Prezados amigos,
Há alguns anos, em julho/agosto de 2002, escrevi um artigo para ser enviado via e-mail ao jornalista Boris Casoy, à época apresentador do Jornal das Record. Tudo porque, ao noticiar atrasos de embarques e desembarques de vôos nacionais, o citado jornalista “desceu o pau” na Aeronáutica, responsabilizando-a por aquelas “inconveniências”, citando que o Brasil estava igual “á África”.
Não sabia, com certeza, o âncora da Record, que um dos radares responsáveis oela integração (conexão) entre Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília, estava inoperante, em manutenção. Assim, o sistema operava “convencional”, obrigando a um espaçamento maior entre as aeronaves em operações de pousos e decolagens, o que acarretaria, por via de conseqüência, em aumento do tempo para a execução destas operações, de tal forma que a demora de cinco minutos no início de um vôo em Curitiba redundaria num atraso de três a quatro horas ao final da jornada, por exemplo em Recife ou Fortaleza.
Acontece que a Aeronáutica já vinha solicitando a liberação de recursos, não representando isto em aumento do orçamento aprovado, para que tais manutenções periódicas, modernização de equipamentos e finalização da integração dos radares dos CINDACTA (Curitiba, Brasília, Recife e Manaus) fossem realizadas. Insisto: não seria aporte de recursos públicos e, sim, o repasse de recursos já arrecadados para tal fim!
Logo após assistir àquele telejornal, não me contive e escrevi um artigo sobre o tema, porém como militar disciplinado que sempre fui, mas impertinente e não subserviente, apresentei-o ao meu chefe que recomendou e sugeriu que não o fizesse, pois de nada adiantaria. Não o fiz e, hoje, arrependo-me. Naquela época eu era Chefe do Estado-Maior do COMGAR. O citado artigo segue abaixo, exatamente como foi redigido à época. Talvez lembre disso um querido amigo a quem mostrei lá no COMGAR.
O lamentável, nefasto e incompreensível acidente ocorrido com a aeronave da GOL, animou-me a mostrar “intra-muros da FAB” o artigo. Não será difícil reeditá-lo com as devidas correções, pois as razões da não liberalização de recursos continuam as mesmas: “falta de verbas, limite orçamentário, não contemplação no orçamento da União, prioridades sociais e outras baboseiras”, enquanto, o que é asqueroso, é que os objetivos políticos são os mesmos, mudando, apenas, as formas.
Hoje vigoram os mensalões, os dólares na cueca, os “VALERIODUTOS (alguém lembra disso? A nossa imprensa comprometida e de mírdia já não toca mais no assunto), os recursos públicos levados a um hotel em São Paulo para a compra de “dossiês”, o assalto à mão desarmada na Saúde com vampiros e sanguessugas e tantos outros ainda a serem descobertos.
Enfim, agora é uma quadrilha que deixou a barba, ou a barbicha, crescer, saiu do submundo do crime e alojou-se no poder deste pobre país.
AQUI NÃO É A ÁFRICA OU PORQUE FICAMOS PIOR DO QUE A ÁFRICA
Prezado Senhor Jornalista Boris Casoy.
Assim como milhares de outros brasileiros, sou fiel espectador do JORNAL DA RECORD por motivos bastante simples: a seriedade, a inteligência, a sagacidade e a veracidade que V Sª emprega na apresentação do aludido telejornal, acrescentando, preponderantemente, ser um dos únicos infensos à paranóia globalizante (ôpa!) que grassa em outras emissoras, excetuando-se, também, o SBT.
Entretanto, na edição do dia 15 de julho de 2002, quando da notícia sobre os atrasos nos horários de embarque e desembarque dos vôos comerciais nacionais, quedei-me espantado e desapontado pelo comentário desairoso que se seguiu, fruto, certamente, da falta de conhecimento do assunto, e nunca, creio, pela intenção deliberada da má informação.
Em razão dos valores transmitidos por meus pais e corroborados, posteriormente, no valoroso (à época) ensino público que freqüentei, causou-me indignação a falta de responsabilidade como um assunto de tamanha gravidade é repassado à nossa sociedade como se fosse mais um descaso das tantas autoridades (?) que povoam e determinam o nosso combalido cotidiano.
É preciso que a sociedade tenha acesso à verdade para que possa debater e, por conseguinte, formar opinião sobre temas de seu interesse. Reconheço a importância do valor que a mídia séria e descomprometida representa nessa formulação dos conceitos do povo brasileiro.
Por tudo isso, ressalta imperioso que as informações que lhe são prestadas sejam verídicas, com todas as implicações, doam a quem doer, consoante a exatidão dos fatos, caso contrário será possível admitir-se que o país está entregue, como já foi dito, a uma “imprensa de mírdia”.
Causou-me repulsa, ainda, como o teor crível e sério que V Sª empresta em suas notícias, possa ser transmutado em comentário jocoso, procurando agradar a algo ou a alguém, quando, em realidade, o assunto é por demais grave, merecendo que o debate seja elevado a nível nacional, por tratar-se da segurança de propriedades e, principalmente, de pessoas humanas iguais a cada um de nós dois, merecedoras do respeito e do conhecimento que detivermos.
