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Corrupção e Cultura

Punir políticos, sem mudar cultura, não transforma, diz czar anticorrupção da Itália Raffaele Cantone atuou na investigação da violenta máfia de Gomorra que resultou na prisão perpétua dos maiores líderes desse clã: Francesco Schiavone e Francesco Bidognetti Conhecido na Itália como uma espécie de czar anticorrupção, o ex-procurador Raffaele Cantone diz que a punição a políticos envolvidos em corrupção não reduz a ocorrência do crime se não vier acompanhada de uma mudança na “mentalidade” da população. Cantone atuou na investigação da violenta máfia Camorra que resultou na prisão perpétua dos maiores líderes desse clã: Francesco Schiavone e Francesco Bidognetti. O caso foi contado no famoso best-seller Gomorra, de Robero Saviano, que também virou filme. Em entrevista à BBC Brasil, o ex-procurador afirmou que, enquanto eleitores considerarem que corrupção “não é problema deles”, investigações não terão efeito transformador na sociedade. “Cito uma piada de Piercamillo Davigo (juiz italiano que atuou na Operação Mãos Limpas): ‘as investigações sobre a corrupção na Itália eliminaram os corruptos e os corruptores de menor alcance e deixaram em campo aqueles que eram realmente relevantes’”, explicou. “Se o (ambiente) cultural é o mesmo de antes, não é suficiente. É necessário alterar as regras do jogo.” Desde abril de 2014, Cantone é presidente da Autoridade Nacional Anticorrupção da Itália, órgão administrativo que supervisiona as medidas de prevenção à corrupção. Forçado a viver sob proteção policial desde 2003 por causa das ameaças de morte dos mafiosos, ele mora entre Roma e Nápoles. Cantone defende que medidas efetivas de repressão e instrumentos “invasivos” de investigação sejam acompanhados de políticas educacionais voltadas a demonstrar para a população os efeitos nocivos da corrupção. “O cidadão comum não está tão interessado na corrupção porque, no final das contas, não a considera um problema seu. (…) Se o cidadão não percebe o efeito negativo da corrupção, ele quase nunca considera a corrupção como uma real emergência”, avalia. Direito de imagemGETTY IMAGESNa Itália, ‘as investigações sobre a corrupção na Itália eliminaram os corruptos e os corruptores de menor alcance e deixaram em campo aqueles que eram realmente relevantes’ BBC Brasil – Qual é a sua leitura da politica brasileira e do Brasil, um país sujeito a frequentes casos de corrupção? Existe um sentimento comum de que os países latino-americanos sejam mais facilmente levados à corrupção? Raffaele Cantone – A América Latina tem uma grande riqueza ainda para desenvolver, mas com uma significativa falta de know-how para desenvolvê-la, provocando, assim, um enorme apetite para quem quer obter essas riquezas sem respeitar as regras. (…) Na América Latina, vejo jovens democracias, grandes recursos e um forte desenvolvimento econômico que, juntos, criaram uma mistura explosiva. Os países latinos da Europa, apesar de ter níveis mais elevados de corrupção do que a América do Norte, têm democracias mais maduras que permitem gerenciar um pouco melhor o problema. BBC Brasil – O que funciona melhor nos países com baixos índices de corrupção? Cantone – A sociedade civil. O único sistema que funciona realmente é aquele (que envolve) a sociedade civil. Por isso, reforço muito a ideia da transparência. Não se pode afirmar que as receitas utilizadas nos países do norte da Europa e América do Norte valem para todos os países. No entanto, são os exemplos de receitas que funcionaram. Direito de imagemGETTY IMAGESIntegrantes da máfia de Gomorra, em foto divulgada pela polícia italiana BBC Brasil – Você identifica três níveis de ação contra a corrupção: repressão, prevenção e educação. Poderia explicá-los brevemente? Cantone – A repressão deve ser capaz de funcionar com a trâmitação rápida dos processos até a sentença. A legislação deve estabelecer atenuantes a favor de colaboradores ou ferramentas de investigação invasivas, como o uso de escutas. O condenado deve ser excluído do setor público e, acima de tudo, não poderá mais ser empresário. Isso já teria um efeito de prevenção. A condenação de uma corrupção que não elimina o condenado do meio em que estava inserido é inútil. A prevenção, por outro lado, é exercida por mecanismos que dificultam a corrupção. Não há sistemas que impeçam a corrupção, mas sim que a tornam mais complicada. O terceiro ponto é o cultural. O cidadão não percebe o efeito negativo da corrupção. Ele quase nunca considera a corrupção como uma emergência real, porque a considera distante de seus interesses. A educação tem como função fazer emergir (essa preocupação) com a corrupção. BBC Brasil – Para muitos analistas, o Brasil, com a Lava Jato, vive uma situação semelhante à da época da Operação Mãos Limpas, na Itália. Supondo que a eliminação da classe dominante política aconteça no Brasil, seria uma solução para o fenômeno da corrupção? Cantone – Não, a experiência italiana nos diz o contrário. Cito uma piada de Piercamillo Davigo (juiz italiano que atuou na Operação Mãos Limpas): “As investigações sobre a corrupção na Itália tiveram um efeito darwiniano – simplesmente eliminaram os corruptos e os corruptores de menor alcance e deixaram em campo aqueles que eram realmente relevantes”. As investigações a respeito de casos de corrupção podem facilitar a substituição de uma classe dirigente dominante, mas não mudam a mentalidade. Se o (ambiente) cultural é o mesmo de antes, não é suficiente. É necessário alterar as regras do jogo. A experiência italiana, nesse sentido, mostrou que, embora a Mãos Limpas tenha sido uma das maiores operações do mundo contra a corrupção, depois de um tempo as pessoas perceberam que nada tinha mudado. Rafaelle Cantone argumenta que o crime de corrupção, muitas vezes, só é descoberto com mecanismos de colaboração- delação premiada- já que é difícil encontrar provas BBC Brasil – A Lava Jato aproveitou-se de muitas delações premiadas, com descontos substanciais de penas. Quais são os limites das colaborações com a Justiça? Cantone – Acredito que este seja um resultado inevitável. A redução do tempo de cadeia é o mal menor. A descoberta da corrupção só surge por meio desses mecanismos (de colaboração), porque, por sua natureza, não há conflito de interesses que possa tornar esse crime público. Isso não deve ser visto com um escândalo, e acho que é uma coisa

