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Slavic, o hacker mais procurado (e protegido) do mundo

Vinculado aos mais graves ciberataques contra os EUA, ele vive supostamente amparado por Moscou O hacker russo Evgeniy M. Bogachev, em imagem do FBI publicada pelo ‘The New York Times’. Cabelo raspado, olheiras profundas e o sorriso de quem não posa muito convencido para a foto. Evgeniy Mikhailovich Bogachev já saqueou dezenas de bancos, roubou milhares de contas correntes e lançou assaltos em escala planetária. O FBI oferece uma recompensa de três milhões de dólares (9,3 milhões de reais) por sua captura, e dois tribunais dos Estados Unidos o processam por fraude, lavagem de dinheiro, pirataria informática e conspiração. Mais conhecido como Slavic ou lucky12345, é o hacker mais procurado do mundo. Mas ninguém o detém. De nada adiantam as diversas fotos suas conhecidas. Nem saber onde mora e o que faz no tempo livre. Aos 33 anos, Bogachev e seu meio sorriso podem mais que a estrutura judicial e policial da nação mais poderosa do mundo. Slavic se esconde na Rússia, e em dezembro passado foi incluído no grupo sancionado pelo então presidente Barack Obama em conexão com o ciberataque orquestrado pelo Kremlin para prejudicar a campanha eleitoral de Hillary Clinton. Embora a Casa Branca só se referisse a ele como um bandido comum, a ordem, que também afetou quatro altos funcionários do serviço secreto russo, proibiu-o de viajar aos EUA e congelou todas as suas contas. Duas medidas sem efeito para quem fez história fora da lei. Os relatórios do FBI e autos judiciais aos quais o EL PAÍS teve acesso revelam Slavic como um dos hackers mais incisivos de todos os tempos. Ele criou o Cryptolocker, um vírus que bloqueia os computadores e obriga o pagamento de um resgate para a sua liberação. No final de 2013, mais de 234.000 computadores haviam sido infectados. Um golpe com o qual Bogachev arrecadou 27 milhões de dólares (83,7 milhões de reais) em apenas dois meses. Criador do Zeus Mas a sua criatura mais conhecida e reverenciada é o Zeus. Extremamente sofisticado, esse código malicioso nasceu em 2006, quando Bogachev tinha apenas 22 anos. Desde então, com enorme perícia, ele o modificou e melhorou até chegar à versão Gameover. Considerado um dos mais perigosos do planeta, o programa age em duas frentes. Por um lado, rouba os dados bancários e as senhas da máquina que infecta; por outro, sem que o dono saiba, coloca o aparelho a serviço de uma rede oculta (botnet). Produz, assim, um universo de escravos silenciosos que os piratas utilizam livremente para todo tipo de propósitos. “É a rede de programas maliciosos mais avançada que já enfrentamos”, declarou o agente especial encarregado da investigação. Sob o mando de Slavic, essa estrutura chegou a submeter um milhão de computadores (25% deles nos EUA) e se transformou no pior pesadelo já vivido pelo FBI. O troféu superou os 100 milhões de dólares (310 milhões de reais). “Todos os computadores que infectava faziam parte de uma botnet, na qual não apenas roubavam os dados que os usuários introduziam ou tinham gravados, como também usavam a potência desses milhares – ou até mesmo milhões – de computadores infectados e controlados para cometer outros crimes, como ataques de negação de serviço (DDoS) destinados a extorquir as empresas”, diz o especialista David Barroso, fundador da Countercraft. O Kremlin, que embora negue, há anos emprega ciberpiratas para seus fins geopolíticos Após um esforço conjunto internacional, a rede foi desmantelada em 2014. Mas seu criador, sobre o qual pesa a maior recompensa já oferecida a um cibercriminoso, não foi preso. Assim como muitos hackers russos, sua tranquilidade estava garantida longe de Washington. Um relatório de segurança ucraniano indica que Slavic age sob a supervisão de uma unidade especial da espionagem