Cai a Chuva Abandonada
Vergílio Ferreira¹
Cai a chuva abandonada
à minha melancolia,
a melancolia do nada
que é tudo o que em nós se cria.
Memória estranha de outrora
não a sei e está presente.
Em mim por si se demora
e nada em mim a consente
do que me fala à razão.
Mas a razão é limite
do que tem ocasião
de negar o que me fite
de onde é a minha mansão
que é mansão no sem-limite.
Ao longe e ao alto é que estou
e só daí é que sou.
Vergílio Ferreira, in ‘Conta-Corrente 1’
¹Vergílio António Ferreira
*Gouveia,Portugal – 28 de janeiro de 1916
+Sintra,Portugal – 1 de março de 1996