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Fascismo

O nada fora do Estado, nada contra o Estado, tudo a favor do Estado, continua. “É necessário além do partido único, um Estado totalitário, isto é, um Estado que absorve para transformar e fortalecer todas as energias, todos os interesses, todas as esperanças de um povo.” Benito Mussolini.      

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Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno

A Revista Samuel reproduz o texto de Umberto Eco “Ur-Fascismo”, produzido originalmente para uma conferência proferida na Universidade Columbia, em abril de 1995, numa celebração da liberação da Europa: Wikicommons – Hitler e Mussolini em Munique, em 1940 “O Fascismo Eterno” Em 1942, com a idade de dez anos, ganhei o prêmio nos Ludi Juveniles (um concurso com livre participação obrigatória para jovens fascistas italianos — o que vale dizer, para todos os jovens italianos). Tinha trabalhado com virtuosismo retórico sobre o tema: “Devemos morrer pela glória de Mussolini e pelo destino imortal da Itália?” Minha resposta foi afirmativa. Eu era um garoto esperto.  Depois, em 1943, descobri o significado da palavra “liberdade”. Contarei esta história no fim do meu discurso. Naquele momento, “liberdade” ainda não significava “liberação”. Passei dois dos meus primeiros anos entre SS, fascistas e resistentes, que disparavam uns nos outros, e aprendi a esquivar-me das balas. Não foi mal exercício. Em abril de 1945, a Resistência tomou Milão. Dois dias depois os resistentes chegaram à pequena cidade em que eu vivia. Foi um momento de alegria. A praça principal estava cheia de gente que cantava e desfraldava bandeirolas, invocando Mimo, o líder a resistência na área, em alto brado. Mimo, ex-suboficial dos carabinieri, envolveu-se com os partidários do marechal Badoglio e perdeu uma perna nos primeiros confrontos. Apareceu no balcão da Prefeitura, apoiado em muletas, pálido; tentou acalmar a multidão com uma mão. Eu estava ali esperando seu discurso, já que toda a minha infância tinha sido marcada pelos grandes discursos históricos de Mussolini, cujos passos mais significativos aprendíamos de cor na escola. Silêncio. Mimo falo com voz rouca, quase não se ouvia. Disse: “Cidadãos, amigos. Depois de tantos sacrifícios dolorosos… aqui estamos. Glória aos que caíram pela liberdade…”. E foi tudo. Ele voltou para dentro. A multidão gritava, os membros da resistência levantaram as armas e atiraram para o alto, festivamente. Nós, rapazes, nos precipitamos para recolher os cartuchos, preciosos objetos de coleção, mas eu tinha aprendido então que liberdade de palavra significa também liberdade da retórica.  Alguns dias depois vi os primeiros soldados norte-americanos. Eram afro-americanos. O primeiro ianque que encontrei era um negro, Joseph, que me apresentou às maravilhas de Dick Tracy e Ferdinando Buscapé. Seus gibis eram coloridos e tinham um cheiro bom. Um dos oficiais (o major ou capitão Muddy) era hóspede na casa da família de dois dos meus companheiros de escola. Sentia-me em casa naquele jardim em que alguns senhores amontoavam-se em torno ao capitão Muddy, falando um francês aproximativo. O capitão Muddy tinha uma boa educação superior e conhecia um pouco de francês. Assim, minha primeira imagem dos libertadores norte-americanos, depois de tantos caras-pálidas de camisa negra, era a de um negro culto em uniforme cáqui que dizia: “Oui, merci beaucoup Madame, moi aussi j’aime le champagne…” Infelizmente, faltava o champagne, mas ganhei do capitão Muddy o meu primeiro chiclete e comecei mastigando o dia inteiro. De noite colocava o chiclete em um copo d’água para que ficasse fresco para o dia seguinte.  