Roberto Amaral: “Declaração de Michel Temer é golpismo explícito”

Roberto Amaral,Políticos,Blog do MesquitaEx-ministro de Lula e próximo da presidente Dilma Rousseff no segundo turno das eleições, Roberto Amaral faz duras críticas à condução da política econômica e do ajuste fiscal empreendido pelo ministro da Fazenda Joaquim Levy. Além de apontar erros e prever que os rumos da economia “não sugerem bons ventos”, o ex-presidente do PSB afirma que a presidente não recebe apoio nem mesmo dos beneficiários do “projeto Levy”.

“O governo não recebe o apoio das forças econômicas beneficiárias do ‘projeto Levy’, de uma parte, e de outra tem dificuldade de falar às grandes massas (atingidas em seus direitos pela política recessiva) — de cujo apoio nas ruas depende sua sobrevivência.

Este paradoxo precisa ser vencido”, afirma Roberto Amaral, que chamou de “golpismo explícito” a declaração do vice Michel Temer de que Dilma não terminaria o mandato se continuasse com os atuais índices de popularidade.

Crítico do PMDB, Amaral é cético quanto ao destino do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, denunciado ao Supremo Tribunal Federal pelo Ministério Público Federal por corrupção e lavagem de dinheiro. “A questão não é apenas jurídica. O STF é um tribunal que julga direito pelo viés da política”, diz, acrescentando ao cenário de incertezas a manipulação da opinião pública pelos meios de comunicação de massa e a blindagem que o peemedebista terá entre seus pares no Congresso para que não deixe o cargo.

Um dos nomes históricos da esquerda brasileira, Amaral não poupa nem mesmo seu partido. “O PSB era um honesto partido de centro-esquerda que renunciou a ser um grande partido de esquerda. Brigou com a história. Pode ser de esquerda um partido que deseja fundir-se com o PPS?”, questiona.

Segundo o ex-presidente do PSB, os erros da legenda surgiram a partir da eleição de 2014. Ele reconhece que o PSB tem uma dívida com Marina Silva, que substituiu Eduardo Campos como candidata e impediu a aliança com a direita. “Devemos-lhe alguns favores: foi sua firmeza, por exemplo, que impediu que o PSB apoiasse o Caiado (Ronaldo, DEM) em Goiás… Recusou-se na campanha, a, em São Paulo, fazer o jogo do PSDB, jogado pelo PSB”.

Confira a entrevista, na íntegra:

Jornal do Brasil – Qual é a opinião do senhor sobre a crise política do governo da presidente Dilma?

Roberto Amaral – É muito grave, pois há uma conjunção de crise econômica e crise política, uma alimentando a outra e, de permeio, o avanço das forças conservadoras, naturalmente em conflito com todo e qualquer governo comprometido com a emergência das massas trabalhadoras. Esse conflito ideológico chega a ser mais contundente do que a crise econômica em si, posto que dela independe. Assim foi em 1954, contra as políticas nacionalistas e trabalhistas de Vargas, assim foi contra o governo popular de Jango. Em ambos os casos se arguia o combate à corrupção. A classe dominante jamais aceitou a política social de Lula; teve de conformar-se com ela em face de sua popularidade. A crise política é o calcanhar de Aquiles do governo Dilma.

Jornal do Brasil – Há erros na política econômica?

Roberto Amaral – Há, evidentes. São erros de concepção ideológica (a teimosia neoliberal) agravados pela sabotagem da Câmara dos Deputados, aumentando os gastos da União. De qualquer forma, a estagnação econômica, sugerindo uma recessão a médio prazo, jamais se revelou competente para sanar os problemas de caixa, nem os juros pornográficos conseguiram conter a inflação, ainda em alta. Ou seja, o ‘projeto Levy’ não sugere bons ventos. A retração tem levado ao óbvio, a saber, a queda da produção, à ausência de investimentos e ao desemprego que levam à queda da produção, da arrecadação, aumentando o déficit, ou seja, realimentando a crise econômica que agrava a crise política, da qual se aproveitam os adversários da estabilidade.

Jornal do Brasil – O senhor acredita que a tese de impeachment tem fôlego para seguir adiante?

