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Tempestade perfeita: podemos estar caminhando para uma nova crise global?

Não faz nem uma década que as bolsas em todo o mundo desabaram com o anúncio da quebra do banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos, e já há quem sinta as vibrações de um novo terremoto financeiro de proporções globais. Sobre a freada da economia da China, George Soros diz que o país ‘tem um grande problema de adaptação’ – Image copyright Reuters Não faz nem uma década que as bolsas em todo o mundo desabaram com o anúncio da quebra do banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos, e já há quem sinta as vibrações de um novo terremoto financeiro de proporções globais. Diante da freada da economia chinesa, da brusca queda do preço do petróleo e da expansão do fenômeno dos juros negativos em países ricos, alguns economistas têm defendido que uma nova crise como a de 2008 estaria se avizinhando.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] O megainvestidor George Soros, por exemplo, levantou essa possibilidade durante um evento no Sri Lanka, no mês passado. “Quando olho para os mercados financeiros há um sério desafio que me faz lembrar da crise de 2008”, disse. Há, certamente, quem considere as comparações exageradas – ou mesmo perigosas, como afirmou o Secretário do Tesouro americano, Jacob Lew. “Adoto um otimismo cauteloso ao olhar essas muitas áreas (da economia global) em que há riscos”, disse Lew em entrevista a BBC News. “Acho importante não permitir que esses riscos se tornem profecias autoanunciadas.” No entanto, mesmo autoridades e economistas mais céticos sobre um novo crash global admitem que 2016 começou com um perigoso “coquetel” de ameaças econômicas – como definiu recentemente o ministro das Finanças britânico, George Osborne. Mas, afinal, quais são os sinais que estão gerando tanta incerteza no que diz respeito à economia internacional? E como essas turbulências poderiam afetar o Brasil em um momento em que o país tenta superar dificuldades internas? Para o professor de economia da PUC Antônio Carlos Alves dos Santos, a economia internacional enfrenta uma espécie de “tempestade perfeita”. As dificuldades começaram com o desaquecimento da China e seu impacto sobre os preços das commodities. No início do ano, uma grande instabilidade da bolsa de Xangai reforçou as suspeitas de que a economia chinesa poderia ter uma desaceleração drástica – o que no jargão econômico é conhecido como “hard landing”. Soros, ao fazer o paralelo com 2008, mencionou justamente as incertezas sobre o gigante asiático. “A China tem um grande problema de adaptação”, disse, explicando que o país está com dificuldades para encontrar um novo modelo de crescimento. Petróleo e juros Queda no preço do barril de petróleo amplia a incerteza para 2016 Image copyright Thinkstock A queda do preço do barril de petróleo para abaixo dos US$ 30 também foi um fator que ampliou o clima de incertezas em 2016. O produto já acumula uma desvalorização de 70% desde 2014. Primeiro, em função de uma demanda fraca – para a qual também contribuiu o desaquecimento chinês. Segundo, porque o período de bonança do setor impulsionou uma série de investimentos em novas áreas de exploração e fontes alternativas de combustível fóssil – o que acabou levando a uma superprodução. “Agora, a incógnita é como as empresas do setor e seus credores serão afetados por esse novo patamar de preços”, diz Santos. “Temos rumores, por exemplo, de que produtoras de gás de xisto nos EUA estão passando por sérias dificuldades financeiras”, completa Wilber Colmerauer, diretor do Emerging Markets Funding, em Londres. “E também há dúvidas sobre o impacto desse novo cenário nos bancos que emprestam para empresas e países produtores.” A terceira fonte de incertezas no cenário global são as taxas de juros negativas adotadas por alguns países para seus títulos e depósitos das instituições financeiras nos Bancos Centrais. Colmerauer explica que essas taxas negativas comprimem as margens de lucro dos bancos – então há quem acredite que alguns deles podem ter problemas. “A verdade é que nunca vimos tantos países adotarem essa política de juros negativos, trata-se de um fenômeno novo. Então há muita incerteza sobre quais podem ser suas consequências”, diz. Segundo o banco J.P. Morgan, há hoje cerca de US$ 6 trilhões em títulos públicos com juros negativos, o dobro do que há dois meses. Na semana passada, até o FED, o Banco Central americano, anunciou que deixaria em aberto a possibilidade de adotar os juros negativos em função das adversidades da economia global, gerando grande alvoroço nos mercados que esperam um aumento da taxa este ano. Já praticam juros negativos em seus títulos ou como taxa de referência o Banco Central Europeu, a Suécia, a Dinamarca e a Suíça, além do Japão, que recentemente emitiu pela primeira vez um título de longo prazo com rentabilidade negativa. Se um país adota os juros negativos, na prática os investidores têm de pagar para emprestar seu dinheiro – em vez de receber uma remuneração. Os bônus de dez anos do governo do Japão, por exemplo, foram negociados por -0,035%, o que significa que quem emprestar para o país hoje, daqui a uma década poderá reaver um pouco menos do valor investido. O fenômeno é impulsionado por uma corrida por economias de baixo risco. A lógica é que há tanta instabilidade no mercado que os investidores não se importam em perder um pouco de dinheiro pela certeza de que seus ativos estarão seguros. Do lado das autoridades financeiras, o objetivo é estimular investimentos na economia real e, em alguns casos, combater a deflação – ou seja, a queda sistemática dos preços. O fato de o FED ter mencionado taxa de juros negativa como opção é sinal de que banco não considera retomada da economia dos EUA segura O problema é que muitos interpretam essa política como um sinal de que as autoridades financeiras do país em questão não acreditam que sua economia vá melhorar tão cedo – e continuam preferindo perder pouco sem risco a arriscar perder muito investindo em uma economia pouco dinâmica. O fato do FED ter mencionado a taxa de juros negativa como uma opção, por exemplo, acabou

