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Cecília Meireles – Prosa na tarde – 20/09/2014

A Arte de Ser Feliz Cecília Meireles ¹ HOUVE um tempo em que a minha janela se abria para um chalé. Na ponta do chalé brilhava um grande ovo de louça azul.Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias límpidos, quando o céu ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia estar pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusão maravilhosa e sentia-me completamente feliz. HOUVE um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flores. Para onde iam aquelas flores? Quem as comprava? Em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existência? E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebe- las? Eu não era mais criança, porém a minha alma ficava completamente feliz. HOUVE um tempo em que minha janela se abria para um terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da árvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava histórias. Eu não podia ouvir, da altura da janela; e mesmo que a ouvisse, não a entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difícil. Mas as crianças tinham tal expressão no rosto,e às vezes faziam com as mãos arabescos tão compreensíveis, que eu participava do auditório, imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz. HOUVE um tempo em que a minha janela se abria sobre uma cidade que parecia feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim seco. Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre homem com um balde e em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. MAS, quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim. ¹ Cecília Benevides de Carvalho Meireles * Rio de Janeiro, Brasil – 7 de Novembro de 1901 d.C + Rio de Janeiro, Brasil – 9 de Novembro de 1964 d.C [ad name=”Retangulo – Anuncios – Duplo”]

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A subversão dos blogs

A não ser com as pessoas se comunicando livremente dizendo, umas às outras, o que pensam e refletindo em conjunto sobre o que sabem não é possível empreender avanços desses que volta e meia são indispensáveis para se mudar, e sempre para melhor, o rumo da história. Vendo que não poderia ficar limitado à comunicação verbal, o homem inventou a escrita em símbolos marcados em pedras. A informação em meio estático, que não se movia, precisava da fala de cada um que a lia para transformar-se em mensagem adiante. A caligrafia depois, permitindo a reprodução dos textos, ainda que em quantidade bem limitada, fez com que a informação se movesse, mas como só alcançava a poucos era um privilégio e assim também fonte de poder. O conhecimento não podia, e àquelas alturas nem deveria, chegar a todos. A religião se assenhoreou dos calígrafos e copistas e de sua produção. A Bíblia, por exemplo, só era acessível ao Papa e a alguns iluminados cardeais. A sua interpretação escorria nas bulas papais, que se diluíam em ordenamentos verbais indiscutíveis entre o restante na hierarquia do clero. E era tudo em latim, o que já restringia bastante o acesso ao conhecimento. O Século XVI registra o primeiro impacto da grande revolução, a partir da qual as pessoas se movem conquistando mais liberdades e descobrindo mais direitos, melhorando assim o mundo em que vivemos. Quem não já ouviu falar em Martinho Lutero? Mas poucos sabem sobre Leão X. Lutero foi o clérigo que não entendendo algumas lógicas das bulas papais resolveu questioná-las, primeiro escrevendo à mão diretamente ao Vaticano, onde passou a não ser bem visto. Lutero não desistiu nos questionamentos, ele não queria romper, estava apenas querendo entender algumas lógicas das bulas papais, mas os hierarcas continuaram o subestimando.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Leão X era o Papa, o Sumo Pontífice infalível, que não arredando de sua hermenêutica, não sabia que na Alemanha um ourives chamado Gutembergue acabara de inventar a imprensa, e que o primeiro livro saído de sua prensa foi exatamente a Bíblia. MacLuhan diria que Gutemberg ao inventar a imprensa deu extensão ilimitada aos olhos e à fala da humanidade. Claro que Lutero usou a nova invenção para dar maior alcance à difusão das suas ideias. Se não convenceu Leão X, mas atraiu para a sua lógica milhões e milhões de dissidentes do Vaticano. O protestantismo, apesar das reações mais severas, ganhou corpo sendo considerado ainda hoje por muitos como um movimento moderno. Sem a imprensa, a Reforma de Lutero não teria vencido. Em termos numéricos não sei como Alvin Tofler classificaria essa onda. Depois da imprensa, o código Morse, o telefone, o rádio, o cinema, a televisão, e agora a internet. Todos meios de comunicação, difundindo as mensagens, democratizando o conhecimento. A produção e difusão da informação, enquanto privilegio de poucos, começa a se tornar acessível a muitos deixando, assim, de ser aquela inesgotável fonte de poder. Manter um jornal em circulação ainda hoje não custa pouco dinheiro. Manter uma televisão funcionando custa muito dinheiro. Manter uma estação de radio no ar ainda custa algum dinheiro. Tudo isso depende de patrocinadores, cada vez mais esses patrocínios são buscados no poder publico, e quando isso ocorre o resultado é uma aliança nefasta contra a verdade dos fatos, restando censura e manipulação política. A sofisticação dos meios de comunicação e o encarecimento dos custos de produção, por conseqüência, tornaram ainda mais poderosos os donos dessas mídias na medida em que só eles conseguem manter suas engrenagens funcionando, em alianças, muitas delas espúrias, com o poder público. O lucro que buscam é apenas o do capital político porque é com esse capital que, manipulando a verdade dos fatos, em redes de mentira única, apostando sempre na impunidade e no medo que impõem a muitos, seguram o poder estatal sem o qual não sobrevivem. Em contraponto, começa agora a era da subversão dos blogs. Blog, como explica Hugh Hewitt, é a contração da palavra inglesa weblog. Log significa diário, aquele diário de bordo dos capitães dos navios ou dos comandantes dos aviões. Web é essa rede solta no espaço. Lógico que nem todos os blogs têm emissões diárias, muitos ficam semanas no ar sem novidade alguma. Apesar da instantaneidade com que podem ser postados os textos, os blogs podem se distinguir quanto à periodicidade. Há apenas 11 anos, portanto, em 1999, surgiu o primeiro blog. Calcula-se que mais de 5 milhões de blogs navegam hoje no cyber-espaço. Hoje em dia qualquer um dentre nós para ser fotografo basta ter um celular e para ser editor de noticias ou de opinião basta ter um blog. A tecnologia necessária para se manter um blog é grátis se comparado com a que os conglomerados de comunicação – jornais, rádio e TV precisam pagar. No nosso caso, com 20 reais por ano podemos obter um domínio ponto com fora do Brasil, por exemplo, o que de algum modo resulta mais seguro. O resto, com qualquer note book você faz. A amplificação dessa liberdade em guetos de atraso político e de pobrezas econômica e social, como no Estado onde vivemos, ainda depende muito da massificação das tecnologias de banda larga e de maior acesso popular ao computador. Em parcerias com a iniciativa privada comprometida com o desenvolvimento, com envolvimento dos movimentos sociais e das entidades não governamentais será possível superar os obstáculos que ainda impedem que os blogs em sua função transformadora cheguem a qualquer hora à maioria das pessoas neste Estado. Fora das nossas fronteiras já estamos sensibilizando simpatias e apoios à causa revolucionária, transformadora. A ferramenta eficaz nesse campo tem sido os blogs. O blog é hoje a mídia que inspira maior confiança porque resulta da ação de pessoas que, bem intencionadas, não querem perder sua inocência, recusando-se à cumplicidade com os que conspurcam contra princípios morais e éticos, negando os fundamentos da República, impedindo os avanços da Democracia. Nos blogs você confia. Pode discordar ou não, mas confia quando quer fazer um juízo

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