russa. Não é nada extraordinário. O Kremlin, que nunca aceitou tais acusações, há anos emprega ciberpiratas para seus fins geopolíticos. Também fez isso, sempre segundo os informes de inteligência norte-americanos, com o Wikileaks. No ataque cibernético que orquestrou contra Clinton na campanha eleitoral, usou a organização de Julian Assange para difundir material roubado. No caso de Slavic, a própria trajetória e evolução do vírus Zeus o vincula a essas práticas. No apogeu de sua atividade, Bogachev analisava a imensa rede de computadores cativos à sua disposição em busca de informações confidenciais: e-mails de altos funcionários da polícia turca, dados de inteligência da Geórgia, documentos classificados da Ucrânia. “Há tempo, considera-se que Bogachev tenha algum tipo de relação com pessoas próximas dos serviços de inteligência. Inclusive quando a Rússia invadiu a Crimeia, parte dabotnet foi utilizada para buscar informações de vítimas da Ucrânia”, explica Jaime Blasco, especialista em segurança cibernética e chefe científico da Alien Vault. Slavic era e é um pirata, mas não age apenas como tal. Seu objetivo vai além: um território pantanoso do qual pouco se conhece. O Kremlin mantém silêncio, e as autoridades dos EUA evitam dar detalhes sobre os ciberataques a Clinton. Como sempre, a escuridão ampara. Slavic pode continuar sorrindo. UMA VIDA DE LUXO NA COSTA Casado e com uma filha, Evgeniy Mikhailovich Bogachev, codinome Slavic curte a vida como um rei na pequena e portuária cidade de Anapa, no Cáucaso Ocidental. Ali, segundo relatórios policiais, ele coleciona carros de luxo, navega pelo Mar Negro e, quando pode, visita a Crimeia. Slavic tem adoração pelos felinos. Tanto que seu animal de estimação é um gato-de-bengala (fruto do cruzamento entre o gato doméstico e o gato-leopardo) e sua roupa preferida é um pijama com estampa de leopardo. Segundo a inteligência ucraniana, Slavic tem uma frota de automóveis espalhada por toda a Europa só para não ter de alugar nenhum veículo quando está de férias. O hacker costumava passar alguns dias num dos chalés que possuía na França e viajava com um dos três passaportes russos de que dispunha para transitar com liberdade. ElPaís

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A fome em São Paulo; Assombrados pela desnutrição

Comer e viver assombrado pela subnutrição: a fome em São Paulo Mural do artista Paulo Ito em uma rua de São Paulo. ANDRE PENNER AP Idas e vindas de Doria sobre alimento processado joga luz sobre questão na cidade. Especialistas explicam que famílias de baixa renda e moradores em situação de rua convivem com insegurança alimentar, agravada pela crise. Faz seis meses que Ricardo, 33 anos, e Liliane da Silva, 28, decidiram se unir a outras famílias em uma ocupação de um antigo edifício da rua Vitorino Carmilo, no centro de São Paulo. As contas não fechavam. Ela faz bicos de costura e recebe 240 reais do Bolsa Família. Ele trabalha numa padaria — de maneira informal — e recebe 2.000 reais por mês. Mas com o aluguel de 1.000 em um quarto e sala e a pensão de 300 para a ex-mulher de Ricardo, pouco sobrava para sustentar quatro crianças entre um e oito anos. “O aluguel e o gás a gente pagava em dia, mas faltava comida. Às vezes tinha que cortar feijão, carne, tomate…”, conta ele, que há um ano e meio perdeu o emprego em outra padaria — onde ganhava ainda menos, uns 1600 reais — e ficou sem trabalho durante seis meses. Naquela época passaram a comprar só arroz e batata — “o mais barato” — e a depender da ajuda de família e doações de cesta básica. E ainda hoje dependem de que seus quatro filhos tomem café da manhã e almocem nas creches e escola municipais que frequentam diariamente. As dificuldades enfrentadas pela família de Ricardo e Liliane refletem a realidade de milhares de famílias da capital paulista — e do Brasil — que, ainda