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Conheça Verónika Mendoza, a candidata da esquerda que defende o fim do ciclo neoliberal no Peru

Entre as propostas defendidas pela candidata franco-peruana para o país estão mudar a Constituição neoliberal de 1993 e implementar reformas econômicas e sociais de caráter progressista, com maior presença do Estado na economia. Agência Efe Entre as propostas defendidas pela candidata franco-peruana para o país estão mudar a Constituição neoliberal de 1993 e implementar reformas econômicas e sociais de caráter progressista, com maior presença do Estado na economia Se Verónika Mendoza, nascida em 9 de dezembro de 1980, fosse um mês mais nova, teria que esperar até 2021 para se candidatar à presidência do Peru por não cumprir a idade mínima legal para postular a vaga. Ela cumpriu os 35 anos exigidos apenas um mês antes de vencer o prazo de inscrição no JNE (Júri Nacional de Eleições), após ganhar as prévias, na qual venceu, inclusive, o ex-sacerdote Marco Arana, líder do Terra e Liberdade, principal partido da coalização Frente Ampla.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Se cumprir o objetivo de ganhar a disputa pela Presidência do Peru, Verónika Mendoza será a chefe de Estado mais jovem da história do país, recorde mantido atualmente por um de seus rivais, o neoliberal Alan García, que chegou ao cargo em 1985, quando ela tinha cinco anos. Verónika fez uma campanha de poucos recursos e surpreendeu ao vencer as prévias da Frente Ampla Entre as propostas defendidas por ela para o Peru estão mudar a Constituição neoliberal de 1993 e implementar reformas econômicas e sociais de caráter progressista, com maior presença do Estado na economia, poder de decisão sobre a exploração dos recursos naturais, luta contra a corrupção e maior participação cidadã na política. Leia também sobre as eleições no Peru: Ollanta Humala traiu projeto nacionalista, diz candidata de esquerda à Presidência do Peru Verónika Mendoza, da Frente Ampla, é a candidata em ascensão na disputa presidencial peruana A arremetida de Verónika Mendoza Entrevista: Candidata da esquerda à presidência do Peru é alvo de guerra suja dos meios de comunicação, diz deputado Duas mulheres disputam as eleições no Peru Feridas da ditadura Fujimori voltam a sangrar no Peru O Peru na reta final das eleições Nascida na cidade de Cusco — histórica capital do império Inca —, filha de mãe francesa, Gabrielle Frisch, e pai peruano, Marcelino Mendoza, tem ambas as nacionalidades. Estudou Psicologia, Educação e Antropologia na França e, como escreveu em uma autobiografia de 2011, a permanência em Paris “não só contribuiu com minha formação acadêmica, mas também e principalmente com a minha consciência política”. Surpreendentemente, foi no país europeu que Mendoza aprendeu a falar quéchua. Peru: A um mês da eleição presidencial, Justiça impugna 2 candidatos; Fujimori é beneficiada Para ativistas, leis antiterrorismo criadas por pressão internacional criminalizam movimentos sociais na América Latina Justiça decide pela manutenção de Keiko Fujimori nas eleições presidenciais do Peru “A vida política dinâmica e associativa francesa me enriqueceu muito e assim compreendi que sem lutas não há vitórias, que o bem-estar social nunca é um presente das elites, mas uma conquista do povo organizado”, escreveu em sua autobiografia. “Apropriei-me da história política de meus pais: meu pai foi militante da Esquerda Unida e fundador do SUTEP (sindicato dos professores); minha mãe foi militante do Partido Socialista Unificado Francês e partícipe da revolução cultural, social e política de Maio de 1968”, contou. Em 2004, se integrou na França a um núcleo de peruanos em apoio ao nascente Partido Nacionalista, do hoje presidente Ollanta Humala, no qual desempenhou diversas funções no âmbito das relações internacionais. Em 2011 foi eleita parlamentar, representando Cusco. Agência Efe Apoiadores de Verónika no encerramento de campanha realizado na última quinta-feira (07/04) em Lima Entretanto, em junho de 2012 renunciou ao Partido Nacionalista por divergências políticas, devido à repressão de um protesto ambientalista dos moradores da província