Poema
Fernando Pessoa ¹
De quem é o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo
Enquanto estou pensando?
Por que caminhos seguem,
Não os meus tristes passos,
Mas a realidade
De eu ter passos comigo?
Às vezes, na penumbra
Do meu quarto, quando eu
Para mim próprio mesmo
Em alma existo,
Toma um outro sentido
Em mim o Universo –
É uma nódoa esbatida
De eu ser consciente sobre
Minha idéia das cousas.
Se acenderem as velas
E não houver apenas
A vaga luz de fora –
Não sei que candeeiro
Aceso onde na rua –
Terei foscos desejos
De nunca haver mais nada
No Universo e na Vida
De que o obscuro momento
Que é minha vida agora:
Um momento afluente
Dum rio sempre a ir
Esquecer-se de ser,
Espaço misterioso
Entre espaços desertos
Cujo sentido é nulo
É sem ser nada a nada.
E assim a hora passa
Metafisicamente.
¹ Fernando Antonio Nogueira Pessoa
* Lisboa, Portugal – 13 de Junho de 1888 d.C
+ Lisboa, Portugal – 30 de Novembro de 1935 d.C
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