Eleições 2014: Rodrigo Janot, Procurador Geral da República e a troca de partidos
Em parecer enviado ao STF, Rodrigo Janot, o novo procurador-geral da República, sustenta que é inconstitucional o trecho de uma resolução do TSE que autoriza parlamentares a abandonarem as legendas pelas quais se elegeram para ingressar em partidos novos. Nesse entendimento, quem se render ao troca-troca partidário está sujeito a perder o mandato. A manifestação de Janot foi requerida pelo Supremo e será anexada a uma ação movida pelo PPS, partido presidido pelo deputado Roberto Freire (SP), em 12 de abril de 2011. No seu parecer, Janot anota que a simples criação de novos partidos não pode servir “de válvula de escape a toda e qualquer acomodação que os integrantes da comunidade parlamentar estejam dispostos a empreender.” Numa forte pregação contra a onda de infidelidade que acaba de levar 67 deputados federais a pularem a cerca para outros partidos, Janot anotou: “Não se pode ignorar que a criação de partido não raro significa apenas reflexo da conveniência eleitoral momentânea de um grupo de mandatários do povo e até serve como moeda de troca no mercado de interesses pouco nobres, a fim de propiciar arranjos de cargos na administração pública ou negociação visando à partilha de recursos do Fundo Partidário e do tempo de presença na propaganda partidária gratuita no rádio e na televisão.” Chama-se Renato Galuppo o advogado que assinou a ação movida pelo PPS. Ele recorda que o processo foi deflagrado mais de um ano antes da criação do PSD de Gilberto Kassab. Referindo-se à promiscuidade parlamentar que desaguou na recente criação de dois novos partidos –Pros e Solidariedade— Galuppo lamentou: “Se essa ação já tivesse sido julgada, talvez não estivéssemos assistindo a nada disso.” Nessa ação direta de inconstitucionalidade protocolada no STF há mais de dois anos e meio, o PPS se insurge contra uma resolução editada pelo TSE em 2007. Leva o número 22.610. Trata da infidelidade partidária. No seu artigo 1º, a resolução estabelece que o partido pode pedir de volta o mandato de parlamentares que se desfiliam sem justa causa. [ad#Retangulo – Anuncios – Esquerda]No parágrafo 1º desse mesmo artigo, a resolução do TSE enumera as quatro situações em que o parlamentar pode abandonar a legenda sem correr o risco de perder o mandato. São elas: 1) “incorporação ou fusão do partido”; 2) “criação de novo partido”; 3) “mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário”; e 4) “grave discriminação pessoal”. O PPS argumenta que é inconstitucional o item 2 (“criação de novo partido”) por considerar que, no sistema eleitoral brasileiro –proporcional com lista aberta de candidatos—, o dono do voto é o partido político, não o candidato. Assim, a legenda poderia exigir a devolução dos mandatos dos filiados infiéis. O procurador-geral Janot dá razão ao PPS. Para Janot, o destinatário do voto de fato seria o partido político que viabilizou a candidatura. O eleito estaria vinculado ao programa e ao ideário da legenda. Portanto, a menos que o pragrama partidário seja radicalmente alterado ou que haja perseguição pessoal ao filiado, é inquestionável o “direito do partido político de manter o número de cadeiras obtidas nas eleições proporcionais.” A ação do PPS é relatada no Supremo pela ministra Rosa Weber. Ela não está vinculada ao parecer de Janot. Pode acolher ou não o ponto de vista do procurador-geral no voto que irá submeter ao crivo do plenário do STF. Não há data para que o julgamento ocorra. Rendendo-se à realidade promíscua que marca a política brasileira, Janot propõe que a Suprema Corte acolha a ação do PPS e faça a “modulação” dos seus efeitos. Nessa hipótese, o tribunal decidiria que a mudança para um novo partido sujeitaria o parlamentar infiel à perda de mandato. Mas, em nome da “segurança jurídica”, informaria que a regra só valeria para o futuro. Ou seja: quem já pulou a cerca não corre nenhum risco. Quando a ação do PPS chegou ao Supremo, a relatora era a ministra Ellen Gracie. Acompanhado do advogado Galuppo, o presidente do PPS, Roberto Freire, visitou a ministra. Rogou-lhe que deferisse o pedido de liminar contido na ação. Nessa época, ainda filiado ao DEM e com a máquina da prefeitura de São Paulo nas mãos, Gilberto Kassab aparelhava-se para criar o PSD. Ellen deu de ombros, indeferiu a liminar, e requisitou a manifestação do procurador-geral. Chefiava o Ministério Público Federal nessa época o doutor Roberto Gurgel. Em tese, ele deveria ter respondido ao STF em cinco dias. Silenciou. Ellen Gracie aposentou-se. Foi substituída pela ministra Rosa Weber, que herdou-lhe os processos. E nada da manifestação de Gurgel. Nesse meio tempo, Kassab obteve no TSE a certidão de nascimento do seu PSD. Arrastou para sua legenda 52 deputados federais. Os partidos que perderam quadros para o PSD se juntaram numa ação judicial. Tentando reduzir os danos, sustentaram no STF a tese segundo a qual os deputados desertores não tinham o direito de levar para a agremiação de Kassab a verba do Fundo Partidário e o tempo de propaganda no rádio e na tevê correspondentes à votação de cada um. Os partidos perderam. Prevaleceu no Supremo, por maioria de votos, o seguinte entendimento: se a Justiça Eleitoral autoriza um novo partido a funcionar, precisa prover-lhe os meios. Assim, os deputados infiéis teriam, sim, o direito à “portabilidade” das respectivas cotas do Fundo Partidário e do tempo de propaganda. Resultado: os deputados passaram a circular pelos corredores da Câmara com um código de barras na lapela. O tempo continuou passando. E nem sinal da manifestação Roberto Gurgel sobre a ação do PPS. Sobrevieram o Pros e o Solidariedade. O mandato de Gurgel expirou sem que ele se dignasse a enviar à ministra Rosa o parecer que a antecessora Ellen requisitara. Seguiu-se um novo surto de infidelidade. De repente, Janot, o substituto de Gurgel, envia ao STF, com dois anos e meio de atraso, a resposta que poderia ter atenuado o descalabro. Brasilllll! – Serviço: Aqui, a íntegra do parecer do procurador-geral Rodrigo Janot (tem 20 folhas).