se expressar livremente. Vale o mesmo para whistleblowers. A darknet é um lugar seguro para publicar informações de crucial importância para a opinião pública, mas que pode colocar a pessoa responsável pelo seu vazamento em perigo. A darknet tem, portanto, seu lado mau e, ocasionalmente, um lado bom. Se ao invés de publicarem nomes de usuários, os hackers do caso Ashley Madison tivessem feito vazamentos de emails provando corrupção em governos, a opinião do público sobre os sites anônimos poderia ser agora bem diferente. Com informações da DW

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A vida como não deveria ser

Esta foto mostra o sírio Laith Majid, com sua filha no colo, ao desembarcar de um bote de borracha usado para atravessar da Turquia para a ilha grega de Kos. O bote estava defeituoso e esvaziava constantemente sob risco de naufragar. A expressão de alívio do pai não passou despercebida. ‘A dor de todo um país refletida no rosto de um pai’, foi a mensagem que @MaryFitzger postou em sua conta de Twitter após a imagem ter sido publicada pelo ‘The New York Times‘. [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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Mundo tem três trilhões de árvores e perde 10 bilhões por ano, diz estudo

O estudo de Yale diz que há 420 árvores para cada habitante do planeta Um estudo da Universidade de Yale, publicado pela revista científica Nature, calcula que o número de árvores no mundo passa de três trilhões. Isso significa que há 420 árvores para cada habitante do planeta. Trata-se de um total que supera em oito vezes a medição anterior, de 400 bilhões de espécimes. Image copyright PA Coníferas A nova contagem foi coordenada pela equipe de Thomas Crowther, usando desde análises topográficas a análises de fotos de satélite. Este cálculo mais “refinado” servirá de base para uma gama de pesquisas, estudos sobre biodiversidade a modelos de mudanças climáticas – isso porque árvores têm papel fundamental na remoção do dióxido de carbono da atmosfera. Leia mais: 1% das árvores da Amazônia ‘captura metade do carbono da região’ “Não se trata de boas ou má notícias que chegamos a esse número. Estamos simplesmente descrevendo o estado do sistema global florestal em números que as pessoas entendam e que cientistas e responsáveis por políticas ambientais possam usar”. Pelo menos 40% das árvores do mundo estão em florestas tropicais e sub-tropicais. Image copyrightPA Apesar do uso de alta tecnologia, um ponto crucial do estudo de Yale foi o uso de medições locais. O time de Crowther coletou dados sobre densidade arbórea em mais de 400 mil áreas florestais ao redor do mundo. Isso ajudou a compensar as limitações das análises por satélite, cujas fotos são boas para mostrar as extensões de florestas, mas que não são muito úteis para revelar números individuais de espécimes. Dos três trilhões de árvores do mundo, os cientistas estimam que 1,39 trilhão esteja em regiões tropicais, como a Amazônia, ou subtropicais. Cerca de 0,61 trilhão estariam em locais de clima temperado e 0,74 trilhão nas florestas boreais – os imensos grupos de coníferas que circulam o globo logo abaixo do Polo Norte. Leia mais: Cabras são usadas para reciclar árvores de Natal na Inglaterra E é justamente nessas regiões em que foram encontradas as maiores densidades florestais. Efeito humano Mas o que ficou evidente durante o estudo foi a dimensão da influência humana sobre o número de árvores no planeta. A equipe de Yale estima que, enquanto 15 bilhões de árvores são removidas por ano, apenas cinco bilhões são plantadas. Os pesquisadores calculam que pelo menos 15 bilhões de árvores são removidas anualmente no mundo. Image copyright AFP “Estamos falando de 0,3% de perda global anual”, explica um dos coautores do estudo, Henry Glick. Leia: Cidade inglesa vai plantar ‘árvore solar’ “Não é uma quantia insignificante e deveria levar a uma reflexão sobre o papel do desflorestamento nas mudanças em ecossistemas. Sem falar que essas perdas de árvores estão ligadas à exploração madeireira e à atividade agrícola. Com o crescimento da população mundial poderemos ver essas perdas aumentarem”. Glick exemplifica essa ameaça com a estimativa de que, desde a última Era do Gelo, há 11 mil anos, o homem pode ter removido mais de três trilhões de árvores. “A Europa antigamente era coberta por uma floresta gigante e agora é praticamente campos e pastos. O homem controla as densidades arbóreas”, afirma Thomas Crowther.