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O crash que todos deveriam estar esperando

Há dias as bolsas de valores estão em queda pelo mundo. Uma nova crise impulsionada pelo caos na China está iminente? Existem muitas provas do contrário, opina o jornalista da DW Henrik Böhme. Tecnicamente, não aconteceu nada ainda. São apenas os mercados que estão ficando agitados, ainda que violentamente. De concreto neste momento é que, a cada minuto de transações, bilhões de dólares evaporaram. Mas se você realmente refletir sobre isso – conseguindo de alguma forma ignorar as somas perturbadoras desaparecendo dos balanços – este último crash não é tão surpreendente. Sim, eu imagino que, nas últimas semanas, os mercados financeiros superaquecidos tiveram de lidar com uma série de notícias ruins que vem surgindo, particularmente vindas da China. Quando a segunda maior economia do mundo sofre um período de instabilidade, os investidores podem ficar nervosos. Mas esta não é a única causa da turbulência atual.[ad name=”Retangulo – Anuncios – Direita”] Existe um grupo de países, apontados certa vez como nações emergentes, que tem preocupado as pessoas. Tome a Rússia como exemplo: ela foi enfraquecida recentemente por sanções do Ocidente e problemas internos. Ou o Brasil que, como a Rússia, depende principalmente das exportações de commodities para manter a economia avançando. Mas agora – prejudicado pela queda na demanda destas commodities e, assim, pela queda na receita – desliza para a recessão. É claro que eu seria muito simplista culpando apenas os mercados emergentes. Isso porque o atual boom no mercado de ações, que estava sendo mantido por sete anos, era subsidiado basicamente pelos bancos centrais do mundo. Desde a crise do Lehman Brothers, o americano Federal Reserve (FED) e o Banco Central Europeu têm injetado bilhões de dólares e euros nos mercados enquanto mantêm as taxas de juros próximas a zero. Mas para onde todo esse dinheiro deveria ir? Ele deve ser investido de forma lucrativa em algum lugar, especialmente quando os fundos de pensão e companhias de seguros querem manter suas promessas de rendimento. Mas o que aconteceu então? O dinheiro foi investido em todos os tipos de títulos. E se uma coisa é certa sobre ações é que elas são vulneráveis a flutuações no mercado. Às vezes estas flutuações podem acabar com o valor da ação. É assim que as coisas funcionam. Outro produto destes anos selvagens é a tendência das empresas usarem seus consideráveis lucros apenas secundariamente para novos investimentos. Como prioridade, elas preferem recompensar seus acionistas com rendimentos mais gordos. Mas não é também o caso de que seja este o primeiro crash dos últimos anos. Os mercados – de acordo com previsões de vários especialistas diante da bolha de dinheiro barato – ficariam extremamente voláteis e sujeitos à flutuação. Você se lembra, no segundo semestre do ano passado, quando o alemão DAX começou a derrapar subitamente e não parou até atingir 8.400 pontos? A razão naquele momento eram preocupações econômicas. Aquelas preocupações se tornaram infundadas. Após isso, o DAX recuperou-se rapidamente, subindo 4 mil pontos em meio ano. E não parou até o índice atingir o recorde de 12,390 pontos. Não parece estranho que ninguém pareça se importar com as razões para que o mercado tenha um ganho tão dramático? Apenas quando as coisas correm de forma negativa para as pessoas, elas começam a questionar. Nestes casos, sempre ajuda dar uma olhada em números brutos. A Alemanha, maior exportador global, vende a maior parte dos seus produtos à Europa – apenas 7% vão para China. Os problemas de Beijing devem de fato ser motivo para os chefes de empresas alemãs perderem várias noites de sono, especialmente no setor automotivo. Mas existem outros empresários que não compartilham desta preocupação. Um fator encorajador é a performance da economia americana, que está, neste momento, em posição de crescimento. Para além disso, o preço das matérias-primas como petróleo e cobre está baixos. O que deve ser lamentável para alguns países, mas para outros se trata de um estímulo muito bem-vindo. Agora muita coisa está nas mãos da chefe do Federal Reserve, Janet Yellen. A mera sugestão de mudança na política monetária dos Estados Unidos poderia fazer o banco central subir as taxas de juros o suficiente para instalar grande temor nas economias emergentes, de onde investidores estão retirando dinheiro porque esperam altas taxas de rendimento nos EUA. É um círculo vicioso. Mas, em algum momento, as medidas de combate à crise de dinheiro barato e baixas taxas de juros têm que terminar. O único problema é se a crise da China se ampliar e arrastar a economia mundial com ela. O Ocidente não terá instrumentos para responder a isso. Os efeitos residuais da crise no Lehman Brothers ainda podem ser sentidos até hoje.

