Opinião – Patriotismo de Chuteiras.

O patriotismo brasileiro
Paulo França

Muitas pessoas dizem que o brasileiro só é patriota na Copa do Mundo. Foi o que explanou, por estes dias, o sambista Martinho da Vila. E ele tem razão. Junto com esta idéia, vem outra de que se o Brasil tivesse tido uma guerra, teria crescido, como aconteceu com Japão, Alemanha, França e outros.

Aqui, o samba atravessa.O Brasil já esteve em guerras, como a do Paraguai e a Segunda Mundial. Nesta, contribuiu decisivamente para seu desfecho na Itália, onde, apesar de chegarmos quase no fim, fizemos um belo estrago nas hordas nazistas.

Para quem não sabe, a Força Aérea Brasileira, que sequer tinha aviões e pilotos qualificados, rapidamente se tornou um terror para a Alemanha hitlerista. É a única força aérea do mundo a ter um reconhecimento de excelência em combate conferido pelos EUA.

Naquela época, o nacionalismo do brasileiro estava exaltadíssimo, como agora. E, mais uma vez, nos vemos diante da Alemanha, hoje, um país pacato e desenvolvido, com um projeto nacional definido, apoiado que foi pela forte verba do Plano Marshall.

O que é uma guerra? É a aplicação bélica de um projeto nacional, bem estudado, parte da estratégia nacional de um país em atingir pela força determinada posição entre os demais.

Para unir o povo e levá-lo a executar tal estratégia, é preciso que este se identifique com o projeto. Ele precisa receber uma única identidade nacional. Não se pode ir à guerra desunido. Nem se pode enfrentar o inimigo sem que todos estejam de fileiras cerradas. Os povos não são unidos para guerrear.

Ir à guerra é que os une. Aqui entra a identidade americana. Como nos EUA existem diversas nacionalidades: a do afro-americano, do ítalo-americano, do sino-americano etc… pois é da natureza deles separarem quem é Wasp (White, anglo-saxon and protestant) e quem não é, para levar a cabo sua estratégia de se impor ao mundo como potência hegemônica é preciso que cada indivíduo daquele país se sinta parte do todo.

Então, tome de bandeirinha pra tudo que é lado. Nas fachadas, inclusive das casas, nas mesas, nas roupas… Em praticamente todo filme feito por Hollywood, a maior máquina de propaganda do mundo, sempre tremula a bandeira dos EUA.

É para reforçar que “somos todos uma só América”. Daí, seus filhos são enviados a combater em diversas partes do mundo acreditando que é um povo unido defendendo seu país e levando aos outros os “elevados valores dos EUA”.

O Brasil está, há muito tempo, sem um projeto nacional. O mais recente foi o “Fiscais do Sarney”, lembra? Patriotismo aqui tem hora marcada para acontecer desde que os militares tomaram o civismo para si. Nosso civismo sai à rua sem pudor apenas para ganhar a Copa do Mundo. Uma guerra mundial a que todos queremos ir.

Temos nosso general, no caso, Parreira. Um Estado-Maior, com Zagallo à frente. Enviamos nossos melhores homens, experientes e bem treinados em táticas e estratégias para invadir o campo inimigo e vencê-lo.

O projétil mortal agora é a bola. Um campeonato de futebol é uma campanha bélica. Quando seus soldados partem para esta guerra, que tem dia e hora para começar e acabar, o povo se une em festa. Este é o momento em que o brasileiro, novo ou idoso, homem ou mulher, se enche de brios pátrios e, sentindo-se parte de um projeto nacional, participa ativamente.

O brasileiro poderia ver seu patriotismo ser canalizado também para, por exemplo, combater o uso de drogas, ilícitas ou não. Mas, com tanta gente usando e ganhando com isso, como haver união nacional? Ou, nosso projeto poderia ser o de combater a corrupção em todas as suas modalidades. Contudo, enquanto aceitarmos dar dinheiro ao policial para liberar nosso carro de multa, estaremos autorizando os políticos a desviar montanhas de recursos públicos para compras superfaturadas, como de ambulâncias, por exemplo. Por isso não nos escandalizamos.

Também praticamos a corrupção, em pequena escala. Desviamos verba de nossa família para o suborno ao policial. E ficamos aliviados quando ele aceita!

Poderíamos, então, começar por algo mais simples e comum a todos os mortais. Aquilo que elogiamos na terra dos outros: a limpeza. Poderíamos começar um projeto nacional individual de pararmos de jogar lixo no chão e achar que tudo que é público é da mãe-joana.

Poderíamos começar a nos recusar a aceitar a extorsão do guarda andando com o veículo e os documentos em ordem. Quando ele quiser multar, que multe. Vai rebocar? Que leve.

Aí, o político ladrão começará a ter medo de nós.Estas pequenas atitudes poderiam mudar o Brasil e fazer de nós um povo unido também fora da Copa do Mundo. Sem precisarmos entrar em conflitos internacionais para crescermos e exercitarmos nosso patriotismo.

(*) Paulo França – Jornalista, com pós-graduação em História e em Marketing.
jornalocorreio@terra.com.br
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