¹Nos discursos presidenciais na Assembleia da ONU em NYC, ouviu-se o slogan nacionalista (parecia anos 50) com Trump reiterando que sua política é “América First” e Bolsonaro grunhindo “A Amazônia é nossa”.
Pelo menos nos anos 50 o nacional-desenvolvimentismo fazia algum sentido, e pasmem era a contraparte do suposto “imperialismo ianque”. Era ainda anti-imperialista, nos anos seguintes, o mantra dos militares “integrar para não entregar”. A Amazônia era vista como vazio geográfico na iminência de ser tomado dos brasileiros. Naqueles anos, tais aventuras tiveram seu apelo e houve quem embarcasse à direita e à esquerda.
Hoje, tanto Donald Trump quanto Bolsonaro parecem – no curto prazo – leões que rugem em reinados despedaçados. O primeiro tenta com bazófias segurar um ciclo econômico de fôlego e data de validade prestes a vencer. Há quase unanimidade entre especialistas no prognóstico de que a América do Norte caminha para uma recessão.
O segundo, o nosso Capitão Viva a América, quer fazer caixa já, pagar as contas do dia seguinte e para tanto torra o patrimônio nacional, vendido a preço de banana.
No longo prazo ambos nos parecerão ratos que roeram a roupa do rei de Roma. E com seu nacionalismo populista de direita deixarão triste e malfadada lembrança.
Os dois, Trump e Bolsonaro – apresentam seu nacionalismo falacioso e acusam seus opositores de GLOBALISTAS. Inclui no pacote esquerda e ambientalistas.
Somos globalistas? Acho que não. É pura mistificação.
Vejamos: a globalização se deu via mercados e via doutrina neoliberal nos anos 80. A falência do estado de bem-estar social que predominava na Europa livre e a derrocada do socialismo soviético, fortaleceram o projeto de um capitalismo universal. Quem não se globaliza se trumbica, mais ou menos assim. Nunca foi um projeto da esquerda, muito menos ambientalista.
Globalismo? É mais um “ismo” em que se apoia o discurso do ódio.
Ao contrário, frequentando as várias edições do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, e depois em outras praças, o slogan era “Outro Mundo é Possível”.
Ali como em outros lugares se fizeram presentes os “descontentes da globalização” (assim chamados por J. Stiglitz, ex-economista do Banco Mundial e prêmio Nobel de Economia). Os que sobraram no processo de globalização econômica feita aos trancos e barrancos. O processo foi tão brutal que gerou Davos e os Objetivos do Milênio.
Por isso é risível imputar à esquerda o epíteto de globalista.
No caso dos ambientalistas a mistificação também não se sustenta.
Sabemos desde os anos 70, enquanto comunidade científica, elites dirigentes, governantes ilustrados, tecnocracia competente e mídia informada – que a poluição de rios e oceanos e as mudanças climáticas não respeitam fronteiras. É só lembrar de Chernobyl nos anos 80.
Chuva ácida, radiação, animais migratórios, genes de plantas, vírus e pestes não fazem chek-in nem obedecem a processos aduaneiros. Simple like that!
Há muito tempo sabemos que existem problemas ambientais globais. O Planeta Terra é um só embora as culturas humanas possam ser diferentes.
Temos um encontro inadiável entre a História e a biologia da Terra.
A visão de que devemos construir uma governança global para administrar os problemas que afetam a todos, indistintamente, pode ser tudo menos ideologia de quinta.
Precisamos de lideranças visionárias e responsáveis.
As mudanças climáticas em curso não podem ser tratadas com fanfarronice. Ou com ferramentas políticas do século passado.
Nós ambientalistas falamos de Humanidade, de Civilização, dos direitos das gerações futuras.
Falamos sobretudo de responsabilidade e da preservação da vida.
Globalismo? É mais um “ismo” em que se apoia o discurso do ódio.
Triste ver governantes minúsculos em momento tão grave.
¹Por Samyra Crespo é cientista social, ambientalista e pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins e coordenou durante 20 anos o estudo “O que os Brasileiros pensam do Meio Ambiente”.