Em maio, ouvimos dizer que a guerra tinha acabado. A paz deu-me uma sensação curiosa. Haviam me dito que a guerra permanente era a condição normal de um jovem italiano. Nos meses seguintes descobri que a Resistência não era apenas um fenômeno local, mas Europeu. Aprendi novas e excitantes palavras como “reseau”, “maquis”, “armée secrète”, “Rote Kapelle”, “gueto de Varsóvia”. Vi as primeiras fotografias do Holocausto e assim compreendi seu significado antes mesmo de conhecer a palavra. Percebi que havíamos sido liberados.  Hoje na Itália existem algumas pessoas que se perguntam se a Resistência teve algum impacto militar real no curso da guerra. Para a minha geração a questão é irrelevante: compreendo imediatamente o significado moral e psicológico da Resistência. Era motivo de orgulho saber que nós, europeus, não tínhamos esperado passivamente pela liberação. Penso que, também para os jovens norte-americanos que derramaram seu sangue pela nossa liberdade, não era irrelevante saber que atrás das linhas havia europeus que já estavam pagando seu débito.  Hoje na Itália tem gente que diz que a Resistência é um mito comunista. É verdade que os comunistas exploraram a Resistência como uma propriedade pessoal, pois realmente tiveram um papel primordial no movimento; mas lembro-me dos resistentes com bandeiras de diversas cores.  Grudado ao rádio, passava as noites — as janelas fechadas e a escuridão geral faziam do pequeno espaço em torno ao aparelho o único halo luminoso — escutando as mensagens que a Rádio Londres transmitia para a Resistência. Eram, ao mesmo tempo, obscuras e poéticas (“Ainda brilha o sol”, “As rosas hão de florir”), mas a maior parte eram “mensagens para Franchi”. Alguém soprou no meu ouvido que Franchi era o líder de um dos grupos clandestinos mais poderosos da Itália do Norte, um homem de coragem legendária. Franchi tornou-se o meu herói. Franchi (cujo verdadeiro nome era Edgardo Sogno) era um monarquista tão anticomunista que, depois da guerra, se uniu a um grupo de extrema direita e foi até acusado de ter participado de um golpe de Estado reacionário. Mas que importa? Sogno ainda é o sonho da minha infância. A liberação foi um empreendimento comum de gente das mais diversas cores.  Hoje na Itália tem gente que diz que a guerra de liberação foi um trágico período de divisão, e que precisamos agora de uma reconciliação nacional. A recordação daqueles anos terríveis deveria ser reprimida. Mas a repressão provoca neuroses. Se a reconciliação significa compaixão e respeito por todos aqueles que lutaram sua guerra de boa-fé, perdoar não significa esquecer. Posso até admitir que Eichmann acreditava sinceramente em sua missão, mas não posso dizer: “Ok, volte e faça tudo de novo”. Estamos aqui para recordar o que aconteceu e para declarar solenemente que “eles” não podem repetir o que fizeram.  Mas quem são “eles”? Se pensamos ainda nos governos totalitários que dominaram a Europa antes da Segunda Guerra Mundial, podemos dizer com tranquilidade que seria muito difícil que eles retornassem sob a mesma forma, em circunstâncias históricas diversas. Se o fascismo de Mussolini baseava-se na ideia

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Raquel Sheherazade

Na hora do “pega pra capar” todos querem os direitos constitucionais que negam aos que não lhes são servis. Assim também se dá com os que não sabem “bulhufas” sobre Direitos Humanos. Raquel Raquel Sheherazade, que endossou linchamento de negros – lembra do negro preso ao poste? – acusados de crimes, agora é vítima de linchamento moral na internet. Apoiadores de Bolsonaro não reagiram bem às críticas da jornalista sobre o inexplicável patrimônio do “nazi” e começaram a postar ameaças ao namorado de Sheherazade, Matheus Faria Carneiro. Aí, imaginem onde ela foi buscar apoio? Nos princípios Republicanos e na tradição de Direitos Humanos de respeito ao próximo, que ela tanto atacou. Aprendam! O troco sempre virá.