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Economia: a Europa perde o sono

A partir da quebra do banco Lehman Brothers, verifica-se uma espécie de efeito-dominó sobre um conjunto de instituições bancárias e de crédito em diversos países. Passados menos de dois anos do início da atual crise de liquidez, principalmente de títulos bancários, a realidade dos países e economias afetadas mundo afora é bastante complexa e desconcertante. A discrepância se acentua quando olhamos para setembro de 2008, onde a situação das instituições financeiras norte-americanas revelava-se insustentável. É o que foi intitulado de crise do “sub-prime”, consequência direta da irresponsabilidade do mercado hipotecário nas áreas imobiliárias e da construção civil. Mesmo sem que não se queira cogitar dos aspectos sociais na crise atual, voltam ao cenário ambulatorial macroeconômico as paleolíticas propostas do FMI no que concerne a retomada das políticas públicas de caráter keynesiano e desenvolvimentistas. O Editor Nessun dorma… Por Antonio Delfim Netto ¹/VALOR É um fato conhecido que os competentes economistas alemães representam a fina flor do mais extremo monetarismo ao qual somam uma boa dose de conservadorismo. Foram ferozmente contra as concessões (com implicações econômicas) feitas por Helmut Kohl, quando aproveitou uma janela semiaberta e teve a coragem de reunificar a Alemanha, objetivo político de longo prazo absolutamente desdenhado pelos “puristas econômicos”. Quando a Alemanha decidiu participar do euro, 150 dos seus mais reconhecidos acadêmicos publicaram um célebre manifesto contra, com bons argumentos, mas que de novo ignorava solenemente o objetivo político de longo prazo, que era a pacificação de um continente que durante os últimos mil anos foi atormentado por guerras. Os argumentos eram respeitáveis e mostravam que o sucesso do euro dependia de um rigoroso controle da situação fiscal de cada país, preliminar para a construção de uma área monetária ótima: absoluto controle fiscal, liberdade de movimentos da mão de obra e de capitais e a cessão da emissão das moedas nacionais a um banco central autônomo, com uma nova unidade monetária, com relação à qual as taxas de câmbio de cada país seriam irrevogavelmente fixadas.[ad#Retangulo – Anuncios – Direita] Nem o Fed, nem o BCE sabem, até agora, o que fazer. Eram contra, porque não acreditavam que os países se submeteriam a tal disciplina. Para impô-la, foi formalmente estabelecido e aprovado no acordo de Maastricht, que precedeu a introdução do euro, que: 1) nenhum país poderia ter déficit nominal superior a 3% do PIB; e 2) uma relação dívida/PIB maior do que 60%. Por que não funcionou? Porque os governos de vários países (em particular da Grécia) mentiram, como suspeitavam os economistas alemães! Iludiram aquelas condições com a conivência do sistema financeiro internacional e das agências de risco. Tudo veio à tona depois da “quebra” do Lehman Brothers, quando a “rede de patifarias” escondida nos derivativos tóxicos explodiu na cara dos bancos centrais, sob o nariz dos quais ela se realizara. É cada vez mais evidente que esses