Arquivo

Wislawa Szymborska – Poesia – 19/09/23

Boa noite. Alguns gostam de poesia Wisława Szymborska ¹ Alguns — quer dizer nem todos. Nem a maioria de todos, mas a minoria. Excluindo escolas, onde se deve e os próprios poetas, serão talvez dois em mil. Gostam — mas também se gosta de canja de massa, gosta-se da lisonja e da cor azul, gosta-se de um velho cachecol, gosta-se de levar a sua avante, gosta-se de fazer festas a um cão. De poesia — mas o que é a poesia? Algumas respostas vagas já foram dadas, mas eu não sei e não sei, e a isto me agarro como a um corrimão providencial. ¹ Wisława Szymborska * Kórnik, Polônia – 2 de Julho de 1923  + Cracóvia, Polônia – 1 de fevereiro de 2012 Escritora polonesa. Destacou-se como poetisa com uma obra que tem como tema as vicissitudes da Polônia moderna. Emprega uma linguagem simples e coloquial, herança do realismo social que dominou a Europa oriental, mas sua modernidade se revela no tom irônico e na complexidade formal de muitas de suas poesias. Recebeu o Nobel de Literatura de 1996.

Leia mais »

Pablo Neruda – Versos na tarde

Amor, quantos caminhos Pablo Neruda¹ Amor, quantos caminhos até chegar a um beijo, que solidão errante até tua companhia! Seguem os trens sozinhos rodando com a chuva. Em Taltal não amanhece ainda a primavera. Mas tu e eu, amor meu, estamos juntos, juntos desde a roupa as raízes, juntos de outono, de água, de quadris, até ser só tu, só eu juntos. Pensar que custou tantas pedras que leva o rio, a desembocadura da água de Boroa, pensar que separados por trens e nações tu e eu tínhamos que simplesmente amar-nos com todos confundidos, com homens e mulheres, com a terra que implanta e educa cravos. ¹Neftalí Ricardo Reyes * Parral, Chile – 12 de Julho de 1904 d.C + Santiago, Chile – 23 de Setembro de 1973 d.C Prêmio Nobel de Literatura em 1971 [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

Pablo Neruda – Versos na tarde – 07/03/2015

Se tu me esqueces Pablo Neruda ¹ Quero que saibas uma coisa. Tu já sabes o que é: se olho a lua de cristal, o ramo rubro do lento outono em minha janela, se toco junto ao fogo a implacável cinza ou o enrugado corpo da madeira, tudo me leva a ti, como se tudo o que existe aromas, luz, metais, fossem pequenos barcos que navegam para essas tuas ilhas que me aguardam. Pois ora, se pouco a pouco deixas de me amar, de te amar, pouco a pouco, deixarei. Se de repente me esqueces, não me procures, já te esqueci também. Se consideras longo e louco o vento de bandeiras que canta em minha vida e te decides a me deixar na margem do coração no qual tenho raízes, pensa que nesse dia a essa hora levantarei os braços me nascerão raízes procurando outra terra. Porém, se cada dia, cada hora, sentes que a mim estás destinada com doçura implacável. Se cada dia se ergue uma flor a teus lábios me buscando, ai, amor meu, ai minha, em mim todo esse fogo se repete, em mim nada se apaga nem se esquece, do teu amor, amada, o meu se nutre, e enquanto vivas estará em teus braços e sem sair dos meus. ¹ Neftalí Ricardo Reyes * Parral, Chile – 12 de Julho de 1904 d.C + Santiago, Chile – 23 de Setembro de 1973 d.C Prêmio Nobel de Literatura em 1971 [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

Pablo Neruda – Versos na tarde – 28/02/2015

Poema Pablo Neruda ¹ Plena mulher, maçã carnal, lua quente, espesso aroma de algas, lodo e luz pisados, que obscura claridade se abre entre tuas colunas? que antiga noite o homem toca com seus sentidos? Ai, amar é uma viagem com água e com estrelas, com ar opresso e bruscas tempestades de farinha: amar é um combate de relâmpagos e dois corpos por um só mel derrotados. Beijo a beijo percorro teu pequeno infinito, tuas margens, teus rios, teus povoados pequenos, e o fogo genital transformado em delícia corre pelos tênues caminhos do sangue até precipitar-se como um cravo noturno, até ser e não ser senão na sombra de um raio. ¹ Neftalí Ricardo Reyes * Parral, Chile – 12 de Julho de 1904 d.C + Santiago, Chile – 23 de Setembro de 1973 d.C Prêmio Nobel de Literatura em 1971 [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

