Arquivo

Maria Teresa Horta – Poesia – 28/12/23

Boa noite. Os silêncios da fala Maria Teresa Horta¹ São tantos os silêncios da fala De sede De saliva De suor Silêncios de silex no corpo do silêncio Silêncios de vento de mar e de torpor De amor Depois, há as jarras com rosas de silêncio Os gemidos nas camas As ancas O sabor O silêncio que posto em cima do silêncio usurpa do silêncio o seu magro labor. ¹ Maria Teresa Mascarenhas Horta * Lisboa, Portugal – 20 de Maio de 1937

Leia mais »

Demócrito Rocha – Poesia – 26/12/23

Boa noite O Rio Jaguaribe Demócrito Rocha¹ O Rio Jaguaribe é uma artéria aberta por onde escorre e se perde o sangue do Ceará. O mar não se tinge de vermelho porque o sangue do Ceará é azul … Todo plasma toda essa hemoglobina na sístole dos invernos vai perder-se no mar. Há milênios… desde que se rompeu a túnica das rochas na explosão dos cataclismos ou na erosão secular do calcário do gnaisse do quartzo da sílica natural … E a ruptura dos aneurismas dos açudes… Quanto tempo perdido! E o pobre doente – o Ceará – anemiado, esquelético, pedinte e desnutrido – a vasta rede capilar a queimar-se na soalheira – é o gigante com a artéria aberta resistindo e morrendo morrendo e resistindo… (Foi a espada de um Deus que te feriu a carótida a ti – Fênix do Brasil.) E o teu cérebro ainda pensa e o teu coração ainda pulsa e o teu pulmão ainda respira e o teu braço ainda constrói e o teu pé ainda emigra e ainda povoa. As células mirradas do Ceará quando o céu lhe dá a injeção de soro dos aguaceiros – as células mirradas do Ceará intumescem o protoplasma (como os seus capulhos de algodão) e nucleiam-se de verde – é a cromatina dos roçados no sertão… (Ah, se ele alcançasse um coágulo de rocha!) E o sangue a correr pela artéria do rio Jaguaribe… o sangue a correr mal que é chegado aos ventrículos das nascentes … o sangue a correr e ninguém o estanca… Homens da pátria – ouvi: – Salvai o Ceará! Quem é o presidente da República? Depressa uma pinça hemostática em Orós! Homens – o Ceará está morrendo, está esvaindo-se em sangue … Ninguém o escuta, ninguém o escuta e o gigante dobra a cabeça sobre o peito enorme, e o gigante curva os joelhos no pó da terra calcinada, e – nos últimos arrancos – vai morrendo e resistindo ¹Demócrito Rocha * Caravelas, BA – 14 de Abril de 1888 d.C + Fortaleza, CE – 29 de Novembro de 1943 d.C

Leia mais »

Braulio Bessa – Poesia – 24/12/23

Boa noite Poema de Natal Bráulio Bessa Que você nesse momento faça uma reflexão Independente de crença, fé, religião. Pratique o bem sem parar, pois não existe orar se não existe ação. Alimente um faminto que vive no meio da rua. Agasalhe um indigente coberto só pela lua… …Perdoe quem lhe feriu. Se esforce para reerguer um amigo que caiu. E tente dar esperança para alguém que desistiu. Convença quem está triste, que vale a pena sorrir. Aconselhe quem parou que ainda da para seguir. E pra aquele que errou, dá tempo de corrigir. Faça o bem por qualquer um, sem perguntar o porquê. Que você possa ser bom começando de janeiro e que esse sentimento seja firme e verdadeiro.

Leia mais »

Carla Marques – Poesia – 23/12/23

Boa noite. Espero-te aqui Carla Marques Espero-te aqui, onde a tua ausência mais me dói… Vim aqui dizer que me faltas… Que sem ti os meus dias são incompletos, que espero por ti porque sei que sou tua. E te esperar parece ser a única salvação possível para o meu coração. Entre a chuva que cai no outono e as flores que nascem na primavera. Eu sei que me faltas e só posso desejar te ver chegar. Por isso eu espero que uma qualquer estação do ano te traga para mim.