não se recuperaram do choque: nem o Federal Reserve dos EUA, nem o BCE da Eurolândia sabem, até agora, o que fazer. Nos EUA, parece que começa a haver uma mudança. Mais de uma dezena de instituições financeiras, que ativamente (com a conivência das agências de risco) assaltaram os incautos aplicadores, começam a ser investigadas e, seguramente, algumas serão responsabilizadas criminalmente. Trata-se de um problema moral, que não pode mais ser escondido pelo governo Obama como foi até agora. Tardiamente, ele propõe ao Congresso um novo pacote de estímulos para diminuir o sofrimento de 25 milhões de honestos trabalhadores (15 milhões com desemprego aberto e 10 milhões semiempregados), que acabaram desempregados com a política econômica (inspirada por distintos acadêmicos comprometidos com o sistema financeiro) que “salvou” os desonestos administradores. Até agora, o presidente do Fed, Ben Bernanke, não disse a que veio: apenas repete, repete e repete o velho refrão, “farei o que tenho de fazer”. Continua indeciso sobre como atender ao seu duplo mandato: manter alto o nível de emprego e manter baixa a taxa de inflação. O sinal de que ainda resta vida inteligente nos EUA veio num artigo no “Financial Times”, do secretário do Tesouro, Tim Geithner, onde afirmou que é hora dos governos deixarem de lado a paralisia política e esquecerem os medos infundados com a inflação. No fundo, ele está transmitindo aos bancos centrais, que continuam mesmerizados pelos seus modelitos, que a taxa de juros nominal já é nula e que a taxa de inflação está na “meta”, mas a taxa de desemprego é quase o dobro da famosa Nairu (a taxa de desemprego que não acelera a inflação). Logo, é uma eficaz política fiscal que deve ser ativada. É por isso que ele afirma que os EUA resistirão a um rápido ajuste fiscal em 2012 e recomenda a todos os países em dificuldades que façam o mesmo. Essa coordenação, se realizada, tornará mais potente e mais veloz os resultados. No Banco Central Europeu (BCE), a situação se agrava. Enquanto Trichet aguarda sua substituição formal por Mario Draghi, os representantes alemães (diante do iminente desastre político da chanceler Merkel) abandonam o barco, alegando “razões pessoais”. Primeiro foi Alex Weber (presidente do Bundesbank). Agora foi Juergen Stark, o que aperta ainda mais a “saia justa” de Merkel. Se não bastassem esses problemas, o ministro das Finanças da Holanda, Jan Kees de Jager, sugere claramente a expulsão da Grécia, a pedido: “Quando não conseguimos respeitar as regras do jogo, devemos deixá-lo”. O FMI, por sua inexperiente diretora-gerente, Christine Lagarde, lança dúvidas sobre a higidez dos bancos europeus que têm em carteira títulos gregos. Como todos sabem que ela conhece apenas os bancos franceses, produziu uma corrida sobre eles. Parece óbvio que ninguém se entende. Tem razão o dr. Tombini. Vamos pôr nossas barbas de molho e nos proteger da provável desintegração da economia mundial. Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.  E-mail contatodelfimnetto@terra.com.br

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Economia: o Brasil e a crise

