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Cecília Meireles – Versos na tarde – 15/02/2017

Cenário Cecília Benevides de Carvalho Meireles¹ Passei por essas plácidas colinas e vi das nuvens, silencioso, o gado padecer nas solidões esmeraldinas. Largos rios de corpo sossegado dormiam sobre a tarde, imensamente, — e eram sonhos sem fim, de cada lado. Entre nuvens, colinas e torrente, uma angústia de amor estremecia a deserta amplidão na minha frente. Que vento, que cavalo, que bravia saudade me arrastava a esse deserto, me obrigava a adorar o que sofria? Passei por entre as grotas negras, perto dos arroios fanados, do cascalho cujo ouro já foi todo descoberto. As mesmas salas deram-me agasalho onde a face brilhou de homens antigos, iluminada por aflito orvalho. De coração votado a iguais perigos vivendo as mesmas dores e esperanças, a voz ouvi de amigos e inimigos Vencendo o tempo, fértil em mudanças, conversei com doçura as mesmas fontes, e vi serem comuns nossas lembranças. Da brenha tenebrosa aos curvos montes, do quebrado almocafre aos anjos de ouro que o céu sustêm nos longos horizontes, tudo me fala e entende do tesouro arrancado a estas Minas enganosas, com sangue sobre a espada, a cruz e o louro. Tudo me fala e entendo: escuto as rosas e os girassóis destes jardins, que um dia foram terras e areias dolorosas, por onde o passo da ambição rugia; por onde se arrastava, esquartejado, o mártir sem direito de agonia. Escuto os alicerces que o passado tingiu de incêndio: a voz dessas ruínas de muros de ouro em fogo evaporado. Altas capelas cantam-me divinas fábulas. Torres, santos e cruzeiros apontam-me altitudes e neblinas. Ó pontes sobre os córregos! ó vasta desolação de ermas, estéreis serras que o sol frequenta e a ventania gasta! Armado pó que finge eternidade, lavra imagens de santos e profetas cuja voz silenciosa nos persuade. E recompunha as coisas incompletas: figuras inocentes, vis, atrozes, vigários, coronéis, ministros, poetas. Retrocedem os tempos tão velozes que ultramarinos árcades pastores falam de Ninfas e Metamorfoses. E percebo os suspiros dos amores quando por esses prados florescentes se ergueram duros punhos agressores. Aqui tiniram ferros de correntes; pisaram por ali tristes cavalos. E enamorados olhos refulgentes — parado o coração por escutá-los prantearam nesse pânico de auroras densas de brumas e gementes galos. Isabéis, Dorotéias, Heliodoras, ao longo desses vales, desses rios, viram as suas mais douradas horas em vasto furacão de desvarios vacilar como em caules de altas velas cálida luz de trêmulos pavios. Minha sorte se inclina junto àquelas vagas sombras da triste madrugada, fluidos perfis de donas e donzelas. Tudo em redor é tanta coisa e é nada: Nise, Anarda, Marília… — quem procuro? Quem responde a essa póstuma chamada? Que mensageiro chega, humilde e obscuro? Que cartas se abrem? Quem reza ou pragueja? Quem foge? Entre que sombras me aventuro? Quem soube cada santo em cada igreja? A memória é também pálida e morta sobre a qual nosso amor saudoso adeja. O passado não abre a sua porta e não pode entender a nossa pena. Mas, nos campos sem fim que o sonho corta, vejo uma forma no ar subir serena: vaga forma, do tempo desprendida. É a mão do Alferes, que de longe acena. Eloquência da simples despedida: “Adeus! que trabalhar vou para todos!…” (Esse adeus estremece a minha vida.) ¹Cecília Benevides de Carvalho Meireles * Rio de Janeiro, Brasil – 7 de Novembro de 1901 + Rio de Janeiro, Brasil – 9 de Novembro de 1964 [ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]

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Macri e Bachelet aproximam o Mercosul e a Aliança do Pacífico em resposta a Trump

