‘Nunca haverá um novo PT’, diz especialista americana Reforma que mudasse o nome do partido ou criasse ramificações o tornaria “irreconhecível” e “igual aos outros”, diz Hunter Direito de imagemEPA O lugar do Partido dos Trabalhadores na política brasileira não será ocupado após os escândalos de corrupção envolvendo o partido. Nem o próprio PT pode retomá-lo, nem esse espaço se apresenta viável a outras siglas nesse momento. É o que diz Wendy Hunter, professora da Universidade do Texas e especialista em política da América Latina. “Os elementos que formaram o PT – a organização durante a Ditadura, a relação única com suas raízes, o líder carismático, a oposição ao neoliberalismo durante os anos 1990 – dificilmente se reunirão em um só partido novamente”, afirma à BBC Brasil. “Pode haver partidos surgindo com líderes populares, mas o PT precisou de três décadas para criar a organização que criou.” De olho nos acontecimentos recentes no país, Hunter falou à BBC Brasil por e-mail, durante as férias, no Quênia. Autora do livro The Transformation of the Workers’ Party in Brazil, 1989-2009 (A Transformação do Partido dos Trabalhadores no Brasil, em tradução livre), ela diz que uma reforma completa do PT neste momento só poderia ocorrer com o partido fora do poder. Em sua opinião, caso Lula vença o pleito de 2018, isso não ocorreria, portanto. Hunter analisa que a falta de uma agenda econômica que ofereça respostas factíveis à crise econômica e da adoção de temas que possam galvanizar apoio entre eleitores descrentes são dois fatores que aprofundam as dificuldades eleitorais do partido e da esquerda em todo o continente. “O discurso da redistribuição de riqueza não pode se concretizar realmente em meio à crise econômica”, afirma. Confira os principais trechos da entrevista: BBC Brasil – Qual a Sra acha que será o impacto da condenação de Lula para o PT – mesmo que ela não necessariamente signifique prisão para o ex-presidente? Wendy Hunter – Não tenho dúvidas de que vai prejudicar o PT eleitoralmente, num momento em que o partido já está sofrendo com o sentimento de antipetismo. Dilma (Rousseff) venceu a eleição em 2014 por uma margem pequena, e isso aconteceu quando a economia estava melhor e quando as acusações envolvendo os políticos do PT ainda não estavam tão avançadas. Agora, qualquer pessoa que votava no PT tem razões para estar contra o partido. BBC Brasil – Mesmo com a continuação do tumulto político no Brasil, tanto os movimentos de esquerda quanto os de direita têm tido dificuldades de convocar pessoas para as ruas, como vinham fazendo nos últimos anos. O PT, por exemplo, ainda não conseguiu organizar um protesto expressivo após a condenação de Lula. O que isso diz sobre o estado do discurso político no país? Wendy Hunter – Não é só um sinal de como está o humor político do país em geral, mas também uma prova de que os militantes do PT não vão conseguir salvar o dia dessa vez. A base do PT não é o que costumava ser, nem o apoio periférico ao partido. O PT conseguiu tantos cargos majoritários (presidente, governadores, prefeitos em cidades com mais de 200 mil habitantes) não só por causa de sua base, mas porque o partido conseguiu conquistar eleitores e apoiadores esporádicos. Estes também estão diminuindo rapidamente. Segundo pesquisadora, esforços para voltar politicamente não costumam funcionar para líderes latino-americanos BBC Brasil – Pode haver um novo Partido dos Trabalhadores no Brasil? Quem seria o candidato mais provável para ocupar este lugar? Wendy Hunter – Nunca haverá um “novo PT”. Não há nenhum partido agora que consiga ocupar este lugar, com a mesma capilaridade de rede que o PT conseguiu construir no país. Pode haver partidos surgindo com líderes populares, mas o PT precisou de três décadas para criar a organização que criou. Nenhum outro partido tem este nível de organização e nenhum outro pode construi-la em pouco tempo. Os elementos que formaram o PT – a organização durante a Ditadura, a relação única com suas raízes, o líder carismático, a oposição ao neoliberalismo durante os anos 1990 – dificilmente se reunirão em um só partido novamente. BBC Brasil – É possível que o PT passe por uma reforma ou mesmo mude de nome para “recomeçar” depois destes escândalos? Wendy Hunter – Uma reforma completa será difícil, mas só pode acontecer se o PT estiver fora do poder. Se um grupo de petistas se ramificar e começar um novo partido, isso mostraria que o PT se normalizou completamente, já que essa é a história de tantos outros partidos brasileiros – que não deixaram suas raízes de uma maneira orgânica, mas só se separaram de outros grupos de elite. Pense em todos os outros partidos que seguiram o mesmo caminho: PFL (atual DEM), PSDB, etc. BBC Brasil – Qual, na sua opinião, será o futuro da esquerda no Brasil? Wendy Hunter – Entre outras coisas, não é um bom momento para a esquerda porque o discurso da redistribuição de riqueza não pode se concretizar realmente em meio à crise econômica. Por exemplo, o aumento do salário mínimo que aconteceu durante a administração do PT não pode mais ocorrer. E as pessoas esperam mais (do governo), já que nos últimos anos elas tiveram melhoras. A famosa classe C não vai ficar contente com sua posição atual. Estudos psicológicos mostram que as pessoas se acomodam rapidamente a seus ganhos, movem sua referência para uma posição mais alta e esperam mais. A esquerda não vai conseguir entregar isso. Nem a direita, mas isso é outra história – a direita pode tentar entregar isso ou prometer isso em campanhas focando em assuntos como segurança pessoal, por exemplo. Uma das principais “questões unânimes” que o PT usou bem foi a da transparência e governo honesto. Muitos eleitores de classe média votaram no partido por isso. Agora é bem mais difícil acreditar nisso. O ambientalismo pode ser outra dessas ideias, mas não deve atrair muitos eleitores que estão tendo dificuldade de colocar comida na mesa. A segurança pessoal, outro assunto forte, não é um