Roberto Amaral – De certa forma, o sucesso ou insucesso da impatriótica, ilegal e inconstitucional ‘tese de impeachment’ está muito a depender da correlação de forças na sociedade, e isto, por seu turno está a depender do diálogo que a presidente venha a manter, ou não, com as forças populares, com o papel pessoal de Lula e com o papel das forças progressistas de um modo geral, diante da fragilidade da base parlamentar do governo e do monopólio oposicionista dos meios de comunicação de massa. O governo não recebe o apoio das forças econômicas beneficiárias do ‘projeto Levy’, de uma parte, e de outra tem dificuldade de falar às grandes massas (atingidas em seus direitos pela política recessiva) — de cujo apoio nas ruas depende sua sobrevivência. Este paradoxo precisa ser vencido.

Jornal do Brasil – O senhor tem falado com a presidente?

Roberto Amaral – Não. Nossa última conversa foi no curso do segundo turno.

Jornal do Brasil – O senhor acredita que Eduardo Cunha cairá com as denúncias da Lava Jato?

Roberto Amaral – A questão não é apenas jurídica: o desenvolvimento do processo a ser aberto pelo STF, um Tribunal que julga o direito pelo viés da política. Muito dependerá da opinião pública, de resto manipulada pelos meios de comunicação de massa. Qual será, a esse propósito, a posição de nossa imprensa? Se depender da correlação de forças internas da Câmara Federal, Eduardo Cunha está blindado.

Jornal do Brasil – O que o senhor achou das declarações de Michel Temer, de que Dilma não resiste com os índices de popularidade atuais?

Roberto Amaral – No mínimo preocupantes, embora não sejam surpreendentes para um observador da política. Do que li concluo tratar-se de golpismo explícito, formulado por um evidente beneficiário. Trata-se do vice-presidente da República, ex-coordenador político do governo e presidente do PMDB, que tem a metade do governo Dilma e as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, a segunda bancada na Câmara e a maior bancada no Senado. Convenhamos, não é pouca coisa. Eis um indicador da falência da política nacional, que se manifesta na pobreza política e ética daqueles políticos que deveriam desempenhar o papel de estadista. Que fazer? Quem tem um aliado como esse não precisa da oposição nem dos “caiados” nem dos “bolsonaros”. Triste Brasil.

Jornal do Brasil – Como o senhor avalia o PSB nacionalmente e aqui no Rio de Janeiro, a partir da saída do deputado federal Glauber Braga para o Psol e Romário dominando o partido?

Roberto Amaral – O PSB renunciou ao PSB, abjurando sua história, seu manifesto, seu programa e a biografia dos seus fundadores e dos que o trouxeram sério e limpo até 2014. A partir da adesão oportunística ao candidato da direita, optou pelo pragmatismo cínico. Nada tem a ver com o socialismo ou com a esquerda brasileira um partido que ostenta em seus quadros um guarda-costas de Bolsonaro e uma deputada que incita o assassinato de índios.

Jornal do Brasil – O senhor apóia a candidatura do Romário à Prefeitura do Rio?

Roberto Amaral – E ele é candidato?

Jornal do Brasil – O partido não é mais de esquerda?

Roberto Amaral – Não. O PSB era um honesto partido de centro-esquerda que renunciou a ser um grande partido de esquerda. Brigou com a história. Pode ser de esquerda um partido que deseja fundir-se com o PPS?

Jornal do Brasil – O senhor acha que a presença de Marina Silva no PSB tirou um pouco o foco do partido e das atuais lideranças?

Roberto Amaral – Justiça seja feita, a Marina jamais esteve no PSB; era nossa candidata a vice, numa coligação partidária entre o projeto de Rede e o PSB, e, por uma tragédia, tornou-se nossa candidata à presidência. Mas devemos-lhe alguns favores: foi sua firmeza, por exemplo, que impediu que o PSB apoiasse o Caiado em Goiás… Recusou-se, na campanha, a, em São Paulo, fazer o jogo do PSDB, jogado pelo PSB.

Jornal do Brasil – O senhor participa das conversas pela frente de esquerda no Rio de Janeiro e que tem a participação do Tarso Genro?

Roberto Amaral – Participo de todas as conversas, ações e articulações, desde o primeiro momento, de que resultou a Frente Brasil Popular a ser instalada neste sábado em Belo Horizonte. Tenho o orgulho de dizer que foi eu quem levantou a ideia no Grupo Brasil. E participo de todas as conversas que são levadas a cabo pelo companheiro Tarso Genro, justamente preocupado com a tragédia da esquerda no Rio de Janeiro.
Eduardo Miranda/JB

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