Sully Prudhomme – Versos na tarde – 11/01/2015

Le Vase Brisé Sully Prudhomme ¹ O vaso, em que desmaia esta verbena, De um leque a asa lépida o feriu; E a tênue contusão foi tão pequena Que o mínimo sonido não se ouviu! No entanto, a oculta falha pequenina, Imperceptível para o humano olhar – Foi se alastrando,e silenciosa e fina, Veio todo o cristal a contornar! Filtra-se a linfa, gota a gota; e o vaso Sustêm, já, agora, um caule ressequido; Ninguém, à volta, advertiu no caso; Não lhe toques, contudo está partido! Quantas vezes a mão que é quase uma pluma Nos roça o coração, e ele a sangrar, Fundamente ferido em dor reçuma, Vendo a flor da afeição se estiolar E, assim, por fora o julga intacto a gente, Que não lhe escuta o soluçar dorido; É, na aparência, o mesmo vaso olente Não lhe toques, porém, que está partido. ¹ René Armand François Prudhomme * Paris, França – 16 de março de 1893 d.C + Châtenay-Malabry, França – 6 de setembro 1907 d.C René Armand François Prudhomme, mais conhecido como Sully Prudhomme, foi um poeta francês. Filho de Sully Prudhomme, comerciante, e de Clotilde Caillat, ingressou num instituto politécnico para estudar na área científica. No entanto, devido a uma doença oftalmológica, teve que desistir desse objectivo. Trabalhou numa fábrica, como escriturário, mas, descontente, decidiu estudar direito, em 1860. Em 1865, publica a sua primeira obra poética, Stances et Poemes. Pertence ao grupo de poetas parnasianos, responsáveis pela publicação da revista Parnasse contemporain. Foi eleito para a Academia Francesa em 1881, ocupando a cadeira 24. Foi o primeiro autor a receber o Prêmio Nobel de Literatura, no dia 10 de dezembro de 1901. [ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]

Leia mais »

Boris Pasternak – Versos na tarde – 03/12/2014

É impróprio ser famoso Boris Pasternak ¹ É impróprio ser famoso Pois não é isso que eleva. E não vale a pena ter arquivos Nem perder tempo com manuscritos velhos. O caminho da criação é a entrega total E não fazer barulho ou ter sucesso. Infelizmente, nada significa Como uma alegoria andar de boca em boca. Mas é preciso viver sem pretensões, Viver de tal modo que no fim de contas Venha até nós um amor ideal E ouçamos o apelo dos anos que hão-de vir. O que é preciso rever É o destino, não antigos papéis; Lugares e capítulos de uma vida inteira Anotar ou emendar. E mergulhar no anonimato, E ocultar nele os nossos passos, Como foge a paisagem na neblina Em plena escuridão. Que outros nesse rastro vivo Seguirão o teu caminho passo a passo, Mas tu próprio não deves distinguir A derrota da vitória. E não deves por um só instante Recuar ou trair o que tu és, Mas estar vivo, e sói vivo, E só vivo – até ao fim. Tradução de Manuel de Seabra ¹ Boris Leonidovitch Pasternak Prêmio Nobel de Literatura em 1958 * Moscou, Rússia – 10 de fevereiro de 1890 d.C + Moscou, Rússia – 31 de maio de 1960 d.C [ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]

Leia mais »

Pablo Neruda – Versos na tarde – 26/01/2013

Cantas e a sol e a céu com teu canto Pablo Neruda ¹ Cantas e a sol e a céu com teu canto tua voz debulha o cereal do dia, falam os pinheiros com sua língua verde: trinam todas as aves do inverno. O mar enche seus porões de passos, de sinos, cadeias e gemidos, tilintam metais e utensílios, chiam as rodas da caravana. Mas só tua voz escuto e sobe tua voz com vôo e precisão de flecha, desce tua voz com gravidade de chuva, tua voz esparge altíssimas espadas volta tua voz pesada de violetas e logo me acompanha pelo céu. ¹ Neftalí Ricardo Reyes * Parral, Chile – 12 de Julho de 1904 d.C + Santiago, Chile – 23 de Setembro de 1973 d.C Prêmio Nobel de Literatura em 1971 [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

Octavio Paz – Versos na tarde

Entre ir e ficar Octavio Paz ¹ Entre ir e ficar duvida o dia, enamorado de sua transparência. A tarde circular é já baía: em seu quieto vaivém se mexe o mundo. Tudo é visível e tudo é efusivo, tudo está perto e tudo é intocável. Os papéis, o livro, o copo, o lápis repousa à sombra de seus nomes. Bater do tempo que em minha têmpora repete a mesma teimosa […] ¹ Octavio Paz * Cidade do México, México – 31 de Março de 1914 d.C + Cidade do México, México – 20 de Abril de 1998 d.C Prêmio Nobel de Literatura de 1990 [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

Leia mais »

José Saramago – Reflexões na tarde

De onde saiu este homem? José Saramago Donde saiu este homem? Não peço que me digam onde nasceu, quem foram os seus pais, que estudos fez, que projeto de vida desenhou para si e para a sua família. Tudo isso mais ou menos o sabemos, tenho aí a sua autobiografia, livro sério e sincero, além de inteligentemente escrito. Quando pergunto donde saiu Barack Obama estou a manifestar a minha perplexidade por este tempo que vivemos, cínico, desesperançado, sombrio, terrível em mil dos seus aspectos, ter gerado uma pessoa (é um homem, podia ser uma mulher) que levanta a voz para falar de valores, de responsabilidade pessoal e coletiva, de respeito pelo trabalho, também pela memória daqueles que nos antecederam na vida. Estes conceitos que alguma vez foram o cimento da melhor convivência humana sofreram por muito tempo o desprezo dos poderosos, esses mesmos que, a partir de hoje (tenham-no por certo), vão vestir à pressa o novo figurino e clamar em todos os tons – “Eu também, eu também”. Barack Obama, no seu discurso, deu-nos razões (as razões) para que não nos deixemos enganar. O mundo pode ser melhor do que isto a que parecemos ter sido condenados. No fundo, o que Obama nos veio dizer é que outro mundo é possível. Muitos de nós já o vínhamos dizendo há muito. Talvez a ocasião seja boa para que tentemos pôr-nos de acordo sobre o modo e a maneira. Para começar.

Leia mais »