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T.S.Eliot – Poesia – Poemas

A canção de amor de J. Alfred Prufrock – Parte I T.S.Eliot¹ S’io credesse che mia risposta fosse A persona che mai tornasse al mondo, Questa fiamma staria senza piu scosse. Ma perciocche giammai di questo fondo Non torno vivo alcun, s’i’odo il vero, Senza tema d’infamia ti rispondo. Dante Alighieri. Ladivina Commédia Inferno, XXVII, 61-66 (N. do T.)² Sigamos então, tu e eu, Enquanto o poente no céu se estende Como um paciente anestesiado sobre a mesa; Sigamos por certas ruas quase ermas, Através dos sussurrantes refúgios De noites indormidas em hotéis baratos, Ao lado de botequins onde a serragem Às conchas das ostras se entrelaça: Ruas que se alongam como um tedioso argumento Cujo insidioso intento É atrair-te a uma angustiante questão . . . Oh, não perguntes: “Qual?” Sigamos a cumprir nossa visita. No saguão as mulheres vêm e vão A falar de Miguel Ângelo. A fulva neblina que roça na vidraça suas espáduas, A fumaça amarela que na vidraça seu focinho esfrega E cuja língua resvala nas esquinas do crepúsculo, Pousou sobre as poças aninhadas na sarjeta, Deixou cair sobre seu dorso a fuligem das chaminés, Deslizou furtiva no terraço, um repentino salto alçou, E ao perceber que era uma tenra noite de outubro Tradução Ivan Junqueira * Nuneaton, Reino Unido – 22 de novembro de 1819 + Chelsea, Londres, Reino Unido – 22 de dezembro de 1880 [ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”] ² O poema  “The Love Song of J. Alfred Prufrock”, consta de seu primeiro livro de versos, editado em 1917, Prufrock and Other Observations. Havia aparecido anteriormente na revista Poetry, em 1915. Prufrock, representa, talvez, o jovem Eliot da época em que freqüentava Harvard e a sociedade de Boston que descreveu como sendo “civilizada para além dos limites da civilização”. O poema, de fato, descreve o drama de um membro dessa sociedade, Prufrock. Através de um monólogo que mantém consigo mesmo, em que especula as conseqüências da consuma- ção de um amor que, devido à sua ultra-sensibilidade, jamais conseguirá declarar (o poema é ironicamente intitulado uma canção de amor), ele nos revela a futilidade e o vazio dessa sociedade sem fé, sem objetivo, extremamente artificial e sofisticada. Prufrock compreende e interpreta a sociedade (várias alusões a Dante e à Divina Comédia esclarecem que ela está no Inferno em vida), mas não consegue, nem conseguirá jamais agir de maneira diferente, porque éle pertence integralmente a esse mundo perdido. A única salvação está em voltar para perto do mar, jogar-se nele, purificar-se, mas como Prufrock não pode na realidade viver sem ouvir as vozes humanas, êle afoga-se. Nenhuma dessas idéias está implícita no poema. Revelamse através de imagens que descrevem o aspecto desolador do ambiente, justapostas à conversa fútil das senhoras que falam a respeito de Miguel Ângelo, mas que jamais conseguirão compreender o alcance da obra daquele que foi o maior espírito criador da Renascença, uma época de grandes conquistas espirituais que contrasta extraordinariamente com a nossa, vazia e estéril: “como um paciente anestesiado sobre a mesa”. Por todo o poema encontramos alusões à literatura universal e, em especial, aos grandes poetas, tais como Hesíodo, Dante, Marvel, Shakespeare, assim como referências a passagens da Bíblia. Essas referências servem para elucidar, ou colocar em confronto os acontecimentos do poema, com trechos dramáticos de obras da literatura universal (cf. Notas). Resta-nos dizer algo acerca das metáforas no poema. Em um ensaio a respeito de Hamlet, Eliot declara que nenhuma emoção pode ser expressa suficientemente bem em literatura sem o “objective correlative” que êle define como sendo — “uma série de objetos, uma situação, uma cadeia de acontecimentos, que constituirão a fórmula dessa emoção; de maneira que, quando os fatos externos são apresentados, a emoção é imediatamente evocada” (1). Por exemplo, nos versos 62 a 74, Prufrock não diz que tem medo de relações físicas, que também receia uma vida destituída delas ou que desejaria nunca ter nascido. E’ muito mais eficaz, quando descreve quase amorosamente “braços enfeitados, nus e brancos”, mas logo se lembra de que, “na claridade”, são “cobertos por cabelos loiros”. Desculpa-se por ter chegado a pensar no amor, mas lamentase, dizendo que já viu homens sozinhos em mangas de camisa, debruçados nas janelas. Logo depois, incapaz de chegar a uma conclusão, grita: “Deveria ter sido um par de garras escabrosas / Rastejando pelos fundos de águas silenciosas”. As imagens, que à primeira vista parecem desconexas, quando tentamos justapô-las, intensificam enormemente a emoção.