cusquenha de Espinar. Ela se integrou à bancada da coalizão parlamentar Frente Ampla-Ação Popular, que faz oposição a Humala. Já em 2015, formou o grupo Sembrar, que a promoveu na eleição interna para a candidatura da Frente Ampla à presidência, ganhando de forma inesperada, pois o favorito era o ex-sacerdote Arana. Com uma campanha modesta, percorreu o país e recebeu, no trecho final da disputa, um apoio crescente. Segundo dados do Instituto Datum divulgados em 2 de abril, oito dias antes das eleições, Verónika tem 14,8% das intenções de voto e está tecnicamente empatada com Pedro Pablo Kuczynski (do “Peruanos por el Kambio”), com chances reais de disputar o segundo turno com Keiko Fujimori — filha do ex-ditador Alberto Fujimori —, que lidera as pesquisas com 36,1% de preferência dos eleitores.   Texto publicado originalmente pela Prensa Latina

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Panama Papers: Protesto em Londres pede renúncia de David Cameron por envolvimento nos ‘Panama Papers’

Cerca de 5.000 pessoas se dirigiram a hotel onde primeiro-ministro britânico estava reunido com membros do Partido Conservador neste sábado (09/04) Milhares de pessoas protestaram em Londres, neste sábado (09/04), pedindo a renúncia do primeiro-ministro britânico, David Cameron, que admitiu nesta semana ter se beneficiado das empresas offshore de seu pai, como revelaram os “Panama Papers”. Manifestantes gritavam palavras de ordem contra o primeiro-ministro durante protesto neste sábado (09/04) nas ruas de Londres[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Sob o lema “termine as evasões fiscais ou renuncie”, a manifestação teve a participação de 5.000 pessoas, segundo a imprensa local, que se concentraram em frente ao número 10 de Downing Street, a residência oficial do premiê. Os manifestantes gritavam palavras de ordem contra o primeiro-ministro, e alguns usavam chapéus panamá e camisas havaianas em referência aos “Panama Papers”. O protesto foi convocado por diferentes organizações, dentre elas a chamada Assembleia do Povo, formada por partidos de esquerda e sindicatos para combater as medidas de austeridade. Macri diz que se apresentará à Justiça argentina para esclarecer participação em offshores Para incentivar turismo, Suécia cria número de telefone para estrangeiros conversarem com sueco aleatório Após ‘Panama Papers’, aprovação de Cameron já é menor do que a de Corbyn, líder da oposição Em entrevista à Agência Efe, o secretário da Assembleia do Povo, Sam Fairbairn, disse que Cameron e os conservadores formam um “governo de ricos”. Além disso, afirmou que as autoridades são as responsáveis por problemas como no setor do aço do Reino Unido e pelas greves dos médicos residentes. Recentemente a empresa siderúrgica Tata Steel comunicou que deverá fechar seu negócio britânico, o que causará a perda de postos de trabalho, enquanto os profissionais da saúde convocaram greves para protestar contra mudanças contratuais que o governo pretende impor. Da residência oficial, os manifestantes se dirigiram ao hotel onde Cameron estava reunido em um fórum com membros do Partido Conservador em Londres. “Culpem a mim” No encontro com delegados do seu partido, Cameron disse que não lidou de maneira adequada com a informação revelada pelos “Panama Papers” sobre sua participação em empresas offshores de propriedade de seu pai, Ian Cameron. “Não foi uma grande semana”, disse. Cameron assumiu a responsabilidade pelo caso e afirmou que há lições para aprender a partir do episódio. “Sei que há lições a aprender e aprenderei. Não culpem o número 10 de Downing Street [sua residência oficial] ou assessores sem nome, culpem a mim”, disse. Na quinta-feira (07/04), Cameron admitiu ter lucrado em cima da empresa offshore de seu pai, Ian Cameron. O premiê declarou ter possuído ações da companhia, chamada de Blairmore Holdings Inc, que administrava bens de famílias da elite britânica. Estas ações foram vendidas por mais de 30 mil libras (mais de R$ 150 mil) apenas quatro meses antes de Cameron ser eleito para o cargo de primeiro-ministro. Cameron disse que publicará “em breve” as declarações de imposto de renda dos últimos anos porque quer ser “transparente”. A atitude será inédita por parte de um premiê britânico. Via OperaMundi  