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Brasil acolhe mais sírios que países na rota europeia de refugiados

Desde o início da crise na Síria, o Brasil vem concedendo asilo a mais refugiados sírios do que os principais portos de destino de refugiados na Europa. Segundo dados do Conare, 2.077 sírios receberam asilo do governo brasileiro de 2011 até agosto deste ano. Segundo dados do Conare (Comitê Nacional para os Refugiados), órgão ligado ao Ministério da Justiça, 2.077 sírios receberam asilo do governo brasileiro de 2011 até agosto deste ano. Trata-se da nacionalidade com mais refugiados reconhecidos no Brasil, à frente da angolana e da congolesa. O número é superior ao dos Estados Unidos (1.243) e ao de países no sul da Europa que recebem grandes quantidades de imigrantes ilegais ─ não apenas sírios, mas também de todo o Oriente Médio e da África ─ que atravessaram o Mediterrâneo em busca de refúgio, como Grécia (1.275), Espanha (1.335), Itália (1.005) e Portugal (15). Os dados da Eurostat, a agência de estatísticas da União Europeia, referem-se ao total de sírios que receberam asilo, e não aos que solicitaram refúgio. Nas últimas semanas, a crise humanitária na Síria voltou a ganhar projeção na imprensa internacional, com levas de refugiados abandonando o país em direção, principalmente, à Europa. A imagem de um menino sírio morto em uma praia da Turquia virou símbolo da tragédia.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Apesar da distância ─ 10 mil quilômetros separam Brasil e Síria, o governo brasileiro vem mantendo uma política diferente da de muitos países europeus em relação a refugiados sírios. Solicitações de refúgio concedidas* Brasil – 2.077 Argentina** – 233 Uruguai -117 Chile – 1.220 EUA – 1.243 Canadá – 2.374 Reino Unido – 4.035 Grécia*** – 1.275 Espanha*** – 1.335 Itália – 1.005 Portugal*** – 15 Noruega – 2.995 França – 4.975 Bélgica – 5.430 Suécia – 39.325 Alemanha – 65.075 *Estimativas até o 2º trimestre de 2015 **Estimativas até 2014 ***Estimativas até o 1º trimestre de 2015 Há cerca de dois anos, o Conare publicou uma normativa facilitando a concessão de vistos a imigrantes daquele país. Desde então, muitos sírios daquele país vem escolhendo o Brasil como destino para fugir de guerras, perseguições e pobreza. Segundo fontes ouvidas pela BBC Brasil no Ministério das Relações Exteriores, o número de vistos concedidos por mês a cidadãos sírios é hoje quatro vezes maior do que antes do início da crise, em 2011. Naquele ano, grupos rebeldes tentaram tomar o poder no país e entraram em confronto com forças de segurança do presidente da Síria, Bashar al-Assad. Atualmente, a emissão do documento está concentrada principalmente nas embaixadas brasileiras em Beirute (Líbano), Amã (Jordânia) e Istambul (Turquia). A representação diplomática em Damasco (Síria) foi fechada em 2012 por motivos de segurança. “Antigamente, emitíamos 20 vistos por mês. Hoje são 20 por semana. Mas já emitimos mais”, afirmou à BBC Brasil um diplomata que não quis se identificar. “São pessoas com todos os perfis socioeconômicos. Há desde camponeses a engenheiros e advogados, muitos deles com pós-graduação. Em comum, todos estão fugindo de um país imerso em uma