A presidente Dilma, como se diz na linguagem popular, parece estar iniciando um “revertério, na política externa brasileira. Apesar da ainda inexplicável presença de Marco Aurélio “Top-Top” Garcia na assessoria de D. Dilma, a ‘real politik’ prevalece sobre os desvairos ideológicos. Mesmo antes de assumir, recentemente eleita, a presidente Dilma marcou posição sobre o controverso tema: “Não concordo com as práticas medievais características que são aplicadas quando se trata de mulheres. Não há nuances e eu não farei nenhuma concessão em relação a isso”. “Não concordo com o modo como o Brasil votou. Não é a minha posição”. Ave! O Editor Brasil muda de rumo, vota contra Irã na ONU e irrita regime dos aiatolás [ad#Retangulo – Anuncios – Esquerda]Após dez anos de atuação diplomática que poupou Teerã de censura em fóruns internacionais sobre direitos humanos, País dá sinal de que o Itamaraty agirá com menos condescendência em relação a Estados que promovam violações de garantias individuais Marcando uma mudança importante na atuação da diplomacia brasileira, a representação do Brasil no Conselho de Direitos Humanos da ONU votou ontem em favor de uma proposta, patrocinada por EUA e Europa, que determina o envio de um relator independente para investigar a situação das garantias individuais no Irã. O regime iraniano reagiu irritado. A diplomacia iraniana acusou o País de “dobrar-se” à pressão dos EUA e insinuou uma traição. Argélia, Paquistão e outros países islâmicos também atacaram a posição brasileira. A nova posição do Brasil – antecipada na véspera pelo Estado – , que nos últimos dez anos havia poupado o regime iraniano de censura em fóruns internacionais, foi comemorada por ONGs e países ocidentais. A proposta foi aprovada com 22 votos a favor e 7 contra, com 14 abstenções. Entre os aliados do Irã estavam Cuba, China e Paquistão. A esperança de Teerã era de que o governo brasileiro se abstivesse, repetindo o padrão de votação durante o mandato de Luiz Inácio Lula da Silva – que havia buscado intensificar a aproximação com o Irã para se apresentar até mesmo como mediador na questão nuclear entre Teerã e Washington. Ontem, o mal-estar na relação com o Irã ficou explícito. “É mesmo lamentável ver o Brasil adotar essa posição”, afirmou o embaixador do Irã na ONU, Sayad Sajjadi. “Não esperávamos isso do Brasil”, disse. Na segunda-feira, um dia depois da saída de Barack Obama do Brasil, o iraniano pediu uma reunião com a missão brasileira em Genebra, justamente para pressionar por uma mudança de posição. Seu recado foi de que Brasília não poderia fazer parte da campanha americana. Mas não foi ouvido. Em seu discurso ontem à ONU, Sajjadi acusou a resolução de fazer parte de uma “campanha política organizada pelos EUA”. “Mais uma vez, o tema de direitos humanos tem sido manipulado para defender os interesses de alguns”, alertou. Segundo ele, são os EUA os maiores responsáveis por violações no mundo, citando o apoio a Israel, guerras no Iraque e Afeganistão e prisões secretas pelo mundo. “Queremos manter o diálogo e esperávamos que a ONU fosse o lugar para isso. No Irã, estamos trabalhando pelos direitos da população e isso tem florescido”, alegou, contradizendo o relatório do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon que aponta que a repressão tem sofrido uma alta preocupante no Irã. Questionado se a relação comercial com o Brasil e a eventual participação na negociação nuclear seria afetada, o embaixador não foi otimista. “Isso é o que teremos de ver agora”, alertou. A embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo, minimizava o voto e se esforçava para convencer de que o voto não era contra o Irã nem uma admissão dos erros do governo Lula. “É um voto a favor do sistema, não é um voto que é contra o Irã”, disse. Segundo ela, o voto é ainda “coerente” com as posições que o país tem defendido na ONU. “Estamos dizendo a todos os países da ONU que a abertura para o sistema, receber visitas e dialogar é importante”, apontou. Para ela, o governo Dilma insistirá que todos os países terão de ter um mesmo tratamento. Mahmoud Ahmadinejad mantinha a relação com o Brasil como prova de que nem todo o mundo ocidental e democrático era contra o Irã. Mas nos primeiros dias do governo de Dilma – que em declarações públicas e entrevistas posicionou-se de forma contrária à sentença de apedrejamento da prisioneira iraniana Sakineh Ashtiani e deixou claro que não transigiria em temas de direitos humanos -, os iranianos já haviam se mostrado irritados com a presidente. Há um mês, em entrevista ao Estado, o chanceler iraniano confirmou atritos na relação bilateral. Ontem, Mohammad Reza Ghaebi, negociador iraniano para temas de direitos humanos, foi ainda mais duro: “Neste momento que o Brasil deveria mostrar que é um país independente, e não um país pequeno que se curva aos interesses dos EUA”, acusou. “É lamentável. Era uma questão de princípios”, afirmou. Orientado pessoalmente pela presidente, a ordem do Itamaraty era a de mostrar que o Brasil terá uma nova posição sobre direitos humanos. Outra constatação do País foi de que as oportunidades já foram dadas ao Irã por anos e Teerã não as aproveitou. Do lado iraniano, porém, o sentimento de traição não vem por acaso. Na última década, o governo brasileiro se absteve ou votou contra todas as resoluções que condenavam o Irã. No ano passado, o Brasil foi um dos dois únicos países a não apoiar sanções contra Teerã por seguir com seu programa nuclear. No final de 2010, o Brasil absteve-se numa resolução que condenava o apedrejamento no Irã. Na ocasião, o ex-chanceler Celso Amorim alegou que “não votaria para agradar à imprensa”. Ontem, apenas ditaduras votaram em favor do Irã. Países islâmicos, que durante o governo Lula foram poupados de críticas por parte do Itamaraty, também não economizaram críticas ao Brasil. “O novo governo brasileiro está votando para agradar à opinião pública interna e ao Ocidente, não para mudar a vida dos iranianos”, afirmou o embaixador da Argélia na ONU, Idriss Jazairy.