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Tecnologia: “Realidade virtual é início de algo grande para a humanidade”

Em entrevista, designer garante que tecnologia terá influência em quase todos os setores e destaca vantagens para o ensino. Primeiros produtos comerciais serão lançados em 2016. Imagine um mundo no qual um professor de História leve seus alunos para um passeio pedagógico e interativo pela Atenas da Grécia Antiga ou no qual um potencial comprador possa andar pelos cômodos de um apartamento que nem saiu da planta. Tudo isso é possível graças às realidade virtual (RV) e aumentada (RA), tecnologias já existentes, mas que ainda não alcançaram o consumidor comum. Em 2016, no entanto, devem ser lançadas as primeiras versões de produtos comerciais.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Para o designer eletrônico Cyrill Etter, a realidade virtual mudará quase todos os setores industriais. “É o início de algo muito grande para a humanidade”, afirma o cofundador do Game Science Center em Berlim, uma espécie de museu de tecnologia interativa. Em entrevista à DW, Etter defende as vantagens cognitivas e de aprendizado geradas pela interatividade dentro de um ambiente virtual, refuta as alegações de que a tecnologia fomentaria o empobrecimento intelectual das pessoas e explica como funciona uma caixa de areia de realidade aumentada. “Não há nenhum grande setor que não encontre vantagens na realidade virtual ou na realidade aumentada.” DW: Há quem diga que a realidade virtual vai se tornar mainstream ainda este ano. Concorda? Cyrill Etter: Este é o ano no qual tudo começará, já que as primeiras versões dos produtos comerciais serão lançadas, e certamente a realidade virtual não sairá de moda depois de 2016. É o início de algo muito grande para a humanidade. Quais são os tipos de produtos? Etter prevê uso em terapias contra o medo de alturas Basicamente são head-mounted displays[HMD, dispositivo de vídeo usado como capacete e com fontes de ouvido] para realidade virtual e realidade aumentada. A realidade aumentada ainda está um pouco atrás da realidade virtual. Mas ambos os segmentos prometem um vasto conteúdo aos consumidores neste ano. Portanto, é provavelmente por isso que as pessoas estão especulando que este é o ano [no qual a RV alcançará o público comum]. Acho que as pessoas diziam a mesma coisa quando a televisão foi inventada, e podemos ver como a TV se desenvolveu ao longo dos anos. O mesmo acontecerá com a RV. Um dos objetos expostos no estande do Game Science Center é uma espécie de caixa de areia em realidade aumentada. O que é essa ferramenta? Ela foi criada originalmente pela UC Davis [Universidade da Califórnia, em Davis]. É uma ferramenta incrível: a pessoa constrói suas montanhas e, em tempo real, as colorações de altura e topografia aparecem sobre a areia. O instrumento foi originalmente desenvolvido para ensinar crianças a ler mapas topológicos quando elas estiverem no jardim de infância, brincando na areia. Imagine dois grupos de crianças: um cresce com uma caixa de areia com realidade aumentada e o outro, com uma caixa de areia comum, e uma vez que chegarem à escola e tiverem geologia nas aulas, o grupo que teve contato com a RA já entenderá muito mais sobre mapas – eles saberão, por exemplo, o que é alto e baixo num mapa, enquanto o outro grupo dirá “não entendo”. Portanto, a realidade aumentada e a realidade virtual permitirão outras formas de ensino. Quando as coisas são interativas, as pessoas as guardam mais rapidamente em seus cérebros e podem se lembrar delas mais facilmente. Na caixa de areia, cor muda para representar montanhas e vales num mapa Porém, até mesmo alguns dos desenvolvedores pioneiros da realidade virtual, como Jaron Lanier, têm demonstrado certo ceticismo com a tecnologia. Por que então devemos seguir animados com as novidades? Acredito que esta tecnologia mudará quase todos os setores. Da arquitetura, onde poderão ser visualizadas casas que ainda nem foram construídas, à educação, onde professores poderão lecionar colocando os alunos num cenário virtual