As armas do Brasil contra a crise Um dos fatos marcantes da crise financeira de 2008 é que o Brasil não sucumbiu, ao contrário do que ocorrera em turbulências anteriores. O país foi fortemente atingido, entrou em recessão, mas se recuperou rapidamente. E agora? Está preparado para enfrentar o recrudescimento da crise mundial? Em tese, o Brasil está mais forte. Tem um volume de reservas cambiais bem superior – US$ 349,6 bilhões, face a US$ 205,7 bilhões em 12 de setembro de 2008, véspera da quebra do banco Lehman Brothers -, e um colchão de liquidez (os depósitos compulsórios recolhidos ao Banco Central) igualmente vultoso – R$ 420 bilhões, diante de R$ 270 bilhões. Ninguém duvida, no entanto, que o agravamento da crise na Europa e nos Estados Unidos vá nos afetar. A forte queda da Bovespa nos últimos dias foi um sinal. A principal consequência deverá ser a redução da atividade econômica. Para o economista Mário Torós, sócio da Ibiúna Investimentos e um dos personagens centrais do governo no enfrentamento da crise de 2008, a melhor maneira de enfrentar a situação é por meio da redução da taxa de juros.[ad#Retangulo – Anuncios – Direita] Torós: situação atual favorece queda dos juros A crise de 2008 se caracterizou pelo excesso de endividamento do setor privado nas economias avançadas, fato que levou a uma crise bancária e ao travamento do crédito doméstico e internacional. Os governos reagiram com medidas de alívio monetário e fiscal. O objetivo era desafogar o crédito, promover a desalavancagem dos bancos e, assim, evitar uma grande contração global. Na prática, o que houve foi a transferência de grande parte da dívida do setor privado para o setor público. A ideia, explica Torós, era que esse movimento estancasse de algum modo a crise, uma vez que o crédito do setor público era, naquele momento, melhor que o do setor privado. O resultado foi um crescimento brutal das dívidas soberanas, que superaram as altas históricas da Primeira Guerra Mundial e da Depressão de 1929. No caso das nações ricas, segundo cálculo dos economistas Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart, as dívidas cresceram, em média, 134% entre 2007 e 2010, face à média histórica, registrada em crises anteriores, de alta de 86%. Já a relação dívida/PIB chegou, em média, a 88%. O problema é que a dramática deterioração fiscal não resultou na recuperação das economias. Os investidores passaram, então, a duvidar da capacidade de pagamento das dívidas dos países mais frágeis da Europa. A desconfiança aumentou depois do caso Grécia, chegando a Portugal, Espanha e Itália. A diferença de spread entre os títulos das dívidas francesa e alemã, por exemplo, superou 90 pontos básicos (quase 1 ponto percentual). “Isso mostra que há uma aversão absoluta a risco no mercado. Os investidores estão correndo para os títulos alemães, considerados mais seguros. O normal seria os spreads estarem mais próximos”, diz Torós, um especialista em gestão de risco. “O risco da crise bancária de 2008 transferiu-se agora para o de uma crise das dívidas soberanas, o que, se se confirmar, obviamente afetará o sistema financeiro.” Em 2008, o Brasil reagiu à crise com instrumentos fiscais e monetários. A posição fiscal era mais favorável que a atual e, por essa razão, o governo teve espaço para reduzir impostos e estimular a oferta de crédito via bancos oficiais. Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deixou claro que o governo não pretende enfraquecer o resultado fiscal. É uma decisão acertada porque fortalece as defesas do país frente a um provável cenário de estresse. No caso da política monetária, o momento atual é distinto. No terceiro trimestre de 2008, quando a crise atingiu o Brasil, a economia crescia acima de 7% ao ano, com a inflação ameaçando estourar o teto de 6,5% do regime de metas. Com a quebra do Lehman Brothers, o pânico se espalhou rapidamente, provocando forte desvalorização do real. Além disso, grandes empresas exportadoras estavam expostas a contratos de derivativo cambial, estimados em US$ 38 bilhões, e sofreram, por causa da abrupta perda de valor do real, prejuízo de pelo menos US$ 10 bilhões. Naquele ambiente, o BC optou por tornar funcionais os mercados de dólar e reais e, apenas num segundo momento, reduzir os juros. A decisão foi muito criticada dentro e fora do governo. A alegação do BC é que, num cenário de inflação alta, era impossível prever o impacto da depreciação do real sobre os preços. Agora, a economia está rodando a 4% ao ano, com perspectiva de queda abaixo desse patamar, e a inflação está começando a desacelerar. O real, à medida que uma recessão mundial afete os preços das commodities, tende a se desvalorizar, mas possivelmente não na mesma intensidade de 2008, uma vez que empresas brasileiras estão menos expostas a câmbio. Torós acredita que, no pior cenário, a principal consequência da crise pode vir a ser o travamento do crédito doméstico. E desta vez as fontes oficiais não terão como suprir o mercado. “Nesse contexto, parece que a resposta a um agravamento da crise parece ser, de fato, mais monetária que fiscal. O Brasil ainda possui os instrumentos [juros e liquidez via compulsórios] que os outros países já não têm”, observa o ex-diretor do BC. Cristiano Romero é é editor-executivo/Valor E-mail cristiano.romero@valor.com.br

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Sistema bancário próximo do colapso