Os dois presidentes promovem uma grande reunião para coordenar os dois principais grupos latino-americano. Bachelet e Macri em Colina, no Chile, durante a comemoração do 200º aniversário da batalha de Chacabuco. PRESIDÊNCIA A chegada de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos está provocando um grande movimento de fundo em toda a América Latina. E Mauricio Macri, presidente da Argentina, parece estar no centro desse impulso. Na semana passada, viajou para Brasília e afirmou, com Michel Temer a seu lado, que os dois gigantes sul-americanos dariam um “impulso histórico” ao Mercosul.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”] Na próxima semana irá à Espanha para, entre outras coisas, acelerar o acordo UE-Mercosul que está parado há 15 anos. Mariano Rajoy – presidente do Governo espanhol – está muito disposto a apoiá-lo nessa tarefa. E na noite de domingo, para finalizar a jogada, Macri foi a Colina, perto de Santiago do Chile, para se encontrar com Michelle Bachelet e lançar a aproximação entre o Mercosul e a Aliança do Pacífico, o outro grande bloco econômico da América Latina liderado por México, Colômbia, Peru e Chile. Enquanto os Kirchner estavam à frente da Argentina e o Partido dos Trabalhadores governava o Brasil, Mercosul e Aliança do Pacífico se olhavam com cautela. O segundo grupo era a estrela em ascensão da ortodoxia e do livre comércio contra o Mercosul mais protecionista. Mas a chegada de Macri, e mais recentemente de Temer, mudou as coisas. O argentino já assistiu como observador a última cúpula, precisamente no Chile, onde foi a grande estrela com o peruano Pedro Pablo Kuczynski, que ainda não tinha assumido, e anunciou sua intenção de fortalecer os laços. A chegada de Trump acelerou os tempos e todos os países da América Latina, que em boa medida vivem da exportação de matérias-primas, buscam alternativas caso Trump cumpra suas promessas e comece a fechar suas fronteiras aos produtos de outros territórios. Macri e Bachelet, que neste momento presidem as duas alianças centrais da América Latina, organizaram para abril uma reunião em Buenos Aires de chanceleres do Mercosul e da Aliança do Pacífico que será um marco e poderia abrir caminho para uma fusão no futuro. Ainda persistem muitas dificuldades pelas diferentes políticas econômicas – o Chile tem acordos de livre comércio com 180 países do mundo, algo semelhante acontece no Peru e na Colômbia, Argentina e Brasil são duas economias muito fechadas e os argentinos viajam a Santiago para comprar roupas mais baratas em redes internacionais, como H&M, que nunca se instalou em Buenos Aires – mas a vontade política de aproximação é muito evidente e a mudança ideológica na Argentina e no Brasil também. Ninguém quer enfrentar diretamente Trump e, na verdade, Macri busca formalmente um bom relacionamento. Esta semana manteve conversas com o vice-presidente Michael Pence. Mas a preocupação é evidente. A América Latina está em pleno giro para a abertura e Trump vai na direção oposta. A declaração conjunta deixa clara a rejeição às políticas dos EUA: “As tendências protecionistas observadas internacionalmente contradizem o esforço para alcançar um crescimento sustentável e o desenvolvimento inclusivo”. O Mercosul acaba de eliminar a única oposição real a essa aproximação com a mais liberal Aliança do Pacífico: a Venezuela de Nicolás Maduro foi suspensa do grupo com o apoio de Temer e Macri, embora o maior promotor de sua expulsão tenha sido o conservador paraguaio Horacio Cartes. Macri e Bachelet se encontraram no Chile por uma questão especialmente simbólica: a comemoração dos 200 anos da travessia dos Andes de General San Martín, que primeiro liderou a liberação de Argentina e depois do Chile com uma ousada operação militar através de uma das cordilheiras mais altas do planeta. Em Colina, onde aconteceu a batalha chave de Chacabuco, Bachelet lançou uma mensagem de unidade contra Trump: “Nos dias em que o planeta vive segregação, xenofobia e protecionismo, Chile e Argentina iniciam um caminho de colaboração”, concluiu. Argentina e Chile são dois vizinhos com relações às vezes complicadas – tiveram disputas no passado pelos territórios na Patagônia – e com dois modelos econômicos quase opostos: o chileno, herdeiro de Pinochet, é muito liberal, com educação universitária pública paga – Bachelet está tendo dificuldades para cumprir sua promessa de aumentar a gratuidade –, aposentadorias privadas e sindicatos fracos. A Argentina tem ensino superior gratuito e aposentadorias públicas e sindicatos onipresentes. O Chile teve uma inflação de 3% em 2016 e a Argentina, de 40%. Mas ambos estão se aproximando gradualmente – o Chile aumenta lentamente o peso do Estado enquanto a Argentina reduz e inicia uma lenta abertura – e deram início a uma nova fase de aproximação. A chegada de Trump está fazendo com que o resto do mundo se una para combater o protecionismo. ElPais

