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Amazônia, desmatamento e mortes

Amazônia desmatada concentra 9 em cada 10 mortes de ativistas por conflito no campo Maioria das mortes no campo ocorre nas bordas da Amazônia Direito de imagemVITOR FLYNN/BBC BRASIL O Brasil vem se mantendo no primeiro lugar de um ranking nada honroso: há cinco anos consecutivos, é o país em que mais se mata ativistas que lutam por terra e defesa do meio ambiente, de acordo com a organização internacional Global Witness, que anualmente lista os lugares do mundo onde há mais mortes em conflitos no campo.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”] Mas um mapeamento feito pela BBC Brasil em dados da ONG referentes ao período compreendido entre janeiro de 2015 e maio deste ano vai além: mostra que a Amazônia Legal, a área que engloba os oito Estados e parte do Maranhão, é palco de nove entre dez desses crimes (87%). As demais mortes ocorrem em outros lugares, principalmente no Nordeste. O levantamento mostra ainda que quase não há mortes no coração da floresta, onde está grande parte da mata preservada, mas sim em um arco de zonas desmatadas na periferia da Amazônia, localizadas principalmente em Rondônia e no leste do Pará. Entre 2016 e 2017, dois de cada três mortos ali eram sem-terra, posseiros ou trabalhadores rurais – a lista também inclui indígenas e quilombolas. A Amazônia Legal abriga 24 milhões de pessoas, 13% da população brasileira, em um espaço que corresponde a cerca de 60% do país. E segundo os dados gerais da Global Witness, a violência contra ativistas está aumentando: foram 32 vítimas em 2013, 29 em 2014, 50 em 2015 e 49 em 2016. Nos primeiros cinco meses deste anos, já morreram 33. A ONG investiga abusos ambientais e contra os direitos humanos, e define como “ativistas” indivíduos engajados, voluntariamente ou profissionalmente, na luta pacífica por terras e pela defesa do meio ambiente. Na sua visão, esse grupo reúne indígenas, líderes camponeses ou mesmo advogados, jornalistas e funcionários de organizações. Os dados compilados pela Global Witness são baseados em informações coletadas pela Comissão Pastoral da Terra – ambas as organizações alertam que a quantidade de mortos pode ainda estar subestimada. Críticos, por sua vez, dizem que a lista pode estar incluindo crimes sem relação com ativismo. Procurado pela BBC Brasil para comentar os números, o Ministério da Justiça afirmou em nota que “o governo brasileiro é um dos mais atuantes nas políticas de erradicação de conflitos agrários”. Argumentou ainda que o ranking global considera a quantidade total de mortes, sem levar em conta a população do país. “Sendo o Brasil o maior país da região, esses dados podem ter outras leituras.”  Mapa mostra que 9 em 10 ativistas assassinados no Brasil morreram na Amazônia No entanto, se considerada isoladamente, a Amazônia Legal tem uma taxa de mortes em relação à população que supera a de Honduras – o que a torna o território mais perigoso do mundo. “Há um agravamento da violência no campo”, avalia Darci Frigo, presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos. “Em outros momentos, quem era assassinado eram as lideranças. Agora, há uma generalização. No caso de Colniza (o massacre em abril de trabalhadores rurais no MT), por exemplo, ficou evidente que mataram todo mundo que viram pelo caminho, não procuraram os líderes. Também há um aumento da brutalidade dos assassinatos, com requinte de crueldade, tortura, execuções muito bárbaras.” História de violência As 33 vítimas registradas no país até maio representam um terço do total de ativistas mortos em todo o mundo em 2017 – em segundo lugar está a Colômbia, com 22 pessoas assassinadas. Entre os brasileiros assassinados, 28 eram trabalhadores ou militantes rurais da região amazônica. É o caso de Roberto Santos Araújo, integrante de um movimento camponês de Rondônia, assassinado a tiros em 1º de fevereiro. E o de Waldomiro Costa Pereira, do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), morto em 20 de março no hospital de Paraupebas (PA), onde se recuperava de outro atentado. Em 19 de abril, foi a vez do massacre de Colniza (MT), área de disputa por madeira. Foi o pior no Brasil em mais de vinte anos, com nove mortos. Dias depois, em 4 de maio, Kátia Martins, de 43 anos, foi assassinada dentro de casa, na frente do neto, em Castanhal, nordeste do Pará. Era presidente de uma associação de moradores de um assentamento rural. No mesmo dia e Estado, Etevaldo Soares Costa, membro do MST, foi morto a tiros e teve os dedos decepados, indício de tortura. Vinte dias depois, outra chacina: o massacre de Pau D’Arco (PA), com dez mortos, durante uma operação policial que cumpria mandados de prisão contra suspeitos de envolvimento na morte do segurança de uma fazenda. As regiões que concentram as mortes tem um histórico de conflitos entre grandes e pequenos posseiros. Em 1995, 12 pessoas foram assassinadas de uma só vez em Curumbiara (RO), entre elas dois policiais. No ano seguinte, 19 sem-terra foram mortos pela polícia militar no massacre de Eldorado dos Carajás (PA). Casos de assassinato de proprietários rurais ou seus funcionários são raros, mas também ocorrem, explica o delegado Mario Jorge Pinto Sobrinho, da delegacia de conflitos agrários de Rondônia: “Morrem pessoas dos dois lados. Mas a maior parte das mortes é do lado dos movimentos sociais”. No Estado, ainda há episódios de violência não letal supostamente praticada por grupos sem-terra, como destruição de propriedade privada. O mapa das mortes mostra que elas se concentram em regiões marcadas pelo avanço da exploração de madeira, pecuária e agricultura. “A terra na Amazônia está sendo tomada para agricultura e outros grandes negócios, bem como para exploração madeireira. O fato comum é que as comunidades não dão o seu consentimento sobre o uso da sua terra e de seus recursos naturais. Isso as coloca em rota de colisão com interesses poderosos, que leva à violência”, diz Ben Leather, da Global Witness. Cemitério de vítimas da chacina de Pau D’Arco, no Pará Direito de imagemMARIO CAMPAGNANI/JUSTIÇA Ocupação desordenada Especialistas ouvidos pela BBC Brasil apontam as disputas

