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Kadafi, Fujimori, Lula e FHC

Couro espesso blog do Alon ¹ Sempre haverá explicações para a necessidade de relacionar-se com ditaduras e ditadores, mas uma diplomacia de viés presidencial aumenta muito o risco de queimar capital político É hora de revanche. Tucanos ouviram incomodados, durante anos, chacotas petistas sobre as boas relações entre Fernando Henrique Cardoso e Alberto Fujimori. Agora, tripudiam sobre o histórico de boas relações entre Luiz Inácio Lula da Silva e Muamar Gadafi. É do jogo. Uma rápida troca de mensagens ontem no twitter trouxe elementos a esta coluna. O presidente do PT, José Eduardo Dutra (um político que entendeu as tais redes sociais) argumentou que Fujimori foi condecorado por FHC, o que não Lula não fez com Gadafi e outros líderes árabes agora em desgraça. É verdade, mas o apoio político e o carinho pessoal de Lula na época valiam mais que condecorações formais. Eram medalhas bem mais ambicionadas. George W. Bush, por exemplo, tudo fez para ser olhado aqui e lá fora como amigo de Lula, um “companheiro”. Não tenho razões objetivas para enxergar em Lula motivação pessoal, ou ideológico-pessoal, na condução de sua diplomacia, de claro viés presidencial.[ad#Retangulo – Anuncios – Direita] A questão está nos riscos e ônus de uma diplomacia desse tipo. Em 1939 Josef Stalin confraternizou com o chanceler alemão, Joachim von Ribbentrop, quando a União Soviética assinou o pacto de não-agressão com a Alemanha Nazista. Aqui, Stálin foi duplamente ajudado pela sorte. Ou pelo destino. O encontro não foi com Adolf Hitler, mas com um assessor. Não existe a foto dos dois líderes brindando o acordo. E no fim, o que é muito mais importante, a URSS ganhou a guerra. O debate sobre as razões dos soviéticos para o pacto -e se as razões se justificavam ou não- vai percorrer a historiografia e a política pelo tempo necessário, mas a foto que permanecerá daquela guerra será Stálin com Winston Churchill e Franklin Roosevelt em Ialta, na Crimeia. Em benefício de FHC, pode-se dizer que condecorar Fujimori foi um gesto de Estado, voltado para estreitar as relações com um vizinho. O Brasil é a potência regional e precisa administrar o clima na vizinhança. E não vai ficar selecionando, conforme a política interna de cada um, com quem vai se relacionar -ou não. Ou como vai relacionar-se. Nesse aspecto, os primeiros sinais são de que Dilma Roussef vai operar numa frequência bem próxima da linha adotada um dia por FHC. Em benefício de Lula, pode-se dizer que o mercado islâmico, nas esferas do consumo e do capital, é estratégico para o Brasil diversificar as relações da nossa economia. O tamanho e a situação do Brasil exigem uma agressiva presença no comércio e na atração de investimento externo. Como se vê, tudo tem uma explicação. O que define o resultado final, como saber se o sujeito deu-se bem ou mal ao associar a imagem ao ditador fulano ou ao golpista sicrano? O próprio resultado final. Como a condecoração a Fujimori não teve qualquer efeito tonificador para ele na política peruana, e como o Peru é hoje uma democracia bem consolidada, FHC estará mais confortável para justificar -como Stálin sobre o pacto de 1939- que o gesto se deveu a razões de Estado. Aliás, FHC não carregou da passagem pela Presidência qualquer mancha de pendor antidemocrático. E se a agressiva diplomacia presidencial de Lula mostrar-se, mesmo depois da nova onda revolucionária árabe, um ativo permanente na região, se as recentes relações comerciais do Brasil resistirem bem à tempestade, o PT poderá argumentar que Lula investiu suas reservas de imagem e prestígio em benefício do desenvolvimento nacional. Não deixa de ser um argumento. Já se der errado terão que ouvir. E terão que ouvir também até lá, até a conclusão se deu certo ou errado. Ou talvez para sempre. Como no caso do Stálin de 1939. Paciência, a política exige couro grosso. Quem tem pele fina deve buscar outra atividade. E Dilma Rousseff? Por enquanto está entocada. Mas daqui a pouco vai ter que sair da toca. Afinal, Barack Obama vem aí. Sem falar que o mundo de Dilma promete ser bem mais complicado do que foi o de Lula. Referendo As propostas até agora colocadas na mesa para a reforma política têm pelo menos uma característica comum: todas são piores que o sistema vigente. Porque todas partem da necessidade de tirar direitos do eleitor. Numa, o eleitor perde a prerrogativa de escolher o candidato eleito. Noutra, deixa de escolher quantas cadeiras cada partido ou coligação ocupará no parlamento. E em quase todas deixa de ter o direito de ajudar financeiramente quem ele acha que merece seu voto. Um bom caminho para a reforma política seria dar meia volta e passar a imaginar que o sistema melhorará se o eleitor tiver mais direitos, em vez de menos. E uma boa ideia será submeter a referendo popular o que for decidido por suas excelências. ¹ Coluna (Nas entrelinhas) publicada no Correio Braziliense. twitter.com/AlonFe youtube.com/blogdoalon

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