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Ana Blandiana – Versos na tarde – 27/08/2015

Humildade Ana Blandiana¹ Nada posso fazer para que o dia não tenha vinte e quatro horas. Apenas posso dizer: perdoa-me pela duração do dia. Também não posso impedir o voo das borboletas a partir das larvas. Apenas posso implorar o teu perdão, pelo voo das borboletas, pelas larvas, perdoa-me pelas flores que se transformam em frutos e os frutos em sementes e as sementes em árvores. Perdoa-me pelos mananciais que se convertem em rios e os rios em mares e os mares em oceanos. Perdoa-me pelos amores que se transformam em recém-nascidos e os recém-nascidos em solidões e as solidões em amores… Nada posso impedir. Tudo segue o seu destino e nunca me pergunta nada. Nem o último grão de areia, nem sequer o meu sangue. Apenas posso dizer: perdoa-me. ¹ Ana Blandiana * Timișoara, Romênia – 25 de março de 1942 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]

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O crash que todos deveriam estar esperando

Há dias as bolsas de valores estão em queda pelo mundo. Uma nova crise impulsionada pelo caos na China está iminente? Existem muitas provas do contrário, opina o jornalista da DW Henrik Böhme. Tecnicamente, não aconteceu nada ainda. São apenas os mercados que estão ficando agitados, ainda que violentamente. De concreto neste momento é que, a cada minuto de transações, bilhões de dólares evaporaram. Mas se você realmente refletir sobre isso – conseguindo de alguma forma ignorar as somas perturbadoras desaparecendo dos balanços – este último crash não é tão surpreendente. Sim, eu imagino que, nas últimas semanas, os mercados financeiros superaquecidos tiveram de lidar com uma série de notícias ruins que vem surgindo, particularmente vindas da China. Quando a segunda maior economia do mundo sofre um período de instabilidade, os investidores podem ficar nervosos. Mas esta não é a única causa da turbulência atual.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Existe um grupo de países, apontados certa vez como nações emergentes, que tem preocupado as pessoas. Tome a Rússia como exemplo: ela foi enfraquecida recentemente por sanções do Ocidente e problemas internos. Ou o Brasil que, como a Rússia, depende principalmente das exportações de commodities para manter a economia avançando. Mas agora – prejudicado pela queda na demanda destas commodities e, assim, pela queda na receita – desliza para a recessão. É claro que eu seria muito simplista culpando apenas os mercados emergentes. Isso porque o atual boom no mercado de ações, que estava sendo mantido por sete anos, era subsidiado basicamente pelos bancos centrais do mundo. Desde a crise do Lehman Brothers, o americano Federal Reserve (FED) e o Banco Central Europeu têm injetado bilhões de dólares e euros nos mercados enquanto mantêm as taxas de juros próximas a zero. Mas para onde