Leia mais »

José Mesquita – Poesia – 20/12/23

Boa noite Poema CXXX José Mesquita¹ A tarde cai. Anoitece. E que os sonhos se ergam. Brilhem os olhos Mais que as luzes. As paixões e o silêncio Somente a mim pertencem E ardem como o mormaço Que tua pele deixou na minha. Do livro inédito “O Ofício da Paixão” ¹José Leite Mesquita *Fortaleza, Ce. – 15 de março de 1948

Leia mais »

Pedro Mexia – Poesia – 19/12/23

Boa noite Eu amo Pedro Mexia¹ Eu amo o teu gravador de chamadas. Ele não me abandona e repete vezes sem conta a tua voz. ¹Pedro de Magalhães Mexia Bigotte *Lisboa, Portugal – 5 de dezembro de 1972

Leia mais »

Affonso Romano de Sant’Anna – Poesia – 18/12/23

Boa noite Leitura natural Affonso Romano de Sant’Anna¹ Tendo lido os jornais — infectado a mente, enauseado os olhos — descubro, lá fora, o azul do mar e o verde repousante que começa nas samambaias da sala e recrudesce nas montanhas. Para que perco tantas horas do dia nessas leituras necessárias e escarninhas? Mais valeria, talvez, nas verdes folhas, ler o que a vida anuncia. Mas vivo numa época informada e pervertida. Leio a vida que me imprimem e só depois o verde texto que me exprime. in Epitáfio para o Século XX e Outros Poemas ¹ Affonso Romano de Sant’Anna * Belo Horizonte, MG. – 27 de Março de 1937

Leia mais »

Thiago de Melo – Poesia – 16/12/23

Boa noite A fruta aberta Thiago de Melo ¹ Agora sei quem sou. Sou pouco, mas sei muito, porque sei o poder imenso que morava comigo, mas adormecido como um peixe grande no fundo escuro e silencioso do rio e que hoje é como uma árvore plantada bem alta no meio da minha vida. Agora sei as coisas como são. Sei porque a água escorre meiga e porque acalanto é o seu ruído na noite estrelada que se deita no chão da nova casa. Agora sei as coisas poderosas que valem dentro de um homem. Aprendi contigo, amada. Aprendi com a tua beleza, com a macia beleza de tuas mãos, teus longos dedos de pétalas de prata, a ternura oceânica do teu olhar, verde de todas as cores e sem nenhum horizonte; com a tua pele fresca e enluarada, a tua infância permanente, tua sabedoria fabulária brilhando distraída no teu rosto. Grandes coisas simples aprendi contigo, com o teu parentesco com os mitos mais terrestres, com as espigas douradas no vento, com as chuvas de verão e com as linhas da minha mão. Contigo aprendi que o amor reparte mas sobretudo acrescenta, e a cada instante mais aprendo com o teu jeito de andar pela cidade como se caminhasses de mãos dadas com o ar, com o teu gosto de erva molhada, com a luz dos teus dentes, tuas delicadezas secretas, a alegria do teu amor maravilhado, e com a tua voz radiosa que sai da tua boca inesperada como um arco-íris partindo ao meio e unindo os extremos da vida, e mostrando a verdade como uma fruta aberta.

Leia mais »

Sylvia Plath – Poesia – 13/12/23

Boa noite Canção de Amor da Jovem Louca Sylvia Plath¹ Cerro os olhos e cai morto o mundo inteiro Ergo as pálpebras e tudo volta a renascer (Acho que te criei no interior da minha mente) Saem valsando as estrelas, vermelhas e azuis, Entra a galope a arbitrária escuridão: Cerro os olhos e cai morto o mundo inteiro. Enfeitiçaste-me, em sonhos, para a cama, Cantaste-me para a loucura; beijaste-me para a insanidade. (Acho que te criei no interior de minha mente) Tomba Deus das alturas; abranda-se o fogo do inferno: Retiram-se os serafins e os homens de Satã: Cerro os olhos e cai morto o mundo inteiro. Imaginei que voltarias como prometeste Envelheço, porém, e esqueço-me do teu nome. (Acho que te criei no interior de minha mente) Deveria, em teu lugar, ter amado um falcão Pelo menos, com a primavera, retornam com estrondo Cerro os olhos e cai morto o mundo inteiro: (Acho que te criei no interior de minha mente.) Tradução de Maria Luíza Nogueira ¹Sylvia Plath * Jamaica Plain, Massachusetts – 27 de outubro de 1932 + Primrose Hill, Londres – 11 de fevereiro de 1963

Leia mais »

Walter Benjamin – Poesia – 12/12/23

Boa noite. Como é que a Solidão Hei-de Ir Medindo? Walter Benjamin ¹ Como é que a solidão hei-de ir medindo? desse-me os golpes de uso inda esta dor um a um sua nudez a sobrepor que o ritmo sem nome a foi vestindo mas sofro agora o tempo nu saindo numa levada sem nenhum teor gasto caudal do meu rio interior nem chora o peito por mais gritos vindo Quando é que é novo ano na amargura quando volto a chegar-me à desventura que me faz falta em ocos dias vis. ah quando é que arde escura em cores febris à testa do ano como a vi na altura do agosto em chamas funda cicatriz? Walter Benjamin, in “Sonetos” Tradução de Vasco Graça Moura ¹ Walter Benedix Schönflies Benjamin + Berlim, Alemanha – 15 de julho de 1892 + Portbou, Espanha – 27 de setembro de 1940

Leia mais »