Casimiro de Abreu – Versos na tarde – 28/03/2016
Amor e Medo Casimiro de Abreu¹ Quando eu te vejo e me desvio cauto Da luz de fogo que te cerca, ó bela, Contigo dizes, suspirando amores: – “Meu Deus! que gelo, que frieza aquela!” Como te enganas! meu amor, é chama Que se alimenta no voraz segredo, E se te fujo é que te adoro louco… És bela – eu moço; tens amor, eu – medo… Tenho medo de mim, de ti, de tudo, Da luz, da sombra, do silêncio ou vozes. Das folhas secas, do chorar das fontes, Das horas longas a correr velozes. O véu da noite me atormenta em dores A luz da aurora me enternece os seios, E ao vento fresco do cair cias tardes, Eu me estremece de cruéis receios. É que esse vento que na várzea – ao longe, Do colmo o fumo caprichoso ondeia, Soprando um dia tornaria incêndio A chama viva que teu riso ateia! Ai! se abrasado crepitasse o cedro, Cedendo ao raio que a tormenta envia: Diz: – que seria da plantinha humilde, Que à sombra dela tão feliz crescia? A labareda que se enrosca ao tronco Torrara a planta qual queimara o galho E a pobre nunca reviver pudera. Chovesse embora paternal orvalho! Ai! se te visse no calor da sesta, A mão tremente no calor das tuas, Amarrotado o teu vestido branco, Soltos cabelos nas espáduas nuas!… Ai! se eu te visse, Madalena pura, Sobre o veludo reclinada a meio, Olhos cerrados na volúpia doce, Os braços frouxos – palpitante o seio!… Ai! se eu te visse em languidez sublime, Na face as rosas virginais do pejo, Trêmula a fala, a protestar baixinho… Vermelha a boca, soluçando um beijo!… Diz: – que seria da pureza de anjo, Das vestes alvas, do candor das asas? Tu te queimaras, a pisar descalça, Criança louca – sobre um chão de brasas! No fogo vivo eu me abrasara inteiro! Ébrio e sedento na fugaz vertigem, Vil, machucara com meu dedo impuro As pobres flores da grinalda virgem! Vampiro infame, eu sorveria em beijos Toda a inocência que teu lábio encerra, E tu serias no lascivo abraço, Anjo enlodado nos pauis da terra. Depois… desperta no febril delírio, – Olhos pisados – como um vão lamento, Tu perguntarás: que é da minha coroa?… Eu te diria: desfolhou-a o vento!… Oh! não me chames coração de gelo! Bem vês: traí-me no fatal segredo. Se de ti fujo é que te adoro e muito! És bela – eu moço; tens amor, eu – medo!… ¹Casimiro José Marques de Abreu * Barra de S. João, RJ – 1893 d.C + Rio de Janeiro – 18 Outubro 1860 d.C [ad#Retangulo – Anuncios – Duplo]