espiral de violência”, acrescentou. Comparação Síria vive crise humanitária sem precedentes O Brasil também é o país que mais concedeu asilo a refugiados sírios na América Latina. No continente americano, só perde para o Canadá ─ que recebeu 2.374 refugiados entre janeiro de 2014 e janeiro deste ano. Especificamente na comparação com os vizinhos sul-americanos, contudo, o número de solicitações concedidas pelo governo brasileiro é consideravelmente superior. Desde 2011, por exemplo, a Argentina concedeu refúgio a apenas 233 sírios. Já o Uruguai, a 117. O Chile, por sua vez, recebeu 1.220 imigrantes. Na outra ponta, contudo, o Brasil recebeu menos do que Alemanha (65.075), Suécia (39.325), Noruega (2.995), Bélgica (5.430), França (4.975) e Reino Unido (4.035), segundo dados da Eurostat. Nesta sexta-feira, em resposta à pressão doméstica e internacional, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, afirmou que o Reino Unido vai oferecer asilo a “milhares de refugiados sírios” devido à piora da crise humanitária. Ele não divulgou estimativas, mas a Acnur (agência de refugiados da ONU) informou que o número poderia chegar a 4 mil. Facilidade Em entrevista à BBC Brasil, o representante da Acnur (Agência da ONU para Refugiados), Andrés Ramirez, elogiou a iniciativa do governo brasileiro, que classificou como uma “importante mensagem humanitária e de direitos humanos”. “O Brasil tem mantido uma política de portas abertas para os refugiados sírios. O número ainda é baixo, em muito devido à localização geográfica. Mas sem dúvida se trata de um exemplo a ser seguido a nível mundial”, afirmou ele. Ramirez lembrou que no Brasil, diferentemente de outros países, enquanto espera pela concessão do asilo, o refugiado pode trabalhar e ter acesso à saúde e à educação. Ele criticou, entretanto, a demora no processamento de pedidos. Segundo ele, o Conare vem tendo dificuldades para atender à demanda crescente das solicitações de asilo. “Temos realizado conversas com o governo no sentido de modernizar a estrutura do órgão, face à nova realidade. Houve um aumento substancial no número de pedidos de asilo no mundo. Com o Brasil não foi diferente. É necessário agilizar a dinâmica do Conare, mas sem perder de vista a qualidade. Isso significa desde aumentar o número de funcionários a melhorar a organização interna”, explicou. “Outro desafio é integrar esse refugiado à sociedade brasileira, tanto social quanto economica e culturalmente”, acrescentou. Crise sem precedentes Travessia no Mediterrâneo pode custar mais de R$ 10 por pessoa O mundo enfrenta a pior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial, segundo organizações como a Anistia Internacional e a Comissão Europeia. Desde janeiro deste ano, mais de 350 mil imigrantes atravessaram o Mediterrâneo. Desse total, estima-se que 2.643 tenham morrido no mar enquanto tentavam chegar à Europa, de acordo com a OIM (Organização Internacional para as Migrações). O número supera com folga o total de 2014, quando 219 mil migrantes tentaram realizar a travessia, normalmente feita em botes ou em embarcações superlotadas, sem os mínimos requisitos de segurança, por traficantes de pessoas. A viagem pode custar mais de R$ 10 mil por