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PSDB – Fernando Capez – Mafia da Merenda

Contra a máfia Tucana da merenda do Governo Alckmin, haverá processo rápido? Haverá julgamento a toque de caixa?; Haverá condenação prévia na imprensa?; Haverá festa do MBL?; Haverá dancinha na Av. Paulista?; Fernando Capez, o chefe do roubo da merenda das crianças, será capa da Veja?

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Reinaldo Azevedo – Apartamento do Lula e Hospício

“Um mesmo sistema judicial reconhece que o apartamento é e não é de Lula. Hospício ou circo?”, diz Reinaldo Azevedo  “Se a sentença de Moro for confirmada pelo TRF-4, o tribunal estará dizendo que Lula é o dono não declarado do tal tríplex de Guarujá, fruto de propina, mas, segundo o juiz, não oriunda da Petrobras, embora seja isso a constar da denúncia. Ocorre que a Justiça do Distrito Federal penhorou o imóvel como um bem da OAS. Vale dizer: um mesmo sistema judicial reconhece que o apartamento é e não é de Lula. Hospício ou circo?” Reinaldo chamou atenção ainda para o utilitarismo da oposição ao PT e ao ex-presidente Lula. “A paúra da direita circense decorre do fato de que ela alimentou seus sectários com uma penca de estelionatos políticos, morais e existenciais. O antipetismo e o antilulismo se tornaram uma profissão de vigaristas. E das mais rentáveis. Se Lula vence a eleição, haverá uma horda em busca de emprego – em alguns casos, do primeiro emprego. A eventual vitória de um petista já lhes seria um desastre considerável”, completa.

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Carlos Marun

Não adianta um dos mininus da GrobuNius – aquele voz de porta, ops! porta-voz do ditador Figueiredo – agora no relés papel de porta asneiras e insultos, e esquerdinha de orelha de livro, exibir um cínico distanciamento crítico “Brechtiano” sobre o descerebrado Carlos Marun. Toma que o porco é teu.

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Venezuela: a vida num país em colapso