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Tecnologia,super humanos e idiotas

Tecnologia pode criar elite de super-humanos e massa de ‘inúteis’, diz autor de best-seller O israelense Yuval Harari investiga a relação entre história e biologia, as diferenças essenciais entre o ser humano e outros animais e o rumo da história humana Os avanços em tecnologia, genética e inteligência artificial podem transformar a desigualdade econômica em desigualdade biológica? O autor e historiador Yuval Noah Harari se fez essa pergunta.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”] Professor de História na Universidade Hebraica de Jerusalém, ele estuda o passado para olhar para o futuro. Autor de dois best-sellers, Sapiens: Uma breve história da humanidade (editora L&PM)e Homo Deus: Uma breve história do amanhã (editora Companhia das Letras), Harari foi entrevistado pelo programa The Inquiry, da BBC, sobre a possibilidade de a tecnologia alterar o mundo e a espécie humana. Leia o depoimento do professor à BBC: “A desigualdade existe há no mínimo 30 mil anos. Os caçadores-coletores eram mais igualitários do que as sociedades subsequentes. Eles tinham poucas propriedades, e propriedade é um pré-requisito para desigualdade de longo prazo. Mas até eles tinham hierarquias. Nos séculos 19 e 20, porém, algo mudou. Igualdade tornou-se um valor dominante na cultura humana em quase todo o mundo. Por quê? Foi em parte devido à ascensão de novas ideologias como o humanismo, o liberalismo e o socialismo. Mas também se tratava de mudanças tecnológicas e econômicas – que estavam ligadas a essas novas ideologias, claro. De repente, a elite começou a precisar de um grande número de pessoas saudáveis e educadas para servir como soldados nos exércitos e como trabalhadores nas fábricas. Os governos não forneciam educação e vacinação porque eram bondosos. Eles precisavam que as massas fossem úteis. Mas agora isso está mudando novamente. Engenharia genética é hoje disseminada. Até onde ela poderá evoluir? Direito de imagem GETTY IMAGES Os melhores exércitos da atualidade demandam poucos soldados, mas altamente treinados e com equipamentos de alta tecnologia. As fábricas também estão cada vez mais automatizadas. Esse é um dos motivos pelos quais poderemos – num futuro não tão distante – ver a criação das sociedades mais desiguais que já existiram na história humana. E há outros motivos para temer esse futuro. Com rápidos avanços em biotecnologia e bioengenharia, nós podemos chegar a um ponto em que, pela primeira vez na história, desigualdade econômica se torne desigualdade biológica. Até agora, humanos tinham controle sobre o mundo ao seu redor. Eles podiam controlar rios, florestas, animais e plantas. Mas eles tinham muito pouco controle do mundo dentro deles. Eles tinham capacidade limitada de manipular seus próprios corpos, cérebros e mentes. Eles não podiam evitar a morte. Talvez esse não seja sempre o caso. Inteligência artificial está sendo vista como uma ameaça a levas de empregos humanos – Direito de imagem GETTY IMAGES Há duas maneiras principais de aprimorar humanos: ou você altera algo em sua estrutura biológica por meio de alteração de seu DNA, ou – o jeito mais radical – você combina partes orgânicas e inorgânicas, talvez conectando diretamente cérebros e computadores. Os ricos – ao adquirir tais melhorias biológicas – poderiam se tornar literalmente melhores que os demais: mais inteligentes, saudáveis e com vidas mais longas. Nesse ponto, será facil que essa classe “aprimorada” tenha poder. Pense desta forma: no passado, a nobreza tentou convencer as massas que eles eram superiores a todos os outros e que deveriam deter o poder. No futuro que estou descrevendo, eles realmente serão superiores às massas. E como eles serão melhores que nós, fará mais sentido ceder a eles o poder e a prerrogativa de tomada de decisões. Poderiam aqueles que controlam dados e algoritmos tornar-se a superclasse do futuro? – Direito de imagem GETTY IMAGES Podemos também constatar que a ascensão da inteligência artificial – e não apenas automação – pode significar que grandes contingentes de pessoas, em todos os tipos de emprego, simplesmente perderão sua utilidade econômica. Os dois processos casados – aprimoramento humano e ascensão de inteligência artificial – podem resultar na separação da humanidade em uma pequena classe de super-humanos e uma gigantesca subclasse de pessoas “inúteis”. Eis um exemplo concreto: pense no mercado de transporte. Há centenas de motoristas de caminhões, táxis e ônibus no Reino Unido. Cada um deles comanda uma pequena parte do mercado de transporte, e todos ganham poder político em função disso. Eles podem se sindicalizar e, se o governo faz algo que não gostam, eles podem fazer uma greve e travar todo o sistema. Agora, avance 30 anos no tempo. Todos os veículos conduzem a si próprios e uma corporação controla o algoritmo que comanda todo o mercado de transporte. Todo o poder econômico e político previamente compartilhado por milhares agora está nas mãos de uma única corporação. Ricos, diz autor, poderiam adquirir melhorias biológicas e se tornar literalmente melhores que os demais: mais inteligentes, saudáveis e longevos – Direito de imagem GETTY IMAGES Depois que você perde sua importância econômica, o Estado perde ao menos um pouco do incentivo de investir em saúde, educação e bem-estar. Seu futuro dependeria da boa vontade de uma pequena elite. Talvez haja boa vontade mas, em tempo de de crise – como uma catástrofe climática -, seria muito fácil te descartar. Tecnologia não é determinista. Ainda podemos fazer algo para lidar com tudo isso. Mas acho que deveríamos estar cientes de que descrevo um futuro possível. Se não gostamos dessa possibilidade, precisamos agir antes que seja tarde. Existe mais um passo possível no caminho rumo à desigualdade previamente inimaginável. A curto prazo, a autoridade pode se centrar em uma pequena elite que detenha e controle os algoritmos e os dados que os alimentam. A longo prazo, porém, a autoridade poderá se transferir completamente dos humanos aos algoritmos. Quando uma inteligência artificial for mais inteligente que nós, toda a humanidade poderá se tornar inútil. O que aconteceria depois disso? Não temos nenhuma ideia – literalmente não podemos imaginar. Como poderíamos? Estamos falando de uma inteligência muito maior do que a que a humanidade possui.”

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