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Archibald McLeish – Poesia – O voo dos corvos

O vôo dos corvos00 Archibald McLeish Haverá pouca coisa a esquecer: O vôo dos corvos, Uma rua molhada, O modo do vento soprar, O nascer da lua, o pôr do Sol, Três palavras que o mundo sabe, Pouca coisa a esquecer. Será bem fácil de esquecer. A chuva pinga Na argila rasa E lava lábios, Olhos e cérebro. A chuva pinga na argila rasa. A chuva mansa lavará tudo: O vôo dos corvos, O modo do vento soprar, O nascer da lua, o pôr do Sol. Lavará tudo, até chegar Aos duros ossos desnudados, E os ossos, os ossos esquecem. Tradução: Manoel Bandeira

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Fernando Pessoa/Alberto Caeiro – A Espantosa Realidade das Cousas – Poesia

A Espantosa Realidade das Cousas Fernando Pessoa/Alberto Caeiro A espantosa realidade das cousas É a minha descoberta de todos os dias. Cada cousa é o que é, E é difícil explicar a alguém quanto isso me alegra, E quanto isso me basta. Basta existir para se ser completo. Tenho escrito bastantes poemas. Hei de escrever muitos mais. Naturalmente. Cada poema meu diz isto, E todos os meus poemas são diferentes, Porque cada cousa que há é uma maneira de dizer isto. Às vezes ponho-me a olhar para uma pedra. Não me ponho a pensar se ela sente. Não me perco a chamar-lhe minha irmã. Mas gosto dela por ela ser uma pedra, Gosto dela porque ela não sente nada. Gosto dela porque ela não tem parentesco nenhum comigo. Outras vezes oiço passar o vento, E acho que só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido. Eu não sei o que é que os outros pensarão lendo isto; Mas acho que isto deve estar bem porque o penso sem estorvo, Nem idéia de outras pessoas a ouvir-me pensar; Porque o penso sem pensamentos Porque o digo como as minhas palavras o dizem. Uma vez chamaram-me poeta materialista, E eu admirei-me, porque não julgava Que se me pudesse chamar qualquer cousa. Eu nem sequer sou poeta: vejo. Se o que escrevo tem valor, não sou eu que o tenho: O valor está ali, nos meus versos. Tudo isso é absolutamente independente da minha vontade.

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Francisco Carvalho – Burocracia – Poesia

Burocracia Francisco Carvalho¹ Eles te advertem que a aurora foi abolida por tempo indeterminado. Eles te comunicam que o trigo e o vento vão ser exportados para o arco-íris. Eles te aconselham a esquecer o corpo ensangüentado dos acontecimentos. Eles te ensinam que o orvalho não cai sobre aqueles que semeiam dúvidas. Eles te mandam esvaziar as palavras de toda a possível reminiscência. Eles te fiscalizam do alto dos edifícios escanchados nalgum dragão lunar. Eles te dão um ataúde azul e te ordenam que é tempo de morrer !Poeta Cearense, nascido em Limoeiro

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Saramar Mendes – Teus lábios de navegar – Poesia

Teus lábios de navegar Saramar Mendes Refazem teus lábios minha pele lassa e rios traçam, de sangue em rebuliço de mar sem tempo marcado, teus lábios de me tomar. Tanto tempo desfazes com teus beijos e o sol tem outro alumiar de passeio e pipa, no ar e a pele que com teus beijos devassas, são rosas avermelhadas de amor, guardando o viço, o fogo de me queimar. Tanto tempo, tanto amor e conheço a saudade de cada pedaço meu de onde tua língua lenta e doce se vai, barco de me singrar. Tanto teus lábios levam de mim para jardins no mar o ruim, a escuridão, o siso e deixam, longe, longe… em meus delírios, teus risos em meus rios, teus lábios a navegar. Pintura: Toulouse Lutrec,1892,Beijo na cama,Detalhe

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