A história, sabe-se, é escrita pelos vencedores. Mas, os vencidos, também deixam registros que com o tempo vêm a lume.
Historiadores e antropólogos permitem que a versão bilateral dos fatos seja conhecida.
Poucas pessoas no Brasil se dão conta da proporção da mortandade de índios nas Américas, em especial nas selvas da América do Sul, após a chegada dos europeus ao Novo Mundo com suas armas e vírus.
E se esse genocídio tivesse sido grande o bastante para afetar o clima do planeta, ou pelo menos o do Velho Mundo?
<= Índios sul-americanos em ilustração de livro didático americano de 1914 (Reprodução/Wikipedia)
A hipótese chocante foi levantada por Richard Nevle e Dennis Bird, da Universidade Stanford. Está em trabalho apresentado anteontem na reunião anual da União Geofísica Americana, segundo leio em comunicado da universidade: a chamada Pequena Era Glacial, iniciada em meados do século 17, poderia ter resultado do morticínio após a diminuição drástica das áreas cultivadas pelas populações desaparecidas, com o conseqüente reflorestamento natural das áreas abandonadas.
Ao crescer, árvores e qualquer tipo de planta retiram CO2 (gás carbônico, principal agente do efeito estufa) da atmosfera.
Quando uma floresta alcança sua maturidade, por assim dizer, esse “seqüestro” de carbono tende a cessar, porque os vegetais o retiram de dia, ao fazer fotossíntese, e o devolvem à noite, ao respirar, com um saldo próximo de zero.
Esse balanço se altera, porém, quando uma área degradada de floresta é abandonada e a mata rebrota: durante alguns anos, ou décadas, o saldo de carbono seqüestrado será positivo, enquanto a maturidade não chegar.
[ad#Retangulo – Anuncios – Esquerda]Nevle e Bird acham que o genocídio foi extenso o bastante para retirar uma quantidade significativa de carbono da atmosfera, a ponto de gerar um efeito refrigerador do clima que teria sido sentido na Europa nos séculos que se sucederam à ocupação das Américas.
Mas não teria sido o único fator – eles calcularam que a mortandade pode ter respondido por 10-50% do resfriamento de cerca de 1 grau Celsius em alguns períodos dos séculos que se seguiram.
Outros fatores teriam contribuído, como erupções vulcânicas, que também podem favorecer o resfriamento.
Os pesquisadores de Stanford foram um pouco além do que muitos poderiam considerar um mero chute, ou correlação sem vínculo causal provável.
Sabendo que o processo de fotossíntese tende a consumir versões (isótopos) mais leves de átomos de carbono, eles verificaram que nas amostras estratigráficas estudadas a diminuição quantitativa de carbono também se correlaciona com um aumento relativo na proporção do isótopo mais pesado, o que reforça sua hipótese.
Não dá para omitir que a idéia pareceu e ainda parece fantasiosa. Um tanto inacreditável.
Vai ver é porque, para a maior parte dos brasileiros, persiste uma resistência a encarar o quanto há de horrível no passado do país e o quanto disso se perpetua no presente.
bolg Ciência em dia – por Marcelo Leite