que se alimentem, vivem assombradas pela fome. Uma realidade que se atenuou nos anos de bonança econômica, o que fez com que o Brasil deixasse o Mapa da Fome da ONU em 2014. Mas que nunca sumiu. “A fome em São Paulo é a insegurança alimentar. Ou seja, aquela pessoa que não tem o que comer em quantidade e qualidade adequada para o seu bom desenvolvimento. Mas isso é fome. É diferente daquela pessoa extremamente desnutrida quase morrendo. Mas uma pessoa que não tem capacidade de se desenvolver é tão sério quanto”, explica a nutricionista Isabel Marçal, gerente da ONG Banco de Alimentos, que recolhe mensalmente cerca de 50 toneladas de comida que ainda está própria para o consumo, mas que não será comercializada, e distribui a entidades como creches e asilos, combatendo o desperdício. “No primeiro caso, quando alguém está quase morrendo, você tem que tomar uma medida emergencial. Já a fome em São Paulo é a fome que incapacita da mesma maneira, mas nem sempre é visível a olho nu”, acrescenta. O debate sobre a fome na capital voltou com força nas últimas semanas, após o prefeito João Doria (PSDB) lançar o programa Alimento Para Todos e prometer distribuir um granulado feito de farinata, uma espécie de farinha composta por alimentos próximos de sua data de validade ou que não seguem os padrões de comercialização. Chegou a anunciar que o produto, que foi batizado pelos críticos do prefeito de “ração humana”, chegaria como complemento alimentar nas refeições dos centros de acolhida de pessoas em situação de rua e, já em outubro, nas merendas de crianças da rede municipal de ensino — o que pegou de surpresa da própria secretaria de Educação e contrariou as regras municipais e federais que regulam a alimentação escolar, segundo noticiou a Folha de S. Paulo. “A alimentação nas escolas paulistanas é reconhecida internacionalmente pela sua qualidade. Se continuar a ser fomentada, com orgânicos e a retirada de produtos industrializados, ela é muito boa. Será que realmente é necessário entrar com o complemento?”, questiona Vivian Zollar, conselheira do Conselho Regional de Nutrição, um dos organismos que criticou a decisão do prefeito. A rejeição foi tanta, e não apenas por parte de especialistas e nutricionistas, que mães com filhos matriculados no ensino público chegaram a se manifestar na avenida Paulista na última quinta-feira. Doria acabou recuando, segundo ele mesmo admitiu nesta quarta-feira para jornalistas. A posição de sua gestão, ele garante, é a de “aguardar”, para não transformar o tema em “uma polêmica interminável”. “Há sempre um cuidado muito grande na área de educação e assistência social. Estamos avaliando com cuidado, mas não haverá nenhuma decisão para que a farinata seja distribuída neste momento”, afirmou. Assegurou, entretanto, que “o produto é bom”. Em coletiva de imprensa, Doria anuncia que a farinata estaria presente na merenda de crianças da rede pública. HELLOISA BALLARINI AFP Flávia Rondão, 38 anos, ficou assustada com a possibilidade de que seu filho Vitor Hugo, de um ano e quatro meses, começasse a comer a farinata na creche, onde fica de 7h30 até 17h30. Ainda mais porque ele nasceu prematuro e possui uma série de restrições alimentares. “A alimentação dele na creche é super controlada, então para mim é uma tranquilidade. Eu economizo com ele estando lá e isso para mim é importante. Quando ele chega eu só faço a janta, ou então ele come um mingau, um miojo, uma bolacha ou toma um leite… E deita e dorme”, conta. Mãe e filho vivem um pequeno quarto no mesmo edifício ocupado do centro, na Vitorino Carmilo, porque pagar as contas ficou impossível. Flávia ganha um salário de 1.200 reais por mês em uma fábrica de produtos para pet shop e viu o aluguel subir de 900 para 1.700 reais no final do ano passado. Ainda que dividisse os gastos com sua madrinha, conta ter passado dificuldades durante uns cinco meses, antes de finalmente decidir ir para a ocupação com as outras famílias. “Já cheguei a não ter o leite do meu filho, cheguei a não ter comida para comer. A gente apertou de um jeito, apertou de outro, porque não queríamos sair de lá. Cortei muita coisa”, explica. Zollar, do Conselho Regional de Nutricionista, explica que uma situação comum nas famílias é a de “fome oculta”. “São indivíduos que até estão com peso adequado ou com excesso de peso, mas por conta da qualidade ruim do que come, acaba tendo carência específica de alguns nutrientes”,

