Luís Fernando Veríssimo – Versos na tarde
Quem Sabe? Luís Fernando Veríssimo ¹ Diz a mecânica quântica que as partículas atômicas se comportam de um jeito quando são observadas e de outro quando estão sós (como, aliás, todos nós). E quem nos assegura que o Universo que está aí não é como aí está quando ninguém está olhando? E que quando os astrônomos se viram do telescópio para a prancheta o Universo não faz uma careta? O corpo e a mente têm biografias separadas, cada um sua memória própria, seu próprio jogo de charadas, Meu corpo tem lembranças – cheiros, tiques, andanças – que a mente não registrou e o corpo não tem as marcas de metade do que a mente passou (Pior que uma mente insana num corpo sem muito assunto é um corpo que já foi ao Nirvana sem que a mente tenha ido junto.) Cada um tem um passado do qual o outro não tem pista (como um bilhete amassado) e nem o Mahabharata explica uma mente anarquista num corpo socialdemocrata. Compartilham bioplasmas e o gosto por certas atrizes, mas não tem os mesmos fantasmas nem as mesmas cicatrizes. Das duas, uma, gente: ou toda mente é de outro corpo – ou todo corpo mente. Do livro “Poesia numa hora dessas?” 2002, Editora Objetiva 1 Luis Fernando Veríssimo * Porto Alegre, 26 de setembro de 1936 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]