em vez de lhes mostrar a Espanha apenas num monitor, por exemplo. É muito melhor poder colocá-los na cena e pedir que eles procurem ativamente por coisas. Isso faz com que os alunos usem o cérebro de forma diferente e que este memorize melhor as coisas. A tem mais: a tecnologia pode servir para implementar escolas virtuais de condução, ou, na medicina, terapias contra o medo de alturas ou aracnofobia. Não há nenhum grande setor que não encontre vantagens na realidade virtual ou na realidade aumentada. Mas e os processos em nossos cérebros, que, com o tempo, serão cessados quanto mais usarmos essa tecnologia? Iremos perder a faculdade da imaginação? Não, não penso assim. Acho que isso [a realidade virtual] é mais ativo do que apenas ficar olhando para uma tela – a pessoa está olhando ao redor, dentro de um ambiente, e participando da experiência em vez de apenas consumi-la, como é o caso da televisão… No entanto, as pessoas não estão criando suas próprias imagens dentro da realidade virtual. Se olharmos com os olhos da mente, por outro lado, criamos nossas próprias imagens. Sim, claro que você faz isso quando imagina alguma coisa. Mas vamos comparar a RV com jogos eletrônicos e outros softwares similares: a pessoa está ativamente no ambiente e decide que parte quer olhar. A pessoa decide o que é mais importante, e há uma grande diferença entre isso e alguém que decide por você o que querem lhe mostrar, ou o que você irá experimentar. As possibilidades da realidade aumentada Portanto, ao devolver a autoridade ao usuário, ele também poderá gerar mais criatividade, porque há um monte de novas formas de criar conteúdo dentro de mundos virtuais. O usuário pode andar em torno de coisas que foram construídas e analisá-las de todos os ângulos, e, consequentemente, a pessoa teve que imaginar os objetos antes que eles fossem construídos. É apenas uma nova ferramenta para visualizar um objeto e torná-lo real para todos – e até mesmo “experimentável” para todos, pois agora as pessoas podem colocar os óculos e caminhar em torno de algo que acabou de ser criado. Há essa imagem

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Design Gráfico: Sobre “Uns contos”, de Ettore Bottini

Com sua morte prematura em dezembro de 2013, durante uma cirurgia cardiovascular, sabíamos que, com Ettore Bottini, o país perdia um de seus melhores artistas gráficos, um profissional competente e apaixonado dos bastidores da literatura. Por Ricardo Domeneck/Blog ContraCapa Visível, mas invisível, como tantos profissionais excelentes de bastidores na labuta de fazer os grandes textos chegarem a seus leitores. Luiz Schwarcz, editor da Companhia das Letras, lamentou a morte do colega em texto que o chamava de um dos grandes e primeiros responsáveis pelo aspecto visual dos livros da editora. Bottini projetou para a Companhia das Letras, entre dezenas de outras editoras, capas de volumes dos brasileiros Alfredo Bosi, José Paulo Paes e Decio de Almeida Prado, assim como dos estrangeiros Jean Starobinski, Edmund Wilson, Roger Bastide e Gérard Lebrun, entre inúmeros outros. Seus projetos de capa para as redescobertas de grandes livros, como Lavoura Arcaica e Um Copo de Cólera, de Raduan Nassar, são emblemáticas de seu estilo limpo, legível, elegante. Sem firulas ou fuzuê, alguém diria lá pelas bandas onde nasci, ainda que o meu próprio uso dessas palavras possa parecer firula e fuzuê. Mas, se faço uso dessas palavras, é por motivo que elaboro adiante.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] A publicação póstuma de Uns contos (São Paulo: Cosac Naify, 2014), volume com 11 narrativas curtas de Bottini, seguidas de sete “aparas”, ou começos de contos, mostra-nos que perdêramos em 2013 não apenas um excelente artista gráfico, mas também um impecável artista textual, um escritor de verdade escondido em meio aos celebrados incapazes. E que nos deixou alguns dos melhores contos da literatura brasileira deste novo século. O escritor cuiabense Joca Reiners Terron o diz de maneira clara e direta no título de sua resenha: LivroUns Contos, de Ettore Bottini, já nasce clássico [Folha de S. Paulo, 22.03.14]. Não poderia estar mais de acordo. Terron fala ainda