todo esse dinheiro deveria ir? Ele deve ser investido de forma lucrativa em algum lugar, especialmente quando os fundos de pensão e companhias de seguros querem manter suas promessas de rendimento. Mas o que aconteceu então? O dinheiro foi investido em todos os tipos de títulos. E se uma coisa é certa sobre ações é que elas são vulneráveis a flutuações no mercado. Às vezes estas flutuações podem acabar com o valor da ação. É assim que as coisas funcionam. Outro produto destes anos selvagens é a tendência das empresas usarem seus consideráveis lucros apenas secundariamente para novos investimentos. Como prioridade, elas preferem recompensar seus acionistas com rendimentos mais gordos. Mas não é também o caso de que seja este o primeiro crash dos últimos anos. Os mercados – de acordo com previsões de vários especialistas diante da bolha de dinheiro barato – ficariam extremamente voláteis e sujeitos à flutuação. Você se lembra, no segundo semestre do ano passado, quando o alemão DAX começou a derrapar subitamente e não parou até atingir 8.400 pontos? A razão naquele momento eram preocupações econômicas. Aquelas preocupações se tornaram infundadas. Após isso, o DAX recuperou-se rapidamente, subindo 4 mil pontos em meio ano. E não parou até o índice atingir o recorde de 12,390 pontos. Não parece estranho que ninguém pareça se importar com as razões para que o mercado tenha um ganho tão dramático? Apenas quando as coisas correm de forma negativa para as pessoas, elas começam a questionar. Nestes casos, sempre ajuda dar uma olhada em números brutos. A Alemanha, maior exportador global, vende a maior parte dos seus produtos à Europa – apenas 7% vão para China. Os problemas de Beijing devem de fato ser motivo para os chefes de empresas alemãs perderem várias noites de sono, especialmente no setor automotivo. Mas existem outros empresários que não compartilham desta preocupação. Um fator encorajador é a performance da economia americana, que está, neste momento, em posição de crescimento. Para além disso, o preço das matérias-primas como petróleo e cobre está baixos. O que deve ser lamentável para alguns países, mas para outros se trata de um estímulo muito bem-vindo. Agora muita coisa está nas mãos da chefe do Federal Reserve, Janet Yellen. A mera sugestão de mudança na política monetária dos Estados Unidos poderia fazer o banco central subir as taxas de juros o suficiente para instalar grande temor nas economias emergentes, de onde investidores estão retirando dinheiro porque esperam altas taxas de rendimento nos EUA. É um círculo vicioso. Mas, em algum momento, as medidas de combate à crise de dinheiro barato e baixas taxas de juros têm que terminar. O único problema é se a crise da China se ampliar e arrastar a economia mundial com ela. O Ocidente não terá instrumentos para responder a isso. Os efeitos residuais da crise no Lehman Brothers ainda podem ser sentidos até hoje.

