Eleições Americanas – A Conversão de Sarah
Lucas Mendes De Nova York para a BBC Brasil Já cobri 10 convenções – desde 68 – e nunca vi um milagre político parecido. Há cinco dias, Sarah Palin era o pecado mortal do senador John McCain. O velho senador tinha perdido o juízo. Quem era esta mulher que passou por cima de tantos caciques do partido para o posto de candidata à vice? A desconhecida Sarah Palin tem suas virtudes. Está fora do circuito de Washington, é uma conservadora radical, jovem, honesta, rebelde, pesca, caça e come. Casada desde os 18 anos com o namorado que conheceu numa quadra de basquete quando estudavam juntos. No jogo, pela agressividade, ficou conhecida como Sarah Barracuda, mas hoje projeta a imagem de mãe adorável de cinco filhos. Professoral ou bibliotecária, mas adorável. Será que conquistará os votos das mulheres americanas, em especial aquelas decepcionadas com Barack Obama, que derrotou e depois desprezou Hillary Clinton como vice? O senador McCain, um apaixonado por jogos de azar, apostou nela e hoje é tratado como gênio, uma prova de sua capacidade de decisão. Só novelas têm tantas guinadas e surpresas em tão pouco tempo. O currículo político da ex-prefeita de Wasilla, 7 mil habitantes, eleita com 826 votos contra 255 do adversário, é mais magro do que o de qualquer um dos outros candidatos que estavam na lista. Há dois anos foi eleita governadora e em menos de uma semana a desconhecida foi transformada numa nova líder não só da política americana, mas do mundo ocidental. Sarah Palin fez uma viagem internacional na vida – tirou passaporte no ano passado – para visitar os soldados da Guarda Nacional do Alasca no Oriente Médio e talvez até saiba onde fica o Brasil – é ligada em petróleo- mas, pelos discursos da convenção republicana, ela está pronta para assumir a Presidência dos Estados Unidos. Na opinião de Cindy McCain, ela é bem informada sobre a Rússia porque o Alasca é o Estado americano mais perto do país de Putin. Em menos de dois anos, disse o prefeito Giuliani , ela se tornou a melhor governadora dos Estados Unidos e a mais popular, com 80% de aprovação ( tanto ou mais do que o governador Aécio Neves). “Sozinha tem mais experiência do que Obama e Biden juntos. Vai sacudir Washington. Quem ousa questionar como Sarah Palin pode cuidar de 5 filhos e do país ao mesmo tempo?”, disse Giuliani, o “prefeito da América”, sobre a multiplicação dos talentos da governadora. Os traços da ex-miss, 25 anos depois, ainda estão no rosto dela. Simpática, bonita, sexy e discreta na blusa gelo, saia preta, óculos de professora. Pinta de vice ela tem. E até mais. De professora e bibliotecária também. No discurso mais importante da vida, com carisma e eloqüência, ela tirou nota dez. Debochou do currículo de Barack Obama – organizador comunitário que não precisa prestar contas – e do vice Joe Biden, que durante a campanha martelou o candidato democrata. A prestação de contas dela sobre as finanças do Alasca causa inveja aos outros governadores americanos que não têm tanto gás nem petróleo e têm muito mais do que 800 mil habitantes. Alasca é o Estado com a 47ª população dos Estados Unidos. Sarah Palin ficou devendo explicações sobre os planos para resolver os problemas do país. Houve quem criticasse a presença do filho com a síndrome de Down, adormecido no braços do marido, parte esquimó, herói do Alasca. Ele é tetracampeão da mais famosa corrida do Estado, a Iron Dog. São 3.200 quilômetros de snowmobile, dura de 6 a 7 dias e, na última corrida, com o braço quebrado nos últimos 600 quilômetros, ele chegou em 4º lugar. Gosta de ser tratado não como Primeiro Marido, mas como Primeiro Cara – First Dude. Se a mulher for vice ele será qual Cara? Uma família diferente na corrida para a Casa Branca. A filha adolescente solteira, grávida de 5 meses, ao lado do futuro marido recrutado às pressas no Alasca, agora também é um modelo de moça que decidiu ter o filho em vez de optar pelo aborto. Até agora prevaleceram as virtudes da candidata, mas ela teve conexões com lobistas e está envolvida numa investigação sobre abuso de poder. Briga de família. Vão surgir pecados e serão multiplicados pelos democratas. O discurso mais “macho” da noite foi feito por uma mulher, disse Alex Castellano, um analista político na rede CNN mas nem ela, e nenhum outro orador da noite, teve a macheza de pronunciar o nome do presidente Bush. Este nem Santa Sarah cura.