A história por trás da foto do menino negro de Copacabana
Um menino observa os fogos na virada de ano novo em Copacabana. Fotografia de LUCAS LANDAU
Garoto cuja imagem viralizou após o réveillon acompanhava mãe que vendia chaveiros na praia. Família mora em favela dominada pelo tráfico e chegou a prestar queixa na polícia após a divulgação
O menino negro retratado em uma fotografia em preto e branco observando os fogos durante a virada do ano em Copacabana teve parte da sua história revelada. No dia 31 de dezembro o garoto de oito anos saiu com sua mãe da favela onde moram a caminho de uma das praias mais famosas do mundo. A família, sem pai, e formada por mais três irmãos mora num prédio ocupado e dominado pelo tráfico.
Eles não percorreram os 17 quilômetros que separam sua casa da areia para curtir da festa vestidos de branco. A mãe, de 35 anos, é vendedora ambulante e essa noite saiu para vender chaveiros entre os 2,5 milhões de pessoas que comemoravam o réveillon à beira da praia. Ao começarem os fogos, o pequeno se separou da mãe e foi dar um mergulho quando em seguida ficou absorto ao observar o espetáculo de luzes no mar.
Foi nesse instante que o fotógrafo Lucas Landau, que retratava a festa para a agência Reuters, captou a fascinação do menino. A imagem, sem o fotógrafo pretender, acabou viralizando, chegou a milhares de brasileiros e foi tema de matérias em vários jornais internacionais.
A que poderia ter se limitado a uma bela fotografia levantou, no entanto, uma enorme discussão nas redes sociais. Discutia-se o papel da fotografia, mas também como a interpretávamos. Muitos enxergaram um menino perdido, pobre, assustado, sendo ignorado pela massa branca. Outros viram apenas uma criança absorta no espetáculo e multiplicaram-se as vozes que apontaram a estigmatização das crianças negras no Brasil ao se perceber a quantidade de pessoas que associaram de imediato a cor da pele do garoto com sua suposta condição social.
Os dias se passaram sem ninguém saber quem era aquele menino, alheio ao reboliço que sua foto tinha causado. A mãe dele, que não tem celular, não sabe ler nem escrever, nem assinar seu próprio nome, acabou sabendo da repercussão por meio de uma vizinha. Assustada, ela chegou a ir na delegacia de Repressão de Crimes de Informática para apresentar uma queixa. Acreditava que o fotógrafo estava comercializando a imagem sem seu consentimento, algo que Landau sempre negou. A polícia, de fato, não observou nenhum crime, não haverá investigação e a denúncia ficou resumida a apenas um registro. Foi desse documento, ao qual o EL PAÍS teve acesso, que saíram boa parte das informações para esta reportagem.
Fotógrafo e menino chegaram a se conhecer, mas o próprio Landau alertou em suas redes sociais que aquele encontro ficaria apenas para eles. “O conheci cinco dias depois da nossa vida ter mudado. Conheci também sua mãe. Foi um encontro emocionante em que pudemos criar nossos vínculos, finalmente. Escolhemos manter esse momento privado, assim como a nossa relação”, ele escreveu. A reportagem tentou conversar com a mãe, mas ela se negou. Quer proteger seu filho.
Maria Martin/ElPais