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Pelo 5º ano, Brasil é líder em mortes em conflitos de terra; Rondônia é Estado mais violento no campo

Desde 2011, o Brasil é o país onde mais pessoas morrem em conflitos de terra no mundo. Indígenas representam 40% das mortos por conflitos de terra no mundo Image copyright AG. CÂMARA Divulgado nesta segunda, o relatório “Em Solo Perigoso”, da ONG Global Witness, traz o país mais uma vez no topo do ranking de assassinatos violentos provocados por disputas de território rural. No ano passado, 185 pessoas morreram em situações de violência no campo em todo mundo – o número é 59% maior do que o de 2014. Só no Brasil, foram 50 – os Estados mais violentos são Rondônia e Pará, com 20 e 19 mortes, respectivamente.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] No relatório, a Global Witness alerta para a falta de investigação de crimes relacionados a conflitos de terra no Brasil e pede maior proteção a ativistas da causa. A ONG cita a história de Isídio Antônio, líder de uma comunidade de pequenos produtores do Maranhão e uma das vítimas mais recentes – ele recebeu diversas ameaças de morte por denunciar extração ilegal de madeira e acabou assassinado. O crime não foi solucionado, lembra a organização. Extração ilegal de madeira colabora para mortes no campo, afirma ONG Image copyright WILSON DIAS/ABR A Global Witness também chama a atenção para a violência provocada pela extração ilegal de madeira. Há uma estimativa de que 80% da madeira extraída no Brasil seja fruto de operações ilegais – isso representaria 25% da madeira ilegal no mercado mundial, cujos maiores compradores são os Estados Unidos, a China e o Reino Unido. “Os assassinatos que ficam impunes em remotas áreas de mineração ou no interior das florestas tropicas são impulsionados pelas escolhas que os consumidores estão fazendo do outro lado do mundo”, disse Billy Kyte, um dos autores do estudo. “As empresas e os investidores devem cortar relações com os projetos que desrespeitam os direitos das comunidades às suas terras.” Maiores vítimas Em 2015, 40% das vítimas contabilizadas em todo o mundo eram indígenas, afirma o relatório da Global Witness. “O frágil direito à terra e o seu isolamento geográfico fazem com que esse grupo seja um alvo frequente da apropriação ilegal de terras e de recursos naturais”, afirma o documento. A ONG coloca como principais responsáveis pelas mortes no campo a indústria de minérios (responsável por 42 assassinatos), o agronegócio (responsável por 20), a extração de madeira (responsável por 15) e as usinas hidroelétricas (responsável por 15). A entidade também aponta que o número real de mortes tende a ser bem maior, já que os casos costumam ser subnotificados. Crimes provocados por conflitos de terra muitas vezes ficam sem solução Image copyright PABLO RODRIGUES Além do Brasil, outros países que aparecem na parte de cima da lista são as Filipinas, com 33 assassinatos, seguida por Colômbia (26), Peru (12), Nicarágua (12) e República Democrática do Congo (11). Na conclusão do relatório, a Global Witness faz um apelo para que os países que aparecem na lista tomem medidas urgentes para combater a violência no campo. Entre elas: – Aumentem a proteção de ativistas ambientais que correm riscos de violência, intimidação ou ameaças; – Investiguem os crimes, incluindo seus idealizadores corporativos e políticos, assim como os assassinos, e apresentem os autores à Justiça; – Apoiem o direito de ativistas de dizer não a projetos em suas terras, e assegurem que as companhias busquem o seu consentimento prévio; – Solucionem as causas subjacentes da violência contra defensores (as), reconhecendo formalmente os direitos das comunidades a suas terras e combatendo a corrupção e as ilegalidades que assolam os setores de recursos naturais.

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