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Quais são os obstáculos para Dilma no TSE?

A maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) votou na noite desta terça-feira pela reabertura de uma ação proposta pela oposição que pede a cassação dos mandatos da presidente Dilma Rousseff (PT) e do vice, Michel Temer (PMDB). Ministros do Tribunal Superior Eleitoral durante sessão nesta terça-feira que decidiu pela reabertura de ação contra a presidente Dilma e o vice Temer. Image copyright ASICS TSE Na ação, o PSDB acusa Dilma de praticar abuso de poder político, econômico e fraude na campanha de 2014. Entre as 11 supostas irregularidades apontadas, cita financiamento eleitoral por empreiteiras envolvidas na operação Lava Jato e desvio de finalidade na convocação de rede nacional de TV. Leia mais: ‘Dilma pode sobreviver à turbulência?’, questiona jornal britânico O processo em curso chama-se Aime (Ação de Impugnação de Mandato Eleitoral) 761 – um instrumento jurídico previsto na Constituição para cassação de mandato obtido por meio de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Em fevereiro, a ministra do TSE Maria Thereza de Assis Moura havia negado a continuidade da ação, apontando indícios insuficientes, mas a decisão foi revertida em Plenário – quatro dos sete ministros já se manifestaram nesse sentido. Na mesma sessão, marcada por momentos de tensão entre os ministros, Luiz Fux propôs a unificação de todas as ações contra a campanha do PT, mas nada ficou decidido. O julgamento foi suspenso após um pedido de vista da ministra Luciana Lóssio e não tem data para ser retomado. O PT nega irregularidades e diz que as contas de campanha de Dilma foram aprovadas pelo próprio TSE. Esse, contudo, é apenas um entre cinco processos que podem culminar, em caso de condenação, na cassação da chapa presidencial. Entenda as outras quatro ações: Suposto uso da máquina pública (Aije 154781) A Aije (Ação de Investigação Judicial Eleitoral) 154781 tramita no TSE desde outubro de 2014, e foi proposta pela coligação do PSDB ainda durante a campanha. Esse tipo de ação visa impedir e apurar atos que possam afetar a igualdade dos candidatos em uma eleição. O ministro do TSE Gilmar Mendes pediu novas investigações sobre as contas da campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff. Image copyright TSE Se julgada antes do pleito, pode resultar na cassação do candidato acusado de irregularidades. Caso a ação seja julgada procedente após a eleição, o processo segue para o Ministério Público para eventual proposição de ação de impugnação de mandato. O processo em questão está atualmente com o corregedor-geral eleitoral do TSE, ministro João Otávio de Noronha. Testemunhas apontadas pelo PSDB já foram ouvidas na ação. Os tucanos apontam supostos episódios de uso da máquina pelo governo na campanha de Dilma, como participação indevida de ministros, envio de 4,8 milhões de folders pró-Dilma pelos Correios e dificuldades para distribuição de material de campanha de Aécio Neves em Minas Gerais. Propaganda institucional e poder econômico (Aije 194358) A Aije 194358 foi proposta pelo PSDB em dezembro de 2014, após as eleições. Também acusa supostas irregularidades na campanha petista, como “veiculação de propaganda institucional em período vedado” e “ocultação de dados econômicos e sociais negativos” por órgãos públicos federais como Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A representação também cita a operação Lava Jato e a possibilidade de recebimento de doações de empreiteiras envolvidas em desvios de recursos da Petrobras, o que caracterizaria abuso de poder econômico. Foi nesse processo que o empreiteiro Ricardo Pessoa, da UTC, um dos delatores da Lava Jato, foi convocado a depor. Ele seria ouvido no último dia 14 de julho, mas o depoimento foi suspenso para aguardar autorização do ministro Teori Zavaski, relator da Lava Jato no STF (Supremo Tribunal Federal). O ministro João Otávio de Noronha também é relator dessa ação, que tramita sob segredo de Justiça e está mais avançada. O PSDB pede que Aécio, segundo colocado na disputa, seja diplomado e assuma o cargo. Mas entendimento consolidado no TSE indica que cassação de registro nos dois primeiros anos de mandato exige realização de novo pleito. Contas de campanha (PC 97613) A PC (Prestação de Contas) da campanha de Dilma foi aprovada com ressalvas pelo TSE em dezembro de 2014, mas na última sexta-feira o ministro do TSE Gilmar Mendes apontou a existência de “vários indicativos” de que a campanha à reeleição de Dilma e o PT tenham sido beneficiados por propina desviada da Petrobras. Mendes, que é o relator do processo, pediu novas diligências, citando dados das investigações da Lava Jato e doações registradas na Justiça Eleitoral. Uma eventual rejeição das contas pode levar à abertura de procedimento de cassação do diploma da presidente e do vice, além da aplicação de multa e suspensão de verbas do fundo partidário para as siglas da coligação. Ministra Maria Thereza de Assis Moura durante sessão plenária do TSE nesta terça; ministra havia negado andamento de ação contra Dilma que agora seguirá tramitando. Image copyright TSE Despesas de campanha (RP 846) A RP (representação) 846 foi proposta pelo PSDB em janeiro deste ano. Aponta problemas nas contas da campanha à reeleição de Dilma, como despesas acima do limite legal, financiamento irregular e “falta de comprovantes idôneos de significativa parcela das despesas efetuadas na campanha dos requeridos”. O relator da ação, que aguarda parecer da Procuradoria Geral Eleitoral, é o ministro Luiz Fux. BBC

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O que pode se esconder sob a crise do Brasil