da “linguagem de talhe clássico, da minúcia vocabular com predileção por expressões incomuns (’embarafustou para a rua’, lê-se emTodos os Medos) e o jargão de ambientes que ressurgem no entremear das histórias, como o do turfe, da marinha e da pesca fluvial, e em muito bem-vindas paisagens rurais que destoam da onipresença urbana no conto brasileiro contemporâneo”. Bottini nasceu em Blumenau, Santa Catarina, em 1948. Estudou na Marinha de Guerra e chegou a iniciar a faculdade de Arquitetura antes de dedicar-se à arte gráfica, trabalhando para várias editoras e projetando centenas de livros. Sua passagem pela Marinha nos demonstra a origem de seu uso seguro do vocabulário e certa rotina do mar para um conto como Irmãos de Armas, sobre marujos brasileiros em um navio atracado em Montevidéu, onde perambulam pela cidade. O mar retorna em Material para a um Conto, que nos leva ao policiamento britânico dos mares após o Aberdeen Act de 1845 – entre a Rainha Vitória, da Inglaterra, e Pedro 2º, do Brasil –, num texto que ressuscita de forma convincente, em plena literatura brasileira, a narrativa sobre piratas. Nas palavras de Terron, as paisagens “rurais” de Bottini, talvez resultem de uma vida iniciada neste espaço cultural algo indefinido, que atravessa diversas fronteiras estaduais. Um espaço geográfico a que geralmente damos o nome de “interior” e que perpassa torrões de terra de Goiás e Minas Gerais a Paraná e Santa Catarina, longe dos litorais e capitais, passando por cidadezinhas de São Paulo e Mato Grosso. Mudam-se as comidas e os sotaques, mas permanece uma certa modorra de verões gastos em pescarias à beira de rios e lagos, onde decisões familiares importantes são tomadas em churrascos em meio a perrengues sob a sombra de mangueiras. Senti um reconhecimento desse ambiente cultural interiorano, tendo nascido nas terras caipiras de São Paulo, em contos como As Provisões do Tempo, sobre um dono envelhecido da mercearia de uma cidadezinha que se recusou a crescer; e Hey, Joe, sobre o neto matador de aluguel de uma família próspera de fazenda. Há ainda O Mesmo Rio, sobre a reunião dos membros de uma família na terra natal antes do retorno à capital. Em sua escrita, está presente a mesma elegância e legibilidade de suas capas. Sim, há contos de “talhe clássico”, nos quais Bottini recusa epifanias construídas. Não há revelações repentinas, não há catástrofes surpreendentes. Não há estrela cadente, sem aviso: há a descoberta de que o cometa Halley passará em 14 anos. Tudo à espera, até o maravilhoso e extraordinário tem anúncio. Nada fora dos eixos, ainda que os eixos sejam tortos. A espera do próprio destino, igual ao do amigo velho, enquanto se observa o desenrolar das decepções da velhice. Há o luto lento em um conto tão bonito como Mundo Natural, no qual um homem, após viajar milhares de quilômetros da capital ao interior, onde enterrou o pai, e então de volta à sua casa, chega à descoberta do que é a dor da perda de forma gradual, como anestesia que perde o efeito lentamente, observando uma mariposa presa em sua cozinha. Ainda que algumas de suas expressões possam parecer incomuns, seu vocabulário sempre parece adequado ao ambiente em que surgem para definir, nomear, e, num tom baixo, sem gritaria, louvar. A um leitor da cidade grande, talvez pareça estranho ler “coaxar” se há anos não vê um sapo. Se lê “brim”, dentro de seus jeans, sem jamais ter visto um daqueles velhos senhores em suas calças de brim. Para certos leitores, um lambari será sem dúvida coisa raríssima, e capim é só algo que se vê bordeando rodovias. Por que haveria de aparecer com frequência na literatura? Estamos preocupados com coisas maiores. Não, não vejo firulas nem fuzuê, tudo o que vejo é precisão. Bottini parece-me um grande observador da alma humana, mas não cai jamais na tentação de criar situações inusitadas e fora do comum para desentranhar verdades escondidas sob as ilusões de si mesmos, que talvez pudessem enovelar suas personagens. Sua tática parece ser simplesmente a de olhar com calma, dar-lhes tempo para que se revelem. Encarar essas pessoas como se escondido atrás de uma cortina

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