Assim é que, como V Sª não desconhece, contingenciamentos e bloqueios de recursos públicos oriundos dos impostos que todos nós somos impelidos a pagar, culminaram por corroer verbas destinadas às Forças Armadas brasileiras, onde se inclui a Aeronáutica, surrupiadas para satisfazerem desejos políticos em pleno ano eleitoral, acrescentando-se a isso a necessidade da economia em apresentar, a determinados interesses alienígenos, um mentiroso “superavit” primário.
Os recursos covardemente retirados atingiram dura e violentamente a capacidade das Forças Armadas no cumprimento de suas missões constitucionais, sejam elas específicas ou subsidiárias. A ratificar tal afirmativa socorro-me dos artigos de Carlos Heitor Cony e de Jarbas Passarinho, publicados em 16 de julho na Folha de São Paulo e no Estado de São Paulo, respectivamente, além das notas indignadas de parlamentares que dignificam, inquestionavelmente, seus mandatos como Aldo Rebelo e Miguel Arraes, nos quais todos procuraram bem informar a sociedade das atividades desenvolvidas pelas Forças Armadas.
E assim os cortes orçamentários aconteceram, de maneira unilateral e inconseqüentemente, refletindo-se na Aeronáutica de forma a impossibilitar a necessária manutenção de radares, seja por intermédio de contratos terceirizados, ou por parte da própria Força Aér
ea adquirindo peças de reposição, mesmo considerando-se tratarem-se de equipamentos oriundos da década de setenta, valvulados e arcaicos, porém ativos e eficazes desde que bem conservados e cuidados, como até então vinha ocorrendo.
Para qualquer mediana inteligência, afigura-se factível compreender que, da obsolescência dos radares sem a devida manutenção, decorrerá a inevitável degradação de todo o sistema integrado, comprometendo, por via de conseqüência, não só os horários das companhias, mas a eficiência do controle de tráfego e a segurança das operações aéreas.
Casos de atrasos como os recentemente ocorridos, influindo na conveniência e no conforto dos passageiros, ainda serão bem melhores do que notícias outras, que tornar-se-ão um prato fundo para o baixo jornalismo, antigamente conhecido como “imprensa marron”, porém venderão jornais e trarão audiências, como acidentes aéreos em regiões de intenso tráfego, seja no Rio de Janeiro ou em São Paulo, comparáveis a determinadas regiões da Europa, onde há pouco colidiram dois aviões em pleno vôo.
Mas o mais relevante, ainda, é dizer à sociedade que o usuário do transporte aéreo pagou, embutido no preço de sua passagem, por este serviço, porém tal verba, recolhida conforme determina a lei e, portanto, com destinação exclusiva, cujo bloqueio constitui-se me “apropriação indébita”, foi presa fácil para um economista burocrático qualquer, normalmente de 2º ou 3º escalão, armado com uma tesoura aritmética e ignorantemente cega.
Ignorante e cega porque, ao atender aos desígnios de seus Chefes, politicamente arrogantes, obtusos e subordinados a intenções desconhecidas, porém de fundo incoerente, colocam em risco a segurança de vôo e a vida de brasileiros como nós, permutados por verbas destinadas a emendas que erguerão pontes para ligar coisa alguma a lugar nenhum, ou suportar projetos de ranários ou de uma USIMAR qualquer, ou para construir mais um prédio nababesco da Justiça, hoje em São Paulo e futuramente em outros locais, ou, pior ainda, para proteger e salvar proprietários de bancos falidos.
Para todas estas excrescências nunca faltaram recursos, enquanto a Força Aérea Brasileira e a aviação civil definham por inanição financeira, em uma absurda e nojenta inversão de valores.
Por fim, prezado jornalista, creia-me que este brado de desespero não objetiva pura e simplesmente contrapor-me ao infeliz comentário, mas visa, fundamentalmente, contribuir para o esclarecimento de V Sª para bem informar a sociedade das conseqüências que poderão advir nos céus brasileiros, sem alarmismo, porém fiel ao quadro a que as ditas autoridades relegaram a segurança de vôo, para não falar do espaço aéreo aberto a todas as formas de ilícitos, como o narcotráfico, o contrabando de armas e outros delitos, justamente no momento em que a voz da população se levanta contra a violência e o poder paralelo dos bandos de marginais que pululam em nossas metrópoles.
Ah, sim! Se vier a acontecer um acidente aéreo, poderemos inferir o que se seguirá:
– liberação das verbas retidas: “eu não tinha conhecimento da gravidade da situação!” (idêntico ao caso da crise de energia elétrica);
– culpa da Aeronáutica, por não ter cuidado de suas responsabilidades, certamente por ser integrada de militares, que estão sempre vendo chifre em cabeça de burro; ou
– esqueceremos de tudo após os picos de audiência e a venda de jornais, pelo comprometimento político da mídia, até um próximo acidente.
Quem viver, se não estiver a bordo, verá!
Enviado por Arthur Torres de Melo.