“Nas democracias, governantes não são ungidos por Deus, mas eleitos pela vontade popular”. O Brasil atravessa uma grave crise que, segundo analistas, que não são poucos, é mais política do que econômica. E por isso é mais difícil de resolver apesar da riqueza do país em recursos naturais, matérias primas e capacidade criativa. A economia brasileira, além disso, não enfrenta um risco de quebra como o caso da Grécia ou Venezuela. É o que diz o correspondente Juan Arias, do jornal espanhol El País, em artigo publicado nessa quarta-feira (26/08). O problema é, acima de tudo, político. O povo das ruas o sabe. O deixou claro em suas últimas reivindicações de protesto nas quais ressoaram mais os gritos contra os políticos e seus crimes de corrupção, do que sobre a inflação ou o desemprego, dois fantasmas que assustam cada vez mais.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] O que não funciona, e parece sem solução, é o enredo político com atores medíocres, mais burocratas que estadistas, que não conseguem recitar os grandes dramas e parecem conformar-se com resultados de opereta. Um papel que mal se conjuga com a democracia consolidada e moderna de um país continental como o Brasil. Existem muitas explicações ao desafio que o Brasil enfrenta: o de conjugar uma política exercida por profissionais com o desenvolvimento de uma economia com grandes possibilidades e capacidades. Talvez a menos prevista, e a razão pela qual os políticos se afogam e a recuperação econômica se atrasa, é a tentação latente de sacralizá-los ao mesmo tempo que se lhes outorga impunidade, como se não fossem cidadãos como os demais. Se algo deveria distinguir as democracias modernas dos antigos regimes totalitários é de ter se libertado do perigo dos messianismos, seja religiosos ou ideológicos. O Brasil não vive os tempos bíblicos em que foi necessário um Moisés messiânico para libertar o povo judeu da escravidão do Egito. Nem vive os tempos das teocracias da Idade Média, durante as quais os reis governavam em nome de Deus, com quem não é possível discutir, só obedecer. A modernidade é incompatível com dogmas políticos. Os governantes, nas democracias, não são ungidos por Deus e devem só responder às leis e à vontade de quem os elege livremente. E são proibidos de mentir. Quanto mais perfeita é uma democracia, menos os políticos têm. Em um cenário assim, os representantes do povo chegam a confundir-se na rua com as pessoas comuns, sem privilégios. Essas democracias maduras não precisam de heróis, nem de messias, nem de salvadores da Pátria, nem de pais ou mães dos pobres. A eles lhes é exigido apenas capacidade para governar com acerto e justiça, tendo em conta sempre, a hora de dividir os orçamentos, as necessidades mais urgentes, como reduzir as desigualdades sociais e alentar o crescimento do país. Poderá parecer simples, mas na prática as coisas não são tão fáceis nem delicadas. Os que chegam ao poder se esquecem que não ganharam o posto por uma designação divina, mas pelo voto popular. Inclusive nos países com Constituições democráticas existe a tentação, alimentada às vezes pela mesma sociedade, de sacralizar o poder. Certos messianismos seguem ainda vivos, com sua nefasta carga antidemocrática e até ditatorial, em vários países da América Latina, onde uma mistura de fundamentalismo religioso, fomentado pelas Igrejas Evangélicas e de messianismo ideológico, herdado dos velhos socialismos totalitários, impede o desenvolvimento de democracias modernas e participativas. Quando os governantes são divinizados, se tornam indispensáveis e insubstituíveis, até o ponto em que qualquer movimento de mudança política é visto como diabólico e contra os pobres. No Brasil, um país com uma constituição democrática e separação entre a Igreja e o Estado, segue viva a tentação de querer levar Deus ao Congresso, ou aos bancos da Justiça, sacralizando a vida pública e com ela seus governantes, ainda que depois sejam denegridos e criticados. Há até quem defende que se introduza na Constituição que o poder vem de Deus e não do povo. E há legisladores evangélicos que profetizam que, se um deles chega à presidência brasileira, seria por vontade divina. Dizem também que governariam consultando a Bíblia antes da Constituição. Só quando a política se limita à arte de governar com capacidade e com ética, sem tentações messiânicas, pode-se falar de democracia. Não existem políticos ungidos por Deus, insubstituíveis e eternos. O poder deles é temporal. Só o da sociedade é permanente e inapelável. Eles estão a seu serviço e não ao contrário. Esquecê-lo é abrir a porta a todo tipo de instabilidade que acaba, inexoravelmente, em crises econômicas e irritação popular. El País/Juan Arias

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