“Desculpa por tortura faria bem a militares”
Para pesquisadora Glenda Mezarobba, o importante não é mudar Lei de Anistia, mas interpretá-la à luz dos direitos humanos.
Ao não julgar torturadores, Brasil perde oportunidade de sinalizar que crime contra a humanidade não é mais tolerado, diz pesquisadora.
É uma “falácia” defender a não-revisão da Lei de Anistia -texto que já passou por revisões-, mas não há necessidade de mexer no texto legal. O importante, segundo Glenda Mezarobba, pesquisadora do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Unicamp e autora do livro “Um acerto de contas com o futuro: a anistia e suas conseqüências”, é dar à lei uma correta interpretação, sob a ótica dos direitos humanos. Ela defende ainda que um pedido de desculpas oficial faria bem às Forças Armadas.
FOLHA – O Brasil conseguiu superar a ditadura militar?
GLENDA MEZAROBBA – Dos quatro deveres do Estado com a sociedade na passagem para a democracia após um período de repressão, o Brasil apenas tem feito reparações às vítimas. Os outros três, estabelecidos internacionalmente, ainda não avançaram. São eles: fazer justiça, processando e punindo responsáveis por crimes contra a humanidade, o direito da sociedade à verdade, com a revelação dos crimes e suas circunstâncias, e renovação de instituições. Mesmo dentro das reparações, o Brasil apenas fez pelo aspecto econômico. Há ainda o plano simbólico, com pedidos oficiais de perdão, constituição de museus e monumentos.
FOLHA – Como a sociedade pode se beneficiar com um acerto de contas?
GLENDA – Ao não julgar e processar os violadores dos direitos humanos, o Brasil perde a oportunidade de sinalizar que na democracia tais crimes não seriam tolerados. Perde a chance de deslegitimar aquela ideologia autoritária e de romper com recriminações de grupos, contra as Forças Armadas, contra os guerrilheiros. O Brasil ainda não se dedicou à questão da justiça, mas não significa que não possa se dedicar. Não há um prazo de validade, especialmente em relação a crimes contra a humanidade como a tortura, que não prescrevem e que não são passíveis de anistia.
da Folha de S. Paulo
De Ana Flor