JOSÉ RENATO NALINI ¹
A judicialização de todas as questões fez da Justiça tema permanente. Se isso ocorre em todo o mundo, a reforma do Judiciário no Brasil ganhou destaque a partir da visita que o general Ernesto Geisel fez ao Supremo Tribunal Federal (STF), quando ficou perplexo com o volume de recursos em trâmite.
A pretexto de aprimorar a Justiça, editou o “pacote de abril”, a emenda constitucional nº 7/77, após fechar o Congresso.
Fruto disso, a Loman – Lei Orgânica da Magistratura Nacional, lei complementar nº 35, de 14/3/1979), considerada “a camisa de força do juiz brasileiro” e ainda em vigor, recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Este, o pacto republicano que mais confiou na Justiça.
Prestigiou o Judiciário, ampliou-lhe funções e insistiu na celeridade.
A crise continuou, mesmo porque é permanente, pois é parte da crise do Estado. Foi necessária uma nova reforma do Judiciário, agora com a emenda constitucional nº 45/2004.[ad#Retangulo – Anuncios – Direita]
Criou-se o Conselho Nacional de Justiça, o controle externo do Judiciário e seu órgão de planejamento.
A lentidão continua a ser o maior problema. Tanto que se inseriu novo direito fundamental ao já alentado rol do artigo 5º da Constituição de 1988, a garantir rapidez na prestação jurisdicional.
Às modificações do Pacto, seguiu-se a edição de leis processuais de aceleração da Justiça. O CNJ alavancou as exigências de um sistema afinado com a pós-modernidade e implementou boas medidas.
Dentre elas, os mutirões de atualização jurisdicional, a apuração de falhas nos presídios e a adoção de estatísticas propiciadoras de racionalização. Estratégias de que o Judiciário nunca se valera antes na história da República.
Tudo ainda não repercutiu em profunda reforma estrutural da Justiça. As queixas em relação aos serviços judiciais recrudescem. A burocracia impera. O anacronismo aliou-se à inércia, princípio processual transplantado para a administração e subsistente em boa parte do universo judiciário.
O que falta para modernizar a Justiça? Sobram pessoas eruditas e tecnicamente capazes para a função de decidir. Padece a Justiça de capacidade gestora da atividade-meio e de estratégias hábeis a conferir eficiência à a atividade-fim.
Eficiência é princípio impositivo à administração pública e, portanto, ao Judiciário. Resiste-se à busca de eficiência como se fosse inviável conciliá-la com segurança jurídica.
Todavia, não é eficientismo o que se deseja, senão atender aos necessitados do justo concreto. Ou a decisão é oportuna ou já falhou.
O Brasil tem peritos em administração e empreendedores criativos.
Como foi que as empresas conseguiram sobreviver num capitalismo competitivo e selvagem? Foram cérebros os artífices da façanha.
Tais talentos hão de ser requisitados para contribuir na elaboração de projeto consistente e viável para reduzir gargalos, racionalizar procedimentos e trâmites e conferir um trato modernizante ao emperrado aparelhamento judicial.
É inviável aguardar uma reação endógena ao urgente pleito de “aggiornamento” da Justiça. Até o momento, não conseguiu o Judiciário desatar seus nós.
Fazer justiça é um serviço público que afeta a todos e, enquanto a sociedade não se interessar por seu funcionamento, de pouco valerão as reformas constitucionais, a produção de novas leis e as recomendações correcionais.
Aperfeiçoar a Justiça brasileira é dever de todos os que nela enxergam o equipamento essencial à concretização da democracia participativa prometida pelo constituinte, sem a qual não há que se falar em Estado de Direito.
¹ JOSÉ RENATO NALINI mestre e doutor em direito constitucional pela USP, é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e autor de “A Rebelião da Toga”, 2ª ed., editora Millennium
fonte: blog diário de um juiz