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Sob as barbas de Marx – Cinema

Exibido pela primeira vez no Festival de Cinema de Berlim, filme “O jovem Karl Marx” mostra o curto, mas intenso período que antecedeu à publicação do Manifesto Comunista no ano de 1848. Jovens querem mudar o mundo: Marx (August Diehl, dir.) ao lado de Friedrich Engels (Stefan Konarske) A barba tem de ser cortada, ao menos simbolicamente. Essa foi uma exigência do diretor haitiano Raoul Peck. E a barba em questão é a de Karl Marx. Peck é o diretor de O jovem Karl Marx, filme sobre a juventude do filósofo alemão cuja estreia mundial aconteceu no último domingo (12/02) na 67ª Berlinale, o Festival de Cinema de Berlim.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”] “A velha barba encobre não somente o rosto de Marx. No ano de 2017, ela também obscurece a possibilidade de uma discussão e uma reflexão cuidadosa”, diz Peck, para quem, diante da arrebatadora barba de Karl Marx, esqueceu-se do cerne de sua mensagem. “Isso impede de descobrir a real contribuição deste pensador científico e político, seu extraordinário poder de análise, seus esforços humanísticos, suas preocupações legítimas.” Briga entre esquerdistas: sociais-democratas, socialistas e comunistas em “O jovem Karl Marx” No filme, Peck mostra o curto, mas intenso período que antecedeu à publicação do Manifesto Comunista no ano de 1848. Na época, com pouco mais de 20 anos, Marx conheceu em Paris Friedrich Engels, o filho de um industrial de Wuppertal, que trazia consigo uma rica experiência da Inglaterra. Em Manchester, seu pai tinha uma tecelagem. Marx e Engels ficaram amigos. Junto a Jenny, esposa de Karl Marx, os jovens desenvolveram o Manifesto Comunista. O texto deveria reunir tudo o que os três consideravam importante observar numa época de grandes mudanças sociais. “O filme acompanha a juventude de Marx e Engels, delineia a amizade inabalável entre os dois e mostra como um trio único nasce a partir das dificuldades que eles viveram durante a sua turbulenta juventude”, descreve Peck a sua obra. O diretor recriou a atmosfera do período febril da industrialização na Europa dos anos 1840: “Fábricas da indústria pesada na Inglaterra, a miséria extrema e a sujeira nas ruas de Manchester e, em contraste, o calor dourado dos palácios parisienses, a energia de uma juventude que quer mudar o mundo.” Jenny Marx (Vicky Krieps) coescreveu o “Manifesto Comunista”, ao lado de Marx e Engels Paris e Manchester como cenários Peck rodou um filme histórico. Karl Marx é interpretado pelo ator alemão August Diehl; Friedrich Engels, por Stefan Konarske, e Jenny Marx, por Vicky Krieps. A Paris do século 19, como também a tecelagem na Inglaterra, servem de cenário para um filme encenado de forma um pouco antiquada, em estilo televisivo excessivamente impecável. De qualquer forma, talvez o tema do filme seja mais importante que experimentos estéticos e a cinematografia. No 100° aniversário da Revolução Russa e num mundo vivendo um período entre a globalização e novos pensamentos nacionalistas, ocupar-se de Marx vem na hora certa. Mesmo sob a forma de um filme de apelo popular, que mostra a um grande público como se chegou ao famoso manifesto. Após a estreia no 67° Festival de Cinema de Berlim, na série Berlinale Special, o filme de Raoul Peck poderá ser visto na Alemanha a partir do início de março. No Brasil, a estreia nos cinemas está prevista para meados de junho.

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Temer, Renan e Lava Jato

Da série “Você sabe que…quando…” 1. Temer, o minúsculo, em rede de TV dá ênfase que só afastará ministro enroscado na Lava-Jato.E daí? 2. Renan Bandalheiros está respondendo à quatro inquéritos, mas nenhum na Lava-Jato. 3. Renan poderá receber durante o carnaval, a fantasia de Ministro da Justiça enquanto o povo samba. PS. Espero confirmação do meu drone bípede do Planalto, dessa quarta-feira de cinzas.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]

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