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Novo capitalismo dissolve cooperação, desurbaniza cidades e expulsa pessoas

Marco Weissheimer – Richard Sennett e Saskia Sassen foram os debatedores do Fronteiras do Pensamento, no Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Quando eclodiu a crise financeira de 2007-2008, o sociólogo Richard Sennett acreditou que as pessoas iriam se rebelar contra as atitudes e o funcionamento do sistema financeiro internacional, responsável por rombos e falências cujas repercussões ainda estão presentes na economia mundial. Mas as pessoas não se comportaram da maneira que supôs que iria acontecer. O que teria acontecido? O professor da Universidade de Nova York e da London School of Economics iniciou sua participação no Fronteiras do Pensamento, expondo essa expectativa frustrada e a perplexidade que se seguiu a ela. “Fiquei intrigado com a crise de 2007-2008. Por que as pessoas não estavam se rebelando contra ela?” – assinalou. As reflexões de Sennet apontaram dois motivos centrais para que isso acontecesse. Em parte, afirmou, as pessoas não se rebelaram porque deixaram de acreditar na ação cooperativa e colaborativa. Uma das evidências desse fenômeno foi a redução da participação de trabalhadores em sindicatos.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] “A nova economia, neoliberal, enfatiza muito a autonomia e não a colaboração. As pessoas não ficam no mesmo emprego por muito tempo, não desenvolvem laços mais permanentes e não se associam com outras pessoas”, observou Sennett. Havia, portanto, razões ligadas à estrutura de funcionamento da economia para explicar a baixa participação. A corrosão do caráter e da colaboração Em parte, esse diagnóstico já está presente em seu livro “A Corrosão do Caráter: Consequências pessoais do trabalho no novo capitalismo” (1998, publicado no Brasil pela Record), onde Sennett argumenta que o ambiente de trabalho dessa nova economia, com ênfase na flexibilidade e no curto prazo, inviabiliza a experiência e narrativas coerentes sobre a própria vida por parte dos trabalhadores, o que, por sua vez, impediria a formação do caráter. No novo capitalismo, não haveria lugar para coisas antiquadas como lealdade, confiança, comprometimento e ajuda mútua. De 1998 para 2015, muita coisa aconteceu, mas a julgar pela reflexão que Sennett fez nesta segunda-feira em Porto Alegre sobre a possibilidade das cidades seguirem sendo espaços para se “viver juntos”, o déficit desses valores e princípios só se agravou. Um indicativo desse agravamento apareceu no segundo motivo apresentado pelo autor para tentar entender a não revolta das pessoas diante da crise provocada pelo sistema financeiro altamente desregulamentado. Sennett pesquisa há algum tempo a vida em comunidades carentes de cidades como Nova York e Paris. Na década de 80, relatou, estudou uma comunidade deste tipo na capital francesa e constatou que havia muito espírito de colaboração e cooperação entre seus moradores. “Hoje”, constatou preocupado, “isso também está desaparecendo”. “As pessoas passaram a viver em compartimentos, sem esse espírito de colaboração. Não sou sociólogo político, meu foco sempre foi a vida social dos indivíduos, mas o que me chama a atenção é que a ideia de interdependência está desaparecendo. A ideia de que preciso do outro para viver, de que é importante fazer parte de um grupo, tudo isso está desaparecendo”, afirmou. A ausência de destino compartilhado “Algo está errado com a nossa sociedade”, acrescentou Sennett, “com o modo como estamos tratando a questão da cooperação. O novo capitalismo está dissolvendo esses laços”. Ou, como o autor em seu livro de 1998: “Esse é o problema do caráter no capitalismo moderno. Há história, mas não narrativa partilhada de dificuldades, e portanto tampouco destino compartilhado. Nestas condições, o caráter se corrói e a pergunta “Quem precisa de mim?” não tem mais resposta imediata. Sennett não apresentou nenhuma receita pronta para lidar com essa situação, mas apontou um caminho que considera necessário para a recuperação da experiência do convívio com o outro: a cooperação dialógica, termo tomado do linguista russo Mikhail Bakhtin, que reivindica um tratamento participativo, diverso e múltiplo na linguagem. Contra a dissolução da interdependência e a corrosão da cooperação, Sennett defendeu a importância de nos tornarmos bons ouvintes, sensíveis à fala, mas também aos silêncios e gestos do outro, de estarmos abertos às ambiguidades e às diferenças. A cooperação envolve a capacidade de negociação entre essas distâncias e diferenças, defendeu. O autor não detalhou como essa postura comunicacional dialógica poderia enfrentar os mecanismos de dissolução da interdependência alimentados diariamente pelo novo capitalismo. Uma marca da globalização: expulsar pessoas Richard Sennett dividiu o palco do Salão de Atos da UFRGS com sua esposa, a socióloga holandesa Saskia Sassen, uma estudiosa dos impactos da globalização e das novas tecnologias na vida das cidades e também dos processos de migração urbana que ocorrem neste contexto. Para Saskia Sassen, as nossas cidades vivem uma crise derivada, entre outros fatores, do processo de concentração de renda ocorrido no mundo nas últimas três décadas. Ao longo dos últimos trinta anos, defende, “houve perda de renda de metade da população mundial e tamanha concentração no topo que simplesmente chegamos ao limite. É a explosão disso que estamos vendo agora nas nossas cidades”. Em sua obra, Sassen defende que a globalização permitiu às grandes corporações terem uma geografia global da produção e da exploração, maximizando as possibilidades da velha lógica de obtenção do lucro, com práticas como a da terceirização e da redução dos custos do trabalho. Uma das marcas características desse modelo, que se reflete na vida das cidades, defende a socióloga holandesa, é expulsar pessoas. Essas práticas de expulsão ocorrem de maneiras variadas: desemprego, expulsão de pequenos agricultores para as periferias cidades, expulsão dentro das cidades por mega-projetos imobiliários. Neste contexto, defende Saskia Sassen, as cidades têm que ser vistas como algo diferente de uma área geográfica preenchida por grandes construções. Fileiras de grandes prédios comerciais, estacionamentos e shoppings centers não fazem de uma região uma cidade. “Isso não é uma cidade, é apenas um terreno densamente construído”. Contra esses aglomerados de densas construções, a socióloga cita o caso de Londres que tem mais de três de dezenas de pequenos centros no seu espaço urbano. Os megaprojetos que desurbanizam as cidades Para Sassen, a existência dessas pequenas

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