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Por que em 2019 1 kg já não pesará 1 kg

A partir de 2019, 1 kg deixará de ser o que era. Direito de imagemGETTY IMAGESMedidas básicas serão redefinidas pela Conferência Geral sobre Pesos e Medidas (CGPM) em novembro de 2018 Mas por quê? É que o quilo consiste em uma das quatro unidades de medida básicas – juntamente com ampere, kelvin e mol – que serão redefinidas pela Conferência Geral sobre Pesos e Medidas (CGPM) em novembro de 2018, no que representa a maior revisão do Sistema Internacional de Unidades (SI) desde a sua criação em 1960. O objetivo da mudança é relacionar essas unidades a constantes fundamentais e não arbitrárias, como tem sido até agora. A decisão foi tomada na semana passada em uma reunião em Paris, na França. A mudança é de grande importância para pesquisas científicas que exigem um alto nível de precisão em seus cálculos. Imagem criada por computador mostra protótipo utilizado para calcular 1 kg O novo quilograma O novo sistema, que entrará em vigor em maio de 2019, permitirá que os pesquisadores realizem várias experiências para relacionar as unidades de medida com as constantes. Tome, por exemplo, o caso do quilograma. Atualmente, essa unidade de medida é definida por um objeto: um quilograma é a massa de um cilindro de 4 centímetros de platina e irídio fabricado em Londres que é guardado pelo Escritório Internacional de Pesos e Medidas (BIPM em um cofre na França desde 1889. Mas esse quilo original perdeu 50 microgramas em 100 anos. Isso ocorre porque os objetos podem facilmente perder átomos ou absorver moléculas do ar, então usar um para definir uma unidade SI é complicado. Como todas as balanças do mundo são graduadas de acordo com esse quilo original, quando calculam o peso, acabam gerando dados incorretos. Mesmo imperceptíveis na vida cotidiana, essas diferenças mínimas são importantes em cálculos científicos que exigem extrema precisão. A nova unidade, no entanto, será medida com a chamado “balança de Watt”, um instrumento que permite comparar energia mecânica com eletromagnética usando duas experiências separadas. Essa maneira de medir o quilo não muda, como pode acontecer no caso de um objeto físico. Além disso, uma definição baseada em uma constante – não um objeto – resultaria na medida exata do quilo, pelo menos em teoria, disponível para qualquer pessoa em qualquer lugar do planeta e não apenas para aqueles que têm acesso ao quilo original guardado na França. Outras unidades A maneira de definir o ampere (unidade de corrente elétrica) também mudará. Passará a ser medido com uma bomba de elétrons que gera uma corrente mensurável, na qual os elétrons individuais podem ser contados. O kelvin (unidade de temperatura) será definido a partir do novo sistema com termometria acústica. A técnica permite determinar a velocidade do som em uma esfera cheia de gás a uma temperatura fixa. O mol, a unidade usada para medir a quantidade de matéria microscópica, é atualmente definido como a quantidade de matéria de um sistema que contém tantas partículas quantos átomos existem em 0,012 kg de carbono-12. No futuro, será redefinido como a quantidade precisa de átomos em uma esfera perfeita de silício puro -28.

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