Paul Krugman* O camarada Greenspan deseja que nos apoderemos do alto comando econômico. Tudo bem, não é exatamente isso o que está acontecendo. O que Alan Greenspan, ex-presidente do Federal Reserve (o BC americano) – e aguerrido defensor do livre mercado – disse foi: “Pode ser necessária a estatização temporária de alguns bancos para facilitar uma rápida e ordenada reestruturação do sistema”. Eu concordo. Os defensores da estatização levam em consideração três observações. Em primeiro lugar, alguns grandes bancos estão perigosamente perto do abismo – na verdade, já teriam falido se os investidores não esperassem um resgate governamental caso surgisse a necessidade. Em segundo, os bancos precisam de resgate. O colapso do Lehman Brothers quase destruiu o sistema financeiro mundial, e não podemos correr o risco de deixar que instituições muito maiores, como o Citigroup, implodam. Em terceiro lugar, embora os bancos precisem de resgate, o governo dos EUA não pode bancar, tanto fiscal quanto politicamente, a distribuição de imensos presentes entre os acionistas. Sejamos concretos. Há uma chance considerável – não é uma certeza – de que o Citi e o Bank of America (BofA), juntos, percam centenas de bilhões de dólares nos próximos anos. E o capital deles, o excedente dos seus ativos em relação aos passivos, está muito aquém de poder cobrir essas perdas em potencial. O único motivo pelo qual essas instituições ainda não faliram é a atuação do governo, que age como anteparo, garantindo implicitamente suas obrigações. Mas se trata de bancos zumbis, incapazes de proporcionar o crédito do qual a economia necessita. Para pôr um fim a esse estado de morte em vida, os bancos precisam de mais capital. Mas esse não pode ser obtido com os investidores privados. Assim, o governo precisa fornecer os fundos necessários. Mas é aí que está o problema: os fundos necessários para devolver esses bancos à vida excedem em muito o valor dos mesmos. Citi e BofA têm juntos um valor de mercado inferior a US$ 30 bilhões, e mesmo esse valor tem por base a esperança de que os acionistas recebam parte da oferta do governo. Se o governo vai entrar com todo o dinheiro, deveria ficar com a propriedade dos bancos. Ainda assim, a estatização é antiamericana? Não, é tão americana quanto a torta de maçã.

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Pirâmide. O caso Madoff e o Brasil

A pirâmide de Bernard Madoff – o ex-presidente da Nasdaq autor de um rombo de US$ 50 bi no mercado mundial – deixou várias vítimas no Brasil. Tempos atrás, em meu Blog, a comentarista Bainca Feijó já havia antecipado vários pontos que agora começam a vir à tona. O maior representante de Madoff no Brasil era Bianca Hagler, do grupo Fairfield Greenwich Group), filha de Alex Haegler. A família é milionária, com trânito em Milão, Londres, Madri, Genebra e Rio de Janeiro. Tia de Bianca, Mônica Haegler é casada com o americano Walter Noel – melhor amigo e sócio há 20 anos de Bernard Madoff. E os Haegler têm relações de parentesco com Jorge Paulo Lehman, da Inbev. Foi através da família da esposa, que Walter trouxe a pirâmide Madoff para o Brasil. Por aqui, a distribuição dos produtos ficou a cargo do Banco Safra, com sede também na Europa e nos Estados Unidos. Os primeiros clientes foram frequentadores do Country Club, do Rio de Janeiro. Devido ao tombo, os Haegler foram proibidos de continuar frequentando o clube. *** A posição mais delicada é a do Banco Safra. Para aplicar nos fundos Madoff, o Safra montou em abril de 2006 uma empresa, a ZEUS PARTNERS LIMITED, com sede nas Ilhas Virgens. A empresa é controlada em 100% pelos Safra e seu board é constituído por Gerard Vila, Michael Paton and Charles Galliano. O custodiante da companhia é o Banco Safra de Gibraltar. E a companhia se responsabiliza pela avaliação da origem dos recursos depositados – para evitar qualquer risco de se envolver com dinheiro ilegal. *** É aí que o jogo começa a complicar para o lado dos Safra. Há cerca de uma centena de investidores no Zeus Partners. Conforme divulguei em meu blog, o diretor de CRM (sistemas de gerenciamento de clientes) de um grande portal, por exemplo, perdeu US$ 3.015.431,98; um ex-dirigente do Banco Santos (que está com os bens bloqueados) tinha US$ 1.073.435,35 em sua conta; o diretor executivo de TI de uma empresa média de informática tinha fabulosos US$ 13.270.567,51; e uma funcionária de TI da Secretaria da Fazenda de São Paulo US$ 565.129,15. Todos esses casos são, no mínimo, indicativos de possível lavagem de dinheiro.

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