O governo de Riad perde com a queda de preços, mas celebra instabilidade no Irã e teste à nova indústria petrolífera norte-americana Salman bin Abdulaziz Al-Saud, o príncipe-herdeiro do trono saudita, em evento na terça-feira 6. A família real depende do petróleo, mas por enquanto está disposta a encarar a queda. Na terça-feira 6, o preço do petróleo nos mercados de Londres e Nova York, referências para o resto do mundo, ficou abaixo dos 52 dólares, menor valor desde 2009. A brusca queda recente, de 55% desde a metade de 2014, é resultado de uma oferta elevada, marcada por picos de produção na Rússia, no Iraque e nos Estados Unidos, e demanda comprimida pela lentidão das economias de China, Japão e países europeus. O cenário deveria provocar preocupação na Arábia Saudita, maior exportadora e dona da maior capacidade de produção de petróleo do mundo, mas a monarquia se mostra tranquila. A queda de preços é ruim para o governo saudita, mas pior para seu maior inimigo, o Irã, e serve para testar a força da crescente produção norte-americana, que causa apreensão em Riad por minimizar a dependência que Washington tem do petróleo saudita. Em 21 de dezembro, em reunião da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) na Áustria, a Arábia Saudita revelou sua serenidade com o tombo do preço do petróleo. Sem conseguir um acordo com países de fora do cartel, como a Rússia e o México, a Opep decidiu não reduzir suas metas de produção, o que faria a cotação do barril crescer. A opção pela regulação do preço a partir da lógica do mercado foi um afastamento da tradição da Opep, comandada pelos sauditas. Ao longo das últimas quatro décadas, o cartel petrolífero tirou e injetou barris no mercado sempre que os preços escaparam aos limites desejados, para cima ou para baixo. Desta vez, sem a mesma capacidade de influenciar o mercado, os sauditas aceitaram pagar para ver até onde a queda vai. O governo de Riad nega estar conspirando para prejudicar determinadas nações, mas parece óbvio que a família real observa o resultado de sua aposta com a expectativa de obter dividendos políticos.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Não há dúvidas de que o petróleo em baixa prejudica a Arábia Saudita. A economia do país é pouco diversificada e muito dependente do setor petrolífero, responsável por 85% das exportações e 50% do PIB. Entre 2014 e 2015, a receita do petróleo deve cair 88%, sendo responsável por um déficit de 39 bilhões de dólares no orçamento saudita, o maior da história, o que acarretará cortes de gastos públicos e, possivelmente, alguma instabilidade política. Ainda assim, a Arábia Saudita pode suportar o baque – além de reservas monetárias de 750 bilhões de dólares, o País tem o menor custo de produção de petróleo no mundo, de cerca de cinco dólares por barril. Se cortasse sua produção sem uma combinação prévia com países de fora da Opep e promovesse a elevação do preço do petróleo, a Arábia Saudita poderia perder cotas de mercado. Foi isso o que ocorreu nos anos 1980, quando o barril foi vendido a menos de 10 dólares e os sauditas perderam clientes ao cortar sua própria produção, enquanto outros países mantiveram-na, vendendo seu petróleo por um preço mais baixo. Em um cenário de disputa por mercado, a Arábia Saudita poderia perder espaço para aliados, como os Emirados Árabes Unidos e o Kuwait, mas também para países que vê como rivais. Um deles é a Rússia, que segue apoiando o ditador sírio Bashar al-Assad, o qual os sauditas tentam derrubar. Outro é o Irã, visto como o maior inimigo da Arábia Saudita. Além de apoiar Assad, o regime iraniano, visto como ameaça existencial, contrapõe os interesses sauditas em quase todos os pontos nevrálgicos do Oriente Médio. O Irã como alvo A queda atual do preço do petróleo atinge duramente as ambições de Teerã em um momento sensível. No próximo dia 15, negociadores iranianos vão se encontrar novamente com emissários de Alemanha, China, EUA, França, Reino Unido e Rússia para tentar chegar a um acordo sobre o programa nuclear. A Arábia Saudita jamais apoiou o diálogo com o Irã – ao contrário, o país árabe faz lobby para que os Estados Unidos resolvam a questão por meios militares, bombardeando as instalações nucleares iranianas para “cortar a cabeça da cobra”. Sem condições de direcionar a política externa dos EUA, a Arábia Saudita trabalha para desestabilizar o Irã. O ímpeto pelo acordo nuclear é comandado por Hassan Rouhani, presidente do Irã. Rouhani trava uma batalha interna com setores linha-dura, contrários ao diálogo com os EUA, e tem vendido a ideia de que a solução para os graves problemas econômicos do país é o acordo nuclear e o fim das sanções impostas por EUA e Europa. Para manter o impulso pelo diálogo, Rouhani precisa de apoio popular e este depende significativamente da situação da economia. Após um acerto provisório com as potências em novembro de 2013, algumas sanções contra o Irã foram aliviadas. Isso facilitou a recuperação econômica do país, marcada pela reversão da recessão e pelo fim da alta da inflação, mas a diminuição do lucro do petróleo provocará um duro impacto nas contas iranianas. Metade das receitas do país é oriunda do setor petrolífero, e Teerã precisaria, segundo o FMI, de um barril cotado a 136 dólares para ter um orçamento balanceado. Com o petróleo vendido perto dos 50 dólares, as dificuldades serão tremendas. Por isso, a partir de março, entrará em vigor no Irã um orçamento bastante austero, com aumento de impostos e redução de subsídios para alimentos e combustível. São medidas impopulares, que podem erodir o apoio a Rouhani e dificultar o diálogo, exatamente o que os sauditas desejam. Os EUA como alvo Além de ver o sofrimento do Irã, a Arábia Saudita espera obter um segundo dividendo político-econômico com a brusca queda do preço do petróleo: testar a resiliência da produção norte-americana do petróleo de folhelho (shale oil, em inglês), uma rocha sedimentar que é explorada por meio