Bertolt Brecht – Versos na tarde – 04/11/2013
Sobre o pobre B.B. Bertolt Brecht¹ 1 Eu, Bertolt Brecht, vim das florestas negras. Minha mãe trouxe-me, no abrigo de seu ventre, às cidades. E, enquanto eu viver, o frio das florestas estará comigo. 2 Na cidade de asfalto estou em casa. Recebi cada extrema-unção logo, a saber: jornais, álcool, tabaco. Cheio de suspeitas, preguiça e, afinal, de prazer. 3 Eu sou cordial com todos. Ponho um chapéu-coco, pois isto é normal. Eu digo: que animais de cheiro estranho. E digo: tudo bem, eu sou igual. 4 Eis que em minhas cadeiras vagas, de manhã, uma mulher ou outra se balança. Olho-a sem pressa e digo-lhe: dispões em mim de alguém que não merece confiança. 5 À noite eu me reúno com os homens. Tratamo-nos de gentlemen. O bando, com pés na minha mesa, diz que tudo vai melhorar. E eu nem pergunto: quando? 6 À luz da aurora gris pinheiros mijam e os pássaros, seus vermes, abrem o alarido. É quando, na cidade, esvazio o meu copo, jogo fora o charuto e me recolho aflito. 7 Nós, geração leviana, vivemos em casas supostamente eternas. (Desse modo, além de altos caixotes em Manhattan, construímos junto do Atlântico as antenas que o entretêm.) 8 Restará das cidades quem as cruza: o vento. A casa alegra o comensal que a dilapida. Sabemos bem que somos provisórios. Nem vou falar do que virá logo em seguida. 9 Manter, sem mágoa, nos futuros terremotos, o meu Virgínia aceso já me satisfaz. Eu, Bertolt Brecht, que, das florestas às cidades, vim no ventre materno, anos atrás. Tradução de Nelson Aschaer ¹Bertold BRECHT * Alemanha – 1898 d.C + ?, 1956 d.C => biografia [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]