Inflação ultrapassou 2.500% em 2017 na Venezuela Inflação em quatro dígitos, senha para ir ao supermercado, escassez de produtos básicos, onda de violência e surtos de doenças como sarna: o cotidiano dos venezuelanos se tornou um desafio. População de Caracas sofre com preços altos e falta de mantimentos e remédios A Venezuela, país com 30 milhões de habitantes, tem as maiores reservas de petróleo do mundo, mas vem sofrendo uma maciça e severa recessão econômica desde que os preços globais da commoditty caíram drasticamente, há três anos. O governo não publica dados relativos à inflação há mais de um ano. Mas o Fundo Monetário Internacional (FMI) previu uma taxa de 2.350% para 2018; e a Assembleia Nacional estimou em mais de 2.500% a de 2017. Numa tentativa de amortecer o efeito da inflação, no fim de dezembro o governo venezuelano implementou o sexto aumento de salários e aposentadorias em um ano, elevando o salário mínimo em 40%.  Maduro lança “bitcoin venezuelano” para enfrentar crise econômica e embargos “De manhã, vê-se pessoas bem vestidas procurando restos no lixo antes de ir ao trabalho”, diz Miguel Ángel Hernandez, um estudante de mestrado de 24 anos. “Com um salário como o meu, as pessoas costumavam ser capazes de comprar carros e pagar uma parcela do financiamento da casa. Eu não consigo nem comprar um par novo de sapatos. Enfrentar essa realidade destrói as perspectivas de qualquer um”, continua. “A inflação está ‘comendo’ quase tudo”, diz um advogado de 38 anos que trabalha numa agência pública e pediu anonimato. “Hoje em dia, eu vou ao supermercado para comprar xampu, e o preço de uma unidade é quase o que eu ganho em duas semanas. Ultimamente, tem havido racionamento de açúcar. Achei um saco, na semana passada, por 105 mil bolívares. Mas eu ganho só 650 mil bolívares por mês.”  Cristina Carbonell é uma advogada que trabalha na ProVene, uma organização que oferece conselhos legais de graça. Ela confirma que a vida cotidiana na capital se tornou um desafio. “O número da nossa carteira de identidade determina em que dia da semana podemos ir ao supermercado. Mas de produtos básicos como leite, você compra apenas dois litros. Na semana passada, não tive água corrente por três dias. A escassez contínua tem causado surtos de fungos e sarna – e eu estou falando de Caracas”, indigna-se. Emergência médica No final de dezembro, houve protestos nas favelas de Caracas, desencadeados por entraves em lojas financiadas pelo Estado, onde 20 alimentos básicos ficam disponíveis a preços subsidiados. Manifestantes furiosos queimaram lixo e entoaram coros de “Estamos famintos” enquanto protestavam contra a falta de comida. A Venezuela não tem as reservas em moeda estrangeira necessárias para importar mantimentos e artigos de primeira necessidade. Várias agências de rating já classificaram o país sul-americano como parcialmente falido. Lorena Surga, fundadora do movimento de ajuda humanitária Angeles Invisibles (Anjos Invisíveis), trabalha com médicos na Colômbia que compram remédios de três hospitais venezuelanos e também doam suas amostras de medicamentos. “Aumentou a taxa de natalidade. Não há pílulas anticoncepcionais. O número de pessoas afetadas por doenças sexualmente transmitidas aumentou porque não há preservativos. Pacientes de câncer estão morrendo porque não há remédios suficientes para que eles completem os seus tratamentos. Alguns estão usando medicamentos vencidos”, afirma. A polícia foi acusada de reprimir violentamente protestos da população no país Violência policial Em maio de 2017, milhares de venezuelanos foram às ruas para protestar contra a crise humanitária e as mudanças políticas depois que o presidente Nicolás Maduro retirou poderes do Congresso dominado pela oposição. “Marchei várias vezes, e a cada dia as forças policiais eram mais repressivas”, lembra Cristina Carbonell. “Um policial atirou no meu cunhado à queima-roupa com um projétil de borracha. Eu não podia deixar o escritório para ir ajudá-lo porque a polícia estava atirando nos transeuntes”, continua. Em novembro de 2017, as ONGs Human Rights Watch (HRW) e Fórum Penal publicaram um relatório conjunto sobre as violações de direitos humanos cometidas pelas Forças Armadas venezuelanas durante os protestos de maio e os meses seguintes. Gás lacrimogêneo, jatos d’água e armas de ar comprimido foram usadas sistematicamente. As balas de borracha, em muitos casos, eram recheadas com bolas de gude, estilhaços de vidro ou parafusos metálicos para causar ferimentos e dor. “Os protestos foram reprimidos mais brutalmente que antes”, diz Tamara Taraciuk, pesquisadora sênior da HRW Americas. “Basta olhar os números: em 2014, 43 pessoas morreram em protestos e 800 ficaram feridas [na Venezuela]. Em 2017, 124 pessoas morreram e duas mil ficaram feridas”, enumera. O relatório da HRW também menciona vários casos de tortura em centros de detenção. Diz que homens mulheres e adolescentes foram submetidos a choques elétricos, espancamentos cruéis, abusos sexuais, e asfixia e detidos junto com dezenas de outras pessoas em minúsculas celas sem ventilação, tendo acesso a apenas um mínimo de água e comida. A existência de algumas pessoas se reduziu a procurar comida no lixo em Caracas Êxodo e criminalidade Alguns sociólogos estimam que dois milhões de venezuelanos já deixaram o país desde que Hugo Chávez, morto em 2013, assumiu o poder em 1999, embora sua figura seja controversa no governo Maduro. “As pessoas estão trancando suas casas e saindo com o que podem carregar”, diz Lorena Surga. A taxa de criminalidade também está aumentando, de acordo com o Observatório Venezuelano da Violência (OVV), uma organização criada pelo Laboratório Venezuelano de Estudos Sociais em 2005. O Observatório diz que 28.479 pessoas foram mortas em 2016, o que se traduz num aumento na taxa de homicídios de 91,8 por cem mil habitantes em todo o país. Em Caracas, a taxa é ainda maior, com o OVV dizendo que houve 140 homicídios por cem mil habitantes em 2016. Até mesmo o número oficial de homicídios de 2016, divulgado pela Procuradoria Geral venezuelana, embora seja muito mais baixo que o do OVV, ainda está entre os mais altos do mundo, com 70,1 por cem mil habitantes. “Sinto que estou vivendo numa prisão. Vou de casa para o trabalho para a faculdade e preciso voltar antes das oito da noite porque

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